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quarta-feira, 30 de maio de 2012

SUICÍDIO - UMA FUGA SEM NORTE , SEM SENTIDO, SEM RAZÃO




 Em julho de 1862, Kardec analisa uma estatística estarrecedora e publica na Revista Espírita que “desde o começo do século XIX, o número dos suicídios na França de 1836 a 1852, era de 52.126 suicídios, ou seja em média 3.066 por ano. Em 1858, contaram-se 3.903 suicídios, dos quais 853 mulheres e 3.050 homens; enfim, segundo a última estatística no curso do ano de 1859, 3.899 pessoas se mataram, a saber, 3.057 homens e 842 mulheres."(1)
Atualmente, como se não bastasse o inquietante “Dia Nacional de Prevenção ao Suicídio”, a Justiça francesa está investigando a onda de suicídios na operadora de telefonia France Telecom. Nos últimos anos, 46 funcionários da companhia se mataram – 11 deles apenas em 2010, segundo dados da direção da empresa e dos sindicatos. Infelizmente , são exatamente nos países ricos, em que a ambição e o materialismo se acentuam, onde sobressaem os preconceitos que o número de óbitos por suicídios é aterrorizante. Segundo estimativa dos estudiosos, alguns países do Velho Continente carecem de um “plano nacional para a prevenção de suicídios”, pois é ameaçador o número de mortes auto-infligidas.
Kardec  escreveu que o suicídio é contagioso; “o contágio não está nem nos fluidos nem nas atrações; ele está no exemplo que familiariza com a ideia da morte e com o emprego dos meios para que ela se dê; isto é tão verdadeiro que quando um suicídio ocorre de uma certa maneira, não é raro ver vários deles do mesmo gênero se sucederem.”(2)  Quinze anos antes da Revolução Francesa , o lançamento do livro “Werther” do poeta alemão Goethe, provocou uma onda de suicídio na Europa. “Romeu e Julieta, criação de Shakekspeare, assim como tantos Romeus e Julietas da vida real, se matam para vingar-se de seu ambiente e das pessoas que estão ao seu redor”(3)
Albert Camus em “O Mito de Sísifo” defende a tese que só existe um problema filosófico realmente grave: o suicídio - Julgar se a vida vale ou não a pena ser vivida é responder a questão de filosofia.(!?) Que o abonem os escritores Artur Shopenhauer  em “As Dores do Mundo”, que induz seu leitor invigilante ao suicídio, e Friedrich Wilhelm Nietzsche que escreveu em “Assim Falava Zaratustra” que orar é vergonhoso,  afirmando  que “a ideia do suicídio é uma grande consolação: ajuda a suportar muitas noites más.”(!?) .
O suicídio é uma ação unicamente humana e está presente em todas as civilizações. Suas matrizes originais são abundantes e intricadas. Algumas pessoas (re)nascem com certas desordens psiquiátricas, tal como a esquizofrenia e o alcoolismo, o que obviamente acresce o risco de suicídio.  Os determinantes do autocídio patológico estão nas ansiedades mentais, desesperanças, desgostos, intranquilidades emocionais, alucinações recorrentes. Pode estar vinculada a falência financeira, vergonha e mácula moral, decepções amorosas, depressão, solidão, medo do futuro, soberba pessoal (recusa a admitir o fracasso) ou exacerbado amor próprio (acreditar que sua imagem não possa sofrer nenhum arranhão ou ferimento). Mas, cremos que a exata causa do suicídio não está nas ocorrências infelizes em si, todavia na atitude como a pessoa cede diante do desgosto.
Há autoextermínio por ideias fixas, realizados fora do império da razão, como aqueles, por exemplo, que ocorreram na psicose, na embriaguez; aqui a causa é meramente fisiológica; mas paralelamente “se encontra a categoria, muito mais numerosa, dos suicídios voluntários, realizados com premeditação e com pleno conhecimento de causa.”(4) O Codificador indagou aos espíritos - “que pensar do suicídio que tem por causa o desgosto da vida?”. Os Benfeitores responderam: "Insensatos! Por que não trabalhavam? A existência não lhes seria uma carga!"(5)
Há dois milênios Jesus disse: “Bem-aventurados os que choram, pois que serão consolados”.(.6) Mas, como compreender a conveniência de sofrer para ser feliz?  Por que uns já (re)nascem abastados e outros na miséria, sem nada haverem feito (na atual existência)que justifique essas posições? “A certeza da imortalidade pode confortar e gerar resignação, contudo não elucida essas aberrações, que parecem contradizer a justiça Divina. Se Deus é soberanamente bom e justo, não pode agir caprichosamente, nem com parcialidade. Logo, as vicissitudes da vida derivam de uma causa e, pois que Deus é justo, justa há de ser essa causa.” (7)
Na Terra, é preciso ter tranquilidade para viver e conviver, até porque, não há tormentos e problemas que perdure uma eternidade. Lembremos que a vida não assenta em nossos ombros fardos mais pesados que nossos limites e carregá-los. A calma e a resignação hauridas da maneira de avaliar a vida terrestre e da certeza no futuro “dão ao espírito uma serenidade que é o melhor preservativo contra a loucura e o suicídio.” (8) Porém, a incredulidade, a simples suspeição sobre o futuro espiritual, as opiniões materialistas, por fim, são os grandes incitantes ao suicídio e ocasionam o acovardamento moral.
Os Benfeitores Espirituais advertem que o suicídio é comparável a alguém que pula no escuro sobre um despenhadeiro de brasas. Após a morte ,  descrevem os espíritos , advém ao suicida a sede, a fome, a friagem ou o calor insuportável, o cansaço, a insônia, os irresistíveis desejos impudicos, a promiscuidade e as tempestades com constantes inundações de lamas fétidas. E pior, aos que fogem da luta,  recordamo-lhes que adiar dívida moral significa reencontrá-la mais tarde (pela reencarnação) com juros somados com cobrança sem moratória.
A Terceira Revelação comprova através das comunicações mediúnicas a posição desventurada em que se deparam os suicidas e comprova  que nenhuma pessoa infringe impunemente a lei de Deus. O espírita tem, assim, vários motivos a contrapor à ideia do suicídio: a confiança de uma vida futura, em que, sabe-o ele, será de tal maneira mais venturosa, quão mais infeliz e abdicada tenha sido na Terra.
É vero! O suicídio é uma porta falsa em que o indivíduo, avaliando alforriar-se de seus incômodos, desmorona em circunstância extremamente mais arruinada. Precipitado, violentamente, para o Além-túmulo, repleto de fluido vital no corpo aniquilado, revive, continuamente, por longo tempo, os espicaces de consciência e sensações dos últimos momentos, além de permanecer debaixo de  penosa tortura aprisionado aos despojos carnais sob a própria tumba. Como se ainda não bastasse, permanecerá na dimensão espiritual submerso em regiões de penumbras, onde seus martírios serão tenazes , a fim de aprender na dor pungente a respeitar a vida com mais empenho noutras oportunidades reencarnatórias.
Portanto, “a certeza de que, abreviando a vida, chega justamente a um resultado diferente daquele que espera alcançar; que se livra de um mal para tê-lo um pior, mais longo e mais terrível, que não reverá, no outro mundo, os objetos de sua afeição, que queria ir reencontrar; de onde a consequência de que o suicídio está contra os seus próprios interesses. Também o número de suicídios impedidos pelo Espiritismo é considerável, e se pode disso concluir que quando todo o mundo for espírita, não haverá mais suicídios voluntários, e isso chegará mais cedo do que se crê.” (9)
Sabemos que a prece é um apoio para a alma; contudo, não basta: é preciso tenha por base uma fé viva na bondade do Criador. Destarte, quando nos advenha uma causa de sofrimento ou de contrariedade, urge sobrepor-se a ela, e, quando houvermos conseguido dominar os ímpetos da impaciência, da cólera, ou do desespero, devemos dizer, cheio de justa satisfação: "Fui o mais forte."  (11)
Ante o impositivo da Lei da fraternidade, precisamos orar pelos nossos irmãos que deram fim às suas vidas, apiedando-nos de suas dores, sem condená-los.
Jorge Hessen
http//jorgehessen.net
Referências bibliográficas:
(1)Análise sobre Estatística dos suicídios que  Kardec fez  do livro “Comédie sociale au dix-neuvième siècle” , autoria de B. Gastineau, publicado na Revista Espírita, julho de 1862
(2)Idem
(3)Disponível em http://www.espirito.org.br/portal/artigos/geae/argumentos-suicidio-1.html
(4)Análise sobre Estatística dos suicídios que  Kardec fez  do livro “Comédie sociale au dix-neuvième siècle” , autoria de B. Gastineau, publicado na Revista Espírita, julho de 1862
(5)Kardec , Allan. O Livro dos Espíritos, RJ: Ed FEB, 2001, perg. 945
(6)Lc. VI, vv. 20 e 21
(7) Kardec , Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo, RJ: Ed FEB, 2006, cap V
(8)Idem
(9)Análise sobre Estatística dos suicídios que  Kardec fez  do livro “Comédie sociale au dix-neuvième siècle” , autoria de B. Gastineau, publicado na Revista Espírita, julho de 1862
 (10) Kardec , Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo, RJ: Ed FEB, 2006, cap V

