“Melhor é repelir dez verdades do que admitir uma única
falsidade, uma só teoria errônea”. (ERASTO).
“Para a opinião errônea de grande número de pessoas,
muito mais do que se pensa têm contribuído a ignorância e a leviandade de
vários médiuns”. (KARDEC).
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Paulo Neto |
É bem certo que alguns
companheiros irão nos denominar de “patrulheiro da fidelidade doutrinária”,
“ortodoxo” e outros adjetivos mais; porém, em prol da Doutrina Espírita, não
nos incomodaremos com isso. Erasto, espírito de escol que participou ativamente
da codificação, que assina uma das frases acima colocadas, num outro momento
aconselha:
É incontestável que, submetendo ao crivo da razão e
da lógica todos os dados e todas as comunicações dos Espíritos, fácil se torna
rejeitar a absurdidade e o erro. Pode um médium ser fascinado, e iludido um
grupo; mas, a verificação severa a que procedam os outros grupos, a ciência
adquirida, a alta autoridade moral dos diretores de grupos, as comunicações que
os principais médiuns recebam, com um cunho de lógica e de autenticidade dos
melhores Espíritos, justiçarão rapidamente esses ditados mentirosos e
astuciosos, emanados de uma turba de Espíritos mistificadores ou maus. – Erasto, discípulo de São Paulo. (Paris,
1862). (ESE, cap. XXI, item 10, p. 341, grifo nosso).
E também a Allan Kardec
(1804-1869) essa necessidade de análise crítica não passou em branco, porquanto
recomendou:
[...] Nem todos os Espíritos sérios são igualmente
esclarecidos; há muita coisa que eles ignoram e sobre que podem enganar-se de
boa-fé. Por isso é que os Espíritos verdadeiramente superiores nos
recomendam de contínuo que submetamos todas as comunicações ao crivo da
razão e da mais rigorosa lógica. (LM, cap. X, item 136, p. 190, grifo nosso).
Além disso, Kardec nos
esclarece um ponto fundamental, que jamais deveremos esquecer: é que sempre devemos
considerar a opinião de um espírito como apenas uma opinião individual, que não
pode e nem poderá fazer parte do corpo doutrinário do Espiritismo, enquanto não
fosse submetida ao crivo do Controle Universal do Ensino dos Espíritos,
o que podemos confirmar em:
[...] Convém, pois,
considerar essas explicações como opiniões pessoais aos Espíritos que as
formularam, opiniões que podem ser justas ou falsas, e que, em todos os
casos, têm necessidade da sanção do controle universal, e até mais
ampla confirmação não poderiam ser consideradas como partes integrantes da
Doutrina Espírita.
Quando tratarmos essas
questões, o faremos sem cerimônia; mas é que, então, teremos recolhido os
documentos bastante numerosos, nos ensinos dados de todos os lados pelos
Espíritos, para poder falar afirmativamente e ter a certeza de estar de
acordo com a maioria; é assim que fazemos todas as vezes que se trata de
formular um princípio capital. Nós os dissemos cem vezes, para nós a opinião
de um Espírito, qualquer que seja o nome que traga, não tem senão o valor de
uma opinião individual; nosso critério está na concordância universal,
corroborada por uma rigorosa lógica, para as coisas que não podemos
controlar por nossos próprios olhos. De que nos serviria dar prematuramente uma
doutrina como uma verdade absoluta, se, mais tarde, ela devesse ser combatida
pela generalidade dos Espíritos? (KARDEC, 1993i, p. 191, grifo nosso).
Então fica claro que Kardec analisava uma mensagem e não a sancionava
senão após a sua confirmação universal; entretanto, uma grande parte de nós, os
espíritas, infelizmente, passou a aceitar qualquer informação ou até mesmo
alguma novidade pelo motivo dela ter vindo de determinado Espírito ou de
determinado médium.
As
orientações do Codificador são claras, conforme se pode também ver nesta outra
transcrição:
O Espiritismo não é mais a
obra de um único Espírito como não é a de um único homem; é a
obra dos Espíritos em geral. Segue-se que a opinião de um Espírito
sobre um princípio qualquer não é considerada pelos Espíritos senão como uma
opinião individual, que pode ser justa ou falsa, e não tem valor senão quando é
sancionada pelo ensino da maioria, dado sobre os diversos pontos do globo.
Foi esse ensino universal que fez o que ele é, e que fará o que será. Diante
desse poderoso critério, caem necessariamente todas as teorias particulares que
sejam o produto de ideias sistemáticas, seja de um homem, seja de um Espírito
isolado. Uma ideia falsa pode, sem dúvida, agrupar ao seu redor
alguns partidários, mas não prevalecerá jamais contra aquela que é ensinada por
toda a parte. (KARDEC, 2000c, p. 307, grifo em itálico do original, em negrito
nosso).
É
dentro deste espírito que faremos os nossos comentários sobre a obra em
questão, não nos movendo outro objetivo senão o de seguir as orientações
citadas; portanto, não temos nenhuma intenção de atingir a individualidade do
médium ou do autor espiritual, aos quais já, de antemão, pedimos sinceras
desculpas caso sintam-se atingidos pelo que diremos.
Os trechos da obra “Nos céus
da Gália”, psicografia de Carlos A. Baccelli (1952- ), ditada por Irmão
José, sobre os quais comentaremos, estarão em destaque, com borda e fundo
amarelo, para facilitar a visualização e separá-los daquilo que é de nossa
produção, em que os parágrafos transcritos de outros textos de nossa autoria
estão na cor azul, visando distingui-los daqueles provenientes de nossos atuais
comentários.
“Procuramos,
sem qualquer pretensão histórica ou literária, alinhavar nestas páginas algumas
reminiscências, da Terra e do Mundo Espiritual, em torno da saga milenar
da implantação do Reino de Deus entre os homens”. (p. 7).
Ora, ora, se são reminiscências
da Terra e do Mundo Espiritual, como aqui é dito pelo autor espiritual, o que
se espera é que seja verdade tudo quanto exporá e que possamos, em alguns
casos, comprovar com os registros históricos ou literários de que a Humanidade
dispõe.
“A
movimentação das Trevas havia forçado uma mudança de planos em relação ao
nascimento de Jesus, que, inicialmente, estava programado para ter o seu
berço em território gaulês. Claro que, apenas em tese, nos referimos a tal
mudança de planos, porque tudo, como sempre, haveria de acontecer de acordo com
os insondáveis Desígnios do Criador”. (p. 111).
Será que as “trevas” tem tanta
força assim que provoca a mudança de planos tão importantes para o Mundo
físico, a ponto de alterar o local previsto para o nascimento de Jesus?
Sinceramente, não acreditamos nisso, porquanto, a força do bem é que sempre
prevalecerá; o mal jamais a vencerá.
“[...]
antes da experiência que vivenciaram no Druidismo, haviam vivido na Grécia, ao
tempo de Sócrates e Platão – notadamente Allan Kardec, que fora a reencarnação
de Platão e, que quase, cinco séculos antes do cristo, já preconizava que o
mundo sensível não passava de uma cópia do mundo ideal e que, portanto, Deus é
tão somente a Ideia!”. (p. 116).
Estranha-nos ver Kardec como
sendo Platão reencarnado, informação que circula no meio espírita, pois
mensagens assinadas por ele aparecem nas obras da Codificação. Transcrevemos de
nosso texto “Só para fanáticos Chico foi Kardec”, o seguinte:
Outro
que é tido como uma das reencarnações anteriores de Kardec é o filósofo Platão;
porém, encontramos, na Revista Espírita, registros de mensagens
assinadas por Platão: 1º) na sessão realizada em 18 de novembro de 1859
(KARDEC, 1993e, p. 358), na de 20 de janeiro de 1860 (KARDEC, 2000a, p. 39), na
sessão de 03 de fevereiro de 1860, assina juntamente com Moisés e Julien
(KARDEC, 2000a, p. 68). Em Prolegômenos, em O Livro dos Espíritos,
encontramos também a sua assinatura, bem como a de João Evangelista (KARDEC,
2007a, p. 63); e, finalmente, entre os espíritos que respondem à pergunta 1009,
consta uma assinada por Platão (KARDEC, 2007a, p. 524).
Será que temos a manifestação
do espírito de um vivo, no caso Kardec? Tudo bem, sabemos que isso é possível,
pois temos experiências disso relatadas na Revista Espírita. Só que há
um porém: é que o encarnado esteja dormindo ou em um estado no qual o seu corpo
esteja quase que sem atividade, para que a sua alma possa desligar-se e se
manifestar. Aqui também vale o que já dissemos alhures: é preciso provar que
Kardec estava neste estado quando Platão se manifestou, providência que cabe
aos defensores dessa ideia.
“Com a invasão das Gálias pelos romanos, ficara
decidido que o Senhor nasceria entre os judeus, na descendência de Davi,
que havia derrotado a Golias, o gigante filisteu, sucedendo a Saul no trono.
A região escolhida para recebê-Lo seria a
Galileia, palavra que é diminutivo de Gália, como se, diante dos impedimentos
das Trevas, que, de todas as maneiras procuravam evitar que Ele viesse ao
mundo, [...]”. (p. 134).
Transcrevemos do nosso texto
“Será que os profetas previram a vinda de Jesus?”:
Profecia: Jeremias
23,5-6: “Eis que vêm dias, diz o Senhor, em que levantarei a Davi um
Renovo justo; e, rei que é, reinará, e agirá sabiamente, e executará o juízo e
a justiça na terra. Nos seus dias, Judá será salvo, e Israel habitará seguro;
será este o seu nome, com que será chamado: Senhor, Justiça Nossa”. (o teor
destes versículos repete-se em Jeremias 33,15-16).
Era crença comum àquela época que o Messias viria da
casa de Davi; provavelmente, tomavam desses passos de Jeremias, embora essa
profecia não esteja literalmente citada; apenas o texto bíblico nos induz à
conclusão que seja ela.
Vejamos algumas explicações dos tradutores para o
passo:
23,1-8:
O oráculo é, provavelmente, pós-exílio. Apresenta uma avaliação negativa dos
reis de Judá, mostrando que a política deles foi a principal responsável pela
queda de Jerusalém e pelo exílio. Os vv. 5-6 manifestam a esperança de um
futuro rei justo, que governará o povo conforme a justiça e o direito.
(Bíblia Sagrada Pastoral, p. 1035, grifo nosso).
23,6:
Os reis de Judá – aqui expressos pela imagem do pastor – falharam
em sua missão de conduzir o povo. Por isso o próprio Deus suscitará um rei
ideal que implantará a paz, a justiça e o direito em seu país. (Bíblia
Sagrada Vozes, p. 981, grifo nosso).
Javé
– nossa justiça: Nesta exclamação há, provavelmente, alusão
ao nome do rei Sedecias que significa: Minha justiça é Javé. (Bíblia
Sagrada Ave-Maria, p. 1067, grifo nosso).
23,5-6:
Acréscimo em futuro indefinido, expressão de esperança escatológica. Dos
pastores passa ao futuro rei davídico, objeto e alimento da esperança
messiânica. Será “rebento legítimo”, ou seja, descendente e sucessor, não
usurpador. Legítimo também por seu governo justo (2Sma 23,3-4, testamento de
Davi). Seu nome, que equivaleria a Yehosedec (cf. Ag 1,1; zc 6,11; Esd 3,2), pode
aludir polemicamente a Sedecias (o mesmo nome em outra ordem), que não
administrou a justiça. Além disso, o componente çdq pertence à
tradição de Jerusalém. (Bíblia do Peregrino, p. 1905, grifo nosso).
Pelas notas fica evidente que a situação política
daquela época é que dava origem a uma esperança de um Messias, porém, não a
Jesus, como alegam, mas a alguém que resolveria seus problemas imediatos.
Nesse passo de Jeremias fica evidente que os
Evangelhos não se completam, como, dessa forma, costumam justificar as
divergências entre eles. Veja, caro leitor, que a genealogia
que se lê aqui é divergente da que encontramos em Lucas, na qual lemos a
seguinte nota em relação ao passo Lc 1,32: “Seu pai Davi: Maria era, da mesma
forma que José, da descendência de Davi” (Bíblia Ave-Maria, p 1346,
grifo nosso). Tentando explicar a divergência em nota dizem: “Esta
genealogia de Jesus difere sensivelmente daquela que se lê no começo do
Evangelho de São Mateus. As diferenças provêm dos ramos distintos que elas
nos conservaram e que provêm de antepassados comuns.” (Bíblia Ave-Maria, p.
1350, grifo nosso).
Na genealogia que se vê em Lucas encontramos
divergências em relação à de Mateus. Aliás, tentando justificar, diz-se que
ela, a de Mateus, é baseada em Maria; entretanto, isso é estranho, porquanto
“Qualquer genealogia banal naquela época se baseava apenas na linhagem
masculina, que tinha uma importância fundamental. […]” (TABOR, 2006, p. 64) e
“[...] as genealogias bíblicas sempre seguem a linha paterna […]” (VERMES, p.
37, 2007).
Por outro lado, considerando que atribuem a Jesus um
nascimento sobrenatural, gerado não por José, mas por uma entidade espiritual à
qual chamam de “Espírito Santo”, torna essa genealogia sem qualquer propósito,
visto que, por ela, não se poderia dizer que Jesus é descendente de Davi, uma
vez que não haveria nenhum laço de sangue com ele.
Pelo exposto, vemos que a
informação, nessa obra, referendando o que consta nos Evangelhos, nada mais é
que produto de crença de quem se vinculou a uma das religiões cristãs
tradicionais. Cremos que as tradições em nível do Mundo Espiritual deveriam
estar ligadas à verdade e não a coisas que não têm o suporte da realidade.
“Foi
assim que, pertencendo à menor das tribos de Israel, a tribo de Judá, e nascendo
numa gruta da cidadezinha de Belém, destinada a abrigar os animais das
intempéries e das fainas naturais do dia, Jesus surgiu entre os homens, tendo
por mãe a Maria e por pai a José, este último filho de Heli, ou Helil”. (p.
134-135).
Mais uma vez busca seguir
crenças, pois é senso comum entre os críticos modernos de que Jesus não nasceu
em Belém, mas, sim, em Nazaré. Fica tão claro que Jesus, realmente, não nasceu
em Belém, pois, se isso tivesse acontecido, Ele seria designado de Jesus de
Belém e não Jesus de Nazaré, como consta dos Evangelhos. Transcrevemos de nosso
texto “Jesus de Belém ou de Nazaré?”, os seguintes parágrafos de seu início:
Resolvemos fazer o presente estudo pelo motivo de já
termos visto estudiosos bíblicos dizerem que Jesus não nasceu em Belém, fato
que, a princípio, nos pareceu estranho, haja vista que sempre nos falaram que
sim. Talvez o comodismo de aceitar certas coisas, sem questioná-las, especialmente,
aquelas vindas de pessoas que, em nosso julgamento, parecem conhecer do
assunto, nos fez acreditar nessa história a respeito da cidade do nascimento de
Jesus.
João Loes (1983- ), em reportagem, na revista IstoÉ,
intitulada “A face humana de Jesus”, apresenta o seguinte sobre esse assunto:
Embora os evangelhos de Mateus e Lucas
afirmarem que Jesus tenha nascido em Belém, é muito provável que isso tenha
ocorrido em Nazaré. “Todos os grandes especialistas bíblicos são unânimes em
admitir que Jesus nasceu em Nazaré”, afirma Frei Betto, religioso
dominicano autor do recém-lançado “Um homem Chamado Jesus”. Ao que tudo
indica, Lucas e Mateus teriam escolhido Belém como cidade natal de Jesus para
que suas versões da vida de Cristo se alinhassem a uma profecia do Antigo
Testamento, segundo a qual o Messias nasceria na Cidade do Rei Judeu, ou
seja, a Cidade de Davi, que é Belém. (LOES, 2009, p. 65, grifo nosso).
Mateus, realmente, dá como certo o nascimento de Jesus em
Belém; seu objetivo parece confirmar o que foi dito na reportagem, que é o de
nos fazer crer que o nascimento nessa cidade tenha ocorrido para cumprimento de
uma certa profecia, pois ele, Mateus, mais do que qualquer um dos outros
evangelistas, preocupava-se em relacionar os vários acontecimentos da vida de
Jesus com algum tipo de profecia, chegando ao ponto de até mesmo citar
profecias inexistentes, como é o caso, por exemplo, do passo Mt 2,23, que
iremos ver, no qual ele diz que profetas previram que Jesus “Será chamado o
Nazareno”.
Elaine Pagels (1943- ), professora de religião na
Universidade de Princeton, confirma essa tendência do autor do Evangelho de
Mateus: “[…] Hoje, porém, muitos estudiosos sugerem que a
correspondência entre profecia e evento que Mateus descreve mostra que ele
às vezes adaptou sua narrativa de modo a adequá-la às profecias”. […]
(PAGELS, 2004, p. 114, grifo nosso).
Como não é o caso de nos
estendermos nesse assunto, aqui só estamos dando uma pequena amostra; mais
informações sobre Jesus ter nascido em Nazaré, e não em Belém, o leitor deverá
ver no citado texto.
“É
de notar-se, inclusive, que os essênios, por vezes, também chamados
'nazarenos', contrastando com a maioria dos judeus, traziam os seus cabelos
à moda dos antigos gauleses, compridos e divididos ao meio, qual, aliás, Jesus
conservava os seus”. (p. 136).
Consultando as obras Enciclopédia
de Bíblia, Teologia e Filosofia e Estudo Perspicaz das Escrituras,
pudemos ver que o costume de não cortar o cabelo não era prática dos essênios e
sim, dos nazireus, a terceira das filosofias do judaísmo. Esta seita
desapareceu após a destruição de Jerusalém (ano 70 d.C.), nunca são mencionados
no Novo Testamento. (CHAMPLIN E BENTES, 1995b).
Os enciclopedistas Russell
Norman Champlin (1933- ) e João Marques Bentes (1932- ) afirmam que:
[…] alguns comentadores relacionam a palavra 'nazareno'
aos indivíduos que, no Antigo Testamento, são chamados de 'nazireus' (ver Núm.
6:2,13,18-20), os quais faziam certos votos difíceis de serem cumpridos, votos
de consagração a Deus. […]. (CHAMPLIN e BENTES, 1995d, p. 465).
Quanto aos nazarenos, informam: “Houve uma antiga seita
judeu-cristã, conhecida por 'os nazarenos', – no século IV d.C.” (CHAMPLIN e
BENTES, 1995d, p. 466).
[…] O voto do nazireado envolve a consagração especial
de pessoas ou coisas a Deus (ver Gên. 49:26; Deu. 33:16). Está especificamente
em pauta o caso dos nazireus, cujos cabelos compridos serviam de emblema de sua
separação ao serviço do Senhor, cabelos esses que eram reputados a coroa da
glória deles. (CHAMPLIN e BENTES, 1995d, p. 467).
Um nazireu não podia cortar os cabelos durante todo o
tempo em que perdurasse a sua consagração. As referências literárias mostram
que os cabelos de uma pessoa eram considerados a sede da vida, e até mesmo a
habitação de espíritos e de influências mágicas. Talvez por essa razão é que,
terminado o voto do nazireado, a pessoa precisava raspar seus cabelos e
queimá-los, como medida eficaz para anular quaisquer poderes que os cabelos
fossem tidos como possuidores. (CHAMPLIN e BENTES, 1995d, p. 467).
Em Estudo Perspicaz das
Escrituras, lemos: “Os nomes nazareno e nazireu não devem ser confundidos,
porque, embora de grafia parecida em português, derivam de palavras hebraicas
totalmente diferentes, com sentidos diferentes”. (p. 70) e “não deviam cortar o
cabelo da cabeça” (p. 71).
Estranhamos a informação de
que os essênios eram chamados de nazarenos, porque somente estes últimos, como
visto, é que tinham o costume de não cortar os cabelos.
