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Margarida Azevedo
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A imposição do Homem à Nautreza é considerada, intelectualmente, uma mais-valia para a humanidade. O Homem alterou o curso natural dos rios, construíu barragens e represas, transportou dos seus habitats animais e plantas para lugares que a Natureza consideraria inóspitos, cultivou massivamente a terra, foi aumentando a produção de plantas, e de animais que domesticou, alterou a constituição orgânica de uma pluralidade de seres, acelerou-lhes o processo de crescimento; construíu cidades com lagos e jardins artificiais, mudou tudo e tudo lhe pareceu ser sempre permitido, baseado no grande princípio de que o Homem é o rei da Criação e todas as outras espécies têm que lhe ser submissas.
E assim, coroado de vaidade, lá foi reinando, espelhando na Natureza não propriamente o seu desejo de bem , mas a sua ambição com o nome de bem. É certo que, nalgumas coisas, a vida lhe foi sendo facilitda, e é para isso que a inteligência serve: escavar um poço para ter água junto de casa e precaver-se contra as intempéries, criar redes de saneamento, plantar e criar silos para armazenar para o inverno rigoroso, ou criar animais para o sustento do lar é meritório. Porém, mexer com as forças intrínsecas da Natureza, alterar os seus propósitos a ponto de até nem o clima escapar, estamos a falar de outra coisa bem diferente.
Face aos resultados sobejamente conhecidos e à vista de toda a gente, isto leva-nos a pensar se não será o humano um erro da Criação ou o ser mais estúpido à face da terra, pois é difícil aceitar que destrua aquilo de que precisa para a sua sobrevivência, a começar pelo ar que respira, a água que bebe, expondo-se à fome, uma natural consequência da sua leviandade. Por outro lado, é difícil aceitar que a sua evolução passe pelo prazer de destruir, em nome do lucro fácil, a ponto de se pensar que é a própria humanidade que neste momento está em perigo de continuar a existir. Obviamente não é este o sentido de destruição natural, em que a Natureza tudo transforma num renascer constante e eterno. Neste desnorteio, até esta eternidade natural é posta em causa, pois até o ciclo das estações do ano foi alterado. As plantas florescem quando deviam dar fruto, ou morrem secas na aridez dos terrenos cheios de rachas, os animais alteram o ciclo de reprodução alteram o seu habitat e mudam-se para outras zonas à procura de água e de alimento.
Pergunta-se: Será que a evolução humana teria este propósito? Mas o que é a evolução? Se é isto, dispensa-se, pois se a ignorância e o atraso civilizacional é respeitar a Vida e o Planeta, então venham eles.
Como é possível associar o processo evolutivo da humanidade ao fim trágico do mundo? Que evolução é esta, qual a sua verdadeira fonte, qual o seu verdadeiro rosto? A que normas e a que regras realmente obedece? Quem é esta humanidade? Estará o humano condenado a um fim trágico? Por outras palavras, estará a viver a dimensão do trágico no seu melhor, ao mais alto nível? Para onde nos conduz esta tão inflamada falta de amor? Estará o humano tão farto de si próprio que já não se suporta? Que é feito do Homem? Que tem ele contra Vida, porque a rejeita nesta destruição sem precedentes? Que forças são essas que o movem? Para onde pensa que vai? O que é que ele quer? Que e qual o horizonte tão ávido de…nada?!
Caberá à Natureza impôr-se como o único e verdadeiro universal, no seu sentido mais lato, mais impenetrável às nossas fracas mentes, um universal cósmico numa hiper-consciência, toda divino, e que justa e brutalmente se está a revoltar contra a humanidade? Que seres compõem essa mesma natureza, qual a sua verdadeira identidade que tanta força têm para se imporem aos humanos, que mais parece que vieram de um hospício do que de um cosmos perfeito?
Os animais dão-nos grandes lições de amor e dedicação à Vida. No cumprimento dos seus deveres naturais para com a Natureza, ensinam aos humanos que esta é para se respeitar.
E a fé? Qual é o seu papel? Será a fé, também ela, uma tragédia? Estamos a viver a falência das nossas convicções, dos nossos valores, a desconstrução dos alicerces que pensávamos profundos. A força converteu-se em fragilidade e está cada vez mais a vir à superfície a necessidade de uma humanidade convertida a Deus, bem como ao entendimento com os Espiritos que comandam o planeta. A fé tem, urgentemente, que mudar, tudo tem que mudar.