terça-feira, 29 de maio de 2012

O CHUMBO HISTÓRICO DO CRISTIANISMO


Margarida Azevedo
Portugal

A imaturidade do espírito humano tem deturpado o trabalho exemplar dos profetas que vão passando por este planeta com o fito essencial de o libertar das forças da ignorância. As suas máximas tornaram-se difusas, como em Siddharta Gautama (Buda), o seu pensamento perturbador da ordem pública, como em Sócrates, a sua conduta politicamente inaceitável, como em Gandhi.

Porém, nenhum foi tão adulterado nos seus propósitos como Jesus. Pregador do amor e da concórdia, do perdão e da tolerância, os seus seguidores, ou os que dessa forma se apresentam, investiram-se de um sobre poder, apoiado numa espécie de força supra-sapiencial, que os conduziu a formas de divulgação de tal modo áridas e bélicas de que não há paralelismo na História das Religiões.

Se Jesus viesse hoje a este mundo seria um juíz implacável contra os seus próprios seguidores, pois seria impossível que se identificasse com o movimento a que chamamos Cristianismo. Aliás, o Cristianismo não precisa de Jesus, nem hoje nem nunca, pois ele é a sua antítese.

Os cristãos construiram um edifício ideológico que nada tem a ver com o dar a outra face, nem o sem pecado que atire a primeira pedra. Os cristãos assenhoraram-se do mundo como se este fosse deles e transformaram-no num vale de suplícios, quer para eles próprios, quer para os que não fizessem parte do seu grupo. Gradativamente, o fosso entre cristãos e Jesus, o Cristo, agigantou-se de tal forma que se houver alguma semelhança entre eles é mera coincidência.

Ao rejeitar as suas raízes judaicas e ao perseguir os judeus, o Cristianismo deu origem ao seu maior erro historico-religioso. O esforço vão de crer implementar um Jesus fora do seu meio, independente da religião de que fazia parte, retirando-o da sua natural mundaneidade conduziu a séculos de desentendimento entre ambos. Proibiram o estudo da Bíblia, fizeram dos Evangelhos letra morta, cujos estudos permaneceram encerrados nas bibliotecas da classe sacerdotal. O Cristianismo foi, assim, durante séculos uma religião bseada na ignorância. Não percebendo que Jesus veio reformular o próprio Judaísmo, baseado na redenção ou transformação interior do homem, traçando o caminho de salvação para toda a Humanidade. Segundo Jesus, ser judeu era ser portador da maior liberdade religiosa alguma vez pensada. O judeu era o escolhido por Deus para transmitir à Humanidade a existência de um Deus único, sem nome e sem representação figurativa. Em que medida o judeu podia ser diferente do gentio? No muito amor a Deus e ao próximo, na sua capacidade de perdoar, ou seja, numa vivência equilibrada entre o divino e o mundano. Jesus, como bom judeu, continuou o trabalho dos profetas, ensinando como viver com Deus e com o homens. A dimensão histórica do homem não pode ser anulada, pois ela é o palco das nossas acções para Deus. E Deus, por seu lado, para se dar a conhecer, manifesta-se na história dos homens.

Com a rejeição do Judaísmo, o Cristianismo talvez pensasse que conseguiria semelhante feito em relação ao politeísmo. Segundo erro. Não tendo força força espiritual para impor-se ao politeísmo, tão politizado quanto religioso, e pretendendo implementar-se politicamente, o Cristianismo acabou por ser absorvido por ele. A diversidade de ritos, de deuses com resposta para todas as necessidades humanas, muitos deles dependentes de grandes correntes filosóficas, de que ainda hoje somos seguidores e legítimos herdeiros, impuseram-se aos cristãos, que não tiveram bagagem intelectual nem religiosa para se lhes impor, como muito bem o fizeram os nossos irmãos judeus.

À “modernização” da vivência monoteísta de um Israel cercado por uma multiplicidade de cultos aos diversos deuses, tomado de assalto pela maior e mais poderosa super-potência politeísta, a mensagem de Jesus sobrepôs-se aos factores militares e políticos da sua época, ultrapassou barreiras sociológicas e dirigiu-se, antes de mais, “às ovelhas perdidas da casa de Israel”. Com isso, Jesus pôs fim às clivagens entre judeus e não judeus, a começar por fazer compreender aos “dissidentes” do Judaísmo o verdadeiro papel dos seguidores de um Deus libertador, a Quem devem amar acima de todas as coisas, e ao próximo como a si mesmos. Em termos práticos e sem pruridos, como é que um zelota podia amar um pastor, ou um farizeu um carpinteiro; como é que os essénios podiam amar os judeus do Templo? A diferença implementada pelos laços da consanguinidade, da profissão ou religiosa não fazia o mínimo sentido para Jesus. Um judeu que a defendesse era por ele considerado uma ovelha tresmalhada.

Esta proposta escandalosa fez tremer as estruturas vigentes, uma vez que a nova noção de próximo não coincide com a de classe social, profissional e menos ainda com a de religião. A salvação emancipa-se do factor religioso e passa para o coração do homem/mulher. A fé é igualmente libertadora no centurião romano, na mulher adúltera, no covulsionário. O sinal que tanto era pedido a Jesus já não caía do céu, estava no coração de cada um. Ser crente em Deus passou a ser uma questão de vivência interior e não uma manifestação estéril do cumprimento da Lei: o que vai na alma e o que é mostrado podem não estar em consonância. O sinal da presença de Deus mostra-se no poder da fé.

Por seu lado, a rede complexa de cultos cristãos às mais diversas Entidades, muitas delas tão ignorantes e tão trevosas como quaisquer outras, foi um substituto mal feito dos cultos que lhe pré-existiram e cuja presença ainda não foi apagada. Por outras palavras, ainda hoje os cristãos têm dificuldade em afirmar o monoteísmo do judeu Jesus, baseado no universalismo das noções de próximo e de salvação. O culto mariano e aos santos, enaltecendo os seus feitos, especialmente a sua heroicidade, martírio ou perseguição como o mostra, por exemplo, a figura de João Baptista, ou até com um historial mais erotisado, Sta. Luzia, a quem, segundo reza a lenda, o pai mandou prender nua à cauda de um cavalo, por ser cristã, mas que ninguém a viu por nesse dia se ter formado um denso banco de nevoeiro, entre outros, fazem do Cristianismo a maior antítese do pensamento de Jesus, e consequentemente uma farsa em termos de monoteísmo.

Ao estender-se aos quatro cantos do mundo, este pan-cristianismo doloroso, sem Cristo e sem Jesus, depressa cresceu como religião do medo, politicamente forte, intolerante e gananciosa. O pan-cristianismo espalhou o terror, arrumou os evangelhos na prateleira e ergueu-se como a voz da hipocrisia elevada ao maior expoente.

Este tecido sintético não conseguiu articular o cruzamento de linguagens proveniente do Judaísmo, e que este soube exemplarmente compreender e estruturar, entrando assim num caminho escorregadio onde confundiu tudo o que havia para confundir: criou redes temáticas baseadas em hermenêuticas exclusivistas, cujo resultado nos leva a termos que afirmar que somos mais seguidores de João Baptista, em termos ascepticos, de Paulo de Tarso, em questões temáticas, que propriamente de Jesus. E ainda que se defenda que é mais fácil seguir João ou Paulo do que Jesus, o certo é que impõe-se o dever de colocar Jesus em primeiro lugar, as suas máximas serem as nossas máximas, o seus preceitos serem os nossos preceitos. E nada disso ainda foi feito.