“No livro 'Boa Nova', de autoria de
Humberto de Campos, pela lavra mediúnica de Chico Xavier, ao referir-se ao
Precursor, o célebre autor, que, na feitura de sua obra consultou os arquivos
existentes na Espiritualidade, menciona nada menos que cinco vezes a João
Batista como sendo o missionário da Verdade, deixando evidente que a
João caberia, séculos mais tarde, a tarefa de restaurar o Evangelho, em sua
primitiva pureza, nas luzes da Doutrina Espírita”. (p. 136-137).
“[...] após o fenômeno de sua
transfiguração no Tabor, referindo-se a Elias, que era a reencarnação de João
Batista: 'É verdade que Elias há de vir e restabelecer todas as coisas: - mas,
eu vos declaro que Elias já veio e eles não o conheceram e o trataram como lhes
aprouve'. João Batista, portanto, seria mais tarde, junto a Kardec, o
representante do Espírito de Verdade, sendo, em essência, o Pensamento do
próprio Cristo!...”. (p. 137-138).
Yokhanan – João
Batista –, que se fez Precursor do Cristo, endireitando-lhe as veredas,
tornaria a vir para restabelecer todas as coisas “no seu verdadeiro sentido, para dissipar as trevas, confundir os
orgulhosos e glorificar os justos!” (p. 209).
Ao destacar João Batista na posição de “missionário” e de
“representante” da Verdade, que viria “mais tarde”, pareceu-nos que o autor
espiritual está relacionando João Batista à função de ser também o precursor da
Doutrina Espírita. Mas isso não faz sentido, pois em lugar nenhum se encontra
essa previsão. Se o autor espiritual toma da fala de Jesus de que “É verdade
que Elias há de vir e restabelecer todas as coisas...”, há um engano, pois
o Mestre se referia à profecia de Malaquias e não que João Batista viria
futuramente para ser o precursor do Espiritismo. Tanto isso é verdade que
Jesus, enfaticamente, completou: “Elias já veio e eles não o
conheceram...”.
Na apostila Estudo
teórico-prático da Doutrina Espírita, Unidade 5, tema: “Antecedentes da
Doutrina Espírita”, divulgada pela Sociedade Espírita Fraternidade do Paraná,
lemos:
Na Antiguidade, um rei que viajasse para lugares pouco
percorridos do seu reino enviava antes os precursores, a fim de aplainarem o
caminho e encherem as depressões, de modo a que não encontrasse obstáculos e
viajasse com segurança.
João Batista que foi um dos maiores precursores de
Jesus, trabalhou intensamente, aplainando os caminhos do coração e do
entendimento para a vinda do Mestre; a Doutrina Espírita, também contou com inúmeros precursores que trouxeram
ao mundo as primeiras luzes do que em breve, se tornaria uma Doutrina, que
codificada por Kardec, se tornaria a Terceira Revelação Divina à Humanidade.
Dentre esses precursores, três merecem especial destaque: Emmanuel Swedenborg,
Edward Irving e Andrew Jackson Davis.
(http://www.mkow.com.br/apostilas/unid5.htm, p. 2, grifo nosso).
A impressão que tivemos foi que
se tomou do início do segundo parágrafo, para afirmar que João Batista foi
precursor da Doutrina Espírita, o que não condiz com o que se deve entender do
texto, que está apenas afirmando que João Batista foi o precursor de Jesus e
que a Doutrina Espírita também contou com inúmeros precursores, destacando três
deles.
Pesquisamos todas as obras da
Codificação e em nenhuma encontramos mensagem de João Batista; portanto, não
sabemos qual foi a sua participação na formação do Espiritismo, se é que teve
alguma. O que vimos registrado foi sua evocação junto à Sociedade Espírita de
Saint-Jean d'Angély, conforme mencionado na Revista Espírita 1862
(KARDEC, 1993g, p. 323-335), onde se constata que ele, João Batista, era o Guia
Espiritual dessa Sociedade. Na Revista Espírita 1861, Kardec transcreveu
um discurso do Grupo Espírita de Saint-Just, que se inicia da seguinte forma:
“Senhor Allan Kardec, discípulo de Jesus, intérprete do Espírito de Verdade,
sois nosso irmão em Deus; estamos todos reunidos em um mesmo coração, sob a
proteção de São João Batista, protetor da Humanidade, precursor do grande
mestre Jesus, nosso Salvador”. (KARDEC, 1993f, p. 292, grifo nosso). Enquanto
João Batista, para o grupo de Saint-Jean d'Angély, é o guia de uma sociedade
espírita, para o de Saint-Just, ele é o protetor da Humanidade.
Com o que o autor espiritual
diz no parágrafo seguinte, é que passamos a compreender qual é a sua opinião a
respeito da participação de João Batista na Codificação; vejamo-lo:
A polêmica positiva em torno da real
identidade do Espírito da Verdade, durante longo tempo, se estendeu entre os que participavam do círculo
mais estreito dos amigos de Rivail, até que, mais tarde, na própria “Sociedade
Parisiense de Estudos Espíritas”, alguns indícios de que o Espírito da
Verdade era João Batista foram transmitidos – conforme Jesus prometera: “É
verdade que Elias há de vir e restabelecer todas as coisas!”. (p. 321).
Então, o que aqui se vê é que,
para o autor da obra, que ora comentamos, o Espírito da Verdade era João
Batista, já se contradizendo, posto que mal acabara de afirmar que João era um
“missionário e representante da Verdade”. Sobre essa questão de quem é (ou foi)
o Espírito da Verdade, mais à frente voltaremos a este assunto.
[…] os nossos personagens, conforme já
ficou dito, igualmente transmigraram para a Judeia, sendo que alguns deles
seriam Apóstolos diretos do Senhor, como é o caso do sacerdote druida Allan,
que ficaria conhecido como João, o Evangelista, irmão de Tiago, ambos
filhos de Zebedeu. [...]”. (p. 138).
“[...] Os seus discípulos se multiplicavam
e muitos deles viriam a ser Apóstolos do Cristo, como é o caso do próprio Simão
Pedro, André e João, o célebre Evangelista, que era a reencarnação do
sacerdote druida Allan”. (p. 150).
O Arquidruida Yokhanan havia sido João
Batista, o Precursor, e os doze Apóstolos – todos eles –, inclusive Judas
Iscariotes, que houvera sido Voughan, também tinham vivido em território
gaulês, ao tempo de Yokhanan e Allan Kardec, que reencarnaria como João,
filho de Zebedeu”. (p. 171).
“É notável a participação de João,
irmão de Tiago, entre os doze Apóstolos, com a sua inegável sensibilidade,
haurida no curso de muitas existências, desde quando fora aclamado pelos seus
adeptos e seguidores como Jina – 'conquistador' –, em depois, na
condição do sacerdote druida Allan Kardec e, ainda, um iniciado essênio,
antes de atender o chamamento do cristo para a propagação do Evangelho. (p.
207-208).
[…] A verdade é que João, ao longo
dos séculos, como fiel guardião do Evangelho, em várias oportunidades, retornaria
ao corpo físico, até que, no século XIX, na condição de
Hippolyte-Léon-Denisard Rivail encetaria a obra da Codificação, restaurando a
mensagem Cristã. (p. 210).
Transcrevemos de nosso texto
“Só para fanáticos Chico Xavier foi Kardec”:
Tomando como base o que já vimos anteriormente (veja as
indicações abaixo), para nós, fica cada vez mais claro que somente por
fanatismo pode-se ainda atribuir a Chico a condição de ser Kardec reencarnado.
Inclusive alguns dos que assim pensam afirmam também que Kardec teria sido João
Evangelista, apesar do fato de que o codificador ter evocado João Evangelista,
conforme se pode comprovar na Revista Espírita 1861, no relato da ata da
reunião na Sociedade Espírita de Paris do dia 14 de dezembro de 1860; veja este
trecho:
“3º
Fato pessoal ao Sr. Allan Kardec e que pode ser considerado uma prova de
identidade do Espírito de um personagem antigo. A Senhorita J... teve várias
comunicações de João Evangelista, e cada vez com uma escrita muito
caracterizada e muito diferente da sua escrita normal. A seu pedido, o Sr.
Allan Kardec, tendo evocado esse Espírito, pela senhora Costel, achou
que a escrita tinha exatamente o mesmo caráter da senhorita J..., embora o novo
médium dela não tivesse nenhum conhecimento; além do mais o movimento da mão
tinha uma doçura desacostumada, o que era ainda uma semelhança; enfim, as
respostas concordavam em todos os pontos com aquelas feitas pela senhorita J...
e nada na linguagem que não estivesse à altura do Espírito evocado”. (KARDEC,
1993f, p. 5, grifo nosso).
Além disso, João Evangelista é
dos que também assina a mensagem dos Espíritos constante em Prolegômenos, em O
Livro dos Espíritos (KARDEC, 2007a, p 63). Esse fato nos coloca diante de
algo inusitado, pois Kardec teria se desdobrado em mais dois outros personagens,
uma vez que além da assinatura de João Evangelista a mensagem contém a de
Platão, que é outra pessoa tida como uma das reencarnações anteriores de Allan
Kardec.
O autor espiritual ainda afirma
que Francisco de Assis, foi a reencarnação de João Evangelista:
E entre os muitos
espíritos leais ao Cristo que, ao longo dos séculos, foram se corporificando no
seio da Igreja, com o intuito de procurar trazê-la de volta às suas origens,
destaca-se a figura extraordinária de Francisco de Assis, que foi a reencarnação
de João Evangelista. (p. 238).
Então, até aqui, temos que
Kardec foi João Evangelista e Francisco de Assis; quanto ao primeiro já
demonstramos a sua impossibilidade; quanto ao segundo, o patrono dos animais,
trata-se apenas de uma hipótese, sem qualquer respaldo nas obras da
Codificação.
“Eles
[os judeus] acalentavam a esperança de que a profecia de Isaías a respeito
d'Ele se cumprisse de maneira textual, conforme se encontra escrito no
livro do referido profeta, no capítulo 9, versículo 6 e 7: 'Porque um
menino nos nasceu, um filho se nos deu: o governo está sobre os seus ombros; e
o seu nome será: Maravilhoso, Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade,
Príncipe da Paz; para que se aumente o seu governo e venha paz sem fim sobre o
trono de Davi e sobre o seu reino, para o estabelecer e o firmar diante o juízo
e a justiça, desde agora e para sempre. O zelo do Senhor dos Exércitos fará
isto!'”. (p. 149).
Transcrevemos do nosso texto
“Será que os profetas previram a vinda de Jesus?”:
Durante
esses anos sombrios Isaías fora conformado pelo nascimento iminente de um bebê
real, indício de que Deus ainda estava com a casa de Davi. “Uma jovem (almah)
está grávida e logo dará à luz um filho que se chamará Immanu-El
(Deus-conosco)” (31) Seu nascimento seria ainda uma fonte de esperança, “uma
grande luz”, para o traumatizado povo do norte, que “caminhava nas trevas” e na
“profunda escuridão”. (32) Quando o bebê nasceu, foi de fato chamado
Ezequias, e Isaías imaginou toda a Assembleia Divina celebrando a criança
real, que, como todos os reis davídicos, se tornaria uma pessoa divina e um
membro do conselho celeste: no dia de sua coroação, ele seria chamado de
“Conselheiro Admirável, Deus Forte, Pai Eterno, Príncipe da Paz!. (33).
_____
(31) Isaías
7:14. Essa é uma tradução literal do versículo, não segue a versão tradicional
da Bíblia de Jerusalém.
(32) Isaías
9:1.
(33) Isaías 9:5-7.
(ARMSTRONG, 2007, p. 25, grifo nosso).
A passagem de Isaías, citada
pelo autor espiritual, nada tem a ver com profecia a respeito de Jesus, mas,
sim, de um bebê que já havia nascido;, no caso, Ezequias, conforme nos informou
Karen Armstrong (1944- ).
“Preferiam
textos semelhantes ao que transcrevemos acima a outros nos quais o próprio
Isaías, mais adiante, profetizava, como, por exemplo, no capítulo 53 de
seu livro, versículos 3, 4 e 5: 'Era desprezado, e o mais rejeitado entre os
homens; homem de dores e que sabe o que é padecer; e como um de quem os homens
esconderam o rosto, era desprezado, e dele não fizeram caso. Certamente ele tomou
sobre si as nossas enfermidades, e as nossas dores levou sobre si; e nós o
reputávamos por aflito, ferido de Deus, e oprimido. Mas ele foi traspassado
pelas nossas transgressões, e moído pelas nossas iniquidades; o castigo que nos
traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados!'”. (p.
149).
Transcrevemos do nosso texto
“Será que os profetas previram a vinda de Jesus?”:
Os versículos compreendidos entre Isaías 52,13–53,12,
ou seja, do versículo 13 do capítulo 52 ao versículo 12 do capítulo 53, são
explicados da seguinte forma:
Apresentam
o Servo sofrendo vicariamente pelos pecados dos homens. A interpretação judaica
tradicional entende a passagem como uma referência ao Messias, como, é claro,
fizeram os primeiros cristãos, que criam ser Jesus o referido Messias (At.
8,35). Não foi senão no século XII que surgiu a opinião de que o Servo aqui se
refere à nação de Israel, opinião que se tornou dominante no Judaísmo. O Servo,
todavia, é distinto do “meu povo” (53,8), e é uma vítima inocente, algo que não
se podia dizer da nação (53,9). (Bíblia
Anotada, p. 905).
Interessante que querem, de todas as maneiras,
desvirtuar o texto para aplicá-lo a Jesus, quando, em verdade, se refere
especificamente à nação de Israel.
Também encontramos:
Os
capítulos 40-55 foram escritos por profeta anônimo, na época do exílio na
Babilônia, apresentando uma mensagem de esperança e consolação. Esse profeta é
comumente chamado Segundo Isaías. O fim do exílio é visto como um novo
êxodo e, como no primeiro, Javé será o condutor e a garantia dessa nova
libertação. O povo de Deus, convertido, mas oprimido, é denominado “Servo
de Javé”. (Bíblia Pastoral, p. 947, grifo nosso).
Veja que até divergem quanto à questão da palavra
“Servo”. Essa divergência se torna ainda mais inexplicável, pois ambas as
Bíblias que foram consultadas, segundo dizem, são a “palavra de Deus” e de
“tradução diretamente dos originais”.
Essa informação também a podemos confirmar e Ehrman,
que disse:
Há
mais de cem anos, os estudiosos se deram conta de que os capítulos 40 a 55 do
livro de Isaías não poderiam ter sido escritos pelo mesmo autor responsável
pelos primeiros 39 capítulos (ou a maior parte deles). Os primeiros
capítulos pressupõem uma situação na qual a Assíria está prestes a atacar Judá
– ou seja, foram escritos no século VIII a.C. Os capítulos 40 a 55, por
outro lado, pressupõem uma situação em que o reino do sul tinha sido destruído
e seu povo, levado para o exílio – ou seja, meados do século VI a.C. Talvez
porque os dois livros têm temas proféticos semelhantes, alguém posteriormente
os somou em um único rolo, acrescentando ainda os capítulos 56 a 66, de um
profeta ainda mais recente (o Terceiro Isaías), que escreveu em um terceiro
contexto (EHRMAN, 2008, p. 72, grifo nosso).
Essa “profecia” de Isaías, por
coerência, não deve ser aplicada a Jesus.
“[...]
Herodes II, apelidado Antipas, filho de Herodes, o Grande, aquele mesmo que,
com o intuito de eliminar a Jesus, ordenara a matança das crianças de até
dois anos de idade”. (p. 153).
Transcrevemos de nosso texto
“Jesus de Nazaré ou de Belém?”:
Será que Herodes tentou mesmo matar
o menino, como é afirmado? O primeiro problema que se nos apresenta é “que
Herodes faleceu quatro anos antes da era cristã” (WILSON, 2007, p. 11). Por
isso essa suposta matança das crianças tem tudo para ser algo fictício, o que é
fácil de perceber, pois não há um relato sequer que João Batista, a essa época
com menos de dois anos, tenha sido poupado por Herodes ou que, talvez, sua
família tenha também fugido para escapar dele. Quanto à idade de João Batista
basta ler Lucas (1,39-44) para ver que a jovem Maria foi visitar Izabel, mãe de
João, e esta, “cheia do Espírito Santo” (v. 41) reconheceu a gravidez de sua
prima.
Pepe Rodríguez (1953- ), destacado
jornalista de investigação, especialista em religiões comparadas, com diversos
livros já publicados, dá a respeito de Mt 2,13-18, citado acima, a seguinte
opinião:
Este relato é o máximo: mostra um
Herodes profundamente estúpido que, apesar de “perturbado” com a notícia do nascimento
de um rei messias que podia destroná-lo (Mt 2,3-5), se revela incapaz de enviar
os seus soldados a Belém, situada a pouca distância do seu palácio, para o
prender e, em lugar de mandar, ao menos, algum dos seus muitos espias da corte
para que o informassem com diligência, ficou à espera das notícias de três
magos desconhecidos que se haviam declarado adoradores do recém-nascido. Um
recém-nascido que, conforme conta Mateus, já podia ter perto de dois anos, o
que nos leva a perguntar: passou Jesus os seus dois primeiros anos num estábulo
à espera dos magos?, ficou Herodes durante esses dois anos à espera dos magos
sem tomar qualquer medida, mesmo depois de esse prazo ter passado?, eram tão
idiotas os soldados de Herodes que não soubessem distinguir entre um
recém-nascido e uma criança mais crescida, a ponto de Herodes ter de os mandar
assassinar todos os nascidos “de dois anos para baixo”?
Contrariamente ao que nos fazem crer Mateus, os dados
históricos reais dizem-nos que Herodes não era um rei papa-açorda e sanguinário. Muito pelo
contrário. Mas, ao silenciarem os factos descritos por esse evangelho,
dizem-nos também que Mateus está a mentir. Não aparecem relatados em lado
algum; nem mesmo nas Antiguidades Judaicas ou em qualquer outra das
obras documentadas do historiador judeu Flávio Josefo (c. 37-103 d.C.): este
autor, que lutou contra os Romanos na guerra judaica, nunca deixou passar em
silêncio os massacres cometidos contra o seu povo, sendo assim impossível não
ter contado – num relato minucioso, como são todos os seus – a notícia da
matança das crianças, se esta tivesse efetivamente acontecido (15).
Esta lenda, como restante mito evangélico sobre Jesus, é
falsa. Na sua origem contam-se antigas tradições pagãs. Como é
óbvio, foi introduzida por Mateus – o único texto canónico em que aparece – por um motivo muito concreto: reforçar a
credibilidade do mito básico do cristianismo, mostrando como este dá
cumprimento a duas supostas profecia sobre o Messias.
_______
(15) Por
outro lado, dado que os Judeus, submetidos ao Império Romano, não podiam
aplicar a pena de morte aos seus próprios concidadãos, sem uma autorização
explícita do governador imperial, não é razoável pensar-se que Herodes tenha
ordenado a matança, como não é provável, caso tal tivesse acontecido, que o rei
judeu não tivesse sido castigado pela autoridade romana.
(RODRÍGUEZ,
2007, p. 110-111, grifo nosso).
Observe, caro leitor, que nem a
essa época Herodes existia; portanto, tal fato é, na verdade, pura ficção. Mas
qual seria a intenção dos autores dos Evangelhos? Vejamos:
[…] Em todo caso, nisso há também o enredo literário,
amplamente difundido, da criança eleita que, por essa sua condição, fica
exposta a muitos perigos; esse motivo reaparece em diversas personalidades da
Antiguidade (por exemplo, como Sargão de Akkad, Moisés, Ciro, o Grande, e até o
Imperador Augusto), bem como em figuras da mitologia antiga (é só pensar em
Édipo, mutilado e banido por seu pai, Laio). Assim, hoje em dia usa-se de um
cuidado bem maior do que outrora na apreciação da historicidade do infanticídio
de Belém e, antes, tende-se a considerar o relato em questão como uma
tentativa, condicionada à mentalidade contemporânea que visa realçar a
importância de Jesus, pelos meios usados na época (para tanto, existe ainda uma
certa autenticidade história, representada pelas atitudes efetivamente tomadas
por Herodes em sua contenda com os fariseus por causa do Messias. […] No
entanto, há ainda mais. O relato do infanticídio de Belém estabeleceu um nexo
entre Jesus e Moisés, pois também desse último a Bíblia conta como escapou,
milagrosamente, de perseguições idênticas, sofridas por parte do faraó egípcio
(Êx 1,15, 2.10) (KELLER, 2000, p. 366).
