Pensam,
alguns companheiros, que o esclarecimento ou a moralização dos Espíritos
inferiores deve ser uma tarefa específica de Espíritos superiores, realizada no
mundo espiritual e não por nós aqui do mundo material. Outros são contra, só
pelo fato delas serem mencionadas por André Luiz, na psicografia de Chico
Xavier; pede-se, apenas, bom senso, pois o excesso para nenhum dos lados é bom.
Estávamos
pesquisando na obra Curso Básico de Espiritismo, 1º ano, uma publicação
da FEESP – Federação Espírita do Estado de São Paulo, visando encontrar algum
material para utilizar numa palestra sobre a vida no mundo espiritual, quando
nos deparamos com este interessante parágrafo:
“Em erraticidade, os Espíritos analisam
e refletem sobre o seu passado, sempre objetivando o aperfeiçoamento e, ao
percorrerem os lugares, observam e escutam com interesse os conselhos dos
encarnados mais esclarecidos, e dessa forma, as ideias novas surgem em seu
íntimo, predispondo-os a aceitação dos desígnios divinos.” (FEESP, 2011, p. 50,
grifo nosso).
Despertou-nos
atenção o trecho que diz “escutam com interesse os conselhos dos encarnados
mais esclarecidos”, razão pela qual fomos ver se nas obras da Codificação havia
algo a respeito disso.
Tomemos,
por pertinente ao tema, a obra O Livro dos Médiuns, cap. XXV –
Evocações, para esclarecimento da questão:
278. Uma questão importante se apresenta aqui, a de saber se há ou
não inconveniente em evocar Espíritos maus. Isto depende do fim que se
tenha em vista e da ascendência que se possa exercer sobre eles. Não há
inconveniente, quando são chamados com um fim sério, instrutivo e tendo em
vista melhorá-los. Ao contrário, o inconveniente é muito grande quando se faz a
evocação por simples curiosidade ou por divertimento, ou, ainda, quando
quem os chama se põe na dependência deles, pedindo-lhes um serviço qualquer.
[…]. (KARDEC, 2013b, p. 300, grifo nosso).
E o alerta no início do item subsequente (279) não deve ser nunca
desprezado: “Ninguém exerce ascendência sobre os Espíritos inferiores, a não
ser pela superioridade moral.” (KARDEC, 2013b, p. 300, itálico do
original).
Um pouco mais à frente, no tópico “Utilidade das evocações
particulares”, do item 281, transcrevemos o seu último parágrafo:
A evocação dos Espíritos vulgares tem, além disso, a
vantagem de nos pôr em contato com Espíritos sofredores, que podemos aliviar e
cujo adiantamento podemos facilitar, por meio de bons conselhos. Todos, pois, nos podemos
tornar úteis, ao mesmo tempo que nos instruímos. Há egoísmo naquele que somente
a sua própria satisfação procura nas manifestações dos Espíritos, e dá prova de
orgulho aquele que deixa de estender a mão em socorro dos desgraçados. De que
lhe serve obter belas comunicações de Espíritos de escol, se isso não o faz
melhor para consigo mesmo, nem mais caridoso e benévolo para com seus irmãos
deste mundo e do outro? Que seria dos pobres doentes, se os médicos se
recusassem a lhes tocar as chagas? (KARDEC, 2013b, p. 304, grifo nosso).
Entenda-se o adjetivo “vulgares” não no sentido pejorativo, mas apenas
uma outra designação com a qual também se nomeia os Espíritos inferiores
(KARDEC, 2013b, item 267, 4).
Caso não tentemos aliviar e ajudar no adiantamento os Espíritos
inferiores, nós os espíritas, estaremos, segundo Kardec, sento egoístas, por
não estarmos sendo caridosos e benévolos para com eles. Entendemos que,
utilizando-se de outras palavras, Kardec está, na verdade, recomendando mesmo a
evocação desses Espíritos para que, por meio de bons conselhos, possamos
contribuir no alívio de seu sofrimento e no seu despertamento moral para
buscarem o caminho da evolução espirital. O que só ocorre em reuniões
mediúnicas criadas precipuamente para esse objetivo.
Ademais, há situações que, segundo Kardec, é mesmo
necessária a evocação, como nos casos das obsessões. Em A Gênese, no capítulo XIV, Os
Fluidos, quando, tratando desse tema, Kardec disse:
46 – Assim como as moléstias resultam das imperfeições físicas que
tornam o corpo acessível às influências perniciosas exteriores, a obsessão
decorre sempre de uma imperfeição moral, que dá ascendência a um Espírito mau.