Porém, reflictamos: será que é, efectivamente, mais fácil João ou Paulo que Jesus? Será que é mais fácil seguir um pregador do deserto, que se alimenta de mel silvestre e gafanhotos, que prega um ascetismo radical, que se envolve na vida íntima de Herodes, que prega o arrependimento porque o fim está próximo? Será que é mais fácil seguir Paulo segundo 1 Cor 13:1-13, ou cumprir a máxima “Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim;”(Gl 2-20)? Em torno de Jesus poi criada a imagem do impossível e do impraticável, o que justificou a sua ausência do movimento cristão. Caminhar para Deus no mundo é bem mais fácil do que fora dele. Jesus jamais pregou uma doutrina impraticável. A sua proposta foi a de começarmos a ser outros, já neste mundo, aqui e agora. Caminhar para Deus acontece em qualquer lado, a qualquer hora, com toda a gente.

Por outro lado, Cristianismo pegou nos fracos e oprimidos, nos pobres e desavindos e fez deles o seu ex-libris. A miséria tornou-se virtude e a riqueza perdição. Com isso apresenta Deus como um amigo dos desamparados, para os quais está prometido um lugar muito especial no céu. No clímax deste discurso, muitos houve que seguiram uma vida de devoção à pobreza mais do que a Deus. Seguir um ideal baseado em ausências, incluindo da própria saúde, converteu-se em senda beatificante para atingir o eterno descanso e a luz perpétua. Jejuar, enfraquecer à fome e à sede com o fim de abreviar a vida, auto-mutilar-se ou flagelar-se transformaram-se nos mais cínicos substitutos da verdadeira apologética de Jesus, a saber, a transformação intrínseca do ser humano. Não perceberam que Jesus jamais defendeu tais práticas e que, portanto, a sua mensagem foi totalmente adulterada.

Com tudo isto não é de causar espanto que, aquando da pergunta “ O que é o Cristianismo?”, a resposta não surja. Como definir uma religião que vai contra os princípios do profeta que diz estar na sua origem? Como justificar e definir uma religião criada sobre as bases de um profeta que ninguém segue, que viveu noutra religião, e cuja temática foi a reformulação da mesma, face à conduta dos seus seguidores? Como explicar a criação de uma religião a partir de determinado profeta, o qual, por sua vez, não criou religião nenhuma? O que é e de onde vem tudo isto?

Mas a questão principal ainda não é esta. Além de pregar o amor como condição máxima para ter um lugar no Reino de Deus, Jesus foi igualmente um profeta da alegria, o que também é uma novidade, tão importante como defender o amor. O ambiente festivo da boa mesa, como muito bem nos descreve Lucas, e o amor ao próximo são os dois pilares fundamentais do seu edifício religioso. Dito de outro modo, o mundo, como criação de Deus, é para amar, e viver nele deve ser um estado de alegria. Jesus desperta-nos para um Deus sem sacrifícios mas de prazer, sem abstinências mas de salutar convívio em comunhão.

Tenhamos em linha de conta que entrar em casa de uma pessoa, para um judeu do tempo de Jesus, era entrar na intimidade dela, donde tomar uma refeição em casa de alguém era comungar com essa pessoa. Tratava-se de situações de tal forma específicas e importantes que não eram possíveis entre classes sociais diferentes. Os doentes, aleijados, pobres, mulheres, crianças eram considerados inferiores e impuros, tais como as profissões de pastores, prostitutas, cobradores de impostos, os que sepultavam os mortos, etc., que, como tal, não eram convidados para nada. Jesus, porém, não age dessa forma. O seu objectivo foi mostrar que todos têm dignidade e fé, além de que todos podem alcançar o Reino de Deus, bastando para isso que cumpram as máximas de uma vivência em amor e paz.

Ora, o factor determinante para o chumbo do Cristianismo consiste precisamente em não perceber a dimensão de amor, alegria e liberdade defendidos por Jesus. Ao arrepio de tudo isso, a alegria era pecado, as imagens de sofrimento proliferaram, a dor foi enaltecida e adorada, cultuou-se a imagem de Jesus crucificado ao invés de um profeta cheio de vida e de Luz.

Nesta apologética, chegou-se ao ponto de defender, nalguns casos, o celibato, pois que ter filhos, ou ter uma normal vida sexual tornou-se pecaminoso. Não ter filhos, nem família, nem amar alguém foi convertido em ideal salvífico, o nobre desapego das coisas materiais. A sexualidade tornou-se corrupta e enganadora do Espírito, impeditiva da sua libertação; viver para Deus era desprezar o mundo porque corrompido, um paraíso perdido pela força do pecado.

Estavam desta forma criadas as linhas de força para um prolongamento do erotismo vinculado ao interdito: excluindo da sexualidade a sua componente de prazer, esta foi reduzida a acto técnico procriativo. Moralidade e sexo tornaram-se alavancas de uma doutrina baseada no fruto proíbido o mais apetecido.

Assim, ao criar interditos sem sentido, o Cristianismo tornou-se a principal vítima das suas máximas. O interdito serve apenas para despertar a curiosidade, empenhar-se em procurá-lo e descobri-lo, logo atrai a atenção para si próprio.

Em suma, as igrejas cristãs em que o Cristianismo se subdivide, facto gerador de grande confusão nos seguidores das outras religiões, com vírgulas a mais ou vírgulas a menos não respondem às necessidades espirituais dos seus seguidores. Cada vez mais os cristãos procuram fora do Cristianismo algo que complemente a ausência de respostas para os seus problemas. Isto, porém, não significa desvinculação a Jesus, é antes uma procura, uma pesquisa com o objectivo de o situar no panorama espiritual e religioso. Os cristãos já não conseguem crer sem compreender.

No século XXI, com o desenvolvimento da pesquisa sobre o Jesus histórico, e de uma maior maturidade do método histórico-críico da análise bíblica estão criadas as traves-mestras para a inauguração do verdadeiro Cristianismo. Cansados de sofrimento, perseguições e guerras, os cristãos estão a encetar um novo caminho: o da comprensão e da tolerância, aceitação da diferença e vivência pacífica com a mesma. Tal como os profetas do Antigo Israel, que sábia e coerentemente souberam reter o lado bom de algumas das máximas do politeísmo, sem que no entanto se tivessem perdido no meio delas, assim os cristãos dos novos tempos vão beber a outras fontes. O Espiritismo já deu o exemplo ao fazer de Sócrates e Platão os precursores da sua doutrina e do Cristianismo, sem que no entanto Jesus tenha ficado para segundo plano, ou que essas entidades sejam cultuadas. O Espiritismo adora a Deus e aceita Jesus como o seu profeta, não descurando o importantíssimo papel de tantos outros.

Com a renovação imperiosa do Cristianismo, a segunda vinda de Cristo está à porta. Do seu Corpo Místico fazem parte todos aqueles que desejam viver em amor e paz. Essa vinda não será física, mas em Espírito. Ela consistirá na vitória de todos aqueles que tiveram força e coragem para implementar a verdadeira religião de Jesus, o Cristo, a saber, a Religião do Amor, e esta consiste num movimento universal de todos os que fazem do Bem a sua razão de viver.

Como fazê-lo, num mundo de profundas convulsões sociais, com os seus mesmos interditos que dia após dia se multiplicam, de direitos que perigosamente se perdem e de deveres que brotam que nem cogumelos? Que cristianismo queremos construir e deixar de herança para as gerações vindouras? Antes de mais torna-se imperioso construir uma mentalidade cristã que, por sua própria natureza, consiste num ideal fraterno. O mundo nunca precisou tanto dos cristãos como hoje. Onde é que eles estão? Quem são eles? No dizer de Jesus são dois ou três. Mas será que eles têm assim tanta força, são tão poucos que passarão despercebidos!? Bem, se tivermos em consideração que não dizem Senhor! Senhor!, mas fazem a vontade do Pai, que perdoam incondicionalmente, que não apontam o argueiro no olho do outro, que ajudam todos os que deles se aproximam, que pregam a alegria, a liberdade e o amor, que dão sem esperar recompensa, que tudo agradecem a Deus, que não prestam culto a outros seres senão a Deus, que não matam, não mentem e não levantam falso testemunho de ninguém, que respeitam a família, defendem a vida, lutam pela dignidade, que vivem em comunhão fraterna e oram a Deus fervorosamente, que procuram a santidade, então não tenhamos dúvidas, esses dois ou três são milhões na força e na coragem, são luz e voz da sublimidade do amor.

