André Barreto Lima
Há mais de dois mil anos Jesus
veio a terra como o filho enviado por Deus para trazer a humanidade a mensagem
de paz que pudesse transformar os corações humanos, servindo como o cordeiro
oferendado para salvar a humanidade das suas iniquidades (já que àquela época,
era através das oferendas que se encontrava “perdão” divino). De lá para cá,
sua mensagem foi assimilada por muitos, que mudaram a forma de viver nesse
planeta, bem como deturpada por outros, que a utilizaram como forma de domínio
e de poder.
Naquele tempo, Jesus trazia em
sua missão a implantação do amor nos corações humanos para transformá-los
tornando-os pessoas melhores rumo ao objetivo da evolução espiritual, contudo,
ainda falava por parábolas, conforme deixa claro o Evangelho Segundo o
Espiritismo nas lições de Allan Kardec (p.214, 1978).1
Ou seja, àquela época, a
humanidade ainda não estava preparada para compreender conceitos existenciais
importantes e se ditos naquele momento, não seriam interpretada como deveriam
ser, deturpando a ideia central do que é a vida neste mundo em virtude do
arraigado materialismo existencial daquela época.
Assim, muitos anos depois, com as
evoluções tecnológicas, culturais e sociais, quando o homem sai da época da
barbárie da antiguidade primitiva, avança pela época das convicções próprias
medievais, adentra a evolução modernista, tem-se um ser humano ao menos preparado
para ouvir e saber interpretar melhor o que é realmente a vida eterna e o seu
objetivo neste planeta. Muitos vieram após Jesus para expandir sua mensagem
conforme a lei de amor e, por fim, surge a Doutrina Espírita.
Ainda incipiente, o Espiritismo
claudicava pela seara da fenomenologia quando o professor francês Hippolyte
Leon Denizard Rivail, que se intitulava Allan Kardec, aprimorou o entendimento
empírico da nova doutrina partindo da análise do curioso fato das mesas
girantes, que virou uma febre em Paris em meados do século XIX, analisando
friamente o que poderia explicar tal fenômeno partindo das teorias basilares da
física e de outras áreas do conhecimento. Surgem as comunicações espíritas,
através da transmissão mediúnica nas quais um médium intermedeia o processo
comunicativo servindo de meio pelo qual os espíritos expressam suas mensagens
do mundo espiritual aos encarnados.
Mas o que as obras literárias do
Professor Hippolyte poderiam ter em comum com a mensagem de Jesus Cristo que já
há séculos pregava o amor como fonte de transformação da humanidade? O fato é
que a doutrina espírita inicialmente elucidou a humanidade acerca das
realidades do mundo espiritual, demonstrando que a vida terrena é passageira
representando um átomo de tempo frente a real vida, a espiritual, e que aqui
viemos para resgatar débitos ou enfrentar desafios para que possamos evoluir
moralmente e para galgar vivenciar experiências em mundos mais evoluídos que
este, despojados de aspectos primitivos.
Fincada nos pilares da religião,
ciência e na filosofia, a doutrina espírita apresenta-se inicialmente sobre as
obras do pentateuco de Allan Kardec sendo composta por: O Livro dos Espíritos,
O Evangelho Segundo o Espiritismo, O Livro dos Médiuns, A Gênese, O Céu e o
Inferno e após seu desencarne, publicou-se o livro Obras Póstumas.
Editado no ano de 1859, o Livro
dos Espíritos representou uma verdadeira revolução para a sociedade francesa
daquela época. O materialismo ainda era exacerbado, contudo as verdades
espíritas não tardaram a ganhar campo e conquistar a atenção de muitos.
Kardec utilizou-se do método
empírico para, através da intervenção mediúnica, interrogar aos espíritos acerca
de diversos temas, desde que é Deus até o que é o paraíso e o purgatório para
criar o corpo da doutrina espírita, confirmando as respostas apresentadas por
espíritos sérios através da identidade moral apresentada pelos mesmos, bem como
da repetição uniforme de informações em outras instancias pelas psicografias
mediúnicas que já se espalhavam incontrolavelmente mundo afora.
Mas o que a obra tem com os
ensinamentos de Jesus? Como exemplo, na pergunta 149 do Livro dos Espíritos
(p.76, 2009), Kardec questiona aos espíritos “Em que se torna a alma no instante da morte?” o que prontamente é
respondido: “- volta a ser Espírito, quer
dizer, retorna ao mundo dos Espíritos, que deixou momentaneamente”.