Essa opinião de Werner Keller (1909-1980), para nós, é uma probabilidade bem evidente
para o caso da suposta matança dos bebês em Belém, por ordem de Herodes.
“Por
ordem de Tibério César, estava sendo realizado um recenseamento dos
judeus e todos, onde estivessem, sem exceção, deveriam se dirigir a
Jerusalém. Era como se, através daquela providência, o mundo estivesse
prestando contas de si mesmo, ante a iminente chegada do Senhor. (p. 158).
Do que pudemos levantar, o
imperador de Roma, à época de Jesus, era Augusto César, que reinou de 16 de
janeiro de 27 a.C. a 19 de agosto de 14 d.C. Foi sucedido por Tibério Júlio
César, que, por sua vez, governou Roma de 18 de setembro de 14 a 16 de março de
37. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Augusto e
http://pt.wikipedia.org/wiki/Tib%C3%A9rio).
O episódio do recenseamento
entra nos relatos bíblicos, certamente, para fazer o casal José e Maria se
dirigirem à Belém, local, segundo alguns acreditavam, nasceria o Messias.
Então, ficamos absolutamente sem entender porque o autor espiritual coloca a
necessidade do povo se dirigir a Jerusalém para participar do recenseamento.
Robin Lane Fox (1946- ), afirma
que:
O erro, até agora, pode parecer bastante marginal. O
terceiro Evangelho limitou-se apenas a confundir um recenseamento local na
Judeia com um decreto universal de Augusto; tentou datar a história com
base num obscuro governador chamado Quirino, enquanto em outros lugares, como
no Evangelho Segundo Mateus, o relato ocorre sob o reinado de Herodes, o
Grande. Na verdade, porém, o problema é bem mais profundo. Há uma contradição
na história de Lucas: se Quirino era governador, o recenseamento romano é
crível, mas se quem governava era Herodes é um erro. Também aparece uma
contradição com a história contada por Mateus: se Quirino ou o recenseamento
romano estiver correto, Herodes não era rei, e as histórias contadas por Mateus
falando de Magos, da Matança dos Inocentes e da Fuga para o Egito são todas
cronologicamente impossíveis. Se Herodes era rei, não podia ter havido um
recenseamento por ordem de César Augusto. Mesmo que esse recenseamento
tenha ocorrido, a visão que o terceiro Evangelho nos apresenta dele incorre em
novos problemas.
[…] Na visão do Evangelho, José descendia de Davi, e
por isso foi para Belém, a “cidade de Davi”, um local de nascimento adequado
para um futuro Messias. Os censos romanos, porém, pouco se importavam com as
genealogias remotas, ainda mais quando eram falsas: baseavam-se na posse de
propriedade pelos vivos, e não pelos mortos. […] José e Maria eram de Nazaré da
Galileia, a cidade natal que mais tarde rejeitará seu profeta, Jesus. Um
censo romano não teria levado José a Belém, onde ele e Maria não possuíam nada
e portanto precisariam hospedar-se numa taverna. Havia razões sólidas para
o tipo de registro empregado pelos romanos. O recenseamento era a base que
utilizavam para pelo menos dois tipos de tributos: um tributo por cabeça e uma
taxa que incidia sobre vários tipos de propriedades. Não havia nem mesmo a
necessidade de Maria ir registrar-se junto com seu marido. […] (FOX, 1996, p.
29-30, grifo nosso).
Podemos acrescentar a opinião
de Geza Vermes (1924- ):
Não há registro de nenhum censo imperial geral na época
de Augusto. Houve um recenseamento fiscal na Judeia em 6/7 d.C. sob Quirino,
governador da Síria, após a deposição de Herodes Arquelau e a transformação da
sua etnarquia na província romana da Judeia. Porém, nenhum censo romano teria
sido imposto a um rei dependente como Herodes, e tampouco Quirino foi
governador da Síria durante a vida de Herodes. Finalmente, mesmo que tenha
havido um censo na época do nascimento de Jesus, José não teria sido
obrigado, sob as leis romanas, a viajar para a terra ancestral da sua tribo, e
tampouco Maria teria sido obrigada a acompanhá-lo. Lucas parece ter
combinado o censo que de fato houve sob Quirino, cerca de doze anos após o
nascimento de Jesus, com o seu roteiro teológico. (VERMES, 2006b, p. 255,
grifo nosso).
Temos aí um registro totalmente
duvidoso, que, de acordo com os conhecimentos atuais da época de Jesus, nos dão
conta de que é invenção; porém, o caso se agrava quando um autor espiritual
quer sancioná-lo como verdadeiro.
“Interessante
registrar que, naquela época do recenseamento, o Império Romano estava
comemorando, como fazia a cada ano, as festividades do Natalis Invicti Solis
– o nascimento do Sol Invencível, que acontecia de 21 a 25 de dezembro, quando
do chamado 'solstício do inverno boreal'. Portanto, simbolicamente, não
haveria mesmo tempo mais propício para o nascimento d'Aquele que é o Sol das
Almas e a Luz do Mundo!” […]. (p. 160).
Simbolicamente pode representar
alguma coisa; porém, como fato histórico, é totalmente inverídico, pois Jesus,
a bem da verdade, não nasceu em 25 de dezembro. Vejamos o que encontramos a
respeito do que dizem do dia do nascimento de Jesus:
Quanto ao 25 de
dezembro, ele só foi adotado por volta de 330 d.C. Nessa data,
ocorria em Roma a festa pagã do Solis Invictus, o Sol Invencível. Comemorado
logo após o solstício de inverno – quando o percurso aparente do Sol ocupa sua
posição mais baixa no firmamento –, o festival homenageava o reinício do deslocamento
da trajetória solar para o alto do céu, de onde os raios da estrela voltaram a
aquecer generosamente a Terra. Frustrados na tentativa de acabar com a festa,
os cristãos resolveram apropriar-se dela. (ARANTES, 2003, p. 12-21, grifo
nosso).
[…] Nada sabemos do dia certo de seu nascimento.
Clemente de Alexandria (c. 200) cita várias opiniões a respeito; alguns
cronologistas põem o nascimento de Cristo no dia 19 de abril, outros em 20 de
maio; e Clemente em 17 de novembro do ano 3 a.C. Lá pelo século 2º os cristãos
orientais celebravam o Natal no dia 6 de janeiro. Em 354 igrejas
ocidentais, incluindo as de Roma, celebrava-se o Natal a 25 de dezembro; era
uma data errônea dada como o solstício do inverno, em que os dias começam a
encompridar; data já da festa central do mitraísmo, o natalis invicti solis, ou
aniversário do sol invencível. As igrejas orientais ficaram-se no 6 de janeiro
e acusaram suas irmãs ocidentais de adoração do sol e idolatria, mas no fim do
século 4º o 25 de dezembro foi também adotado no Oriente. (DURANT, 1957, p.
239, grifo nosso).
O atual costume de se celebrar o Natal no dia 25 de
dezembro parece não ter sido instituído antes do ano 353 ou 354, em Roma, sob o
Papa Libério: possivelmente para
absorver o festival do advento de Mitra, nesse dia, nascido de um rochedo.
Porque 25 de dezembro marcava naqueles séculos o solstício de inverno. De
maneira que Cristo, então, como Mitra e o Imperador de Roma, podia ser
reconhecido com o sol ascendente. Temos, portanto, dois mitos e duas datas
do episódio da Natividade, 25 de dezembro e 6 de janeiro, com vínculos que
apontam por um lado para o domínio persa e, por outro, para a esfera egípcia.
(CAMPBELL, 2008, p. 278, grifo nosso).
Foi só em meados do século IV d.C. que os cristãos
começaram a celebrar o Natal no dia 25 de dezembro. Antes, a data marcava uma festa pagã, do nascimento
do deus-sol no solstício de inverno. Foi uma retaliação deliberada dos
cristãos da parte ocidental do Império romano escolher essa data para a festa
do nascimento do seu novo deus, Cristo. Nem todos os cristãos concordaram.
Na parte oriental do Império, outros cristãos fixaram a data da Natividade
em 6 de janeiro, dia de outra grande festa pagã. Se os pagãos tinham
grandes festas em que todos ficavam em casa, os cristãos, ainda em minoria,
também precisavam de alguma, para que seus membros tivessem suas próprias
celebrações. O Natal, assim, estabeleceu-se em nosso calendário não devido a
uma certeza, mas devido a um conflito, a uma batalha de festividades travada
entre os cristãos e a maioria pagã em meio à qual viviam. (FOX, 1996, p.
34, grifo nosso).
São, portanto, vários
estudiosos que afirmam não ser o dia 25 de dezembro a data real do nascimento
de Jesus; foi escolhida apenas para apagar a comemoração pagã do Solis
Invictus.
“Por aquele tempo, nas planícies da
Caldeia, no alto de uma torre, um homem que estudava o movimento dos astros
[…]. Era Baltasar, o astrônomo, chefe de uma tribo nômade, que, de
repente, observava inusitado fenômeno, como se, depois de se aglomerarem em
determinado ponto do Cosmos, aquelas estrelas, fundindo-se em uma só,
precipitaram-se na direção da Terra, qual se o espesso véu da noite se rasgasse
de cima em baixo.
De imediato, na companhia de outros dois
chefes, Gaspar e Melquior, aprontando os camelos, ele se dispõe a empreender a
longa jornada, porque, estudioso das Profecias que os hebreus haviam deixado
em seu cativeiro na Babilônia, também acreditavam na iminente vinda do Messias
ao mundo”. (p. 161-162).
“Chegando a Jerusalém, com suas vestes
exóticas, chamavam a atenção de todos, também porque começaram a indagar aos
transeuntes se algum deles, porventura, saberia lhes informar a respeito do
nascimento de certa criança destinada a ser o rei dos judeus. […] (p. 162).
Transcrevemos no nosso texto
“Será que os profetas previram a vinda de Jesus?”:
Mateus dá notícia de que
magos do Oriente vieram adorar o menino Jesus, oferecendo-lhe presentes: ouro,
incenso e mirra, numa correspondência ao Salmo 72 de Salomão.
Luís Alonso Schökel
(1920-1998), tradutor da Bíblia do Peregrino, diz que esses magos eram
astrólogos (p. 2320). Na Tradução do Novo Mundo das Escrituras Sagradas já
acontece o contrário, usam o termo astrólogos e em nota dizem “ou magos” (p.
1135).
Que ironia do destino, pois
em Dt 18,9-14 proíbe-se, entre outros, consultar magos e astrólogos e aqui são
exatamente eles que vieram para adorar a Jesus. Para salvar a pátria, tentam
justificar:
Uns magos do oriente. Os magos eram astrólogos ou mágicos, às
vezes o termo incluía os que trabalhavam em outras ciências, as quais na época
tinham pouco a ver com o “espírito científico”, e incluíam a superstição, a
magia e impostura. O comentário que os antigos pais da Igreja fizeram sobre
esta cena, é que representa a astrologia e a magia curvando-se perante Cristo,
reconhecendo que a iluminação de Cristo dissipa as trevas da falsa sabedoria.
As lendas populares atribuíam nomes a estes magos, fazendo deles três reis
orientais; talvez o número de presentes (v 11) e uma aplicação do Sl 72,10-11,
levaram a estas conjecturas, porém o evangelho não se detém nestes assuntos.
(Bíblia Shedd, p. 1329, grifo nosso).
A aplicação do Salmo 72 é
algo sem sentido, porquanto, ele trata apenas de uma “oração pelo rei,
lembrando a função da autoridade e desejando que o rei a realize” (Bíblia
Sagrada – Pastoral, p. 747, grifo nosso). Encontramos também esta outra
explicação:
Sl 72 (71). Salmo da realeza, augurando ao
novo rei, no dia de sua entronização, justiça perfeita e paz imperturbável,
êxito nas campanhas militares, especial solicitude pelos indefesos e muita
prosperidade, da qual se beneficiarão todos os povos da terra. […] (Bíblia
Sagrada – Vozes, p. 709, grifo nosso).
Então o salmo citado não é
uma profecia, porém, uma oração dirigida a Deus a favor do rei que está sendo
entronizado; no caso, Salomão.
Sobre o assunto, Russell
Norman Champlin (1933- ), tece as seguintes considerações: “A VISITA DOS MAGOS:
Este relato não tem paralelo em qualquer outro documento cristão conhecido por
nós. É impossível dizer onde Mateus, autor deste evangelho, colheu esse
material, mas talvez devêssemos atribuí-lo a 'M'”. […]. (RUSSEL, p. 277).
Mais uma história inventada
para enaltecer o personagem Jesus.
“Com receio de que ali mesmo fossem
sumariamente executados, os exegetas lhe responderam com o que está escrito
no livro de Miqueias:
- Segundo foi revelado, em Belém de Judá! -
'E tu, Belém, na terra de Judá, não és de modo algum a menor entre as
cidades principais de Judá; porque de ti surgirá o chefe que há de governar o
meu povo Israel!'”. (p. 163).
Transcrevemos de nosso texto
“Será que os profetas previram a vinda de Jesus?”:
Nesta segunda profecia, perceberemos que,
simplesmente, pegaram parte de um texto, que, fora do seu contexto, se aplica
muito bem aos seus propósitos, mas cuja realidade é completamente outra. Para
elucidar essa questão, vejamos a sequência da passagem: “Pois Deus os
entrega só até que a mãe dê à luz, e o resto dos irmãos volte aos israelitas.
De pé, ele governará com a própria força de Javé, com a majestade e o nome de
Javé, seu Deus. E habitarão tranquilos, pois ele estenderá o seu poder até as
extremidades da terra. Ele próprio será a paz. Se a Assíria invadir o nosso
território e quiser pisar o interior de nossos palácios, poremos em luta contra
eles sete pastores e oito comandantes. Eles vão governar a Assíria com espada,
a terra de Nemrod com punhal. Ele nos livrará da Assíria, se invadirem o nosso
território, se atravessarem nossas fronteiras” (Mq 5,2-5).
A pessoa de quem Miqueias está falando é a que livrará
o povo hebreu da Assíria. Nas pesquisas que fizemos não conseguimos
estabelecer, com precisão, quem era. O mais provável, é que seja Ezequias,
filho do rei Acaz, Rei de Judá (721-693 a.C.), já que a profecia anterior,
conforme pudemos constatar, se refere a ele.
James D. Tabor, em A dinastia de Jesus: a história
secreta das origens do cristianismo, deixa-nos algo importante, para nosso
estudo; leiamos:
Existem
estudiosos do Novo Testamento que duvidam da validade histórica até
mesmo desse arcabouço básico, especialmente da história do nascimento de Jesus
em Belém. Sustentam que a história de Belém foi provavelmente acrescentada
para dar crédito a Jesus como Messias descendente de Davi, já que Belém era a
cidade de Davi. Existem certos indícios de que a questão do local do
nascimento de Jesus, na Galileia ou na Judeia, tornou-se uma questão de
controvérsia e discussão dentro de grupos judeus (consulte João 7:40-44).
(TABOR, 2006, p. 336, grifo nosso).
Quanto mais aprofundamos nas pesquisas, mais e mais se
complicam as coisas, para os que querem sustentar a veracidade de tudo quanto
consta na Bíblia.
A Revista
Superinteressante, nº 183, traz um artigo esclarecedor intitulado “Quem
foi Jesus?”, assinado por Rodrigo Cavalcante (?- ), do qual ressaltamos:
[...] E o segundo problema, ainda mais grave, é que
provavelmente Jesus não nasceu em Belém. “Há quase um consenso entre os
historiadores de que Jesus nasceu em Nazaré”, diz o padre Jaldemir
Vitório, do Centro de Estudos Superiores da Companhia de Jesus, em Belo
Horizonte. Então por que o evangelho de Mateus diz que o nascimento foi em
Belém? Vitório explica que o texto segue o gênero literário conhecido por
midrash. Basicamente, o midrash é uma forma de contar a história da vida de
alguém usando como pano de fundo a biografia de outras personalidades
históricas. No caso de Jesus, ele explica, a referência a Belém é feita para
associá-lo ao rei Davi do Antigo Testamento – que, segundo a tradição, teria
nascido lá. (CAVALCANTE, 2002, p. 43,
grifo nosso).
Não há como contestar os dados da história; não é
mesmo? Porém, podemos ir mais longe e provar que na própria Bíblia encontramos
passos que nos dão conta de que não sabiam de onde viria o Messias. Vejamos
isso em Jo
7,25-27: “Algumas pessoas de Jerusalém comentavam: 'Não é este que estão
procurando para matar? Ele está aí falando em público, e ninguém diz nada! Será
que até as autoridades reconheceram que ele é o Messias? Entretanto, nós
sabemos de onde vem esse Jesus, mas, quando chegar o Messias, ninguém saberá
de onde ele vem'”.
O que é bem interessante é que também em João temos
informações de que Jesus não era mesmo visto como nascido em Belém, mas em
Nazaré; veja, caro leitor: Jo 7,41: “Outros diziam: 'Ele é o Messias'.
Outros ainda afirmavam: 'Mas o Messias virá da Galileia?” e Jo 7,52:
“Eles responderam: 'Você também é galileu? Estude e verá que da Galileia
não sai profeta'”. Em ambas se confirma que Jesus é da Galileia, região
onde está localizada a cidade de Nazaré. Na primeira é até mesmo afirmado, ainda
que de forma indireta, que Jesus não é de Belém, fato que outros autores
perceberam, como, por exemplo, A. N. Wilson (1950- ):
[…]
Podemos observar, no entanto, que o Quarto Evangelho (de São João) afirma
com toda clareza que Jesus não nasceu em Belém e que não fazia parte da
linhagem de Davi.(2). Nesse Evangelho, as multidões não acreditavam na
possibilidade de que ele seja o Messias porque veio da Galileia, e não de
Belém. […]
______
2. João, 7:42.
(WILSON,
2007, p. 99, grifo nosso).
Então a coisa se complicou: Jesus não nasceu em Belém,
mas em Nazaré e, além disso, não era da descendência de Davi. Isso é até óbvio,
pois, se o têm como gerado pelo Espírito Santo, para ser descendente de Davi
José haveria de ser o seu pai carnal, vamos assim dizer.
Ao se aprofundar nas pesquisas,
mais invenções saem à tona.
“Chegando
ao pequenino burgo, não tiveram dificuldade alguma em descobrir onde Jesus, na
companhia de seus pais, se encontrava. Admirando-se da singeleza da improvisada
hospedaria que os albergava e, um tanto confusos, não sabiam o que pensar
daquela situação; todavia, assim que se aproximaram da manjedoura onde, já
um tanto crescido, o menino repousava, o bem-estar que passaram a
experimentar era indizível e, espontaneamente, prostraram-se de joelhos ao
chão, passando a reverenciá-lo”. (p. 164).