Precisa-se, e rapidamente, de repensar o papel da fé, do messianismo, do que significa levar Cristo ao mundo, o que, aliás, ainda não aconteceu. Não é certamente pela mão da intolerância, mas pela voz sublime do homem renovado. Queremos um Cristianismo forte, virado para Deus, o Único, o Altíssimo.Queremos o Messias, queremos a fé libertadora. Precisamos de nos colar que nem lapas a esses dois ou três para sermos como eles.

E queremos uma nova História Cristã, a de um movimento que não exclua Jesus, onde este se reveja e não de que se envergonhe, tão simplesmente o de um messianismo com verdade.

Se o mundo já não suporta o falso cristianismo, a começar pelos próprios cristãos, não é menos verdade que esse mesmo mundo é impensável sem o Cristianismo, porque é impensável sem o movimento de amor universalista que protagonisa. Desse mundo sedento de paz e amor, está emergente a voz de Cristo.

Mundo, o Cristianismo vai começar.


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Bibliografia consultada
NIETZSCHE, O Anticristo, Guimarães, Lisboa, 2011, 1-15, pp.15-32.

NOLAN, Albert, Jesus antes do Cristianismo, Paulinas, Prior Velho, 2010, Parte I, Catástrofe, cap. I, Uma Nova Perspectiva, pp.19-28.

sábado, 26 de maio de 2012

Drogas. “Quase Viúva” (*)

LUIZ CARLOS FORMIGA



 “Os outros deram do que tinham em abundância:  porém esta deu, com indulgência, do que lhe faria  falta."
O Óbulo da Viuva
 ESE, Cap XII, 5., Marcos, XII;  Lucas XXI.


Fatores biológicos ou psicológicos podem impulsionar pré-adolescentes e jovens para a beira do precipício. No entanto, esses impulsos são liberados ou bloqueados através da influência social. O que dá legitimidade às interdições sociais são os laços afetivos familiares (1).
No fundo do precipício do suicídio há muito sofrimento, também para os que ficam. Parentes terão que perdoar e abundar em indulgência. Trabalhar pela prevenção é iniciativa feliz.
Carmélio Marques Lima atirou-se da ponte do Rio Itapecuru, Rosário, Maranhão, janeiro 1999, após o 4º dia ininterrupto usando álcool e outras drogas!
No dia, 29 de abril de 2012, Reinaldo Lima, o pai, foi fotografar nova paisagem na ponte para mudar o visual do seu Blog, criado, com lucidez, para fomentar a implantação da política: Educação Familiar, objetivando ser instrumento de prevenção ao uso e abuso de drogas. Como Reinaldo formulou a proposta?
Iniciou fazendo o estudo de Gottman, PhD. Inteligência Emocional e a arte de educar nossos filhos. RJ 10ª Ed., Editora Objetiva, 1.997. Pesquisa realizada em Illinois, USA, l986. (2)
Em seguida, o estudo de “Quem Ama Educa!” Içami Tiba, São Paulo, 83ª., Editora Gente, 2002, comparando-o com Gottman, PhD. Inteligência Emocional e a arte de educar nossos filhos. Depois, organizou um Seminário. Julho de 2004. A Arte de Educar Filhos. Com enfoques de Gottman, Tiba. Rappaport, Szkymanski, Zagury, Kaloustian entre outros. O evento contou com a participação de 36 profissionais da área de Educação.
Como esses ensinamentos poderiam chegar ao conhecimento popular?
Tópicos foram formulados para desenvolvimento, com auxílio oficial. A proposta sistematizada foi encaminhada ao governo estadual e federal, mas há frustração.
Tópicos: Família como Instituição; Responsabilidade Familiar; Relacionamento Conjugal; Psicologia da Infância; Adolescência e Busca da Identidade; Relacionamento Pais e Filhos; Cidadania e Cidadão; Qualidade Pessoal, Autoestima e Visão Empreendedora.
O que, enquanto espíritas, necessitamos enfatizar? O desenvolvimento da Inteligência Espiritual? Como fazê-lo?
Na Faculdade de Educação aprendemos: inteligência cognitiva(QI). Elaboramos conceitos, fazemos ciência, organizamos o mundo, solucionamos problemas objetivos. inteligência emocional (QE). “Capacidade de identificar sentimentos, de nos motivarmos e de gerir bem as emoções internas e nos nossos relacionamentos."
O período infanto-juvenil é decisivo na vida das pessoas. É necessário, portanto, dar-lhes uma razão para viver, para que, mais tarde, não venham a apresentar um grande vazio interior. (1). Aí pensamos em “Educação e Valores”. Em inteligência espiritual (QS), aquela que incentiva a procura de um significado para a vida.(5)
Cientistas descrevem área nos lobos temporais ligada aos valores ético-morais. Aí nos lembramos do valor da capacidade de perdoar para a Psicoimunologia (3).
Capacidade de Perdoar. “Quantas vezes perdoarei o meu irmão? Não sete vezes, mas setenta vezes sete vezes.” Aí tendes um dos ensinos de Jesus que mais vos devem estimular a inteligência e mais alto falar ao coração. (4)
Como perdoar? Ele ficava na rua 3 dias. Subia o morro. Gastava todo dinheiro (dois filhos), bebia, cheirava.Voltava, sujo, triste e faminto. Cruzava a porta e meus sentimentos se misturavam. Alívio, por estar vivo (não estava viúva), e pena. A tristeza me dava sensação de fracasso e incapacidade.
Evangelho Segundo o Espiritismo (ensinos morais do Cristo), Cap X. Bem Aventurados os Misericordiosos
Perdoarás, sem limites, cada ofensa tantas vezes, quantas te for feita; ensinarás a teus irmãos esse esquecimento de si mesmo, que torna a criatura invulnerável ao ataque, aos maus procedimentos e às injúrias. (4)
O que fez a esposa quando ficou sabendo? Quando fiquei sabendo, a primeira coisa que fiz foi criticar e julgar. Brigava, chorava e depois perdoava. Passei longos anos  assim. Eu o amava e tentava tirá-lo dessa vida. Dopava-me – calmantes -  e entrava em profunda depressão. Aí aconteceu a terceira gravidez  – nasceu uma menininha.
“Estudai e comentai estas palavras que vos dirijo da parte daquele que, do alto dos esplendores celestes, vos tem sempre sob as suas vistas e prossegue com amor na tarefa ingrata a que deu começo faz dezoito séculos.”(4)
O que aconteceu quando nasceu o segundo?
O segundo filho nasceu. Fiquei feliz e desorientado. Minha situação financeira era péssima. Saí da maternidade e fui ao morro procurar cocaína, para fugir da realidade e de mim mesmo.
Como perdoar? O mérito do perdão é proporcional à gravidade do mal. Nenhum merecimento teríeis em relevar os agravos dos vossos irmãos, desde que não passassem de ofensas leves, simples arranhões. (4)
Na Casa Espírita. Depois de mais um sumiço reapareceu triste e solitário, estendeu a mão e pediu ajuda. Mais uma vez acreditei. Encontrei ajuda. Misericórdia de Jesus. Meu esposo estava doente, precisava de apoio e compreensão.
Se vós vos dizeis espíritas, sede-o, pois. Olvidai o mal e não penseis senão numa coisa: no bem que podeis fazer. (4)
Dez Anos Depois. Hoje sou feliz. Fiz a minha parte. Apesar das críticas, não abandonei o barco. Agradeço pela força que ele teve ao se admitir um adicto e aceitar com humildade a ajuda oferecida.
Estes são depoimentos encontrados no livro Alcoolismo e Drogas. Caminhos de Esperança 1)
Podemos fazer um pouco mais, quando chegamos a um nível mais alto da inteligência espiritual.
Não olvideis que o verdadeiro perdão se reconhece pelos atos. Perdoar aos amigos é dar-lhes uma prova de amizade. Mas, perdoar aos inimigos... é fazer algo mais.  Paulo. (Lião,1861). Perdão das Ofensas. (4)
A inteligência espiritual e a Família. O afeto recebido é que torna crianças e jovens capazes de tolerar e se submeter às normas sociais e familiares, controlando seus impulsos, ao invés de por eles serem controlados. (1)