Mas, como, se não se conhece outra coisa que não a dor, a irracionalidade, a loucura? Ou o pesadelo do sofrimento como o inevitável, a sombra de uma perseguição sem tréguas?! Quem sabe, talvez esteja aí a solução para a tragédia: há outro caminho, tem que haver outro caminho que não este banho de sofrimento. É que não se trata de um sofrer penitencial, catarxico ou reparador. Trata-se de criar o desconforto sádico, a destruição gratuita, gerar e premiar comportamenos ao arrepio da ordem natural.
Nesta impotência vocabular e conceptual, sentimos a panóplia de palavras sem sentido a povoarem as nossas cabeças num painel de incongruências, de fantasias, de mitos e de filosofias vãs e de fés egoístas. O que fomos jamais voltaremos a ser. Perdemo-nos. Impotentes perante a realidade dura, temos que aceitar que, de facto, a destruição é o que melhor nos caracteriza.
Ah, mas é claro, aqui entra a fé no Deus todo poderoso, tão mágica, tão colorida. De facto, a fé, nos seus insondáveis labirintos, acaba por ser também ela uma vítima. A fé também destrói pois, qual cata-vento, tem acompanhado a falta de amor orientando-se segundo e conforme os interessses egoístas. Acreditar em Deus, Pai todo poderoso e amigo de todos os seus filhos é uma fé completamente diferente da de acreditar num deus mágico que vai fazer ressuscitar das cinzas os rios secos que nem palha, os oceanos cheios de plástico, os animais que já desapareceram e os que estão em vias de desaparecer; um deus que vai impôr-se à falta de educação ambiental ou aos genocídeos de povos que tão simplesmente querem viver na sua natureza.
Esse deus que vai enviar Espíritos de outras galáxias, imagine-se, que estão a preparar um corpo perispiritual para entrar na atmosfera terrestre, é o grito da mais alta ignorância espiritual, da falta de fé, da maior fascinação que se possa imaginar. É como sanear as Entidades que tão dedicadamente vêm a este planeta com o propósito de prover aos desígnios de Deus; é como se conheccessem tudo o que está à nossa volta, todas as Entidades, e lhes disssessem, desecucadamente, “já não precisamos de vocês porque vocês falharam. Que tristeza.
Falanges enormes de Espíritos presidem aos fenómenos da Natureza. Seres que cumprem a nobre missão do equilíbrio de todas as coisas, em que tudo está em perfeita harmonia com tudo. São miríades que fazem surgir as tempestades, o raio, dirigem as marés, orientam os seres para o cumprimento dos seus propósitos, provendo ao equilíbrio do planeta bem como do seu papel no cosmos.
Isto significa que amar a Natureza é amar quem preside aos seus desígnios sob ordens de uma Vontade soberana. Tudo tem Deus. Aquilo a que chamamos a natureza de todas as coisas mais não é que a manifestação da força divina que a tudo preside, no encadeamneto de géneros e espécies, desde o átomo ao Espírito mais brilhante.
Devemos à Mãe Natureza, naqueles que a dirigem, a nossa vida. Vida essa que não está isolada, mas que depende de uma infinidade de outras vidas para continuar a existir. Devemos-lhe o ar que respiramos, os alimentos que comemos, a terra que pisamos; devemos-lhe as famílias que construímos, os nossos filhos, um bem preciosíssimo; as referências identitárias responsáveis pelos nossos equilíbrios mentais e afectivos. Para esses Espíritos devem ir sempre as nossas orações de acção de graças, um muito obrigado clamoroso.
Somos o que respiramos, energia vital que trespassa o mais íntimo do nosso ser; somos o que comemos, aquilo em que acreditamos, com que sonhamos. É chegada a hora de voltar às forças da Natureza, primárias, e recomeçar tudo de novo e repensar a História Natural, voltar aos Espíritos que presidem às forças do planeta, só que desta vez sem coroas de falsas glórias, sem reinados ridículos, sem superioridades de qualquer ordem. O Homem tem que aprender que está na Vida para obedecer, não para mandar no que está acima de si e que não compreende; há que perceber que são imensos os mistérios que nos envolvem. Um deles é o de saber como é que, apesar de tudo, a vida continua. Grande é a força da Vida e magníficos são os seus mistérios e magníficos os Espíritos que a dirigem.
Espíritos da Natureza, por favor, perdoem-nos porque, efectivamente, não sabemos o que fazemos.
Bibliografia consultada:
KARDEC.,A., O Livros dos Espíritos, CEPC, Lisboa, 1984, Livro Segundo, Mundo Espírita ou dos Espíritos, cap. IX, Intervenção dos Espíritos no Mundo Corpóreo, IX, Acção dos Espíritos nos Fenómenos da Natureza, pp.237-239.