De nosso texto “Nascido de uma
virgem”, transcrevemos:
Carpenter lista também
vinte e uma semelhanças da história de Jesus com histórias antigas de deuses, o
que não deixa de ser algo surpreendente; vejamos o que ele diz:
A história de Jesus, como vemos, tem muita semelhança
com as histórias dos antigos deuses Sol e com o
percurso atual do Sol nos céus – tantas coincidências, que não podem ser
atribuídas à mera coincidência ou até mesmo a blasfêmias do Demônio! Vamos
enumerar algumas delas. Há (1) o nascimento da Virgem; (2) o nascimento
na manjedoura (caverna ou câmera subterrânea); e (3) em 25 de dezembro
(logo depois do Solstício de Inverno). Há (4) a Estrela do Leste (Sírio) e
(5) a chegada dos magos (os "Três Reis"); há (6) o Massacre
dos Inocentes, e o voo para um país distante (dito também de Krishna e
outros deuses Sol). Há os festivais da Igreja de (7) Candelária (2 de
fevereiro), com procissões das velas para simbolizar a luz crescente; há (8) a
Quaresma, ou a chegada da primavera; há o (9) dia de Páscoa (normalmente em 25
de março) para celebrar a travessia do Equador pelo Sol; e (10) simultaneamente
a explosão de luzes no Sepulcro Sagrado em Jerusalém. Há (11) a Crucificação e
a Morte do carneiro-deus, na sexta-feira santa, três dias antes da Páscoa; há
(12) a prisão feita com pregos em uma árvore, (13) o túmulo vazio, (14) a
Ressurreição (nos casos de Osíris. Attis e outros); há (15) os doze discípulos
(os signos do Zodíaco); e (16) a traição de um dos doze. Depois, há (17) o Dia
do Meio do Verão, o dia 24 de junho, dedicado ao nascimento de João Batista, e
correspondente ao dia de Natal; há as festas da (18) Assunção da Virgem (15 de
agosto) e do (19) nascimento da Virgem (8 de setembro), correspondentes ao
movimento do Sol por Virgem; há o conflito de Cristo e seus discípulos com os
asterismos outonais, (20) a Serpente e o Escorpião; e finalmente há um fato
curioso de que a Igreja (21) dedica o dia do Solstício de Inverno (quando
qualquer um pode, naturalmente, duvidar do renascimento do Sol) a São Tomé, que
duvidava que a Ressurreição fosse verdadeira! Algumas coincidências, mas não
todas, estão em questão. Mas elas são suficientes, acredito eu, para provar –
mesmo permitindo possíveis margens de erro – a verdade de nossa contenção
geral. Entrar no paralelismo dos caminhos de Krishna, o deus Sol indiano, e
Jesus demoraria muito tempo; porque, de fato, a semelhança é muito
grande." Eu proponho, no entanto, ao final deste capítulo, que nos
aprofundemos um pouco na festa cristã da Eucaristia, em parte por causa de sua
relação com a derivação de rituais astronômicos e celebrações da Natureza já
referidas, e em parte por causa da luz que a festa geralmente, seja ela cristã
ou pagã, joga sobre as origens da Mágica Religiosa – um assunto que devo
abordar no próximo capítulo. (CARPENTER, 2008, p. 35-36) (grifo nosso).
Então, poderemos dizer que
qualquer semelhança não é mera coincidência.
“Sem
vacilar, José parte para o Baixo Egito, onde deveria permanecer até que
o mesmo Anjo, em outra aparição, o avisa da morte de Herodes e o libera para
voltar, cumprindo assim o que fora escrito no livro de Oseias, capítulo 11,
versículo 1: 'Do Egito chamarei meu Filho!'”. (p. 166).
Transcrevemos de nosso texto
“Será que os profetas previram a vinda de Jesus?”:
A explicação é que “Oseias compara a relação entre Deus
e Israel como a relação que existe entre pai e filho” (Bíblia Pastoral, p. 1173). Veja como
a passagem deixa isso bem claro. Trata-se, portanto, da libertação do povo
judeu (chamado de Israel), quando Deus, através do profeta Moisés, tira esse
povo da subjugação dos egípcios. E para confirmar isso, vejamos, em sequência,
os versículos 2 a 11:
“e no entanto, quanto mais eu chamava, mais eles se
afastavam de mim: ofereciam sacrifícios aos baais, queimavam incenso aos
ídolos. E não há dúvida, fui eu que ensinei Efraim a andar, segurando-o pela
mão. Mas eles não perceberam que era eu quem cuidava deles. Eu os atraí com
laços de bondade, com cordas de amor. Fazia com eles como quem levanta até seu
rosto uma criança; para dar-lhes de comer, eu me abaixava até eles. Voltarão
para a terra do Egito, a Assíria será o seu rei, porque não quiseram
converter-se. A espada devastará suas cidades, exterminará seus filhos e
demolirá suas fortalezas. O meu povo é difícil de se converter: é chamado a
olhar para o alto, mas ninguém levanta os olhos. Como poderia eu abandoná-lo,
Efraim? Como haveria de entregar você a outros, Israel? Será que eu poderia
tratá-lo como a Adama? Eu poderia tratá-lo como a Seboim? O meu coração salta
no meu peito, as minhas entranhas se comovem dentro de mim. Não me deixarei
levar pelo ardor da minha ira, não vou destruir Efraim. Eu sou Deus, e não um
homem. Eu sou o Santo no meio de você, e não um inimigo devastador. Eles
seguirão a Javé. E Javé rugirá como um leão. E quando ele rugir; eles virão
voando como pássaros; como pombos, eles virão do país da Assíria. Então eu os
farei morar nas suas próprias casas – oráculo de Javé”.
Na narrativa, que acabamos de colocar, a fala está
sendo dirigida ao povo de Israel, não resta a menor dúvida. O que consta do
versículo 1, fora deste contexto, modifica completamente o sentido que se deve
dar à expressão “meu filho”;
mas a citação do texto isolado parece ter sido de propósito, para se
dar a ideia de que é a respeito de Jesus que se fala, já que esse era o
objetivo que buscavam atingir.
Temos
uma informação estonteante vinda de Werner Keller: “inexiste prova histórica
ou arqueológica da ‘fuga para o Egito’” (KELLER, 2000, p. 366).
“Ao
saber que fora iludido pelos reis do Oriente, Herodes, completamente
possuído pelas forças das Trevas, em total insanidade, ordena a matança de
todos os meninos de Belém e arredores que contassem de dois anos para baixo”.
(p. 166).
Transcrevemos do nosso texto
“Jesus de Nazaré ou de Belém?”:
Pepe Rodríguez (1953- ), destacado
jornalista de investigação, especialista em religiões comparadas, com diversos
livros já publicados, dá a respeito de Mt 2,13-18, citado acima, a seguinte
opinião:
Este relato é o máximo: mostra um
Herodes profundamente estúpido que, apesar de “perturbado” com a notícia do
nascimento de um rei messias que podia destroná-lo (Mt 2,3-5), se revela
incapaz de enviar os seus soldados a Belém, situada a pouca distância do seu
palácio, para o prender e, em lugar de mandar, ao menos, algum dos seus muitos
espias da corte para que o informassem com diligência, ficou à espera das
notícias de três magos desconhecidos que se haviam declarado adoradores do
recém-nascido. Um recém-nascido que, conforme conta Mateus, já podia ter perto
de dois anos, o que nos leva a perguntar: passou Jesus os seus dois primeiros
anos num estábulo à espera dos magos?, ficou Herodes durante esses dois anos à
espera dos magos sem tomar qualquer medida, mesmo depois de esse prazo ter
passado?, eram tão idiotas os soldados de Herodes que não soubessem distinguir
entre um recém-nascido e uma criança mais crescida, a ponto de Herodes ter de
os mandar assassinar todos os nascidos “de dois anos para baixo”?
Contrariamente ao que nos fazem crer Mateus, os dados
históricos reais dizem-nos que Herodes não era um rei papa-açorda e sanguinário. Muito pelo
contrário. Mas, ao silenciarem os factos descritos por esse evangelho,
dizem-nos também que Mateus está a mentir. Não aparecem relatados em lado
algum; nem mesmo nas Antiguidades Judaicas ou em qualquer outra das
obras documentadas do historiador judeu Flávio Josefo (c. 37-103 d.C.): este
autor, que lutou contra os Romanos na guerra judaica, nunca deixou passar em
silêncio os massacres cometidos contra o seu povo, sendo assim impossível não
ter contado – num relato minucioso, como são todos os seus – a notícia da
matança das crianças, se esta tivesse efetivamente acontecido (15).
Esta lenda, como restante mito evangélico sobre Jesus, é
falsa. Na sua origem contam-se antigas tradições pagãs. Como é
óbvio, foi introduzida por Mateus – o único texto canónico em que aparece – por um motivo muito concreto: reforçar a
credibilidade do mito básico do cristianismo, mostrando como este dá
cumprimento a duas supostas profecias sobre o Messias.
_______
(15) Por
outro lado, dado que os Judeus, submetidos ao Império Romano, não podiam
aplicar a pena de morte aos seus próprios concidadãos, sem uma autorização
explícita do governador imperial, não é razoável pensar-se que Herodes tenha
ordenado a matança, como não é provável, caso tal tivesse acontecido, que o rei
judeu não tivesse sido castigado pela autoridade romana.
(RODRÍGUEZ,
2007, p. 110-111, grifo nosso).
Por outro lado, segundo o escritor Werner Keller (1909-1980), “inexiste
prova histórica ou arqueológica da ‘fuga para o Egito’”. (KELLER, 2000, p.
366). Sobre esse assunto, não nos estenderemos, porquanto, já o estudamos,
pormenorizadamente, em nosso texto “A fuga do Egito”, disponível em nosso site
www.paulosnetos.net, o qual sugerimos a você, caro leitor, a sua leitura.
Os tradutores da Bíblia de Jerusalém explicam
essa narrativa como sendo uma tentativa de se fazer “um paralelo
anterior na infância de Moisés, descrita pelas tradições rabínicas: segundo
estas, quando o nascimento da criança foi anunciado, por meio de visões, ou por
intermédio dos mágicos, o Faraó mandou chacinar as crianças recém-nascidas”
(Bíblia de Jerusalém, p. 1705-1706).
Vejamos esse episódio em Flávio Josefo (37-103 d.C.),
o historiador hebreu:
[…] Um
dos doutores da sua lei, ao qual eles dão o nome de escribas das coisas santas e que passam entre eles
por grandes profetas, disse ao rei que naquele mesmo tempo deveria nascer um
menino entre os hebreus, cuja virtude seria admirada por todo o mundo, pois
aumentaria a glória de sua nação e humilharia o Egito, e cuja reputação seria
imortal. O rei, assustado com a predição e seguindo o conselho daquele que
lhe fazia essa advertência, publicou um edito pelo qual ordenava que se
deveriam afogar todas as crianças hebreias do sexo masculino e ordenou às
parteiras do Egito que observassem exatamente quando as mulheres fossem dar à
luz, porque não confiava nas parteiras de sua nação. Esse edito ordenava também
que aqueles que se atrevessem a salvar ou criar alguma dessas crianças seriam
castigados com a pena de morte, juntamente com toda a família. (JOSEFO,
2003, p. 79, grifo nosso).
O paralelo entre os dois personagens – Moisés e Jesus
– é evidente: ambos representavam problemas políticos no futuro, com a
possibilidade de virem a querer ocupar os cargos dos mandatários.
Em relação à morte das crianças, Keller explica o
seguinte:
Assim, hoje
em dia usa-se de um cuidado bem maior do que outrora na apreciação da
historicidade do infanticídio de Belém e, antes, tende-se a considerar o
relato em questão como uma tentativa, condicionada à mentalidade contemporânea
que visa realçar a importância de Jesus, pelos meios usados na época (para
tanto, existe ainda uma certa autenticidade histórica, representada pelas
atitudes efetivamente tomadas por Herodes em sua contenda com os fariseus, por
causa do Messias. Veja o fim do capítulo precedente). No entanto, há ainda
mais. O relato do infanticídio de Belém estabeleceu um nexo entre Jesus e Moisés,
pois também desse último a Bíblia conta como escapou, milagrosamente, de
perseguições idênticas, sofridas por parte do faraó egípcio (Êxodo 1.15, 2.10).
(KELLER, 2000, p. 366, grifo nosso).
Corroborando o que foi dito acima,
transcrevemos, respectivamente, de Roberto Carneiro Puccinelli Junior (1960- ),
escritor, espiritualista e mestre em ciências e Bart D. Ehrman (1955- ), Ph.D. em
Teologia pela Princeton University, que dirige o Departamento de
Estudos Religiosos da University of North Carolina, Chapel Hill. É
especialista em Novo Testamento, igreja primitiva, ortodoxia e heresia,
manuscritos antigos e da vida de Jesus; é a maior autoridade em Bíblia do mundo:
Outro
exemplo é a matança de meninos de até dois anos, que teria sido ordenada por
Herodes “em Belém e todo seu território” (Mt2:16). Mateus faz uso aqui de
tradições rabínicas sobre a vinda de Moisés, segundo as quais tão logo o
nascimento da criança foi anunciado por meio de visões e anúncios dos magos, o
faraó teria mandado chacinar crianças recém-nascidas do sexo masculino (*).
Também se observa um paralelo com o livro do Êxodo, quando o rei do Egito manda
as parteiras assistentes do povo hebreu assassinar todo recém-nascido menino e
poupar a vida das meninas. Conforme explica Roselis von Sass em “O Livro do
Juízo Final”, Jesus nasceu em 12 a.C., data confirmada também pelo Dr.
Jerry Vardaman, diretor do Instituto de Arqueologia da Universidade do
Mississípi e professor de religião. Nessa época, Herodes não estava
preocupado com o nascimento de nenhum Messias, mas sim com dois de seus
filhos que, segundo imaginava, tramavam a sua morte. Nesse ano ele foi com os
filhos até Roma para que o imperador Augusto decidisse a questão, o qual não
viu indícios de nenhuma rebelião e reconciliou pai e filhos. Ainda nesse ano de
12 a.C., Herodes presidiu a edição dos Jogos Olímpicos e até deu dinheiro do
próprio bolso para garantir o sucesso do empreendimento. De preocupações com o
Messias nascido, nem sinal.
_______
(*) O faraó
de fato tencionava matar os hebreus recém-nascidos do sexo masculino, mas não
para se ver livre de uma criança chamada Moisés, e sim porque achava que o povo
escravizado estava se tornando muito numeroso, o que poderia ser perigoso para
o país. Ao leitor que desejar conhecer detalhes dessa história indicam-se as
obras Aspectos do Antigo Egito ou Moisés, ambas publicadas pela Editora Ordem
do Graal na Terra.
(PUCCINELLI
JUNIOR, 2006, p. 192-193, grifo nosso).
Quanto ao
registro histórico, também devo chamar a atenção para o fato de que não há
nenhum relato, em qualquer fonte antiga, sobre o rei Herodes massacrar crianças
em Belém, ou em seus arredores, ou em qualquer outro lugar. Nenhum outro autor,
bíblico ou não, menciona isso. […](EHRMAN, 2010, p. 46, grifo nosso).
Para nós, fica nítido que a fuga da
família de Jesus para o Egito foi utilizada também para tentar aplicar o que se
supõe ser uma profecia de Oseias. Ao analisarmos a citada passagem desse
profeta (Os 11,1) vemos que ela nem mesmo é uma profecia, pois, na verdade,
trata-se de um fato já acontecido. Deve-se observar que o verbo “chamar” está
no pretérito, o que indica fato do passado e não um evento a acontecer no
futuro. Ademais, a expressão “meu filho”, usada no passo, tem como referência o
povo de Israel e não alguém em particular.
Por outro
lado, a matança das crianças é, por certo, uma tentativa de justificar uma
suposta profecia de Jeremias (31,15). Porém, como já acontecido anteriormente,
essa passagem também não é uma profecia, uma vez que se refere à tomada de
Jerusalém por Nabucodonosor, rei da Babilônia, que subjuga o povo e o leva
cativo para seu país; daí “o pranto de Raquel (sepultada em Ramá, perto de
Belém) pelos filhos massacrados ou deportados pelos caldeus depois da
destruição de Jerusalém em 596 a.C.,...” (Bíblia Sagrada, Edições Paulinas, p.
1062).
Então,
na opinião dos entendidos, não pode ser real essa história de que Herodes
mandara matar as crianças, para, com isso, eliminar Jesus.
“– Eu
sou Jesus! Meu pai, de nome José, descende da tribo de Davi. Minha mãe é Maria,
também da mesma estirpe, filha de Joaquim e Ana, meus avós”. (p. 167).
Transcrevemos do nosso texto
“Nascido de uma virgem”:
Ao que parece, alguns tradutores se
prendem aos dogmas instituídos; como exemplo, citamos o Pe. Matos Soares, de
quem trazemos essa explicação para Mt, 1,16:
José, esposo de Maria. O Evangelista, descrevendo a genealogia de São
José, conforma-se com o costume hebraico de só atender aos homens nas tábuas
genealógicas. Todavia, dá-nos, ao mesmo tempo, a genealogia de Jesus, visto
que Maria era também descendente de Davi. – Da qual nasceu Jesus.
O Evangelista não diz que José gerou Jesus, pois o Salvador foi concebido no
seio de Maria, por obra do Espírito Santo. São José não foi pai natural de
Jesus, mas somente pai legal, como verdadeiro e legítimo esposo de Maria.
(Bíblia Paulinas, 1957, p. 1178, grifo nosso).
O texto bíblico só afirma que
José era descendente de Davi (Lc 1,27), o que aliás é coerente com o costume da
época de que era pelo homem que se transmitia descendência; mulher não
participava disso; portanto, colocar Maria como também descendente de Davi não
altera em nada essa crença, que para todos os efeitos da época Jesus só seria
descendente de Davi se o seu pai o fosse. Essa informação do autor espiritual,
pareceu-nos baseada na crença católica, conforme a nota acima colocada.
Vejamos que os
próprios Apóstolos que redigiram os Evangelhos – Mateus, Marcos, Lucas e
João – somente mais tarde, puderam fazê-lo, assim mesmo registrando apenas
sublimes fragmentos das inesquecíveis lições do Senhor. [...]”. (p. 182).
Transcrevemos de nosso texto
“Os nomes dos títulos dos Evangelhos designam seus autores?”:
2º) Estudiosos e exegetas
Vamos trazer alguns estudiosos e exegetas para vermos o que
pensam a respeito dos autores e de outros importantes pontos dos evangelhos.
a) Léon Denis (1846-1927):
A. Sabatier, diretor da seção dos
Estudos superiores, na Sorbona, “Os Evangelhos Canônicos”, pág. 5. A Igreja
sentiu a dificuldade em encontrar novamente os verdadeiros autores dos Evangelhos.
Daí a fórmula por ela adotada: Evangelho segundo... (DENIS, 1987, p. 26,
grifo nosso).
Caso haja dúvida no que Denis informa, por ter sido ele um
escritor espírita, sugerimos uma consulta direta na obra por ele mencionada.
b) Pepe Rodríguez:
A primeira coisa que salta à vista,
quando nos abeiramos do Novo Testamento, é o facto de os textos que o compõem
serem tão tardios. Só começaram a ser escritos num período compreendido entre o
último quartel do século I d.C. e o primeiro quartel do século II d. C., à
excepção das epístolas de Paulo, escritas entre 51 e 67 d.C. Mas o que
parece ainda mais incompreensível e absurdo é que quem tinha muito para
testemunhar nada escreveu, ou quase nada, enquanto os que nada tinham para
testemunhar acabaram sendo os redactores da maior parte dos textos do cânone
neotestamentário. É tão ilógico como se uma dezena de historiadores ou de
jornalistas (que, propagandistas como eles, eram os apóstolos ou enviados),
presente no momento em que se estava a dar o maior prodígio da história humana,
tivessem ficado totalmente calados e o ocorrido não tivesse de qualquer modo
ficado documentado e só tivesse sido dado a conhecer quarenta anos depois, e,
ainda e apenas, através de escritores desvalorizados de um par de ajudantes de duas
dessas supostas testemunhas privilegiadas. Senão vejamos:
O Evangelho de Marcos é o documento mais antigo de que dispomos sobre a
vida de Jesus. Ora, Marcos não foi discípulo de Jesus, nem o conheceu
pessoalmente. O que sabe sobre ele foi o que, depois da crucificação, ouviu
a Pedro nas prédicas públicas. O Evangelho de Lucas e os Actos, do mesmo autor,
são documentos fundamentais para conhecer a origem e o desenvolvimento da
Igreja primitiva. Ora, Lucas não foi apóstolo. Também ele escreveu de ouvir
dizer. Compôs os seus textos a partir de passagens que plagia de documentos
anteriores e de diversas proveniências. E, por outro lado, do que havia
escutado de Paulo, que não só não fora discípulo de Jesus, como até 37 d.C. –
um ano depois da crucificação de Jesus – se revelara um perseguidor fanático e
tenaz do cristianismo nascente.