(*) Texto escrito para o Seminário sobre “Dependência Química e Espiritismo”. Cartaz em






Fontes
1. A Influência da Mídia. P 83-84. “Alcoolismo e Drogas. Caminhos de Esperança”. MAP Editora.
4. ESE. Cap X. Bem Aventurados os Misericordiosos
5. Universidade e Espiritualidade

sexta-feira, 25 de maio de 2012

PENSAR


 O dicionarista define o termo “pensamento” como o ato de refletir o processo mental que se concentra em ideias, formulações de conceitos e de juízos. O mecanismo pelo qual se opera o fenômeno do pensamento é enigma que os ilustres acadêmicos não conseguiram, ainda, desvendar.
Diz-se que o Universo é a projeção da Mente Divina e a Terra, qual a arquitetamos em seu aspecto político, econômico e social, é reflexo da Mente Humana ainda delirante sob o tacão do egoísmo e da ambição. A mente, em que pese a indefinição do limitado ajuizamento científico, é locus de toda manifestação vital no planeta. Qual um espelho de luz, segundo os Benfeitores espirituais, emitindo raios e assimilando-os, a mente é a matriz de treva ou de luz, alegria ou infelicidade, paz ou guerra, onde quer que se manifeste.
Para fins elucidativos, assinalemos a estrutura mental estratificada em três níveis, a saber: “consciente” (personalidade) como um sistema de acesso, gravação e reprodução; “subconsciente”, material adquirido na atual experiência física arquivado temporariamente nos arcanos do ser; e, finalmente, o “inconsciente” (individualidade), conteúdo imêmore, de vidas transatas e que pode ser reconstruído por determinados artifícios psicológicos, a exemplo do sonho e da “regressão” hipnótica.
Categoricamente, muito de nossos atos só advém porque pensamos alguma coisa, cobiçamos algo, cremos ou descremos em algo, receamos algo, ou seja, há uma condição individual que gera um tipo de circulação no mundo palpável. Deste modo, é difícil, na prática, vacilar sobre esse fato, logo, a influência do que pensamos sobre o que vivemos é bem maior do que, comumente, concebemos.
"O pensamento é o gerador dos infracorpúsculos ou das linhas de força do mundo subatômico, criador de: correntes de bem ou de mal, grandeza ou decadência, vida ou morte, segundo a vontade que o exterioriza e dirige." (1) Energia viva, o pensamento desloca, em torno de nós, forças sutis, construindo paisagens ou formas e criando centros magnéticos ou ondas, com os quais emitimos a nossa atuação ou recebemos a atuação dos outros.
A gravidade no campo mental é tão contundente, quanto no domínio da experiência física. Estaremos sempre sob o influxo de nossas próprias criações, seja onde for. Pensamos, e produzimos vida ao componente imaginado. Temos, então, pensamentos que geram ações, que geram pensamentos, que geram ações. Ações que geram o mundo, que gera ações. O pensamento do outro que constitui o meu pensamento, que constitui o pensamento do outro.
Nessa dinâmica aprendemos que existem pessoas desregradas infestando todos os pontos da Terra, em vista do caráter evolutivo inferior em que ainda se deparam os agrupamentos humanos e, muitas vezes, multidões de espíritos devassos exercitam vampirismo junto dos encarnados incautos, puramente no intento de continuarem fixadas às sensações do campo físico das quais não se desvencilharam (subjugação). Quem mentalize tramoias com o cofre público, violências de toda ordem, erotismos, infidelidade conjugal, crimes, desventura e excitação, só poderá agir e reagir sob o impacto da desarmonia e do desgosto pessoal.
Cada mente é um verdadeiro mundo de emissão e recepção de ondas magnéticas e cada qual atrai os seres que se lhe assemelham. Os adúlteros se procuram, os tristes agradam aos tristes, os violentos se reúnem, os bons estabelecem laços recíprocos de trabalho e realização. Sob o ponto de vista espírita, "nosso espírito residirá onde projetarmos nossos pensamentos, alicerces vivos do bem e do mal".(2)
Atraímos pessoas e recursos, de conformidade com a natureza de nossas ideias, aspirações, invocações e apelos. Quem se atira ao subterrâneo da desonra, da improbidade, do adultério, será influenciado por espíritos perversos e depravados que os buscarão, seduzidos pelo tipo de suas tendências recrimináveis e absorverão os conteúdos mentais lançados, arremessando sobre os desonestos e infiéis as exalações deteriorantes.
É do alicerce palpável da ideia que despontam as asas dos anjos e as grilhetas dos condenados. Vigiemos os pensamentos, depurando-o no trabalho incessante do bem, a fim de arremetermos de nós a algema capaz de agrilhoar-nos a indigestos artifícios de vida promíscua. Pelo pensamento malsão escravizamo-nos a genealogias de agonia cruel, sentenciando-nos, muitas vezes, a séculos de perambulação nos carreiros da dor e do autoextermínio. Nossos pensamentos compõem, no fundo, cargas de força eletromagnética, com as quais golpeamos ou acalentamos, protegemos ou danificamos, vitalizamos ou aniquilamos, e que regressam, firmemente, a nós mesmos, saturadas dos recursos ditosos ou deprimentes com que lhe assinalamos a rota.
É absolutamente inútil proclamarmos o título de “cristãos” sem nenhum empenho de sublimação do pensamento, aliás, é tão arriscado para alguém quanto deter uma qualificação honorífica entre os homens com menosprezo pela responsabilidade que ela inflige. Segundo os Benévolos seres do além , os títulos de fé não se fundam em meras palavras, acobertando-nos deficiências e desvios morais. Anunciam obrigações de melhoria a que não nos será lícito esquivar, sem agravo de constrangimentos.
O pensamento é um núcleo de forças inteligentes, produzindo plasma sutil que, a exteriorizar-se ininterruptamente de nós, harmoniza recursos de concretude às figuras de nossa imaginação, sob o governo de nossos próprios desígnios. Escalemos o plano superior, instilando pensamento de sublimação naqueles que nos cercam. Procuremos a consciência de Jesus para que a nossa consciência lhe retrate a perfeição e a beleza!...
Para Emmanuel “a mente é o espelho da vida em toda parte. Ergue-se na Terra para Deus, sob a égide do Cristo, à feição do diamante bruto, que, arrancado ao ventre obscuro do solo, avança, com a orientação do lapidário, para a magnificência da luz. Nos seres primitivos, aparece sob a ganga do instinto, nas almas humanas surge entre as ilusões que salteiam a inteligência, e revela-se nos Espíritos Aperfeiçoados por brilhante precioso a retratar a Glória Divina.”(3)
Jorge Hessen
http://jorgehessen.net

Referência bibliográfica:
(1) Xavier, Francisco Cândido. Roteiro, Ditado pelo Espirito Emmanuel, Rio de Janeiro: Ed FEB 1972
(2) Xavier, Francisco Cândido. Pão Nosso, Ditado pelo Espirito Emmanuel, Rio de Janeiro: Ed FEB 2000,
(3) Xavier, Francisco Cândido. Pensamento e Vida, Ditado pelo Espirito Emmanuel, Rio de Janeiro: Ed FEB 1990,

