Luiz Carlos D. Formiga (*)
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Considerando a inversão da pirâmide populacional surge uma necessidade. Nessas condições, há que se pensar na educação na idade dourada, aquela que é capaz de gerar na sensibilidade, a reverência e a ternura. Diante da nova demanda, educadores se defrontarão com os que se encontram nessa faixa etária. Nessa etapa inicialmente acontece a crise da aposentadoria. Existem crises anteriores como a da adolescência, a dos trinta e a dos quarenta. Interessa-nos examinar a idade dourada e com ela a trajetória de pessoas para pensar e refletir. Nessa fase se consolida o amadurecimento natural trazendo no seu bojo o desapego, que aponta na direção de novos valores e também a oportunidade educativa.
Pensemos a “crise da aposentadoria”. Este momento crucial produz efeitos relacionados com o estilo de vida apresentado pela individualidade.
Podemos encontrar pessoas obsessivamente compromissadas com suas tarefas, havendo forte vinculação, incluindo dias ou horas reservadas ao descanso. Observamos também que além da vinculação ao trabalho, este também possibilita a outros profissionais acesso a satisfação ocasionada pela interação interpessoal, com dependência aos membros do grupo.
A aposentadoria pode apresentar efeitos destrutivos para este estilo de vida que vê no trabalho a única fonte de satisfação. Se considerarmos que a atividade laboral não é a única dimensão da vida humana seremos capazes de desenvolver outros tipos de projetos e será mais fácil lutar contra o apego ao cargo.
Há pessoas capazes de desenvolver redes sociais fora do ambiente de trabalho e parecem não sentir dificuldades, quando vão deixar de contribuir para o produto interno bruto.
Aquelas que possuem mais autonomia geralmente são muito criativas e demonstram facilidade de estabelecer relações, quando estas são necessárias e também capacidade de assumir novos papéis.
Outras há que são capazes de estabelecer poucas vinculações em toda a sua vida, de trabalhar com relativa facilidade em favor do próprio desenvolvimento pessoal e substituir atividades perdidas por outras novas. Parecem se bem proteger, no sentido de não expressarem suas necessidades de dependências. Essas podem sonhar com a aposentadoria, pois acreditam que esse momento pode se converter em novas oportunidades de crescimento, embora amem o que fazem
Educadores podem ajudar a perceber que a idade dourada pode ser encarada com otimismo e serenidade e, sobretudo mostrar a aposentadoria como uma grande oportunidade educativa, sem inatividade.
Forçoso é reconhecer a dificuldade de lidar com o poder neurótico (1) e com as mentes insensíveis e ignorantes. No entanto, não podemos esquecer que educação é um processo e que bons resultados são possíveis de encontrar. Será trabalho árduo uma vez que este condicionamento é feito pela própria sociedade, que considera o final da vida, a morte, quando o individuo deixa de trabalhar. Um comentarista nos lembrou que diferente da Inglaterra que possui dois mil, o Brasil possui vinte e cinco mil cargos de confiança. Eles não vão se aposentar nunca nas cinco mil prefeituras amigas. Isso nos adverte para que possamos lembrar que não estarão interessados no tema que estamos discutindo.
Embora encontremos no mundo realidades diferentes, sociedades diversas, nesse processo educativo podemos fazer observações que merecem ser consideradas, não importa qual seja a população alvo.
Em primeiro lugar devemos formular objetivos que possam abranger a figura do ser integral, a totalidade da pessoa humana, com natureza composta por domínios diversos e que passam pela transversalidade, interagindo entre si. Teremos que atender a inteligência cognitiva, a inteligência emocional, ao domínio psicomotor e, também, a espiritualidade.
Para determinados indivíduos, parar de trabalhar parece tornar a vida sem sentido, por isso um projeto de educação para a aposentadoria terá que dotar de sentido esta fase da vida e estimular a adoção de um novo estilo de vida. Teremos que atender a saúde, a economia, as relações interpessoais e familiares. Este processo procurará abrir novos horizontes, oferecer alternativas, atividades culturais voltadas para a idade específica.
Não saber o que fazer com o tempo, agora totalmente livre, pode conduzir a perigosa ociosidade. Alguns caem na mão de aproveitadores e são lesados, embora isso seja dos males o menor. Alguns definem a velhice como: “aquela coisa que só se percebe nos outros”. Há um pouco de verdade, quando encontramos adolescentes de cabelos brancos ou camuflados.A falta de atividade planejada pode ser um destruidor físico, psíquico e espiritual. Dessa forma, faz-se necessário elaborar um projeto de vida que se ajuste as reais possibilidades.
Podemos ser otimistas e pensar em etapas não muito longas, levando a vida como se fossemos morrer num futuro relativamente próximo. Um dia a gente acerta. Mas, devemos considerar que é fato comprovado que a humanidade tem ampliado sua média de vida. Assim podemos refletir nas mudanças do modo de viver, de pensar e de se conduzir diante do envelhecimento que é universal, intrínseco (endógeno na origem) e progressivo.
Vamos lembrar também que apenas 5% estão vivendo em recanto de idosos e que a Organização Mundial de Saúde aponta para a velhice apenas após os setenta e cinco anos e ainda que podemos e devemos realizar cirurgias plásticas espirituais, para não ficarmos parecidos com aquela bruxa do conto infantil.
A maior parte dos idosos não apresenta sinais consideráveis de decadência das aptidões físicas e mentais, o que lhes permite vida social, econômica e espiritual produtiva. Ticiano pintava aos 75 anos e Miguel Ângelo aos 89 trabalhava em Pietá. Deveremos, enquanto sociedade, promover a segurança psicológica e espiritual.
