204. “Mais importante a se observar, do que a maneira de fazer o apelo, é a calma e o recolhimento que se deve ter, junto a um desejo ardente e uma firme vontade de êxito. E por vontade não entendemos aqui um desejo efêmero e inconsequente, a cada momento interrompido por outras preocupações, mas uma vontade séria, perseverante, sustentada com firmeza, sem impaciência nem ansiedade. O recolhimento é favorecido pela solidão, pelo silêncio e o afastamento de tudo o que possa provocar distrações.
Nada mais resta então a fazer, senão isto: renovar todos os dias a tentativa, durante dez minutos, um quarto de hora ou mais de cada vez, durante quinze dias, um mês, dois meses e mais se necessário. Conhecemos médiuns que só se formaram depois de seis meses de exercício, enquanto outros escrevem correntemente desde a primeira vez”.
Em primeiro lugar, precisamos frisar que estudar em casa é fundamental para qualquer espírita. E é muito meritório esse estudo. Entretanto, o ideal é estudar em casa e também estudar no grupo espírita. Allan Kardec afirma que “o isolamento religioso assim como o isolamento social conduz a pessoa ao egoísmo”.
De fato, a leitura pessoal é extremamente rica, mas a absorção de informações de outros companheiros, a troca de ideias e toda a ajuda espiritual que recebemos na Casa Espírita são fatores decisivos para o nosso desenvolvimento doutrinário e espiritual. Por conseguinte, o ideal é a manutenção de estudos em casa, onde temos maior liberdade para escolher as obras que no momento achamos mais interessantes para a nossa formação doutrinária, mas sem deixar de frequentar a Casa Espírita. Além disso, não podemos deixar de frisar a importância do culto do “Evangelho no Lar”, o qual deve abranger o máximo de familiares possível, a fim de estabelecer uma proteção espiritual mais efetiva para a casa em questão, entre outros objetivos. Assim, mantendo os estudos em casa, cada vez com maior dedicação, associados aos estudos no Centro Espírita, o crescimento global do indivíduo, tanto do ponto de vista doutrinário como do ponto de vista espiritual (incluindo a chamada “saúde integral”) seria, a priori, muito mais efetivo.
Obviamente, a escolha da casa espírita é muito importante. Há grupos nos quais naturalmente sentimos uma maior identificação e outros em que temos mais dificuldade em termos de amizade, afinidade espiritual e até mesmo afinidade doutrinária. São processos inerentes ao estágio evolutivo de todos nós habitantes da Terra, e, especificamente, nós participantes do Movimento Espírita. Isso é algo totalmente natural. Claro que todo início de harmonização é mais difícil, e, dessa forma, precisamos de um pequeno esforço, um certo nível de perseverança, para vencer as pequenas barreiras iniciais. Faz parte da vida, estando tal processo relacionado à chamada “Lei de Sociedade” (vide terceira parte de “O Livro dos Espíritos”). É possível que uma antipatia/discordância em um primeiro momento possa ser superada e passe a constituir uma grande amizade e um grupo extremamente produtivo do ponto de vista evangélico/espiritista. Portanto, vale lutar pelo trabalho na Casa Espírita, proposta esta que foi especialmente valorizada por Herculano Pires na obra “O Centro Espírita”. Também é interessante lembrar os trabalhos espirituais relatados por André Luiz, os quais foram desenvolvidos em centros espíritas (podemos citar, por exemplo, as obras “Missionários da Luz” e “Obreiros da Vida Eterna”).
Com relação ao desenvolvimento mediúnico propriamente dito, é importante ter muito cuidado. Definitivamente, não devemos iniciar o desenvolvimento mediúnico em casa, salvo exceções muito raras. Mesmo na Casa Espírita, considerando trabalhadores com elevado conhecimento doutrinário, muitas vezes é recomendável grande tempo de adaptação a trabalhos apenas doutrinários, sem desenvolvimento mediúnico. Isso é necessário por várias razões: elevação vibracional; amizade com os companheiros da casa; estudo mais aprofundado, etc.
Quando Dona Guiomar procurou Chico Xavier em Uberaba e disse ao médium de Pedro Leopoldo que iria fundar um Centro Espírita em São Paulo, ela perguntou a Chico o que ele sugeria para ela. Ele respondeu: “Guiomar, minha filha, nos primeiros 2 a 3 anos, não faça intercâmbio mediúnico, não. Só Doutrina, Evangelho e passes...”. Obviamente, era necessário criar uma ambientação protetora para que a equipe espiritual fosse formada e, sobretudo, para que os mentores tivessem também confiança na nova equipe de trabalhadores encarnados. De fato, existem processos educativos e preparativos que não se fazem de improviso e não dispensam um certo intervalo de tempo preparatório.
Tecnicamente, baseando nossa reflexão exclusivamente nesse item 204 de “O Livro dos Médiuns”, em princípio, seria possível desenvolver testes mediúnicos em casa. Mas é importante frisar que Allan Kardec não comenta sobre os problemas de ambientação. Ora, todo o esforço recomendado por Allan Kardec aos candidatos à psicografia pode perfeitamente ser desenvolvido no Centro Espírita. Portanto, estaríamos, a meu ver, tirando um pouco de contexto o parágrafo kardequiano, para respaldar o desenvolvimento mediúnico em casa. De qualquer maneira, não poderíamos afirmar taxativamente que quem tenta o desenvolvimento mediúnico (em áreas como a psicografia e/ou psicofonia) em casa está totalmente errado. É possível que o processo em questão seja bem sucedido, mas, para a maioria das pessoas esse sucesso pode ser bem improvável. Portanto, a priori, sem maiores detalhes de médiuns e ambientes específicos, tal atitude não constitui uma diretriz de segurança para quem deseja desenvolver, com proteção espiritual para si mesmo e para sua família, sua própria mediunidade ou a mediunidade de algum confrade.