segunda-feira, 21 de maio de 2012

PERDOAR É TER DOMINIO SOBRE A FELICIDADE PARA CONQUISTAR A PAZ


Todos ansiamos a conquista da paz e procuramos a alegria  de viver na Terra. Porém, que tipo de felicidade é essa que quanto mais se caça mais afastada permanece? Para que verdadeiramente conquistemos a paz e a felicidade, é urgente reconhecermos nossas fraquezas morais e colocarmos em prática a melhoria pessoal. Das diferentes angústias que nos afastam da paz e da felicidade, a mágoa tem lugar de relevo. Pensando nisso, deliberamos escrever a respeito do perdão, por considerar ser uma das grandes virtudes, por via das quais conseguiremos a paz e a felicidade cobiçadas.
A ordem “perdoar setenta vezes sete vezes” proferida por Jesus precisa ser aplicada ao limite máximo das nossas experiências cotidianas. Não obstante, excepcionalmente conseguimos perdoar pessoas que nos causaram algum agravo, lesão, perda ou ofensa, pois quase sempre elegemos permanecer zangados, desgostosos, melindrados ou magoados (às vezes por uma vida inteira ou várias encarnações). Há casos em que alguns instantes após a ocorrência da ofensa, quiçá, o agressor que nos danificou já tenha esquecido a expressão infeliz ou o insulto a nós dirigido. No que tange ao nosso sentimento de justiça, experimentamos em cada afronta sofrida  a cólera ou a aversão e diversas ocasiões podemos escolher espaçar no tempo esses sentimentos destrutivos, na forma de rancor, preservando no recesso de nossa mente a aflição, a agonia, a ansiedade por alongados anos.
Jesus ensinou: "Se perdoardes aos homens as ofensas que vos fazem, também vosso Pai celestial vos perdoará os vossos pecados. Mas se não perdoardes aos homens, tampouco vosso Pai vos perdoará os vossos pecados".(1) Perdoar é atitude sublime, além de imperativo, já que para que sejamos perdoados é mister que absolvamos o ofensor. O Criador tem nos indultado desde sempre. Tomando-se por base o convite ao perdão, ensinado e exemplificado pelo Cristo, aprendamos a não permitir que consternações, injúrias, danos morais de qualquer espécie nos causem repugnâncias, desapontamentos e agressividades delituosas. Temos na figura incomparável do Crucificado o exemplo culminante de clemência.
Infelizmente, quase sempre optamos por não perdoar no sentido mais exato do termo perdão. Criamos imagens sobre a ofensa sofrida e permanecemos reproduzindo a mágoa a todos que atravessam o nosso caminho, e muitas vezes chegamos às lágrimas, nos fazendo de vítimas quase sempre diante de tudo e de todos. Quando não topamos com alguma pessoa disposta a escutar a nossa lamúria, continuamos reprisando de contínuo a história do insulto em nosso coração. Essa sensação nos deteriora as ideias e ocupa um imenso espaço em nossa mente. É uma categoria de auto-obsessão. Com a mente embebida de pensamentos de “vingança e justiça com as próprias mãos”, não alcançamos raciocínios lógicos; não localizamos expedientes criativos para as dificuldades mais simples, arruinamos a aptidão de concentração, nos tornamos irrequietos e enfadados com pequeninas coisas.
“O perdão do Senhor é sempre transformação do mal no bem, com renovação de nossas oportunidades de luta e resgate, no grande caminho da vida. O perdão é em qualquer tempo, sempre um traço de luz conduzindo a nossa vida à comunhão com Jesus.”(2) Mas quando optamos por não perdoar (ou tão somente perdoar da “boca para fora”), denunciamos o outro pela nossa desdita, o que equivale a responsabilizar o próximo pela nossa condição de vítima em infindável amargura. Agindo assim, estamos oferecendo autoridade ao ofensor sobre nós, ou seja, a faculdade de despedaçar a nossa paz, a nossa calma, o nosso prazer de viver (felicidade) e sobretudo a nossa preciosa saúde.
Não desconhecemos que nosso estado emocional conduz a saúde de todos os complexos fisiológicos. Quando sustentamos bons pensamentos e emoções serenas, geramos frequências magnéticas que alcançam todas as estruturas celulares, conduzindo as reações eletrobioquímicas, a seiva imunológica, a divisão das células, a simbiose entre os tecidos, a alimentação, as funções neuropsíquicas, a pujança de ânimo, enfim, o vigor e a harmonia do arcabouço orgânico.
Sem sombra de dúvida, o máximo de benefício do perdão é para quem perdoa incondicionalmente. O infrator que nos ocasionou determinado agravo não está torturado com a nossa situação emocional. “Quem bate esquece” - diz o jargão popular – é verdade! O ofensor, via de regra, esquece a injúria que suscitou o nosso ajuizamento com a consequente condenação. Em boa medida, perdoar constitui desanuviar o coração; arrancar um espinho encravado n’alma, ter domínio sobre  a tão procurada felicidade e conquistar a paz.
Jorge Hessen
http://jorgehessen.net

Referência bibligráfica:
(1)Mateus, VI: 14-15
(2)Xavier, Francisco Cândido. Pai Nosso, ditado pelo Espírito Meimei, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1952

sábado, 19 de maio de 2012

ANENCÉFALOS. DRIBLANDO NA ÁREA DA INSEGURANÇA JURÍDICA



 LUIZ CARLOS FORMIGA

“O Congresso Nacional, aos poucos, vai deixando de existir como efetivo Poder da República, engolido pelos outros dois, Executivo e Judiciário. O primeiro golpe foi dado com a adoção do instituto das medidas provisórias, que o transformou em cartório do Planalto.”

Hoje, quando o Judiciário disputa com o Executivo a usurpação de prerrogativas do Legislativo, “o Congresso consegue ter menos poderes que ao tempo da ditadura, quando tinha no Judiciário instância de socorro.”

O articulista usou como título  – “O Congresso Acabou”(1) e recorda que o Judiciário não foi eleito por ninguém. “Três quartos de sua atual composição decorreram da vontade do então presidente Lula que nele incluiu o seu advogado (e do PT), Antonio Dias Toffoli, e um amigo pessoal, Ricardo Lewandowski. Carlos Ayres Brito, é fundador do PT em Sergipe (hospedava Lula quando ele ia ao Estado).“

Isso parece explicar os votos contra os “anencéfalos”, na decisão contrária à letra da lei e à própria Constituição. O STF agiu em consonância com a militância de grupos sociais, que driblaram o Congresso.

Não há como esconder o imenso desgaste moral da instituição parlamentar, mas ela é ainda um poder transparente, observado pela mídia e que tem a cassação como fantasma, rondando toda CPI.  “A judicialização do processo político estabelece um padrão autoritário em plena Democracia, tornando-a não mais que uma fachada. Quando a Constituição é um detalhe, tem-se, na prática, o triunfo do “direito achado na rua”, que relativiza as leis a partir de argumentos ideológicos, que ignoram o processo legislativo e se nutrem de truques e subjetivismos.”

Naquele dia em que fetos anencéfalos foram condenados à pena de morte “in útero”, um ministro justificou o voto contrário dizendo que qualquer decisão nesse sentido  'abriria portas para a interrupção da gravidez de inúmeros embriões portadores de doenças que de algum modo levassem ao encurtamento da vida' (2). Outro advertiu: “a pena de morte imposta ao  nascituro anencéfalo macula a Constituição, que assegura a inviolabilidade do direito à vida”.

As declarações reforçam a luta contra o aborto de anencéfalos, que continua (4), apesar dos eventuais efeitos colaterais danosos à Democracia. São efeitos deletérios, pois “ameaçam resoluções de tribunais, atos de conselhos, e decisões do Supremo com repercussão geral.”(1)

Desejando fazer frente à extinção de um dos três poderes (1), deputados brasileiros apresentaram ao Congresso Nacional, em Brasília, três recursos diferentes visando sustar a decisão do Supremo Tribunal Federal em relação à ADPF 54, que despenalizou o aborto dos bebês diagnosticados com anencefalia ou severa deformação cerebral durante a gravidez, baseando-se no direito à vida garantido pela Carta Magna e pelo fato da Corte brasileira ter atuado fora da área de sua competência, legislando em matérias de defesa da vida.”(4)

Em um dos textos, o deputado Nazareno Fonteles afirma que “têm sido cada vez mais frequentes as decisões do Supremo Tribunal Federal sobre matérias que são claramente objeto de decisão do Poder Legislativo. Também tem sido usual se qualificar como omissão inconstitucional do Congresso Nacional quando os legisladores, legitimamente, optam por manter inalterado o ordenamento jurídico vigente.”

Líderes pró-vidas pedem para enviarmos mensagens de felicitações aos parlamentares, uma vez que defendem a Constituição Brasileira e a vida (*).  Por outro lado, pedem também que todos os defensores da vida, de qualquer religião ou Estado, escrevam ao deputado Marco Maia(**) pedindo que aceite o projeto do Deputado Feliciano de sustar a sentença do STF favorável ao aborto, para o qual antecipam uma forte oposição dentro do Congresso.

Estamos diante de um lance onde há perigo de gol. Quando o juiz foi “comprado” pelo adversário, ele apita e interrompe a jogada. Sendo juiz, qual a sua conduta? Agora é com você.



(*) Disque Câmara: 0800 619 619 (ligação gratuita).