Mateus, pelo contrário, foi apóstolo. Porém, uma parte do seu Evangelho
foi escrita a partir de documentos anteriores redigidos por um outro Marcos
que, esse, não fora apóstolo. Resta João Zebedeu que foi, também ele, apóstolo. Acontece, contudo,
que o Evangelho de João e o Apocalipse não são obra sua, mas de um outro
João. Foram escritos por um tal João, o Ancião, um grego cristão que
se baseou não só em textos hebreus e essênios, como nas recordações que
conseguiu obter de João, o Sacerdote, identificado como “o discípulo
amado” de Jesus (mas que não é João Zebedeu), um sacerdote judeu muito amigo de
Jesus que foi viver para Éfeso e onde veio a morrer em idade muito avançada. […]
(RODRÍGUEZ, 2007, p. 65-66) (grifo nosso).
[…] Porém, como mostrámos no seu devido momento, o texto do Evangelho
de João, escrito pelo grego João, o Ancião, em princípios do século II,
revela um Jesus absolutamente deformado, que fala com uma prepotência
descarada, contrariamente à humildade que o caracteriza nos relatos dos três
sinópticos. […] (RODRÍGUEZ, 2007, p. 178, grifo nosso).
c) Bart D. Ehrman (1955- )
Embora
evidentemente não seja o tipo de coisa que os pastores costumem contar às suas
congregações, há mais de um século existe um forte consenso de que muitos
dos livros do Novo Testamento não foram escritos pelas pessoas cujos nomes
estão ligados a eles. […].
[…]
Por que
surgiu a tradição de que esses livros foram escritos por apóstolos e por companheiros
dos apóstolos? Em parte de modo a garantir aos leitores que eles foram
escritos por testemunhas oculares e companheiros das testemunhas oculares.
Uma testemunha ocular merece a confiança de que iria contar a verdade sobre o
que realmente aconteceu na vida de Jesus. Mas a realidade é que não é possível
confiar em que as testemunhas ofereçam relatos historicamente precisos. Elas
nunca mereceram confiança e ainda não merecem. Se testemunhas oculares sempre
fizessem relatos historicamente precisos, não teríamos a necessidade de
tribunais. Quando precisássemos descobrir o que realmente aconteceu quando um
crime foi cometido, bastaria perguntar a alguém. Casos reais demandam muitas
testemunhas, porque seus depoimentos diferem entre si. Se duas testemunhas em
um tribunal divergissem tanto quanto Mateus e João, imagine como seria difícil
chegar a um veredicto.
A verdade é que todos os Evangelhos foram escritos
anonimamente, e nenhum dos autores alega ser uma testemunha. Há nomes ligados
aos títulos dos Evangelhos (“o Evangelho segundo Mateus”), mas esses títulos
são acréscimos posteriores aos próprios livros, conferidos
por editores e escribas para informar aos leitores quem os editores achavam que
eram as autoridades por trás das diferentes versões. Que os títulos não são
originalmente dos Evangelhos é algo que fica claro com uma simples reflexão.
Quem escreveu Mateus não o chamou de “Evangelho segundo Mateus”. As pessoas que
deram esse título a ele estão dizendo a você quem, na opinião delas, o
escreveu. Autores nunca dão a seus livros o título de “segundo fulano”. (1)
______
1. Alguns críticos de um dos
meus livros anteriores, sobre o problema do sofrimento, sugeriram
deturpadamente que o título “O problema com Deus” na verdade deveria ser “O
problema com Deus segundo Bart Ehrman” –, mas obviamente não é como eu mesmo
chamaria o livro!
(EHRMAN, 2010, p. 118-120, grifo nosso).
d) Karen
Armstrong (1944- ):
"Não
sabemos quem escreveu os evangelhos. Quando apareceram, eles circularam
anonimamente, e só mais tarde foram atribuídos a figuras importantes da
Igreja primitiva. (60) Os autores eram cristãos judeus, (61) que escreviam
em grego e viviam nas cidades helenísticas do Império Romano. Eram não
somente escritores criativos - cada um com suas tendências particulares -, mas
também redatores competentes, que editaram materiais anteriores. Marcos
escreveu por volta de 70; Mateus e Lucas no final dos anos 80, e João no final
dos anos 90. Os quatro evangelhos refletem o terror e a ansiedade desse período
traumático. […]
_______
(60)
Fredricksen, Jesus, p. 19.
(61) Há uma crença muito difundida de que Lucas era
gentio, mas não há prova incontestável disso.
(ARMSTRONG, 2007, p. 71, grifo nosso).
e) Juan
Arias:
O último
dos evangelhos, escrito por volta dos anos 90 d.C., é o de João, falsamente
atribuído ao chamado “discípulo amado”, o único dos 12 do qual não se sabe se
foi casado. Modernamente, no entanto, alguns autores, entre eles César Vidal,
inclinam-se a aceitar a tese de que teria sido realmente escrito pelo apóstolo
João. Para tanto, consideram a evidência de o evangelista aparecer como
testemunha ocular de alguns fatos e que sua língua é o aramaico, embora
escrevesse corretamente em grego.
César Vidal
afirma que, mesmo que não fosse o apóstolo João, deveria tratar-se de algum
discípulo muito próximo de Jesus. Seja como for, não se sabe ao certo quem é
o autor desse evangelho, que é o mais diferente dos outros. Pode ter sido
escrito pelo mesmo autor do Apocalipse. […] (ARIAS, 2001, p. 47, grifo nosso).
f) Paul Johnson (1928- ):
[…] o estudo dos textos escriturais,
aplicando os novos métodos de análise histórica e com auxílio da filologia e da
arqueologia, revelaram as Escrituras como uma coletânea de documentos
muito mais complexa do que se havia imaginado até então – um assombroso
composto de alegorias e fatos, a ser peneirado como qualquer outra peça de
literatura antiga. (JOHNSON, 2001, p. 456, grifo nosso).
g) Geza Vermes (1924- ):
[…]
a opinião de que o assim chamado Evangelho de João é algo especial, e que
reflete, não a autêntica mensagem de Jesus ou sequer o pensamento dos seus
seguidores imediatos sobre ele, mas uma teologia altamente evoluída de um
escritor cristão que viveu três gerações depois de Jesus e completou o seu
Evangelho nos primeiros anos do segundo século d.C. Para o crente médio, o
último Evangelho é naturalmente o melhor e o mais confiável dos quatro. […]
(VERMES, 2006a, p. 15-16, grifo nosso).
[...] A
segunda linha de defesa teve bom êxito e sobrevive até hoje. Ela apresenta João
como o biógrafo supremo de Jesus, autor do Evangelho espiritual. Familiarizado
com a obra dos seus predecessores, diz-se que ele evitou deliberadamente
repetir a maioria das suas histórias, exceto o relato da Paixão, que se limitou
a suplementar e enriquecer os seus registros com discursos inteiros atribuídos
a Jesus, e em geral a desenvolver doutrinariamente e aperfeiçoar as suas
narrativas.
Nenhuma leitura crítica dos quatro Evangelhos justifica
tal compreensão de João. Pois é óbvio para qualquer leitor imparcial, sem viés
religioso, que, se o Quarto Evangelho está certo, seus precursores têm de estar
errados, ou vice-versa. Os Sinópticos e João não podem estar simultaneamente
corretos, pois o primeiro atribui a Jesus uma carreira pública que dura um ano,
ao passo que João a estende em dois ou três anos, mencionando duas ou
possivelmente três celebrações da Páscoa consecutivas durante o ministério de
Jesus na Galileia e na Judeia. Do mesmo modo, se for exata a datação de
João da crucificação na véspera da Páscoa, isto é, em 14 Nisan, os
Sinópticos, que descrevem a Última Ceia como um jantar de Páscoa e situam os
acontecimentos que conduzem à execução em 15 Nisan, têm de estar errados. Ou
para hebraizar e adaptar apropriadamente o provérbio inglês à situação da
Páscoa judaica, não é possível guardar o pão ázimo e comê-lo! (VERMES, 2006a,
p. 18, grifo nosso).
A mesma opinião majoritária considera a identidade do
autor indeterminável. Exceto pelo título:
“segundo João”, que é ambíguo – que João? – e que somente mais tarde foi
vinculado ao texto, o próprio Evangelho, do Capítulo 1 ao Capítulo 20, não
menciona nenhum autor. No Capítulo 21, anexado por alguém que não era o
evangelista (cf. Versículo 24), há uma tentativa de identificá-lo com “o
discípulo amado de Cristo”, que se supõe tacitamente ser o pescador galileu
João, filho de Zebedeu. (VERMES, 2006a, p. 19, grifo nosso).
Essas opiniões não podem ser desprezadas, pois seria o mesmo que
querer tapar o Sol com a peneira.
Infelizmente, muitos
expositores espíritas não sabem disso, já que afirmam que os autores dos
evangelhos são aqueles constantes dos títulos.
“[...]
O testemunho do célebre médico grego, pois, autentica, em grande parte, os
Evangelhos considerados 'apócrifos' pela Igreja Católica. A verdade é que,
incentivados por Mateus e, principalmente, por Paulo de Tarso, autor das
famosas Epístolas às comunidades cristãs, é que os Apóstolos e discípulos
algo começaram a escrever em torno dos ensinamentos e da Vida de Jesus Cristo.
Podemos afirmar que, dos doze, somente Judas nada escreveu de próprio punho
sobre o que, durante três anos sucessivos, ele pôde ver e ouvir. (p. 183).
Vejamos o que diz Bart D.
Ehrman (1955-
) sobre os “escritos 'paulinos'
no Novo Testamento”:
Assim como Pedro, o mesmo com Paulo. Fora do Novo Testamento,
há muitas histórias inventadas sobre ele vários escritos, apenas supostamente,
assinados por ele. Todos os escritos atribuídos a Paulo fora do Novo Testamento
foram falsificados. Há falsificações paulinas dentro do Novo Testamento?
Mais uma vez há aqui um amplo consenso acadêmico. Há
13 cartas cuja autoria é atribuída a Paulo, quase a metade dos livros do
Novo Testamento. Mas é provável que seis delas não tenham sido escritas por
ele. Acadêmicos chamaram essas seis epístolas de “deuteropaulinas”, significando
que têm uma posição “secundária” no corpo dos escritos de Paulo.
Quase todos os estudiosos concordam que sete das
epístolas paulinas são autênticas: Romanos, 1 e 2 Coríntios, Gálatas,
Felipenses, 1 Tessalonicenses e Filemom. Essas sete são coerentes e parecem,
estilística e teologicamente, e em quase todas as outras características, ser
da mesma pessoa. Todas são atribuídas a Paulo. Há poucos motivos para duvidar
de que realmente foram escritas por ele.
As outras seis diferem significativamente desse núcleo
de sete. Três delas – 1 e 2 Timóteo e
Tito – são tão parecidas que a maioria dos acadêmicos está convencida de que
foram escritas pela mesma pessoa. As outras três em geral são atribuídas a três
autores diferentes. O consenso acadêmico é maior em relação ao primeiro gruo de
três. Portanto, começarei discutindo por que os estudiosos há muito as
consideraram falsificações. (ERHMAN, 2013, p. 97-98, grifo nosso).
Temos aqui, então, o que os
acadêmicos pensam a respeito das cartas atribuídas a Paulo.
“[...]
embora nunca tenha havido um Homem como Ele na Terra, como nunca terá de haver
algum que, um dia, O supere, por muito pouco a Sua passagem entre os homens não
permaneceu totalmente anônima nas páginas da História, mormente da História
dita oficial que, a não ser em discreto texto de Flávio Josefo, em sua obra
'Antiguidades Judaicas', registra a existência de um 'certo Jesus' vivendo
entre os judeus, que muitos afirmavam ser o Messias. (p. 184).
Transcrevemos do nosso texto
“Josefo cita Jesus?”:
Não raras vezes, encontramos pessoas que,
no esforço de provar a existência do Jesus histórico, recorrem a Flávio Josefo,
historiador judeu do século I, nascido em 37, morto no ano 103. Tudo bem, a
busca das fontes para demonstrar que Ele realmente existiu é algo louvável
mesmo. Entretanto, a questão é: será que podemos confiar na informação que se
encontra em Josefo? Para responder a isso é necessário vermos o que o
historiador soviético Iakov Abramosvitch Lentsman[1]
(1908-1967) argumenta:
[…] Seus escritos, no entanto, constituem uma fonte preciosa
para o estudo da história da Palestina no primeiro século da nossa era. Nas Antiguidades
Judaicas Flávio Josefo relata, sem omitir qualquer detalhe, os
acontecimentos ocorridos em sua época, em seu país; fornece informações muito
importantes a respeito dos essênios e de outras seitas da Judeia. A profusão
de dados de toda espécie que se encontra nesta obra torna ainda mais eloquente
seu total silêncio sobre os cristãos.
Mas, os
doutores da Igreja, percebendo claramente que a essência de qualquer alusão
na obra de Flávio Josefo desacreditava totalmente o mito evangélico, não
recuaram diante de uma falsificação grosseira. Nos manuscritos das
Antiguidades Judaicas está escrito (XVIII, 3,3) que, sob Pôncio Pilatos,
viveu “Jesus, um homem sábio, se é que se pode, todavia, considerá-lo como um
homem, pois foi autor de atos maravilhosos, mestre de homens que, com alegria,
receberam dele a verdade; ele atraiu muitos judeus, e, também, muitos gregos.
Foi o Cristo. Quando, por denúncia daqueles que eram os primeiros entre nós,
Pilatos o condenou à cruz, aqueles que, desde o princípio, o amaram continuaram
procedendo assim pois, ele lhes apareceu três dias depois, ressuscitado de
novo. E os divinos profetas haviam previsto isto e dez mil outras maravilhas
sobre ele. Hoje, ainda não desapareceu a seita dos cristãos, nome esse que
deriva do dele”. Porém, se se levar em conta a fidelidade de Flávio Josefo à
religião judaica e, também, o fato de ele considerar Vespasiano como o Messias,
de modo algum se poderá aceitar que tenha dado tal título a Jesus também.
Segundo a opinião geral dos historiadores, essas linhas não passam de uma
interpolação posterior, devida a um copista, tão ingênuo, quanto piedoso.
Graças a um feliz acaso, é mesmo possível estabelecer a
data dessa intercalação. Um dos Padres da Igreja, Orígenes, polemizando
contra Celso, crítico do cristianismo, acusa Flávio Josefo de não ter
querido admitir que Jesus era o Messias. Eusébio, que compôs a sua História
Eclesiástica no século I, pouco depois da vitória do cristianismo, já
reproduz as linhas que foram acrescentadas, o que dá lugar à crença de que a
passagem citada foi intercalada nos textos de Flávio Josefo entre os fins do
século III e os começos do século IV. Trata-se de uma interpolação tão
manifesta que muitos dos teólogos católicos não mais ousam negá-la.
Em outra página das Antiguidades Judaicas (XX,
9), Flávio Josefo fala da condenação de certo “Pedro, irmão de Jesus, chamado o
Cristo, e de alguns outros”. Em meados do século III, Orígenes, em diversas
ocasiões, referiu-se a essa passagem que, à primeira vista, parece muito mais
digna de fé do que a que citamos anteriormente. Mas, como admitir que essas
palavras são da pena de Flávio Josefo, uma vez que esse mesmo Orígenes o acusou
de duvidar de que Jesus fosse o Messias (o Cristo)? Pode ser que o original se
referisse a outro Jesus. É evidente, em todo o caso, que esta passagem também
traz vestígios da intervenção de copistas cristãos. Nos escritos de Flávio
Josefo nada mais se encontra que se relacione com o cristianismo.
Apesar da ausência de referências ao cristianismo nas
duas obras de Flávio Josefo, tanto uma como outra são indispensáveis ao estudo
do problema que nos ocupa, sendo, com efeito, a única fonte de que dispomos
sobre a história da Palestina antes da Guerra dos Judeus, e a principal fonte
sobre a história dessa guerra. Se bem que o cristianismo tenha nascido entre
hebreus que viviam fora do seu país, os acontecimentos na Palestina não
deixaram de exercer sobre eles uma grande influência, onde quer que vivessem,
no Egito, ou na Ásia Menor. É preciso não esquecer, doutra parte, que os
autores dos livros do Novo Testamento obtinham dados históricos sobre a
Palestina nos escritos de Flávio Josefo: vários detalhes dos evangelhos foram
emprestados das Antiguidades Judaicas. (LENTSMAN, 1963, p.
56-58, grifo nosso).
Acreditamos que as ponderações de Lentsman são
pertinentes, sendo inclusive corroborada pelo teólogo alemão Holger Kersten
(1951- ):
[…]
O historiador judeu Flávio Josefo publicou, por volta de 94 d.C., uma
obra grandiosa, intitulada Antiguidades Judaicas, que cobre um espaço
que vai desde a criação do mundo até a época de Nero, onde narra acontecimentos
considerados mais importantes. Cita João Batista, Herodes e Pilatos; detalha,
com minúcias, fatos políticos e sociais, mas não escreve uma só palavra
sobre Jesus. No terceiro século, surgiu uma obra escrita por um cristão,
intitulada Testimonium Flavianum (12), onde o historiador judeu
Josefo aparece inesperadamente, narrando e confirmando os milagres e a
ressurreição de Cristo. Os padres da Igreja, Justino, Tertuliano e
Cipriano, nada sabiam a esse respeito e Orígenes (13) nos lembra, repetidas
vezes, que Josefo não acreditava em Cristo. […]
______
(12) Flávio
Josefo, Antiguidades Judaicas 18; 3,3 e 20: 9,1.
(13) Orígenes, Contra Celsum.
(KERSTEN, 1988, p. 28-29, grifo nosso).
Acrescentamos, também, os
escritores britânicos Timothy Freke (1959- ) e Peter Grandy (?- ), autores do
livro Os mistérios de Jesus, do qual transcrevemos:
Durante
centenas de anos, estas passagens de Josefo foram tomadas pelos historiadores
cristãos como prova conclusiva de que Jesus existira. Isto é, até que os
académicos começaram a examinar o texto de uma forma mais crítica. Nenhum
erudito sério acredita agora que estas passagens foram na realidade escritas
por Josefo (13). Elas foram claramente identificadas como acrescentos
muito posteriores. O seu estilo de escrita não é o mesmo do de Josefo e, se
forem retiradas do texto, o argumento original de Josefo segue sua sequência
natural. Escrevendo no início do século três, Orígenes, que as
autoridades modernas consideram como um dos eruditos mais conscienciosos da
antiga igreja, diz-nos que não há qualquer referência a Jesus em Josefo e
que Josefo não acreditava que Jesus era o Cristo, dado que não acreditava em
nenhuma figura de Messias judaicas (14).
[…]
[…] Josefo
menciona pelo menos dez Jesus, embora seja revelador notar que algumas
traduções de Josefo só traduzem as passagens que pretendem que o leitor
identifique com Jesus Cristo, usando a versão grega do nome que todos nós
reconhecemos, deixando os nomes de todos os outros Jesus no hebraico não
traduzido (22).
_______
13. Qualquer
um que ainda duvide disto deve ler The Messiah Jesus and John the Baptist
pelo Dr. Eilser: “O que é certo é que nem um único texto grego, latino, eslavo
ou outro de Josefo chegou até nós sem ter passado pelas mãos dos escribas
cristãos e dos seus proprietários cristãos”, Eilser, R. (1931), 38. Relativamente
às interpolações, Eisler diz: “Os críticos da passagem são filólogos, os seus
defensores teólogos, ibid., 41.
14. Gruber e
Kersten (1985), 6, e ver Wells, G. A. (1975), 11. Josefo tinha enorme
desprezo pelos numerosos “Messias” que estavam activos na sua época. Ver
Josefo, The Jewish War, 135. Ele metia as “fraudes religiosas e os
bandidos” no mesmo saco e considerava-os a causa da destruição de Jerusalém.
22. Ver Josefo, The
Jewish War, 403, onde este truque particularmente pouco sincero é mais aparente.