Elucidando que alma é a condição temporária na qual o espírito se encontra
quando encarnado em um corpo material neste ou noutro planeta, e que este espírito
interliga-se através do períspirito 2 ao corpo material, tem-se na explicação
dada, prova cabal da efemeridade da vida terrena e que quando dela partimos
voltamos à vida real, a do mundo espiritual, recordando de quem realmente
somos e de todas as nossas vivências neste mundo ou por onde já passamos
através dos séculos, uma vez que somos eternos.
Nesse sentido, Jesus Cristo, em
sua mensagem de amor, buscando elucidar a humanidade sobre a necessidade de
reformar seus atos e a maneira de enxergar a vida à luz do amor ao próximo, já
dizia que “Ninguém pode ver o reino de
Deus se não nascer de novo”, elucidando acerca da necessidade do homem se
remodelar moral e sentimentalmente, vendo o mundo de outra forma, se assim quer
chegar ao reino de Deus, ou seja, a evolução de si próprio.
Mais adiante, no Evangelho
Segundo o Espiritismo (p. 45, 1978), em seu Capítulo IV o Mestre reforça o
exposto 3, deixando assim, mais do que comprovada à vida após a morte corporal
e que é com a evolução que o home se despoja do arraigado desejo material
sublimando para uma visão menos grotesca acerca da sua própria existência e que
se nos aproximamos mais da matéria, em seus diversos sentidos, estamos mais
afastados de valores como o respeito ao próximo, amor incondicional, perdão, o
entendimento da necessidade das dificuldades como forma de equilibrar o
universo livrando nossa consciência do remorso retardatário das obras
malfazejas de outrora bem como meio de superar desafios capazes de testar nossa
aptidão para suportar a dor e os sofrimentos.
Ao Estudar o Evangelho segundo o
Espiritismo, é cabível explicitar àqueles que não acreditam em Jesus e
questionam-se o motivo pelo qual leem este artigo, que Jesus mais do que
qualquer concepção foi um Fato na história da humanidade. A ciência história marcou
a linha do tempo da história da humanidade como Antes e Depois do Cristo (A.C.
e D.C.), havendo uma contagem de tempo do ano zero para trás e do ano zero para
frente, ou seja, é uma comprovação científica e didática passada a todos ao
longo dos séculos no aprender da história geral nada tendo a se questionar se
Jesus realmente existiu ou não.
Durante sua breve passagem neste
planeta, no cumprir de sua missão, Jesus não se dedicou a propagar sua mensagem
através da escrita – O tempo era curto, ficando essa tarefa para seus
evangelizadores e apóstolos que assimilavam seus ensinamentos doutrinários e os
imortalizavam através das escrituras cristãs.
É apropriado ressaltar que antes
de Cristo, o velho testamento já trazia a mensagem de Deus para reformar a humanidade,
mas era a mensagem de um Pai vingativo e penalizador, pois a humanidade
precisava do “chicote” para ser obediente como uma criança mal educada; já nas
novas escrituras, após Jesus, o real Deus é apresentado como benevolente e que
busca o equilíbrio universal.
O Evangelho segundo o Espiritismo
é justamente o aproveitamento das Leis Morais apresentadas no Evangelho de
Jesus à luz dos ensinamentos da nova Doutrina, assim, tem-se passagens na
citada escritura que apresentam e que elucidam a vida espiritual como eterna
demonstrando a efemeridade da vida carnal, é o exemplo claro do Capítulo IV
(pag. 51, 2010) em que é questionada se a encarnação é uma punição aos
espíritos culpados o que prontamente é respondido: “a encarnação não é senão um estado transitório; é uma tarefa que Deus
impõe como primeira prova do uso que farão de seu livre arbítrio”. O
próprio Cristo demonstrou através da sua ressureição que a vida carnal é
temporária, ressuscitando para o Divino, e que a vida real é aquela na qual
estamos despojados da matéria, cumprindo sua missão ao ser crucificado.
Após a escrita do Livro dos
Espíritos e com a disseminação dos fenômenos mediúnicos por várias partes do
mundo através da psicografia, psicofonia, clarividência, inspirações e até o
que se chamava paranormalidade, a ciência espírita já tinha seu corpo formado e
suas bases alicerçadas, mas o trabalho não parou e as obras foram
complementando-se para dar continuidade ao edificante trabalho elucidador.