Fontes



1.  O CONGRESSO ACABOU


2. ABRINDO A PORTA









3. OS LIMITES DA DECISÃO DO STF SOBRE O ABORTO DOS ANENCÉFALOS


4. A LUTA CONTRA O ABORTO DE ANENCÉFALOS CONTINUA.


http://domvob.wordpress.com/2012/05/18/a-luta-contra-o-aborto-de-anencefalos-continua-veja-como-voce-pode-ajudar/

sexta-feira, 18 de maio de 2012

ESCLARECER PROCEDIMENTOS É DE VITAL IMPORTÂNCIA PARA A DOUTRINA ESPÍRITA

A minha fotografiaMargarida Azevedo/Portugal


PARA ESCLARECIMENTO DE TODOS
Acho que devo partilhar este pedido de ajuda para que todos fiquem cientes do muito que o Espiritismo tem para fazer. Se em vez de perderem tempo em congressos e encontros que não dizem nada, melhor seria que esclarecessem as pessoas naquilo que é o mais básico e o mais indispensável.
Uma linguagem simples é sempre o melhor caminho. É isso que está a faltar, mas não só. Falta o muito amor, e o Cristo ressuscitado, vivo e bem vivo.

16 Mai (há 2 dias)
para mim

Boa tarde, moro em mem martins e gostaria de saber se faz consultas e se sim que cobra pela mesma, tenho muitas duvidas em relação ao mundo espiritual, e gostaria muito de tentar entender como estas coisas me afectam tanto. Aguardo resposta obrigado.

Exmº/ª Sr/a
No Espiritismo não se procede assim.

De um modo geral, as pessoas deslocam-se a um Centro espírita, onde expõem os seus problemas. De seguida são encaminhadas para um grupo, que o atendedor acha ser o mais adequado para a pessoa.

Nesse grupo assiste à sessão pública de Evangelho e, se for caso disso, levará um passe magnético.

O atendedor recomendará a leitura atenta de O Evangelho Segundo o Espiritismo, de Allan Kardec, o codificador da Doutrina Espírita, seguindo-se O Livro dos Espíritos, do mesmo autor.

Em seguida, recomendar-lhe-á também que desenvolva a sua fé, que ore, pratique o bem e tenha confiança em Deus, porque maior que Deus não há.

Estes atendimentos não são consultas, nada têm a ver com isso.

Tudo será feito gratuitamente, sempre.

No entanto, lembro que a sua fé, o seu modo de estar na vida, a sua paz interior ou a busca da mesma são os seus maiores amigos. Antes de confiar seja no que for e em quem for, confie em si próprio/a; lembre-se de que você é o seu maior amigo. Pense o bem e terá ao seu redor o bem. Não perca tempo com o que não vale a pena.

Nunca me lembro do nome do filósofo francês que diz precisamente isto: antes de fazer seja o que for, vejamos primeiro se vale a pena.

E nós perdemos tanto tempo com coisas que não servem para nada. Pense nisso.

Uma amiga ao dispor

terça-feira, 15 de maio de 2012

NUNCA DESANIMEMOS DIANTE DO DESAFIO DE QUALQUER DOENÇA

 


Das patologias humanas, o câncer é o mais, fortemente, enraizado aos erros morais do passado (recente ou remoto).  O conhecimento espírita nos auxilia a transformar a carga mental da culpa, incrustada no perispírito, e nos possibilita maior serenidade ante os desafios da doença. Isso influenciará no sistema imunológico. Os reflexos dos sentimentos e pensamentos negativos que alimentamos se voltam sobre nós mesmos, depois de transformados em ondas mentais, tumultuando nossas funções orgânicas.
Todavia, será crível que a carga mental positiva, por meio de um estado psicológico ou emocional, tem a capacidade de curar doenças? Para alguns, o fato de as pessoas com câncer estarem otimistas ou pessimistas, em relação à cura, não influencia, diretamente, nas chances de sobrevivência à doença. Evidentemente, discordamos desses argumentos, uma vez que diversas provas registram que, no caso de doenças graves, a mente pode influenciar no resultado de recuperação.
Em que pese considerarmos a importância dos médicos e o valioso contributo da ciência, quando não apoiados na mudança de comportamento mental do doente, somente o bom relacionamento médico-paciente é limitado e insuficiente para atacar as causas da doença e a angústia dela decorrente. O paciente, ao chegar ao hospital, traz consigo, além da doença, sua trajetória de vida atual e passada. O seu estado emotivo é resultante de alguns vetores como a estrutura da personalidade, interpretação e vivência dos acontecimentos, considerando aspectos do imaginário e do real, além de outras variáveis de causas patogênicas.
Os espíritas sabem que a matéria mental é criação de energia que se exterioriza do Espírito e se difunde por um fluxo de partículas e ondas, como qualquer outra forma de propagação de energia existente no Universo. Pensar é um processo de projeção de matéria mental e essa matéria é o instrumento sutil da vontade, atuando nas formações da matéria física, gerando as motivações de prazer ou desgosto, alegria ou dor, otimismo ou desespero, saúde ou doenças, que não se reduzem, efetivamente, a abstrações, por representarem turbilhões de forças em que a alma cria os seus próprios estados de mentação indutiva, atraindo, para si mesma, os agentes [por enquanto imponderáveis], de luz ou sombra, vitória ou derrota, infortúnio ou felicidade, conforme conceitua o Espiritismo.
Nesse aspecto, o estado mental, fruto das experiências de vida passada e presente, deixa de ter uma dimensão intangível para se consubstanciar na condição de matéria em movimento. Muitos pacientes, diante do diagnóstico da doença, transformam a dor em esperança e despertam, neles, a vontade de lutar por uma vida melhor. Outros, porém, desistem e se entregam, admitindo que estão sob uma sentença de morte. Cada caso é um caso e, a cada um, a vida responde segundo seus merecimentos.
Do exposto, urge que busquemos, acima de tudo, os hábitos salutares da oração, da meditação e do trabalho, procurando enriquecer-nos de esperança e de alegria, para nunca desanimarmos diante dos desafios de qualquer doença, ainda que sob o guante de nossos delitos do passado “esquecido”. Lembremos, sempre, que o Evangelho do Senhor nos esclarece que o pensamento puro e operante é a força que nos arroja das trevas para a luz, do ódio ao amor, da dor à alegria.
Para todos os males e quaisquer doenças, centremos nossos pensamentos em Jesus, pois nosso remédio é, e será sempre, o Cristo. Ajustemo-nos ao Evangelho Redentor, pois o Mestre dos mestres é a meta de nossa renovação.