Vamos nos utilizar agora do antipático recurso da citação pessoal e antecipo minhas desculpas. Consideremos que experiência vivida não pode ser transmitida; que inexistem duas trajetórias idênticas e a ausência de duas aposentadorias iguais. Por outro lado, consideremos que existem fases na vida que podem generalizar-se e que os exemplos incentivadores são recentes e acessíveis.
Vamos nos socorrer de um trabalho publicado em plena crise dos quarenta e de outro alguns anos depois da crise da aposentadoria.
Tornar-se velho é processo natural e irreversível, que pode ser favorável ou desfavorável. Sentimos insatisfação ao perceber capacidade física diminuindo, no entanto a capacidade intelectual pode aumentar, assim como a experiência de vida.
Podemos demonstrá-lo utilizando duas épocas diferentes da mesma existência. Certamente determinado produto, de esforço intelectual, não poderia ser obtido pelo jovem, apesar de dispor de toda a capacidade física, embora uma pessoa envelhecida pudesse chegar a produto idêntico. Esse raciocínio nos remete a experiência de vida.
Experiência de vida é aquilo que hoje nos faz perceber que nos anos sessenta havia no mundo uma proposta política voltada para o bem coletivo e nos explica ainda a miopia do jovem na sociedade individualista de 2011.
É a experiência vivida, nos laboratórios de saúde pública, que nos faz apelar para a prudência, para a diligência e para a perícia, na Bacteriologia Clínica, mesmo estando dela fisicamente afastados.
Na década de 1980 nos preocupamos em fazer um diagnóstico rápido de uma doença que tinha a taxa de mortalidade aumentada na proporção da demora do resultado do seu exame. Não cogitávamos da possibilidade da existência de técnicos incapazes de perceber que não lidavam apenas com um tubo de ensaio, mas com vidas. Não estávamos alertados porque não tínhamos sido bem instruídos, nem na pós-graduação, no relativo a processo nos tribunais nem ainda tínhamos passado pelos bancos da faculdade de direito.
A primeira preocupação foi resolvida no ano de 1985, 16 anos depois da formatura nas ciências biomédicas e em plena crise dos quarenta. A segunda foi publicada 14 anos depois da crise da aposentadoria.
Isto é resultado do planejamento, não muito ambicioso, que comentei anteriormente. “Podemos ser otimistas e pensar em etapas não muito longas, lembrando que a humanidade tem ampliado sua média de vida, o que é um fato comprovado.“
O crítico mais duro poderá dizer que não foi um gol muito bonito e aí me fará lembrar do presidente que se utilizava de exemplos retirados do futebol e deixar falar o Mestre Dada: “não existe gol feio. Feio é não fazer o gol.”
Mesmo assim, que possamos aceitar a crítica e a realidade de que não fizemos, ou somos, quase nada. Só não poderemos é deixar de resistir à tentação de não começarmos a trabalhar no bem.
Na idade dourada colhemos frutos das diversas sementes lançadas e o leitor deve entender nossa alegria, quando depois de tantos anos encontramos esta citação na literatura. Não estamos iludidos, pois sabemos que representa um átomo do grão de areia dessa praia das ciências biomédicas (2). Esperamos que a contribuição de 2010 (3) não seja esquecida no futuro, embora já tenha produzido frutos no presente.
Outro e mais importante exemplo de planejamento pode ser encontrado na própria sociedade brasileira. A biografia nos permite verificar o quão feliz e produtiva pode ser a idade dourada. Mario Lago lecionou: “fiz um acordo de coexistência pacífica com o tempo. Ele não me persegue nem eu fujo dele. Um dia a gente se encontra.”
O escritor francês, residindo em Lyon, nos oferece precioso exemplo para pensarmos a idade dourada e seu processo de educação, ao biografar uma pessoa pública fácil de examinar pelo conjunto de sua obra inteligente. Com perfeito domínio da língua portuguesa, e, visitando várias vezes o Brasil, oferece-nos uma pérola. Não é uma “mera compilação, mas uma serena e desapaixonada interpretação de fatos.” Um destes fatos não era do nosso conhecimento e por isso o escolhemos para relato aos que possuem mentes aberta.
Rolando Ramaccioti procura Laerte Abnelli. “Chico, lá em Uberaba, pediu que você desenhasse uma capa para seu novo livro.”
Não conhecendo Chico e sendo ateu Laerte não deseja colaborar da divulgação de crença que não compartilha e responde negativamente. Chico lhe escreve reiterando o pedido. Em seguida, de passagem por São Paulo, é recebido com hora marcada. Falou da infância do artista, referência em matéria de publicidade no Brasil. Narrou fatos, que Laerte não lembrava mais, e também toda a sua vida. O artista estupefato dá seu testemunho em livro posterior.
“Fui testemunha de uma coisa (...) Perfume! Muito perfume: de rosas. Não apenas delicioso aroma. Garoava! Abundantemente! Tão intenso que meus cabelos estavam molhados. E vários dias depois, lavados diariamente, recendiam a rosas. E meu terno que guardei no armário, seguiu perfumado por meses e meses a fio...”
Sete anos depois, sem que Laerte tenha notícias do Chico, ocorre-lhe outro fato inusitado. Não tenho coragem de privar o leitor do prazer de verificar, no livro (referência ), como se transfere da fé no niilismo à realidade da alma imortal.
(*) Licenciado em Pedagogia
Livro (referência) - Ponsardin, Mickaél. O homem e o médium. Conselho Espírita Internacional, 2010. 315 p.
http://www.ceilivraria.com.br/Livros-edicei/Portugues/Livro-chico-xavier-o-homem-e-o-medium.html?acao=DT&prod_id=200129
1 Comentários:
Formiga. Obrigado por me proporcionar a grata satisfação de ler esse artigo tão bem escrito. Parabéns!
Marcos Fonseca
Por Marcao, às 5 de março de 2015 às 20:47
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