O Jesus lunático do Capítulo 21 é inexplicavelmente traduzido como Jeshua,
enquanto nas adições eslavas espúrias o editor usa o nome Jesus. Em defesa
destas interpolações, ele afirma que os acréscimos que consideram estas
passagens como espúrias estão simplesmente “empenhadas na destruição”! É
estranho ouvir a linguagem de um profeta do Antigo Testamento a um académico
clássico a escreve em 1959.
(FREKE e GANDY, 2002, p. 129-130, grifo nosso).
Confirma,
o que já foi dito anteriormente.
Será que o autor espiritual não
tinha conhecimento disso?
“Exceto,
pois, o testemunho dos Evangelhos e de Paulo de Tarso, este último, igualmente,
não tendo privado com o Mestre pessoalmente, o único documento de valor
histórico sobre a existência do Cristo, que, infelizmente, muitos contestam, é
a carta que o Senador Públio Lêntulus escreveu a Tibério César,
encontrada na casa do Duque de Cesadini, em Roma”. (p. 184).
O confrade Marco Antônio Vieira
(1961- ), assim opina:
Existe uma carta (Retrato de Jesus cópia anexada) que,
supostamente, fora encontrada nos arquivos particulares do Duque de Cesadine,
na Itália. Tal missiva teria sido assinada por um Senador Romano de Nome Públio
Lêntulus Cornélius – um nome que é bastante conhecido dos leitores e das
leitoras das obras escritas de Chico Xavier, vide o romance histórico
psicografado Há Dois Mil Anos – e que teria sido destinada ao imperador. Nessa
carta, tudo nos faz crer que aquele representante oficial do Império Romano
teria vivido na época de Jesus e que ele teria feito contato com o Nazareno, na
Palestina. Tal documento, na forma que nos é apresentado, permite uma série de
questões entre elas: a) a sua origem e a sua datação ainda não foram
historicamente comprovadas; b) não se tem absoluta certeza sobre a guarda de quem,
ou de qual instituição, se encontra o original; c) não sabemos em que local
exato, nos dias atuais, se acha o original; d) desconhecemos os motivos pelos
quais ela não é mais divulgada e amplamente pesquisada; e) o referido documento
nos apresenta um perfil fisionômico, também duvidoso, do famoso galileu; f) é
de bom alvitre aguardar as confirmações do Mundo Maior; preferencialmente, de
Chico Xavier e de Emmanuel, a respeito de tal documento. (VIEIRA, 2003, p.
168).
Temos aí um bom conselho ao
autor espiritual que divulga essa carta como se fosse verdadeira.
“No
inesquecível episódio da mulher surpreendida em adultério, novamente, os
escribas e fariseus, diante da multidão que se aglomerara na praça, lhe
propunham difícil questão: [...]” (p. 196).
A crítica moderna tem este
episódio como um acréscimo ao original:
[…] Além disso, a história muito impressionante da
mulher pega em adultério, que parece flutuar sem âncora no evangelho de
João, não ocorre em nenhum manuscrito anterior ao final do século IV. Os
estudiosos descobriram um ou dois exemplos flagrantes em que a Igreja antiga
“tradicionalizou” conceitos teológicos deturpando passagens do Novo Testamento.
(JOHNSON, 2001, p. 38, grifo nosso).
Jo 7,53-8,11. A perícope da mulher adúltera é
omitida no texto alexandrino (P66 P77, X B), parte do cesariense e do
ocidental, e de algumas versões e citações dos Padres. Alguns manuscritos
expressam de uma maneira ou outra dúvidas com relação a genuinidade desta
passagem. Outros manuscritos situam o relato depois de Lc 21,38, depois de Jo
7,36, no final do evangelho de Lc ou no final do evangelho de Jo. Nenhum
Padre da igreja grega anterior ao século XII comenta esta passagem. A
crítica interna observa que não é provável uma omissão intencionada da
passagem. O estilo e vocabulário utilizado não correspondem aos do quarto
evangelho. Interrompe ademais a sequência das passagens, interpondo-se
entre elas (7,52 e 8,12s). (BARRERA, 1999, p. 497, grifo nosso).
A nosso ver, o autor espiritual
não deveria tratar o fato como acontecimento verdadeiro. Embora,
particularmente, acreditamos que a narrativa bem espelharia uma atitude de
Jesus.
“Judas,
quando percebeu o que havia protagonizado, tocado de remorso, procurou os
principais sacerdotes para lhes devolver as trinta moedas de prata com
que tinha vendido o Cristo. Sabendo da ilicitude do que tinham feito, eles
recusaram receber o dinheiro de volta, alegando que sequer poderiam aceitá-lo
para o cofre das ofertas do templo, porque era preço de sangue...” (p. 202).
Transcrevemos de nosso texto “A
traição de Judas, uma história mal contada”:
O segundo diz
respeito ao destino dado às moedas. O autor de Mateus menciona que Judas as
teria devolvido, atirando-as dentro do santuário, que, recolhidas pelos
sacerdotes, foram, por deliberação deles, destinadas à compra do campo do
oleiro, para servir de cemitério aos estrangeiros (Mt 27,3-10), citando que
isso aconteceu para se cumprir o que dissera o profeta Jeremias. Mas essa
história nos parece mal contada, pois em Atos se diz que o próprio Judas teria
comprado um campo (At 1,18), que até poderia ser esse do oleiro; mas, de
qualquer forma, está em conflito com a versão anterior.
Na maioria
das Bíblias que consultamos dizem que as profecias relacionadas a Mt 27,9: “Cumpriu-se, então, o que foi dito pelo
profeta Jeremias: Tomaram as trinta moedas de prata, preço do que foi avaliado,
a quem certos filhos de Israel avaliaram e deram-nas pelo campo do oleiro,
assim como me ordenou o Senhor”, estariam nos passos: Zc 11,12-13 e Jr
32,5-16, ou Jr 18,1-4 e 19,1-3 (Bíblia Anotada, p. 1229). Há, portanto, sérias dúvidas quanto à identificação da profecia
específica relacionada ao episódio. Como já falamos sobre a citação de
Zacarias, fica-nos, por conseguinte, apenas as de Jeremias para dizermos alguma
coisa. Em notas explicativas sobre elas encontramos que: “A citação é uma
combinação artificial de Jr 32,6-9 e Zc 11,12-12” (Bíblia do Peregrino, p. 2386); isso nos deixa diante da
realidade de que, por se admitir que seja “uma combinação artificial”, estamos,
certamente, diante de mais uma tentativa de se relacionar acontecimentos no
Novo Testamento com ocorrências registradas no Antigo Testamento, tidas como se
fossem verdadeiras profecias.
Quem tiver a
curiosidade de consultar a passagem citada de Zacarias não encontrará nela algo
no qual se possa qualificá-la como profecia; são apenas fatos relacionados
àquele momento vivido por esse profeta. E quanto a Jeremias, não se encontra
absolutamente nada que ele tenha comprado alguma coisa por trinta moedas. Sobre
a compra de um terreno, sim, como podemos ver em 32,6-12; mas uma situação
circunstancial, explicada da seguinte forma:
À primeira
vista se trata de um incidente: a compra e venda de um terreno segundo as
normas e o procedimento da legislação judaica. O narrador se compraz em
registrar todos os detalhes, mostrando que a lei foi estritamente cumprida e
que o ato é juridicamente válido. O surpreendente dessa compra-e-venda é que se
realiza às vésperas da catástrofe inevitável. Que sentido tem nesse momento
comprar um terreno para que fique em poder da família? Tudo já está perdido.
Mas o absurdo do ato é a chave do seu sentido. Para efeitos legais imediatos, a
compra nada servirá; para efeitos proféticos, é admirável ato de esperança no
futuro. É um oráculo em ação, Jeremias profetiza ao vivo: não só palavras, nem
ação simbólica, mas ato real jurídico. Esse ato significa o futuro que ele
antecipa: a jarra de barro onde se guarda o contrato é um penhor que Deus
concede. Apesar do que está para acontecer, a terra continua sendo propriedade
dos judaítas: a terra prometida aos patriarcas e possuída durante séculos...
(Bíblia do Peregrino, p. 1928).
Podemos ainda
confirmar isso com a seguinte explicação: “A citação [Mt 27,9] é tirada na
realidade de Zacarias (11,12-13). Mas, ele lembra também diversos versículos de
Jeremias onde se faz menção do campo e do oleiro (32,6-6; 18,2-12)”. (Bíblia
Ave-Maria, p. 1319). Ressaltamos que a expressão “ela lembra”, é uma afirmativa
que depõe contra o próprio texto que, positivamente, diz ser de Jeremias essa
profecia.
Então, o que fica claro é: se
foi Judas quem comprou o campo, ele não devolveu as moedas para os sacerdotes;
mas o autor espiritual afirma que sim; que ele as devolveu, parece que não tem
conhecimento desse conflito nos Evangelhos; se soubesse, certamente, explicaria
a divergência.
“Nem
em seus momentos finais, a ironia das Trevas poupa o Cristo, que, através de
Gestas, o mau ladrão – segundo o testemunho de Maria de Nazaré, sua Mãe,
que se encontrava aos pés da cruz –, o desafia; [...]”. (p. 203).
A crença no diálogo entre os
ladrões é fruto dos que não tem conhecimento de que os relatos bíblicos são
conflitantes a respeito do episódio, coisa normal para um encarnado, não para
um desencarnado que tem conhecimento dos fatos históricos nos registros no
plano espiritual. Vejamos, os relatos dos quatro evangelhos:
Mt
27,44: “E os mesmos impropérios lhe diziam também os
ladrões que haviam sido crucificados com ele”.
Mc 15,32: “Também os
que com ele foram crucificados o insultavam”.
Lc 23,39-43: “Um dos
malfeitores crucificados blasfemava contra ele, dizendo: 'Não és tu
o Cristo? Salva-te a ti mesmo e a nós também'. Respondendo-lhe, porém, o
outro repreendeu-o dizendo: 'Nem ao menos temes a Deus, estando sob igual
sentença? Nós na verdade com justiça, porque recebemos o castigo que os nossos
atos merecem; mas este nenhum mal fez'. E acrescentou: 'Jesus, lembra-te de mim
quando vieres no teu reino'. Jesus lhes respondeu: 'Em verdade te digo que hoje
estarás comigo no paraíso'”.
Jo 19,18: “Onde o
crucificaram, e com ele outros dois, um de cada lado, e Jesus no meio”.
Enquanto que, para os autores
de Mateus e Marcos, os dois ladrões insultavam Jesus, o autor de Lucas diz ter
sido um só, e o de João, que o coloca ao pé da cruz, não informa nada a
respeito de algum diálogo. Portanto, temos sérios conflitos e se aceitarmos que
a maioria ganha, então os dois – o “bom” e o mau ladrão – insultaram a Jesus.
Mais sobre o tema em nosso texto “A questão do bom ladrão”, disponível em nosso
site: www.paulosnetos.net.
Conforme dissemos anteriormente, no seu
Evangelho de vinte e um capítulos, nos capítulos 14 e 16, João faz
menção (é o único Evangelista em cujo espírito tais palavras permaneceram
guardadas!) à promessa do Consolador! Mesmo tendo escrito, ou feito
escrever, as suas reminiscências muitos anos mais tarde, ele jamais se
esqueceu do que lhes havia dito Jesus, com o intuito de confortá-los, estando
prestes a partir:
"Se
me amais, guardareis os meus mandamentos. E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará
outro Consolador, a fim de que esteja para sempre convosco, o Espírito da
Verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê, nem o conhece,' vós o
conheceis, porque ele habita convosco e estará em vós. Não vos deixarei órfãos,
voltarei para vós outros. Ainda por um pouco e o mundo não me verá mais,' vós,
porém, me vereis; porque eu vivo, vós também vivereis. Naquele dia vós
conhecereis que eu estou em meu Pai e vós em mim e eu em vós. Aquele que tem os
meus mandamentos e os guarda, esse é o que me ama,' e aquele que me ama, será
amado por meu. Pai, e eu também o amarei e me manifestarei a ele. Disse-lhe
Judas, não o Iscariotes: Donde procede, Senhor, que estás para manifestar-se a
nós, não ao mundo? Respondeu Jesus: Se alguém me ama, guardará a minha palavra;
e meu Pai o amará, e viremos para ele e faremos nele morada. Quem não me ama,
não guarda as minhas palavras; e a palavra que estais ouvindo não é minha, mas
do Pai que me enviou. Isto vos tenho dito, estando ainda convosco: mas o Consolador,
o Espírito Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as
coisas e vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito!" (grifo do
original).
Subentende-se que a referência ao Espírito
Santo e ao Espírito da Verdade é a mesma, compreendendo
uma plêiade de Espíritos Superiores com a missão de ensinar aos homens todas as
coisas e fazer recordar tudo quanto o Cristo lhes disse.
Adiante, no capítulo 16, versículos 1 “Tenho ainda muito que vos dizer, mas vós não
o podeis suportar agora; quando vier, porém, o Espírito da Verdade, ele vos
guiará a toda a verdade; porque não falará por si mesmo, mas dirá tudo o que
tiver ouvido, e vos anunciará as coisas que hão de vir!” O Espírito da Verdade, portanto, que falaria a Allan
Kardec, na obra da Codificação, não falou por si mesmo, mas pelo Espírito do
Cristo!... (p. 208-209).
Allan Kardec não deixa nenhuma
margem à dúvida de que o Espírito de Verdade é uma individualidade e não uma
plêiade de Espíritos Superiores ao dizer que “[...] A qualificação de Espírito de Verdade não
pertence senão a um e pode ser considerado como nome próprio; ela é
especificada no Evangelho. […].” (Revista Espírita 1866, p. 222, grifo nosso).
Um
pouco mais à frente, quando definirmos a identidade do Espírito de Verdade, veremos se ele falou ou não “por si mesmo”.
Foi com base na
autoridade de Orígenes que a Igreja Católica acabou por aceitar os Quatro
Evangelhos ditos Canônicos, de autoria de Mateus, Marcos, Lucas e João. (p.
246).
A informação que encontramos
sobre o processo de escolha de quais evangelhos fariam fazer parte do Novo
Testamento, é assaz curiosa. Transcrevemos do nosso texto “Os nomes dos títulos
dos Evangelhos designam seus autores”:
Vejamos, primeiramente, como ocorreu a
escolha dos quatro evangelhos.
O destacado jornalista de investigação
Pepe Rodríguez, autor do livro Mentiras
fundamentais da Igreja Católica, como a Bíblia foi manipulada, nos dá a seguinte informação:
A seleção
dos evangelhos canónicos foi feita no concílio de Niceia (325) e ratificado no de Laodiceia
(363). O modus operandi, ou o processo utilizado, para distinguir
entre textos verdadeiros e falsos, foi, segundo a tradição, o da
“eleição milagrosa”. Foram apresentados, de facto, quatro versões para
justificar a preferência pelos quatro livros canónicos: 1) depois de os bispos
terem rezado muito, os quatro textos voaram por si sós e foram pousar-se sobre
um altar; 2) puseram todos os evangelhos em competição sobre um altar e os
apócrifos caíram ao chão, enquanto os canónicos não se mexeram; 3) depois de
escolhidos, os quatro foram colocados sobre o altar e foi pedido a Deus que se
neles houvesse qualquer palavra falsa os fizesse cair ao chão, o que não
sucedeu com nenhum deles; 4) o Espírito Santo, na forma de uma pomba, penetrou
no recinto de Niceia e pousando no ombro de cada bispo sussurrou a cada um
deles quais eram os evangelhos autênticos e quais os apócrifos. Esta última
versão revelaria, além do mais, que uma boa parte dos bispos presentes no
concílio eram surdos ou muito incrédulos, visto ter havido grande oposição à
selecção – por voto maioritário, que não unânime – dos quatro textos canónicos
actuais. (RODRÍGUEZ, 2007, p. 68, grifo nosso).
Juan Arias (1932- ), escritor e
jornalista, cursou teologia, filosofia, psicologia, línguas semíticas e
filosofia comparada na Universidade de Roma, tendo sido, durante quatorze anos,
correspondente na Itália e no Vaticano para o jornal espanhol El País,
em sua obra Jesus esse grande desconhecido, corrobora essa informação de
Rodríguez, falando a mesma coisa:
A história
de como os quatro evangelhos de Marcos, Mateus e Lucas e João foram escolhidos
pela Igreja como autênticos e inspirados dentre os mais de cem que então
existiam é muito interessante. Um dos critérios da escolha foi o dos
milagres. Segundo a Igreja, alguns dos prodígios dos evangelhos apócrifos
eram pouco sérios ou muito fantasiosos. Mas houve outros motivos para decidir
que somente os quatro evangelhos escolhidos tinham sido inspirados pelo
Espírito Santo e os outros não.
Os quatro
foram escolhidos entre cerca de sessenta. Santo Irineu, no ano 205, assim o
explicou: “O Evangelho é o pilar da Igreja. A Igreja está espalhada pelo mundo
inteiro e o mundo tem quatro regiões. Convém, portanto que existam
quatro evangelhos”. E também: “O Evangelho é o sopro do vento divino da vida
para os homens, e, assim como existem quatro pontos cardeais, também
devem existir quatro evangelhos”. Além disso, “o Verbo criador do Universo
reina e brilha sobre os querubins, e os querubins têm quatro formas, por
isso o Verbo obsequiou-nos com quatro evangelhos”. Curiosamente, os quatro
escolhidos só foram aceitos pelos Padres da Igreja pouco antes de serem
declarados inspirados.
A decisão
oficial foi tomada no Concílio de Niceia do ano 325, graças a um milagre, como
se conta na obra intitulada Libelus syndicus. O milagre foi que,
dentre todos os evangelhos que existiam, os quatro que conhecemos hoje como
inspirados foram voando sozinhos até o altar.
Outra
versão diz que colocaram todos os evangelhos existentes sobre o altar e os
apócrifos foram caindo no chão, só permanecendo os quatro escolhidos como
autênticos. Uma terceira versão conta que o Espírito Santo entrou no
Concílio de Niceia sob a forma de pomba através de uma janela, sem quebrar o
vidro. Lá estavam reunidos todos os bispos. A pomba pousou no ombro de cada
bispo, dizendo-lhe ao ouvido em voz baixa quais eram os quatro evangelhos
inspirados. E eram os de Marcos, Mateus, Lucas e João. (ARIAS, 2001, p. 34-35,
grifo nosso).
Tudo isso pode, ainda, ser corroborado
em Maria Helena de Oliveira Tricca (1940-1997), na obra Apócrifos: Os proscritos da
Bíblia, vol. I, (p. 13), que cita como sua fonte Fabricius, J. A. - Codex
Apocryphus Novi Testamenti (Hamburgo, 1719).
E temos a informação, muito
oportuna, de que:
“[...] a escolha de quatro Evangelhos
oficiais, de entre os cerca de trezentos existentes nessa altura na
Igreja; foi também ordenado que os restantes Evangelhos, incluindo o de
Barnabé, fossem completamente destruídos, assim como os Evangelhos escritos
em Hebraico; foi ainda publicado um édito, declarando que quem fosse
encontrado na posse de um Evangelho não autorizado seria condenado à morte.
[…]. (UR-RAHIM, 1995, p. 49-50, grifo nosso).
Não há dúvida alguma de que foi,
literalmente, queima de arquivo.
Porém, é fato que Orígenes
(185-254), segundo o que diz Eusébio de Cesaria (c. 265-339), listou os quatro
Evangelhos. Talvez a história acima seja apenas para mostrar algo de
sobrenatural na escolha deles, objetivando, é claro, que os fiéis acreditassem piamente
só neles.
E até ao ano de 553 da Era Cristã, a
Igreja nascente admitia a Reencarnação, contudo, por ação deliberada das
Trevas, no II Concilio realizado em Constantinopla, decretou-se que “todo aquele que defender a doutrina mística
da preexistência da alma e a
consequente opinião de que ela retoma seja anátema!”.