segunda-feira, 7 de maio de 2012

A MORTE ANUNCIADA DO ESPIRITISMO SE TEIMAR EM PERMANECER NO ABISMO EM QUE CAIU

Margarida Azevedo
Portugal



O Espiritismo de hoje tornou-se numa sombra do que foi preconizado pelo codificador. Contrariando os seus fundamentos e consequentemente conduzindo o edifício doutrinário a um processo de estagnação, o Espiritismo está a passar a maior crise da sua história, só comparável com a que aconteceu aquando do desencarne de Kardec, em que parte significativa dos núcleos espíritas de França desmoronou-se em queda livre.
Todavia, nessa altura o problema situava-se ao nível da liderança. Houve algum abalo nas estruturas desses núcleos, o que é de certa forma compreensível, mas a Doutrina impôs-se por ela mesma e continuou de pé, muito embora em moldes significativamente diferentes dos do seu codificador. Hoje, o problema situa-se ao nível doutrinário, e mais concretamente no modus operandi dos espíritas, sendo que o problema da liderança vem depois, como consequência lógica.
O móbil de parte significativa dos espíritas deixou de ser o Evangelho e o messianismo que o mesmo implica. Fala-se mais de átomos que de Jesus, o caminho para a fé já não está nas Escrituras mas na Biologia e o coração foi destronado impiedosamente da sua função de amar que agora pertence aos interesses kármicos de um passado que se desconhece e, portanto, não se pode provar. Com tudo isto a condução do cretente ao redil do bem-fazer cedeu o lugar à veneração do bem-falante que exibe uma linguagem perigosamente apelativa, ignorante, intransigente, onde não raro o discurso diz nada. É a liderança que está em causa, principalmente dos oradores de cartaz, refiro-me àqueles que andam por tudo quanto é sítio, cheios de fama, que contam muitas histórias, falam com Espíritos de grande gabarito e sabem muita ciência. Esses e os que os ludibriam ainda não perceberam que o trabalho doutrinário é de uma responsabilidade sem limites. Julgo mesmo que nem isso lhes interessa pois, se pelo fruto se conhece a árvore, ou se pelo andar da carruagem se sabe quem vai lá dentro, então digo que, mediante o trabalho apresentado por certos oradores, os respectivos aduladores e as massas que os endeusam, no conjunto, fazem parte de uma falange trevosíssima que, se lhes víssemos as auras, ficaríamos de veras assustados.
Os espíritas ainda não aprenderam que aquilo que denominamos líder, em Espiritismo, nada tem a ver com o que socialmente se entende como tal e, por isso mesmo, a palavra líder é perigosa nos meios espíritas. Dito de outra forma, o Espiritismo não tem líderes, tem trabalhadores, todos com idêntica importância, tal como um motor cujo mecanismo depende da boa colocação de todas as peças.
No negrume em que se encontra, o Espiritismo entrou em linha de colisão consigo mesmo, não só no campo doutrinário mas também nas metodologias que utiliza, quer em termos de formação pessoal, quer no que diz respeito aos conhecimentos evangélicos.
Tem-se verificado de há uns anos a esta parte uma desvaloração da pessoa, enquanto ser portador de vivência, experiências e interesses pessoais que, se fossem partilhados, seriam uma mais valia na dinâmica dos Centros.
Constacta-se que há um grupo de silenciados que cresce desmesuradamente, condenados a ouvir, ridicularizados nas suas raras intervenções e que, dentro dos Centros, não têm quaisquer direitos. Porém, não são poucos os seus deveres, que cinicamente se confundem com disciplina, imposta pelo medo. Isto torna-se de tal forma aterrador que, no hipotético incumprimento das normas, as pessoas temem as represálias dos Espíritos malfazejos.
Cada vez mais, ou totalmente embrenhado nas teias perigosas do Sistema, a doutrina espírita caíu nas mãos do belicismo religioso, deixando para trás a sua função pacifista e conciliadora. Receando o silêncio e a estigmatização sociais, de que o movimento espírita é o principal culpado, dá largas a um chorrilho de encontros de toda a ordem, na tentativa de mostrar trabalho ao lado das outras organizações religiosas. No entanto, se o móbil não é honesto, por mais científicas que sejam as vernissages de pouco lhes vale. As intenções é que definem a natureza do acto, e se elas não forem honestas...
Inundado de esteriótipos, desenvolveu o espírito de casta, ainda que para muitos não seja de todo visível, onde um bando de incompetentes se arvoram em senhores e senhoras detentores(as) de tudo o que há para dizer. Esquecendo-se, e com o devido respeito pela actividade científica dessas pessoas, que um médico, um juíz, um cientista, ainda que se digam espíritas e sejam fervorosos seguidores da Doutrina, podem, no entanto, ser leigos na mesma, transformam em oradores “diplomados” gente de parcos conhecimentos na área evangélica.
Além disso, e em nome da coerência o afirmamos, o dogma religioso não pode ser substituído por outro ainda pior, a dogmatização da Ciência. Não podemos confundir a acção do inconsciente, comportamentos desviantes em consequência da frustração por não conseguir atingir metas dentro do aqui e agora movidos pelo ímpeto imediatista, característicos de personalidades infantilizadas, com a presença de Entidades negativas. Não podemos desresponsabilizar o indivíduo dos seus actos, pois o eu é peça fundamental e responsável das suas acções.
Defender que há uma co-explicação entre Ciência, Espiritismo, Educação para os problemas do indivíduo, parece-me aceitável, desde que sejam demarcadas as fronteiras entre cada uma das áreas intervenientes; o que já não faz o mínimo sentido é cair na justificação infantilista de que tudo tem a ver com os Espíritos, com um passado longíquo de há milhares de anos ou com uma noção de karma incorrecta.
Os Espíritos manifestam-se perigosa e sub-repticiamente a todos os que pretendem ter resposta pronta para tudo, irritam-se com as culpas que lhes são atribuídas, o que é fácil de perceber uma vez que os mais ignorantes nem sabem que desencarnaram. Quanto ao passado, é fácil: se nascemos esquecidos por alguma coisa é. Desenterrá-lo, considero o grande pecado de certos espíritas pois estão a mexer no interdito, segundo os parâmetros da Codificação. O passado não nos interessa para nada. A ignorância que nos conduz às acções que cometemos não é sinónimo de culpa. Da minha parte, não me sinto culpada por coisas que tenha feito onde a consciência ainda não era o que é hoje, e hoje ainda é muito pouco, para não dizer quase nada, além de que vivia uma realidade que nada tem a ver com a complexa estrutura das sociedadeas contemporâneas.
Os Espíritos não podem continuar a ser desrespeitados desta forma, culpabilizados dos nossos erros, das nossas ambições. Esquecem-se de que eles são pessoas como nós, apenas a viver em outros planos da existência, possuem sensibilidade e gostos tal como os seres de carne e osso. Ninguém gosta de ser culpado do que erros que não são seus. Os Espíritos também não. A banalização das comunicações, ou melhor dizendo, das pseudo-comunicações com os Espíritos tem sido a principal responsável pelo mau ambiente que impera nos Centros. Doutrina e mediunidade tornaram-se sinónimas, o que nunca poderia ter acontecido. Mais, o erro começou quando os espíritas pensaram que tinham o exclusivo das comunicações e que as demais doutrinas estavam erradas porque não possuíam os conhecimentos kardecistas, mesmo naquilo a que chamam gente de virtude. As leituras incorrectas da Doutrina conduziram a um xenofobismo do Espiritismo face às outras organizações religiosas. Ora, a Doutrina não diz nada disso.
Quanto ao Karma, que nada tem a ver com a pena de Talião ou teorias vingativas do tipo “Fizeste, hás-de pagar!”, é a articulação entre a muita ignorância e o muito que há para evoluir, numa sequência lógica e racional de que não podemos ser melhores do que somos, porque ainda não atingimos níveis que nos permitam superar a actual condição em que nos encontramos. Karma significa afinar comportamentos a cada vida que passa, e na qual se pretende contrariar as tendências nocivas tais como inveja, mentira, ciúme, vaidade...

O Espiritismo está, assim, constituído em doutrina fechada em si mesma e estagnada, pasmada no tempo; cheio de chavões que alguns julgam ser resposta para tudo.
Se o Espiritismo não arrepiar caminho, e a breve prazo, transformar-se-á numa doutrina supersticiosa, obediente aos Espíritos, que é a coisa mais perigosa que há, achincalhada pela vulgarização mediunista, culminando numa praga ou numa epidemia espiritual colectiva, que é o que já está a contecer.
Noto a presença de trevas no ambiente espírita, não vindas do lado de lá, mas construídas pelos de carne e osso, Espíritos muito negativos que estão reencarnados, que invadiram todos os grupos no planeta, dos quais não escapa o movimento espírita. Estes seres em conformidade com os que ficaram do lado espiritual, e por isso lhes são obedientes, formam correntes fortíssimas que aprisionam os Espíritos mais fracos às suas mentes perversas, sejam eles encarnados ou desencarnados, mantendo-os sob a sua alçada.
Acho muito estranho que mediuns videntes, que tão desenvolvidos os há na Doutrina, segundo se diz, não os vejam nas reuniões de pompa e circunstância que tão bem se generalizaram nos meis espíritas. Não é de se perguntar porquê?
Em suma, se o Espiritismo teimar em permanecer nos caminhos tortuosos que encetou, se não regressar ao Evangelho, à coerência a que a Doutrina apela em todas as suas obras, não tenho dúvidas de que vai morrer. Pode permanecer uma qualquer organização com o mesmo nome, mas jamais será a mesma coisa.
Espíritas verdadeiros, é chegada a hora da grande oração, o retorno a Cristo, do perdão das ofensas. Oremos pelo mundo, mas também por tudo o que nos rodeia e que não vemos, desenvolvamos a nossa fé, a coragem e estejamos certos de que o Deus que devemos amar acima de todas as coisas é Aquele que nos tira da terra da servidão e, por isso, não há outro maior do que Ele. O espírita, porque é cristão, só tem um Senhor que é Deus Todo Poderoso, Senhor do Céu e da Terra, Criador de todas as coisas...