A ambientação para o início das atividades mediúnicas é muito importante. Na Casa Espírita, a proteção espiritual gerada pelo grupo e pelas barreiras vibratórias proporcionadas pela psicosfera positiva evita “invasões de Espíritos inferiores”. Os Espíritos sofredores que têm acesso à Casa Espírita são somente aqueles que foram admitidos pelos mentores espirituais da Casa. Tais barreiras vibratórias são construídas passo a passo, pois a utilização dos recintos do centro é exclusivamente destinada a trabalhos espirituais, constituindo um ambiente adequado aos testes mediúnicos. As entidades que se aproximam são muitas vezes cuidadosamente escolhidas e preparadas pela espiritualidade amiga com muita antecedência ao horário da reunião. Portanto, a psicofera do Centro é muito bem cuidada, pois contempla apenas atividades evangélico/espiritistas, o que não ocorre nos lares familiares.
De fato, padronizou-se nas Casas Espíritas uma diretriz de Emmanuel e Chico Xavier que consiste no famoso "o telefone toca de lá para cá". Tal proposta está relacionada a um cuidado maior com as questões espirituais, ou seja, uma cautela responsável para não prejudicar a si mesmo e nem aos confrades e/ou familiares e amigos. Logo, não forçar atividades mediúnicas precipitadamente ou em ambientes perigosos espiritualmente constitui em um importante escrúpulo doutrinário.
Desenvolver os testes em casa e muitas vezes sozinho pode não estar errado, mas pode ser perigoso espiritualmente, pois implica em uma evocação direta ou indireta de possíveis entidades comunicantes. Mesmo que o fenômeno não se verifique com grande ostensividade, somente a evoção já pode implicar na atração das entidades para a nossa casa. São companhias espirituais que estamos chamando para o nosso convívio íntimo. Será que todo o nosso lar e os nossos familiares estão preparados para funcionar como Centro Espírita 24 horas por dia?!
Não podemos esquecer que a Doutrina Espírita começa com Kardec, mas não termina com ele. Contribuições elevadas de autores espíritas como Emmanuel e o próprio Chico Xavier, além de outros com pensamento semelhante como Divaldo Franco merecem ser minimamente consideradas (mesmo que consideremos para estudo e, eventualmente, em um segundo momento, as rejeitemos). De qualquer maneira, mediunidade é assunto complexo, com variadas nuances, dependendo da cada instrumento mediúnico, de cada equipe e de cada ambiente espiritual. Divaldo comenta sobre isso, afirmando que Chico Xavier sempre trabalhou com equipes. E é claro que além da questão da equipe, a questão da psicosfera ambiente é fundamental.
Certa vez, Chico Xavier recomendou ao Doutor Elias Barbosa que passasse a fazer evangelho no lar todos os dias da semana, e não mais uma vez por semana (como tradicionalmente é recomendado nas casas espíritas), pois, segundo Chico Xavier, ele como psiquiatra espírita, juntamente com sua família, estava tendo sua casa literalmente atacada por obsessores irritados com a “atuação desobsessiva” do referido médico. Doutor Elias Barbosa estava logrando sucesso terapêutico em relação a um número muito grande de pacientes psiquiátricos (que, na verdade, eram portadores de cruéis obsessões, ou seja, eram indivíduos obsediados).
Sem conhecer detalhes do ambiente e do médium, uma recomendação geral pede um pouco mais de cautela, uma vez que o Espírito Erasto adverte que "é preferível rejeitar 10 verdades do que aceitar uma única mentira, uma única ideia falsa" (O Livro dos Médiuns). Não podemos esquecer que as crianças com menos de 7 anos são muito suscetíveis a influências espirituais, pois ainda estão, digamos, "mergulhando" cada vez mais nos respectivos corpos físicos. Além disso, os pré-adolescentes e adolescentes estão passando por uma etapa de vida complexa do ponto de vista espiritual. De fato, todos os membros da família podem receber, em algum nível, o impacto da presença das entidades candidatas às comunicações mediúnicas. Por isso é que existe a recomendação básica para que os cultos do "Evangelho no Lar" não tenham, de forma regular, manifestações mediúnicas, o que não significa que eventualmente elas não possam acontecer.
Emmanuel adverte-nos em “Caminho, Verdade e Vida” que quando forçamos nossas aptidões psíquicas precocemente, dificilmente obtemos os resultados positivos inicialmente esperados.
Reflitamos, portanto, sobre a necessidade de avançar lenta e gradualmente na área mediúnica, para que esse avanço não ocorra de forma insegura espiritualmente.
1 Comentários:
Muito bem ponderados os comentários do Leonardo.
A mediunidade é uma ferramenta valorosa para o crescimento de todos nós, mas como qualquer atividade humana, requer critérios e segurança para ser realizada.
Propor o desenvolvimento mediúnico em nossos lares seria similar à realização de experimentos de Química ou Física, ou de cirurgias diversas no próprio lar. Embora possam ser feitos, há fatores de higiene e segurança que nem sempre temos à disposição no lar.
Um abraço, Alexandre F. Fonseca
Por Alexandre, às 11 de março de 2015 às 19:56
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