A História registra que, no referido
Concílio, o Imperador Justiniano, que era influenciado pela esposa, Teodora,
inclusive nos assuntos governamentais e teológicos, mandou que se proibisse a
doutrina da transmigração das almas e do carma. Acontece que Teodora, que
houvera sido uma mulher de vida desregrada, ao se unir com o Imperador, que por
ela se apaixonou, passara a ser ironizada pelas suas antigas amigas de
leviandades. Em consequência, a esposa do Imperador ordenou que quinhentas
mulheres fossem mortas em Constantinopla. Os cristãos, então, passaram a
rotulá-la de assassina e a espalhar a notícia de que, a fim de ressarcir o
débito contraído, nas vidas futuras, ela deveria morrer igualmente assassinada
quinhentas vezes!
Com receio de que tal previsão se
confirmasse, Teodora, passando a odiar a doutrina da Reencarnação, investindo
contra ela, influenciou o marido para que decretasse a sua extinção e
perseguisse os seus defensores. O desastroso desfecho consistiu na absurda
“proibição à lei natural das vidas sucessivas”, no II Concílio de
Constantinopla! (p. 250-251).
Infelizmente, circulam textos
de espíritas exaltados que procuram demonstrar que anteriormente a Igreja
Católica acreditava na reencarnação. O fato dela não ter combatido não
significa, necessariamente, que a admitia; e nem porque um dos “Pais da igreja”
a aceitava, no caso Orígenes, não podemos estender o seu pensamento como sendo
o da própria Igreja, embora esse autor seja tomado por ela, para justificar
alguns pontos doutrinários.
Sobre o fato da imperatriz
Teodora (ca. 500-548) ter mandado matar quinhentas mulheres, parece-nos que
essa informação não foi ainda comprovada historicamente, conforme demonstramos
no nosso texto “Teodora e as 500 prostitutas”, do qual transcrevemos:
O que encontramos do fato
O historiador Procópio de Cesareia (ca 500-ca 565),
citado por alguns dos autores, conforme o que encontramos na WEB, fez
referência às quinhentas prostitutas. Vejamos:
Teodora também devotou considerável atenção à
punição das mulheres encontradas em pecado carnal. Ela pegou mais de
quinhentas prostitutas no Fórum, que viviam uma vida miserável se vendendo
por três óbolos, e enviou-as para a margem oposta, onde foram trancadas em
um monastério chamado Arrependimento para forçá-las a reformar sua maneira
de viver. Algumas delas, entretanto, jogaram-se dos parapeitos à noite para
livrarem-se assim de uma salvação indesejada.
(Fonte: http://procopius.net/procopiuschapter17.html, grifo nosso).
Observar que, neste relato, é dito que Teodora
“devotou considerável atenção à punição das mulheres”, e não que tenha
mandado matá-las. Pelo fato de que “foram trancadas” (presas?), e considerando
que Procópio não dá mais notícias do que aconteceu a elas, podemos supor
qualquer coisa; porém, nesse caso, ficará no campo da hipótese.
Entretanto, pesquisando a informação acima na obra História
Secreta, de Procópio, que custamos a encontrar, vemos o seguinte:
Teodora, entretanto, gostava também de imaginar
castigos para os delitos contra os costumes. Reuniu mais de quinhentas
prostitutas, que exerciam o seu comércio em plena praça pública por três
óbolos – o necessário para sobreviver – e as expediu para a margem oposta a fim
de encerrá-las no mosteiro chamado Metanoia (Arrependimento),
forçando-as a mudar de vida. Algumas delas se lançaram, à noite, do alto do
mosteiro e escaparam assim a uma mudança que não desejavam. (PROCÓPIO, s/d, p.
47, grifo nosso).
Como se vê, trata-se de um relato bem próximo ao
obtido na Internet.
Continuando a pesquisa, encontramos algo no escritor e
jornalista italiano Carlo Maria Franzero (1892-1986),
em referência ao episódio:
Era apenas natural que a Basilissa exercesse a sua
influência em favor das antigas colegas e, assim, quinhentas prostitutas por
modestíssimo preço exerciam abertamente a sua profissão no Fórum, foram convidadas
coercitivamente a entrar no novo convento do Arrependimento, na outra
margem do Bósforo – retiro magnífico para quem quisesse meditar. Ao que parece,
porém, muitas destas donzelas não se deram bem com o regime e preferiram
atirar-se ao mar, durante a noite, com nítida desvantagem para as
possibilidades de salvação das suas almas. (FRANZERO, 1963, p. 87, grifo
nosso).
O francês Francis Fèvre (1951- ), historiador
especialista em sociedades antigas do Oriente Médio, especialmente no Egito e
Bizâncio, acrescenta-nos mais coisas a essa história:
[…] Para evitar a acusação de impiedade, Teodora não
as devolve à perambulação nas ruas sombrias, nas discretas pracinhas. Talvez
com o objetivo de encarnar com convicção seu novo papel de imperatriz, faz
encerrar as prostitutas em um convento fundado para esse fim.
Difícil seria dizer se a antiga cortesã, amaldiçoada
por todo o clero da capital, agiu por piedade ou por diplomacia. Mas, as pecadoras resgatadas a peso de ouro teriam
dispensado uma vida monástica. O novo convento destinado a acolhê-las na
capital mostra claramente seus objetivos: todos os habitantes o conhecem pelo
nome de convento do Arrependimento. Os muros são bastante altos, uma fuga
poderia deixar aleijadas as pecadoras que se arriscassem. Essas mulheres devem
passar o resto de suas vidas à sombra dos muros e das edificações do convento,
mantidas por uma verba significativa doada por sua benfeitora, para glória de
Teodora, destinada ao céu por sua piedosa colaboração para salvar almas em
perigo. (FÈVRE, 1991, p. 173, grifo nosso).
Bom; pelo que aí está escrito não temos como saber
qual a razão de Teodora ter mandado trancafiar as quinhentas prostitutas. O que
podemos deduzir, desse episódio, é que algo de grave estaria, de fato,
acontecendo a elas, pelo motivo de algumas delas se jogarem do alto do
mosteiro, buscando a morte, para não ficarem trancadas.
Pelo que pudemos apurar, o historiador Procópio, fonte
primária desses relatos, só veio a escrever o seu livro Anedotas
(História Secreta), em 558. O que estranhamos, conforme já dito, é que, depois
do relato do confinamento das prostitutas, nenhuma linha a mais ele fala delas,
deixando-nos com uma forte impressão de que foram “apagadas” mesmo; mas é mera
hipótese, sobre a qual não temos nenhum elemento para precisar o que, de fato,
teria acontecido.
Particularmente, não acreditamos que Teodora as tenha
trancafiado para fazer delas quinhentas monjas, preocupada em salvar-lhes as
suas almas do pecado ou que, talvez, tivesse o pensamento de melhorar-lhes a
sorte, garantindo-lhes um sustento para o resto da vida. Entretanto,
encontramos um historiador cuja opinião difere daquilo que outros autores informam
do episódio. Trata-se de Edward Gibbon (1737-1794) em sua obra Declínio
e queda do Império Romano, da qual transcrevemos:
[…] O nome de Teodora figura com igual
distinção em todas as iniciativas piedosas e caritativas de Justiniano; as
instituições mais benevolentes de seu reinado podem ser atribuídas à simpatia
da imperatriz por suas irmãs menos afortunadas que haviam sido seduzidas ou
compelidas a dedicar-se ao ramo da prostituição. Um palácio no lado do
Bósforo foi convertido num espaçoso e imponente mosteiro, e um generoso
sustento, garantido a quinhentas mulheres recolhidas das ruas e dos bordéis de
Constantinopla. Nesse retiro sacro e seguro, elas se devotavam a um
perpétuo confinamento, e o desespero de algumas, que se precipitaram ao mar, foi
calado pela gratidão das penitentes libertadas do pecado e da miséria por
sua generosa benfeitora. (GIBBON, 2005, p. 552, grifo nosso).
Na visão de Gibbon, se essa parte transcrita não for
uma ironia do autor, a imperatriz Teodora foi benfeitora das quinhentas
prostitutas, que o confinamento delas teria sido a benefício delas, uma vez que
as tirara das ruas garantindo-lhes o sustento. Isso porque, se, nesse ponto,
ele coloca Teodora como boazinha, um pouco antes, colocava-a como um monstro:
[…] Seus numerosos espiões observavam e zelosamente
relatavam qualquer ação, palavra ou expressão injuriosa a sua real senhora.
Quem quiser que acusassem era atirado às prisões privativas da imperatriz,
inacessíveis aos inquéritos de justiça; e corria o boato de que a tortura do
cavalete ou do açoite fora aplicada em presença de uma mulher tirana insensível
à voz do rogo ou da piedade. Algumas dessas vítimas desditosas pereciam em
profundos e insalubres calabouços, enquanto a outras se consentia, após
perderem os membros, a razão ou a fortuna, reaparecer no mundo como monumentos
vivos da vingança dela, que habitualmente se estendia aos filhos daqueles de
quem suspeitasse ou a quem lesasse. […]. (GIBBPN, 2005, p. 551).
Na obra mencionada de Gibbon encontramos a informação de
que ele foi um dos maiores historiadores ingleses do
século XVIII; autodidata desde o início, compôs Declínio e Queda do Império
Romano sem consultar outros especialistas e imprimiu muita personalidade ao
texto. (GIBBON, 2005, p. 607).
Não podemos deixar de informar que o viamonense Mário Curtis
Giordani (1921- ), filósofo e teólogo, coloca Procópio
como historiador pouco confiável:
O historiador Procópio, em sua História Secreta,
apresenta-nos um retrato muito vivo (mas não muito digno de fé) da vida
tempestuosa da filha de um domador de ursos, a qual, na palavra de Diehl,
“divertiu, encantou e escandalizou Constantinopla”. (GIORDANI, 1968, p. 47,
grifo nosso).
A terceira obra de Procópio, a História Secreta,
é considerada por Runciman[33] “um conglomerado amargo de mexericos”. A
“História Secreta” difere, com efeito, fundamentalmente das outras duas e sua
autenticidade chegou a ser posta em dúvida pelos críticos. Essa obra é um
libelo grosseiro contra Justiniano, Teodora e o próprio Belisário. A Justiniano
o autor atribui a causa de todos os males que, então, caíram sobre o Império.
______
[33] Lingenthal, Karl Eduard Zachariä von,
Geschichte des Grieschisch-Römischen Rechts. – Aalen in Württenberg – Verlag
Scientia 1955. (Photomecanischer Nachdruck).
(GIORDANI, 1968, p. 192, grifo nosso).
O professor Vicente Dobroruka
(1969- ), do Departamento de História, Universidade de Brasília, que,
gentilmente, nos respondendo a um e-mail, disse-nos:
Minha opinião é q de q o episódio do “suicídio” evoca
dois lugares comuns literários na historiografia antiga: um, o moralismo (uma
vez prostituta, sempre prostituta – e isso me parece fora de dúvida q Teodora
tenha sido, mas n se seguem disso implicações sobre sua crueldade); o outro, o
dos suicídios coletivos de habitantes cercados em cidades das quais n tinham
como sair. As "500 prostitutas" teriam, de certo modo, preferido a
morte a renunciarem à lascívia (mais moralismo...), mais ou menos como os
zelotes de Massada em Flávio Josefo (Guerra dos judeus, 7). Não creio na
história, como representação factual e autêntica. Leve em conta tb a
tendência de *todos* os historiadores antigos a exagerarem nos números
(Procópio mesmo fala em “milhões” mortos por Justiniano – levado a sério, n sei
como a espécie humana sobreviveria a tal fato. :-) (DOBRORUKA, 2009, por
e-mail, grifo nosso).
Trazemos também o que disse o jornalista
americano Paul Iselin Wellman (1895-1966):
Referem-se a respeito de Teodora, particularmente dos últimos
tempos do seu reinado, fatos que atestariam crueldade e falta de escrúpulos. Alguns
deles são visivelmente falsos, como por exemplo a desacreditada Anecdota de
autoria de Procópio, segundo a qual um filho, ostensivamente nascido das
suas relações com algum admirador, na época em que era cortesã, apareceu para
legitimar o seu parentesco com a imperatriz, donde, segundo Procópio, “receando
que a história chegasse aos ouvidos do imperador”, Teodora fez desaparecer para
sempre o rapaz.
[...]
A respeito de
Procópio, historiador oficial do reinado de Justiniano, a maioria do que se
conta em desabono de Teodora baseia-se na sua grosseira “história secreta”,
intitulada Anecdota. Os motivos dessa
inimizade implacável para com a imperatriz são ignorados. Nos seus relatos
oficiais, Procópio mostra-se adulador servil. Enquanto escrevia as suas obras a
respeito de guerras e realizações do império, compilava uma obra secreta onde
reunia qualquer mexerico, insinuação ou calúnia que pudesse recolher.
A falsidade da Anecdota
revela-se através de inverdades óbvias, que prejudicam todo o seu conteúdo. Por exemplo: o historiador assegura, com toda a
seriedade, que Justiniano e Teodora não eram seres humanos e sim demônios que
haviam assumido forma humana. E aduz a evidência alegada para provar a sua
asserção ridícula. Outros seus relatos são, além de contraditórios, impossíveis
de aceitar. E o seu hábito de deturpar até mesmo os atos louváveis do par
imperial, para que se afigurem perniciosos, prova a animosidade que perpassa
através de toda a obra.
Não obstante, é
nesse documento secreto, escrito aparentemente para desabafar o próprio rancor,
e que não se destinava à publicação, vindo à luz somente séculos depois –
quando já era demasiado tarde para aprovar ou desaprovar a maioria das suas
asserções – que muitos se baseiam, nos dias que correm, para as suas
estimativas acerca do caráter de Teodora. O legado da pena despeitada dum
homem que a odiava secretamente, foi o mais mortal dos golpes desferidos contra
a bela imperatriz, embora ela não vivesse o bastante para ter conhecimento
disso.
Entretanto, houve
atos de tirania e crueldade, atestados por outras fontes mais dignas de
confiança do que Procópio. A esse respeito, cumpre-nos dizer que tirania e
crueldade eram comuns naquela época, e sob esse ponto-de-vista a imperatriz
não era pior – se tanto igualmente perversa – do que os seus contemporâneos
assentados em tronos.
A despeito de todas as suas falhas, ninguém, nem
mesmo o seu amargo inimigo anônimo, Procópio, pôde acusá-la jamais de haver
faltado, no tocante à lealdade e à fidelidade a Justiniano. O
absoluto silêncio que se observa a respeito dum assunto, que teria sido dos
primeiros a ser explorados em desabono da imperatriz, constitui a prova máxima
de que, ao se casar, ela deixara para sempre pensamentos e atitudes de sua vida
de cortesã. Trabalhou incessantemente para a glória do marido, o imperador, e
muito do que se lhe aponta foi feito por amor dele. (WELLMAN, p. 399-401, grifo
nosso).
Diante de tudo isso que colocamos fica mais do que
evidente a dificuldade que temos em buscar os dados históricos, pois alguns se
baseiam em interesses do autor; outros apresentam problemas na tradução; sem
falar naqueles que são falseados.
E da nossa conclusão,
transcrevemos este trecho, pois ela cabe como uma luva ao presente caso:
Em nossa modesta opinião, se nos permitem os
companheiros de doutrina, não é nada prudente ficar retransmitindo essa
informação de que Teodora teria matado 500 prostitutas, mesmo que a fonte possa
vir do plano espiritual; pelo simples motivo de que os Espíritos não sabem
tudo e só falam do que aprenderam nos bancos de escola, ou seja, não são
infalíveis e podem, sim, passar informação equivocada. Quem aceita tudo que lhe
falam, não segue as orientações dos Espíritos superiores; daí, torna-se, na
verdade, um fanático. Além disso, ainda podemos encontrar mensagens “assinadas”
que, seguramente, são fruto do pensamento e crença do próprio médium.
Seguindo em frente, agora
entraremos na polêmica questão de quem seria o personagem Espírito de Verdade.
Isto tudo ensejou a que o Mundo Espiritual
promovesse um novo Pentecostes, que, em 1848, a partir da pequenina vila
norte-americana, chegasse até a Europa, particularmente à França – novamente a
Gália! –, onde antigos druidas e cristãos reencarnados estavam a postos, para que,
sob a tutela do Espírito de Verdade e Allan Kardec codificassem a Doutrina
Espírita!... (p. 252).
Sob
a coordenação de diversos Espíritos Superiores, a serviço do Cristo nas Esferas da Luz, entre
os quais o Espírito da Verdade e São Luís, ou Luís IX de França, um
movimento semelhante ao do Pentecostes, ocorrido logo após a crucificação do
Cristo, foi organizado. […]. (p. 255).
Gradativamente, sob a ação do Espírito
da Verdade – que, em nome do Cristo, coordenava aquele novo Pentecostes, a
culminar com a Codificação do Espiritismo –, movimentava-se Allan Kardec, em
torno do qual antigos amigos seus, desde os tempos dos druidas, na Gália, e do
movimento cristão dos primeiros tempos, haveriam de se agrupar. […] (p. 282).
Também não era raro que aquelas entidades, sob
a égide do Espírito de Verdade, recomendassem a Rivail que ele continuasse
procedendo com a maior discrição possível, porque a Obra contava com diversos
inimigos no Mundo Físico e no Mundo Espiritual. […] (p. 312).
Na segunda transcrição está
dito que a coordenação estava a cargo de diversos Espíritos Superiores, isso
destoa do que se afirma nas outras, em que o próprio autor espiritual coloca o
Espirito da Verdade como coordenador único, vamos assim dizer.
Transcrevemos alguns trechos do
nosso texto “Espírito de Verdade, quem seria ele?”, visando definir quem
realmente coordenava o movimento de regeneração:
Numa comunicação de Lacordaire, lemos:
Era preciso, aliás,
completar o que não havia podido dizer então, porque não teria sido
compreendido. Foi porque uma multidão de Espíritos de todas as ordens, sob a
direção do Espírito de Verdade, veio em todas as partes do mundo e em todos
os povos, revelar as leis do mundo espiritual, das quais Jesus havia adiado o
ensinamento, e lançar, pelo Espiritismo, os fundamentos da nova ordem social.
Quando todas as bases lhe forem postas, então virá o Messias que deverá coroar
o edifício e presidir à reorganização com a ajuda dos elementos que terão sido
preparados. (Revista
Espírita 1868, p. 47, grifo nosso).
[...]
reconhece-se que o Espiritismo realiza todas as promessas do Cristo a respeito
do Consolador anunciado. Ora, como
é o Espírito de Verdade quem preside ao grande movimento da regeneração,
a promessa do seu advento se encontra realizada, porque, de fato, é
ele o verdadeiro Consolador. (A Gênese,
item 42, IDE, p. 31, grifo nosso).
[…]
vejamos esta outra fala de Kardec, contida em O Evangelho Segundo o
Espiritismo (p. 134): “O Espiritismo vem, na época predita, cumprir a
promessa do Cristo: preside ao seu advento o Espírito de Verdade”.
(grifo nosso).
A proteção desse Espírito, cuja superioridade eu
então estava longe de imaginar, jamais, de fato, me faltou. A sua
solicitude e a dos bons Espíritos que agiam sob suas ordens, se
manifestou em todas as circunstâncias de minha vida, quer a me remover
dificuldades materiais, quer a me facilitar a execução dos meus trabalhos,
quer, enfim, a me preservar dos efeitos da malignidade dos meus antagonistas,
que foram sempre reduzidos à impotência. (Obras Póstumas, FEB, 2006, p.
307, grifo nosso).
Em 20 de janeiro de 1860, de Chateaubriand:
Sois guiados pelo verdadeiro Gênio do Cristianismo,
eu vos disse; é porque o próprio Cristo preside aos trabalhos de toda
natureza que estão em vias de cumprimento para abrir a era de renovação e de
aperfeiçoamento que vos predizem os vossos guias espirituais. […]. (Revista
Espírita 1860, p. 62, grifo nosso).
