Um leitor de nossa revista pergunta-nos: O comunismo é ateu?
Antes de responder a semelhante questão, lembremos que se entende por comunismo a doutrina ou sistema social que preconiza a comunidade de bens e a supressão da propriedade privada dos meios de produção: terras, minas, fábricas, etc.
O comunismo seria, segundo alguns, a etapa final de um sistema que tem por fim a igualdade social e a passagem do poder político e econômico para as mãos das pessoas que compõem a comunidade.
A palavra comunismo tem origem no latim comunis, que significa comum.
Como doutrina ou sistema social, é ele muito anterior ao advento do marxismo, fato que se deu a partir de meados do século XIX.
Nos primeiros tempos buscou-se dar-lhe uma fundamentação teórica nas teorias do estado dos sofistas gregos e na obra República de Platão, ideia que teve como adversários pensadores como Aristóteles.
Depois disso, o comunismo continuou a se fazer sentir em muitos movimentos sectários, como foi o caso de Thomas Münzer e dos anabatistas, em seitas puritanas da América do Norte nos séculos XVII e XVIII, com a suposição de que o "amor ao próximo" resultaria de uma regulamentação pública, o que seria contrário à proposta cristã.
O ressurgimento das ideias comunistas ou socialistas (termos utilizados nos primeiros momentos de forma indistinta como sinônimos), no princípio do século XIX, esteve relacionado com a Revolução Industrial. Os abusos do capitalismo e do liberalismo econômico, cometidos pela transformação da economia e da indústria, provocaram um movimento crítico que, em muitos casos, fez com que fossem lembradas as ideias comunistas.
Não havia, porém, e efetivamente não há relação entre “comunismo” e “ateísmo”. Uma pessoa pode ser adepto de uma religião qualquer, inclusive a cristã, e ter em seu ideário político ou social ideias comunistas.
Se determinado adepto do comunismo é ateu, ele o é por outras razões, e não por cultivar os ideais comunistas. Esse pensamento está bem claro na mensagem intitulada “Pergunta e Resposta”, que Emmanuel escreveu pelas mãos de Chico Xavier e a FEB inseriu no livro Coletânea do Além.
Ei-la, na íntegra:
"P - Como devemos encarar o comunismo cristão?
"R - O comunismo em suas expressões de democracia cristã está ainda longe de ser integralmente compreendido como orientador de vossas forças político-administrativas.
Somente serão entendidas as suas concepções adiantadas, à luz dos exemplos do Cristo, quando reconhecerdes que o Evangelho não quer transformar os ricos em pobres e sim converter os indigentes em ricos do mundo, fazendo desabrochar em cada indivíduo a concepção dos seus deveres sagrados, em face dos problemas grandiosos da vida.
Comunismo ou socialismo cristão não pode ser a anarquia e a degradação que observais algumas vezes em seu nome, significando, acima de tudo, a elevação de todos, dentro da harmonia soberana e perfeita.
Quando o homem praticar a fraternidade, não como obrigação imposta pelas justas conveniências, mas como lei espontânea e divina do seu coração, reconhecendo-se apenas como usufrutuário do mundo em que vive, convertendo as bênçãos da natureza, que são as bênçãos de Deus, em pão para a boca e luz para o espírito, as forças políticas que dirigem os povos nortear-se-ão sem guerras e sem ambições, obedecendo aos códigos de solidariedade comum.
Semelhante estado de coisas, porém, nunca será imposto por armas ou decretos humanos. Representará o amadurecimento da consciência coletiva na compreensão dos legítimos deveres da fraternidade e somente surgirá, no mundo, por efeito do conhecimento e da educação de cada indivíduo." (Coletânea do Além, obra mediúnica psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier.)
Léon Denis, em seu livro Socialismo e Espiritismo, tradução de Wallace Leal V. Rodrigues, publicada pela Casa Editora O Clarim, também se reportou ao tema, lembrando as condições necessárias para que tais ideais se concretizem no mundo em que vivemos.
Eis o que o grande pensador e escritor francês escreveu:
"Longe de nós criticar os comunistas de convicção sincera que desejariam estabelecer na Terra o regime social que reina, provavelmente, nos mundos superiores, onde todos trabalham para cada um e cada um por todos, no espírito de devotamento absoluto a uma causa comum. Esse regime exige, no entanto, qualidades morais e sentimento de altruísmo que não existe senão em condições excepcionais em nosso mundo egoísta e atrasado. É fácil demonstrar que as aspirações generosas do comunismo são ainda prematuras e inaplicáveis na sociedade atual. Seria preciso séculos de cultura moral e de educação popular para levar o espírito humano ao estado de perfeição necessário a uma tal ordem de coisas. Eis por que a posse individual dos frutos do trabalho permanecerá sendo por muito tempo o estimulante indispensável, o meio de emulação que assegura pôr em ação o equilíbrio das forças sociais." (Socialismo e Espiritismo, pág. 87.)
No momento, o comunismo não é realizável senão no seio de grupos restritos, cuidadosamente recrutados, nos quais todos os membros sejam animados por uma fé intensa e espírito de sacrifício. Não se poderia sonhar com estender-se a sua aplicação a nações inteiras, a milhões de homens de caracteres e temperamentos tão diferentes. E não será através do crime e pelo sangue que se poderá fundar um regime de fraternidade, solidariedade e amor. As instituições não são realmente vivas e fecundas senão quando os homens, por uma vida interior verdadeira, sabem animá-la. Um comunismo sem ideal elevado não poderia ser construído sobre uma areia perpetuamente movediça." (Obra citada, págs. 87 e 88.)
Os revolucionários violentos, que pretendem fundar a ordem social no sangue e sobre ruínas, não passam de cegos e desgarrados. A harmonia social não pode se estabelecer senão sobre a justiça, a bondade, a solidariedade. O verdadeiro comunismo exige a doação de si mesmo, um sentimento de altruísmo que leve até ao sacrifício, e não foi praticado até aqui senão em agrupamentos religiosos, que se inspiravam em um ideal superior e que, em seus arrebatamentos de fé e de amor, chegavam à renúncia pessoal em proveito da coletividade. Acrescentemos ainda que essa renúncia implicava o esquecimento da família. Ora, a família é a base essencial, o pivô de toda sociedade humana. Um sistema assim não poderia, pois, generalizar-se."(Obra citada, págs. 106 e 107.)
Em face das explicações acima, cremos que esteja perfeitamente respondida a pergunta feita pelo leitor.
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Extraído do http://www.oconsolador.com.br - Ano 8 - N° 386 - 26 de Outubro de 2014.
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