A uma causa física, opõe-se uma força física; a uma causa moral preciso é se
contraponha uma força moral. Para preservar o corpo das enfermidades, é
preciso fortificá-lo; para garantir a alma contra a obsessão, tem-se que
fortalecê-la. Daí, para o obsidiado, a necessidade de trabalhar pela sua
própria melhoria, o que na maioria das vezes é suficiente para livrá-lo do
obsessor, sem o socorro de terceiros. Este socorro se torna necessário,
quando a obsessão degenera em subjugação e em possessão, porque neste caso o
paciente não raro perde a vontade e o livre-arbítrio.
Quase sempre a
obsessão exprime vingança tomada por um Espírito e cuja origem frequentemente
se encontra nas relações que o obsidiado manteve com o obsessor, em precedente
existência.
Nos casos de
obsessão grave, o obsidiado fica como que envolto e impregnado de um fluido
pernicioso, que neutraliza a ação dos fluidos salutares e os repele. É daquele
fluido que é preciso desembaraçá-lo, Ora, um fluído mau não pode ser eliminado
por outro igualmente mau. Por meio de ação idêntica à do médium curador, nos
casos de enfermidade, há que se expulsar o fluido mau com o auxílio de um
fluido melhor.
Nem sempre,
porém, basta esta ação mecânica; cumpre, sobretudo, atuar sobre o ser
inteligente, ao qual é preciso que
se tenha o direito de falar com autoridade, que, entretanto, não
possui quem não tenha superioridade moral. Quanto maior esta for, tanto maior
também será aquela.
Mas ainda não é
tudo: para assegurar a libertação, é preciso que o Espírito perverso seja levado a renunciar aos
seus maus desígnios; que nele desponte o arrependimento, assim como o
desejo do bem, por meio de instruções habilmente ministradas, em evocações
particularmente feitas com vistas à sua educação moral. Pode-se então ter a grata satisfação de libertar um encarnado e
de converter um Espírito imperfeito. (KARDEC, 2013c, p. 259, grifo em itálico
do original, em negrito nosso).
Somente
por meio de “evocações particularmente feitas com vistas à sua educação moral”
é que um Espírito perverso pode ser convencido a renunciar a sua vingança,
contra o obsidiado; portanto, não podemos protestar ignorância dessa missão
que, como espíritas, nos cabe.
Voltemos
à obra O Livro dos Médiuns, agora no cap. XXIII – Obsessão, item 254,
onde lemos esclarecimentos importantes:
5. Não se pode
também combater a influência dos maus Espíritos, moralizando-os?
“Sim, mas é o que não se faz, e é
o que não se deve deixar de fazer, porque, muitas vezes, isso constitui uma
tarefa que vos é dada e que deveis desempenhar caridosamente, religiosamente.
Por meio de sábios conselhos, é possível induzi-los ao arrependimento e
apressar o progresso deles.”
(KARDEC, 2013b,
p. 274, grifo nosso).
Uma
das nossas missões é combater a influência dos Espíritos maus, moralizando-os,
obviamente, em reuniões específicas para o trato com eles, já que “isso
constitui uma tarefa que vos é dada e que deveis desempenhar caridosamente,
religiosamente”; mais claro que isso é impossível.
Kardec
insistiu na questão, querendo saber como nós, os encarnados, podemos
influenciar positivamente os Espíritos maus se eles, teoricamente, têm os
Espíritos superiores ao lado.
5-a. Como pode um
homem ter, a esse respeito, mais influência do que a têm os próprios Espíritos?
“Os Espíritos perversos se
aproximam antes dos homens que eles procuram atormentar, do que dos Espíritos,
dos quais se afastam o mais possível.
Nessa aproximação dos humanos, quando encontram algum que os moralize, a
princípio não o escutam e até se riem dele; depois, se aquele os sabe prender,
acabam por se deixarem tocar. Os Espíritos elevados só em nome de Deus lhes
podem falar e isto os apavora. O homem, indubitavelmente, não dispõe de mais
poder do que os Espíritos superiores, porém, sua linguagem se identifica
melhor com a natureza aqueles outros e, ao verem o ascendente que o homem
pode exercer sobre os Espíritos inferiores, melhor compreendem a solidariedade
que existe entre o céu e a terra. Demais, o ascendente que o homem pode
exercer sobre os Espíritos está na razão da sua superioridade moral. Ele
não domina os Espíritos superiores, nem mesmo os que, sem serem superiores, são
bons e benevolentes, mas pode dominar os que lhe são inferiores em
moralidade." (KARDEC, 2013b, p. 274, grifo nosso).
Conforme explicado, a razão
está em que nós, os encarnados, estamos mais próximos deles do que os Espíritos
Superiores; daí ser mais fácil chegarmos a eles do que estes Espíritos.
Concluímos, então, que, conforme o que encontramos nas obras
da Codificação, as reuniões mediúnicas de doutrinação ou esclarecimento de
Espíritos sofredores (imperfeitos) é uma missão nossa, que deve ser levada a
efeito em reuniões específicas, obviamente, sem público externo, mas na
intimidade que esses casos requerem e os espíritos manifestantes merecem.
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