Assim, o Livro dos Médiuns, ou guia dos Médiuns e dos Evocadores, vem
esclarecer os gêneros e formas de comunicação com o mundo invisível no ano de
1861 em Paris.
Observemos que em determinado
trecho da obra, mais precisamente em seu Capítulo XIV, (p. 145, 1987) é
questionado se certas pessoas possuem verdadeiramente o dom da cura pelo
simples contato, sem o emprego dos passes, e a resposta é que sim.4 Não
precisamos aqui elencar a quantidade de milagres realizados por Jesus a mais de
dois mil anos, mas citamos o caso em que uma mulher fora curada somente ao
tocar seu manto com base em sua fé, quando o Mestre responde-lhe “a tua fé te curou”, ou seja, a doutrina
espírita, está intrinsecamente ligada aos ensinamentos de Jesus que foram
transmitidos àquela época de outra forma em virtude do desenvolvimento e da
cultura daquele tempo. Hoje, é tida como a boa nova trazida para consolidar o
que já fora apresentado por Jesus.
A Gênese representa a
continuidade da evolução da doutrina espírita. Publicada em 1868, reflete temas
relativos à origem do universo, o esboço geológico da terra desde períodos
primitivos ao nascimento do homem, milagres, fluidos, dentre outros temas mais.
Em São Mateus, Cap. XXIV, v.35, a mensagem de Jesus é clara ao dizer que “o céu e a terra passarão, mas as minhas
palavras não passarão”, ou seja, mesmo que a terra sofra as evoluções
sociais, culturais e estruturais com o passar do tempo, a palavra de Jesus
sempre existirá reformando os conceitos morais da humanidade.
E com o homem sempre se rendeu à
matéria, até mesmo na forma de adorar a Deus, ou aos deuses nas sociedades
politeístas, com a adoração de imagens ou oferendas, inclusive de sangue, os
milagres visivelmente realizados ao longo da jornada de Jesus neste planeta
foram uma das formas de demonstrar sua autoridade moral e espiritual frente
àqueles espíritos em estágio de evolução. Mas os milagres realizados são fruto
da evolução de Jesus, que caminhava ao ápice da evolução espiritual, sabendo
bem como atuar com as energias empregando-as para o bem, quando aqui encarnado.
Reflexo do exposto, a Gênese
(1992, p.192) demonstra que as curas podem se dá ela pele utilização do próprio
fluido do magnetizador, pelo fluido de espíritos agindo diretamente sem
intermediário, como também pelos fluidos que os espíritos despojam sobre o magnetizador
e ao qual este serve de condutor 5.
Em 1º de agosto de 1865 o
professor Rivail brinda o movimento espírita com a obra O Céu e o Inferno, ou,
A Justiça Divina Segundo o Espiritismo, nessa obra observa-se um exame
comparado das doutrinas sobre a passagem da vida corpórea, a vida espiritual,
as penalidades e recompensas futuras, os anjos e os demónios, dentre outros
temas. Não poderia passar despercebido, o nexo existente entre essa tão
importante obra com a presença de Jesus em nosso planeta encarnado.
Quando aqui veio, deixando sua
mensagem de amor ao próximo, perdão e substituição dos sentimentos obscuros por
sentimentos puros que possam elevar o ser humano a uma condição moral que o
livre do ódio, ambição o egoísmo, dentre outros perniciosos sentimentos, o
Cristo demonstrou que através do sofrimento que aqui passamos alcançamos a
redenção renunciando a maldade com o aprendizado imposto seguindo para as
esferas espirituais mais elevadas dando passos importantes para a elevação
espiritual.
Em O Céu e o Inferno (2009,
p.309), pode-se observar a comunicação advinda do mundo espiritual trazida por
Annaïs Gourdon, uma jovem mulher notável pela sua doçura de caráter, bem como
qualidades morais, falecida ao findar de 1860. Ela pertencia a uma família de trabalhadores
de minas de carvão e fora evocada a pedido do pai e do marido, e assim
prossegue em sua comunicação:
“ P.- Por que foste arrancada tão cedo ao convívio da família?
R.- Porque minhas provas terrestres chegaram ao fim.
P.- Sois felizes como espírito?
R. - Sou feliz. Amo e espero; os céus não constituem terror para mim e
aguardo, confiante e com amor, que as brancas asas me conduzam até eles.
P.- Que entendeis por essas Asas?
R.- Entendo tornar-me espírito puro e resplandecer com o os mensageiros
celestes que me deslumbram.”
A comunicação realizada séculos
após a partida de Jesus, demonstra de forma patente o que seu exemplo deixou
para a humanidade acerca das penas e sofrimentos, aprendizado e resignação bem
como evolução para o mundo espiritual. Mas nem todos chegam a esse patamar e
muitas vezes penam por encarnações sucessivas até alcançarem o aprendizado.
Após o desencarne do mestre
Rivail, a Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas reuniu, em 1890, uma
compilação de estudos do codificador editando esta obra. Em mencionada seleção
(2007, p.64) podemos visualizar com o passar dos tempos a adequação à doutrina
de Jesus à realidade espírita. Tem-se ali no §VII a referência às obsessões e a
possessões, onde aquela representa a influência que os desencarnados exercem
sobre os encarnados através de suas energias – que se adequam ao padrão
vibratório do encarnado – e direcionamentos mentais para o mal enquanto que
esta se refere ao mais alto nível de subjugação que um espírito pode exercer sobre
um encarnado, muitas vezes comandando-o como uma marionete que não consegue
sequer se controlar. 6
Aqui a referencia faz-se
importante, pois por diversas vezes ao retirar-se ao deserto, Jesus Cristo foi
tentado pelo “Diabo”7 como uma forma de o obsidiar a seguir outro caminho e
deixar sua missão (Mateus 4: 1-11)8 . Desta forma, conclui-se que a doutrina do
Mestre Jesus Cristo fincou-se em diversos ensinamentos que mudaram o rumo da
humanidade, ou pelo menos de uma parcela considerável da mesma, e, quando um
pouco mais evoluída, a sociedade foi esclarecida acerca das verdades
espirituais através da Doutrina Espírita, contudo, observa-se que mesmo
apresentando seu lado Cientifico e também Filosófico, o Espiritismo tem suas
bases alicerçadas na doutrina de Jesus e é por isso que tem autoridade moral e
é fincada em fatos comprovados perdurando até os tempos de hoje esclarecendo
mais e mais seguidores.
Notas:
1 Seus Discípulos se aproximaram
e disseram-lhe: Porque para vós outros, vos foi dado conhecer os mistérios do
reino dos céus; mas, para eles, não foi dado. Eu lhes falo por parábolas,
porque vendo não veem, e escutando, não ouvem nem compreendem.
2 Envoltório etéreo, com plasticidade, que faz
ligação fluídica entre o espírito e o corpo material podendo ser mutável e que
leva consigo a identidade dos registros da encarnação após o desencarne
3 Em verdade, em verdade vos digo: Se um homem
não renascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus. O que é
nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espirito é Espírito.
4 “P. - Certas pessoas têm
verdadeiramente o dom da cura pelo simples contato, sem o emprego dos passes
magnéticos? R. - Seguramente. Não tendes numerosos exemplos?”
5 É nesse sentido que são aplicados os passes,
através dos quais, as energias transmutadas, efetivam ações positivas sobre
pessoas enfermas levando-as à uma sensação de bem estar e em muitos casos até à
cura de suas enfermidades
6 É preciso saber que neste estado o indivíduo
muitas vezes tem consciência de que é ridículo o que faz, mas é constrangido a
fazê-lo como se alguém mais forte do que ele o obrigasse a mover os braços, as
pernas, a língua
7 Trata-se de espíritos como nós,
mas que ainda estão em graus de evolução inferiores devido ao apego à matéria
ou a sentimentos pequenos que os travam à evolução e acabam por conduzir suas
atitudes para o mau, influenciando negativamente os encarnados pelo seu ódio ou
mesmo prazer em ver e declínio alheio.
8 “E, chegando-se a ele o
tentador, disse: Se tu és o Filho de Deus, manda que estas pedras se tornem em
pães. Ele, porém, respondendo, disse: Está escrito: Nem só de pão viverá o
homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS:
BIBLIA de Jerusalém. 3. imp. São Paulo: Paulus,
2004.
KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 2010, IDE -
Instituto de Difusão Espírita – SP
KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo.
2010, IDE - Instituto de Difusão Espírita – SP
KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns. 2008, IDE -
Instituto de Difusão Espírita – SP
KARDEC, Allan. O Céu e o Inferno. 2009, FEB -
Federação Espírita do Brasil – RJ KARDEC, Allan. A Gênese. 2012, IDE -
Instituto de Difusão Espírita – SP
KARDEC, Allan. Obras Póstumas. 2007, LAKE –
Livraria Allan Kardec Editora – SP
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