Em 14
de outubro de 1861, Kardec lê a mensagem de Erasto aos Espíritas de Bordeaux:
Sei o quanto vossa fé em Deus é profunda, e quão
fervorosos adeptos sois da nova revelação; é por isso que vos digo, em toda a
efusão de minha ternura por vós, estaria desolado, estaríamos todos desolados,
nós que somos, sob a direção do Espírito de Verdade, os iniciadores do
Espiritismo na França, se a concórdia das quais destes, até este dia,
provas brilhantes viessem a desaparecer de vosso meio. […]. Devo vos fazer
ouvir uma voz tanto mais severa, meus bem-amados, quanto o Espírito de
Verdade, mestre de nós todos, espera mais de vós. (Revista Espírita 1861,
p. 348/350, grifo nosso).
Em Paris, 1863, de Erasto:
Eis, meus filhos, a verdadeira lei do Espiritismo,
a verdadeira conquista de um futuro próximo. Caminhai, pois, em vosso caminho,
imperturbavelmente, sem vos preocupar com as zombarias de uns e amor-próprio
ferido de outros. Estamos e ficaremos convosco, sob a égide do Espírito de
Verdade, meu senhor e o vosso. (Revista Espírita 1868, p. 51, grifo
nosso).
Podemos ainda corroborar isso, em se comparando essas
duas falas de Kardec:
[...]
o Espiritismo […]. Vem cumprir, nos tempos preditos, o que o Cristo anunciou e
preparar a realização das coisas futuras. Ele é, pois, obra do Cristo, que preside, conforme
igualmente o anunciou, à regeneração que
se opera e prepara o reino de Deus na Terra. (O Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. I, item 7, 1990, p. 59-60,
grifo nosso).
[...] reconhece-se que o Espiritismo realiza todas
as promessas do Cristo com respeito ao Consolador anunciado. Ora, como é
o Espírito de Verdade que preside ao grande movimento de regeneração,
a promessa da sua vinda se acha por essa forma cumprida, porque, de fato, é ele
o verdadeiro Consolador. (A Gênese, cap. I, item 42, FEB, 2007, p. 43,
grifo nosso).
Essas transcrições
estão salpicadas ao longo do texto; portanto, não são sequenciais. Mais claro
do que aqui vimos não precisa: O Espírito de Verdade é quem presidia ou
coordenava todos os outros Espíritos envolvidos na codificação.
O encontro de Rivail com o Espírito de
Verdade, que, a seu lado, foi Médium do Cristo, portanto, expressando
o Pensamento do próprio Senhor, deu-se no dia 26 de março de 1856, na casa dos
Baudin. (p. 315).
A polêmica positiva em torno da real identidade do Espírito da
Verdade, durante
longo tempo, se estendeu entre os que participavam do círculo mais estreito dos
amigos de Rivail, até que, mais tarde, na própria “Sociedade Parisiense de
Estudos Espíritas”, alguns indícios de que o Espírito da Verdade era João
Batista foram transmitidos – conforme Jesus prometera: “É verdade que Elias
há de vir e restabelecer todas as coisas!”. (p. 321).
Realmente, não entendemos como
o autor espiritual tirou tamanha sandice em considerar o Espírito de Verdade
como sendo João Batista.
Na Revista Espírita 1861,
Kardec no artigo “O Espiritismo em Lyon”, transcreve o discurso dos que
frequentavam o grupo de Saint-Just, do qual destacamos:
"Senhor Allan Kardec, discípulo de Jesus,
intérprete do Espírito de Verdade, sois nosso irmão em Deus. Estamos reunidos
todos com o mesmo coração, sob a proteção de São João Batista, protetor da Humanidade
e precursor do grande Mestre Jesus, nosso Salvador.
[…].
"Todos o dizemos do fundo do coração; estamos
animados do mesmo fogo e repetimos todos: Glória a Allan Kardec e aos bons
Espíritos que o inspiraram! E vós, bons irmãos, Sr. e Sra. Dijoud, os
abençoados por Deus, Jesus e Maria, estais gravados em nossos corações para
jamais sair, porque por nós sacrificastes os vossos interesses e os vossos
prazeres materiais. Deus o sabe; nós lhe agradecemos por vos ter escolhido para
esta missão, agradecendo também ao nosso protetor superior, São João
Batista. (KARDEC, 1993f, p. 292, grifo nosso).
No relato “Os mistérios da
torre Saint-Michel de Bordeuaux”, tem-se o registro de uma reunião em
Saint-Jean d'Angely, na qual há um diálogo com o espírito Guillaume Remone,
responsável pelos fenômenos ocorridos naquele local. Transcrevemos os seguintes
trechos:
21. Sabeis onde ela está agora? - R. Não sei o que ela
se tornou, mas vos será fácil disso se informar, junto de vosso guia
espiritual, São João Batista.
[...]
29. (A São João Batista.) G. Remone não foi
constrangido, por punição, sem dúvida, a vir à nossa evocação confessar seu
crime?
Isto parece resultar da sua primeira resposta, na qual
fala da justiça de Deus. — R. Sim, ele foi forçado, mas a isso se resignou de
boa vontade, quando viu como um meio a mais para ser agradável a Deus, em vos
servindo em vossos estudos espíritas.
(KARDEC, 1993g, p. 327-328, grifo nosso).
Do que está acima, temos,
portanto, que João Batista além de ser o guia do grupo de Saint-Just também era
guia de um(uma?) médium residente em Saint-Jean d'Angely. Por não se ter
identificado como Espírito de Verdade, estaria ele mentindo?
Vamos agora, como prometido,
identificar quem é o personagem Espírito de Verdade. Sobre o assunto temos o texto
“Espírito de Verdade, quem seria ele?”, do qual tomaremos os três pontos
principais que sustentam nossa opinião; são eles: a) O que os Espíritos
disseram? b) Kardec disse alguma coisa? e c) O Espírito de Verdade nos deixou
alguma pista? Vamos pela ordem:
a) O que os Espíritos disseram?
Na Revista
Espírita 1861, destacamos um trecho da carta do Sr. Roustaing, de Bordeaux,
a Kardec:
Agradeço com alegria e
humildade esses divinos mensageiros por terem vindo nos ensinar que o Cristo
está em missão sobre a Terra, para a propagação e o sucesso do Espiritismo,
essa terceira explosão da bondade divina, para cumprir esta palavra final do
Evangelho: ‘Unum ovile et unus pastor’, por terem vindo nos dizer: ‘Não
temais nada! O Cristo (chamado por eles Espírito de Verdade), a Verdade é o
primeiro e o mais santo missionário das ideias espíritas’. Estas palavras
me tocaram vivamente, e me perguntava: ‘Mas onde está, pois, o Cristo em Missão
na Terra?’ A Verdade comanda, segundo a expressão do Espírito de Marius,
bispo das primeiras idades da Igreja, essa falange de Espíritos enviados por
Deus em missão sobre a Terra, para a propagação e o sucesso do Espiritismo.
(Revista Espírita 1861, p. 169, grifo nosso).
Assim, Roustaing diz a Kardec que os Espíritos com os quais ele tinha relação diziam ser o
Cristo, aquele a quem chamavam de o Espírito de Verdade. Julgamos importante
essa informação por ela ter vindo de fora do círculo ao qual o Codificador
estava vinculado.
Vejamos agora algumas comunicações de Espíritos
relacionados à Codificação Espírita:
Em 20 de janeiro de 1860, de Chateaubriand:
Sois guiados pelo
verdadeiro Gênio do Cristianismo, eu vos disse; é porque o próprio Cristo
preside aos trabalhos de toda natureza que estão em vias de cumprimento
para abrir a era de renovação e de aperfeiçoamento que vos predizem os vossos
guias espirituais. […]. (Revista
Espírita 1860, p. 62, grifo nosso).
Em 19 de setembro de 1861, de Erasto aos
Espíritas lionenses:
Não poderíeis crer o quanto
nos é doce e agradável presidir ao vosso banquete, onde o rico e o artesão se
acotovelam bebendo fraternalmente; onde o judeu, o católico e o protestante
podem se sentar na mesma comunhão pascal. Não poderíeis crer o quanto estou
orgulhoso em distribuir, a todos e a cada um, os elogios e os encorajamentos
que o Espírito de Verdade, nosso mestre bem-amado, me ordenou conceder
às vossas piedosas coortes [...]. (Revista Espírita 1861, p. 305, grifo
nosso).
Em 14
de outubro de 1861, Kardec lê a mensagem de Erasto aos Espíritas de Bordeaux:
Sei o quanto vossa fé em
Deus é profunda, e quão fervorosos adeptos sois da nova revelação; é por isso
que vos digo, em toda a efusão de minha ternura por vós, estaria desolado,
estaríamos todos desolados, nós que somos, sob a direção do Espírito de
Verdade, os iniciadores do Espiritismo na França, se a concórdia das quais
destes, até este dia, provas brilhantes viessem a desaparecer de vosso meio.
[…]. Devo vos fazer ouvir uma voz tanto mais severa, meus bem-amados, quanto o
Espírito de Verdade, mestre de nós todos, espera mais de vós. (Revista Espírita 1861, p. 348/350, grifo
nosso).
Em 21 de novembro de 1862, de Antoine (Espírito
que foi o pai de Kardec):
Aquele, diz-se, que tiver
resistido a essas tristes tentações, pode não esperar a mudança dos decretos de
Deus, os quais são imutáveis, mas contar com a benevolência sincera e afetuosa
do Espírito de Verdade, o Filho de Deus, o qual saberá, de maneira
incomparável, inundar sua alma da felicidade de compreender o Espírito de
justiça perfeita e de bondade infinita, e, por consequência, salvaguardá-lo de
toda nova armadilha semelhante. (Revista
Espírita 1862, p. 343, grifo nosso).
Em 17 de setembro de 1863, de São José:
Compreendei bem que
quanto mais conduzirdes os homens a vos imitar, mais o conjunto de vossas
preces terá poder. Tomai os homens pela mão, e conduzi-os no verdadeiro caminho
onde engrossarão a vossa falange. Pregai
a boa doutrina, a doutrina de Jesus, a que o próprio Divino Mestre ensina em
suas comunicações, que não fazem senão repetir e confirmar a doutrina dos
Evangelhos. Aqueles que viverem verão coisas admiráveis, eu vo-lo digo. (Revista Espírita 1863, p. 365-366, grifo
nosso).
Em Paris, 1863, de Erasto:
Eis, meus filhos, a
verdadeira lei do Espiritismo, a verdadeira conquista de um futuro próximo. Caminhai,
pois, em vosso caminho, imperturbavelmente, sem vos preocupar com as zombarias
de uns e amor-próprio ferido de outros. Estamos e ficaremos convosco, sob a
égide do Espírito de Verdade, meu senhor e o vosso. (Revista Espírita 1868, p. 51, grifo nosso).
Ressaltamos as expressões: “nosso Mestre
bem-amado”, “Mestre de nós todos”, “o Filho de
Deus”, “Divino Mestre” e “Meu senhor e o vosso”; a quem
poderemos dar todos esses títulos? Isso mesmo; só existe um ser a quem podemos
aplicá-los, que não é outro senão o próprio Jesus. Isso fica claro se
compararmos a expressão “nosso Mestre bem-amado”, usada por Erasto em setembro
de 1861, para designar o Espírito de Verdade, com a que consta da sua outra
mensagem, recebida em abril de 1862, na qual ele atribui essa mesma expressão a
Cristo (Revista Espírita 1862, p. 111). Inclusive, numa outra
oportunidade, ele assim se expressou: “[...] o que não sou senão um dos últimos
e dos mais obscuros discípulos do Espírito de Verdade, […].” (Revista
Espírita 1863, p. 384); esse teor não nos permite atribuí-lo a nenhuma
outra pessoa a não ser ao próprio Jesus. Poderemos, ainda, para reforçar, usar
da fala de São José que disse taxativamente que “o próprio Divino Mestre ensina
em suas comunicações”, o que, também, nos dá certeza de que Ele se manifestava,
acabando com as dúvidas que possam surgir sobre essa possibilidade.
Merecem atenção especial as que são citadas por
Erasto, pois, sabendo da sua efetiva participação nas obras da codificação com
várias orientações e instruções, como poder-se-á vê-las em O Evangelho
Segundo o Espiritismo, em O Livro dos Médiuns e na Revista
Espírita, deveríamos levar em conta o que ele nos informa. Esse Espírito,
citado pelo codificador como “sábio” (O Livro dos Médiuns, FEB, 2007, p.
129), “cujas comunicações todas trazem o cunho incontestável de profundeza e
lógica” (O Livro dos Médiuns, FEB, 2007, p. 124), era considerado por
Kardec, em relação a outros espíritos, como sendo “muito mais instruído do
ponto de vista teórico” (O Livro dos Médiuns, FEB, 2007, p. 129). Assim,
não há o que se discutir sobre o que ele aqui fala a respeito do Espírito de
Verdade, pois, se o que ele diz não serve neste ponto, também não servirá nos
outros.
Em Paris, 1863, de João Evangelista:
Jesus queria que
os homens se entregassem a ele com a confiança desses pequenos seres de passos
vacilantes, cujo apelo lhe conquistaria o coração das mulheres, que são todas
mães. Assim, ele submetia as almas à sua terna e misteriosa autoridade. Ele foi
a flama que espancou as trevas, o clarim matinal que tocou a alvorada. Foi o
iniciador do Espiritismo, que deve, por sua vez, chamar a si, não as
crianças, mas os homens de boa vontade. A ação viril está iniciada; não se
trata mais de crer instintivamente e obedecer de maneira mecânica; é necessário
que o homem siga a lei inteligente, que lhe revela a sua universalidade.
Meus bem-amados, eis chegados os tempos em que os
erros explicados se transformarão em verdades. Nós vos ensinaremos o verdadeiro
sentido das parábolas. Nós vos mostraremos a correlação poderosa, que liga o
que foi ao que é. Eu vos digo, em verdade: a manifestação espírita se eleva no
horizonte, e eis aqui o seu enviado; que vai resplandecer como o sol
sobre o cume dos montes. (O Evangelho Segundo o Espiritismo – EME, 2004,
p. 98, grifo nosso).
Aqui tomaremos a informação meio que por via indireta;
levando-se em consideração o que consta em outros pontos desse estudo, onde foi
informado que o Espírito de Verdade presidia o movimento de regeneração e aqui
se afirma que Jesus foi o iniciador do Espiritismo; vê-se, que a relação entre
os dois, mais uma vez, fica bem clara.
Em janeiro de 1864, junto à Sociedade Espírita de
Paris, lemos nas instruções do Espírito Hahnemann: “[...] cada um procurará, pela melhoria de sua
conduta, adquirir esse direito que o Espírito de Verdade, que dirige este
globo, conferirá quando for merecido”. (Revista Espírita 1864, p. 16, grifo nosso). A quem cabe a direção
do nosso globo? Segundo nos informam os Espíritos, a Jesus; assim, via de
consequência, não há como negar que é Ele o Espírito de Verdade.
Em 5 de janeiro de 1866, de Sonnez:
1866,
possas tu, pelos anos a vir, ser essa estrela luminosa que conduziu os reis
magos para a manjedoura de um humilde filho do povo; vinham prestar
homenagem à encarnação que deveria representar, no sentido mais amplo, o
Espírito de Verdade, essa luz benfazeja que transformou a humanidade. Por
esta criança tudo foi compreendido! Foi bem ela que eternizou a graça da
simplicidade, da caridade, da benevolência, do amor e da liberdade. (Revista
Espírita 1867, p. 58, grifo nosso).
Nessa comunicação, a relação de Jesus como
sendo o Espírito de Verdade é direta, sem meio termo, o que poderá, caso não
haja preconceito ou cristalização de opinião, dissipar todas as possíveis
dúvidas quanto a esse fato. Veja-se que ao falar dos reis magos visitando um
humilde filho do povo, prestavam homenagem a Jesus que representaria, no
sentido mais amplo, o Espírito de Verdade; portanto, a relação de Jesus com o
Espírito de Verdade é bem direta, sem rodeios.
Em 30 de janeiro de 1866, de Inocente (em vida,
arcebispo de Táurida):
[...] A Alemanha assiste, como em todos os tempos, à
emigração de seus habitantes às centenas de milhares, o que não faz honra aos
seus governos; o Papa, príncipe temporal, espalha o erro pelo mundo, em vez
do Espírito de Verdade, de que ele se constituiu o emblema artificial.
[…]. (Obras Póstumas, FEB, 2006, p. 346, grifo nosso).
Considerando que o Papa é visto pelos líderes
católicos como o “Vigário do Filho de Deus”, ou seja, Vigário de Jesus, a
citação acima, em se referindo ao Espírito de Verdade, leva-nos à conclusão de
que se fala da mesma personalidade.
Em 11 de março de 1867, numa mensagem sobre a
regeneração da humanidade, cuja assinatura consta simplesmente Um Espírito:
[...] Coragem! O que foi predito pelo Cristo deve-se
realizar. Nesses tempos de aspiração à verdade, a luz que ilumina todo homem
vindo a este mundo, brilha de novo sobre vós; perseverai na luta, sede firmes e
desconfiai das armadilhas que vos são estendidas; ficai ligados a esta bandeira
onde vós haveis escrito: Fora da caridade não há salvação, e depois esperai, porque
aquele que recebeu a missão de vos regenerar retorna, e ele disse:
Bem-aventurados aqueles que conhecerem o meu novo nome! (Revista
Espírita 1868, p. 96, grifo nosso).
Fala-se claramente do retorno de Cristo, com a missão
de regenerar os homens, agora com um novo nome. Essa previsão de sua volta com um novo nome se
encontra no livro Apocalipse (Ap 3,11-12), conforme já o mencionamos um pouco
mais atrás.
No Círculo
Cristiano Espiritista de Lérida (Espanha), em meados de 1873, encontramos duas
mensagens.
A primeira foi assinada por S.
Paulo:
Ensinai
aos que não têm fé as excelentes e doces verdades do Espiritismo que o bom
Senhor vos concedeu por seus enviados, porque a Verdade se aproxima e é
necessário que os enviados lhe preparem o caminho.
Em
verdade vos digo: que o Cristo já recebeu a palavra de Deus – já desceu da
região de luz – e está entre vós. (PELLÍCER, 1982, p. 121, grifo nosso).
Dizendo que a
Verdade se aproxima e depois afirmando que o Cristo está “entre vós”, a relação
entre um e outro é evidente demais para não se a considerar.
A outra, por S. Luís Gonzaga: “Preparai-vos, não durmais;
porque, em vossos dias, o Espírito da Verdade virá, com seus eleitos,
operar a mais importante das renovações que a Humanidade jamais tem presenciado
e admirado”. (PELLÍCER, 1982, p. 132, grifo nosso).
Embora aqui a identidade do Espírito de Verdade não
tenha sido revelada, não podemos deixar de relacioná-la a alguém a quem poderá
aplicar-se a expressão “com seus eleitos”. Esse alguém, sem nenhuma
impropriedade, não é outro senão o próprio Jesus.
E por falar em “seus eleitos”, ei-los na lista: Afonso
de Liguori, Arago, Benjamim Franklin, Channing, Chateaubriand, Delphine de
Girardin, Emmanuel, Erasto, Fénelon, Francisco Xavier, Galileu Galilei,
Hahnemann, Henri Heine, Rousseau, Joana d'Arc, João Evangelista, Lacordaire,
Lamennais, Lázaro, Massillon, Pascal, Paulo de Tarso, Platão, Sanson, Santo
Agostinho, São Bento, São Luís, Sócrates, Swedenborg, Timóteo, Joana de Angelis
(um espírito amigo), Cura D'Ars, Vicente de Paulo, Adolfo (bispo de Argel), Dr.
Barry, Cárita, Dufêtre (bispo de Nevers), François (de Génève), Isabel (de
França), Jean Reynaud, João (bispo de Bordéus), Julio Olivier, Morlot e V.
Monod. (MARCON, 2002). Apenas poderíamos questionar sobre quem, a não ser
Jesus, poderia coordenar este rol de Espíritos?
E, mais recentemente, poderemos colocar do livro Missionários da Luz a explicação do
espírito Alexandre a André Luiz:
– Mediunidade –
prosseguiu ele, arrebatando-nos os corações – constitui meio de comunicação; e
o próprio Jesus nos afirma: “eu sou a porta... se alguém entrar por mim será
salvo e entrará, sairá e achará pastagens!” Por que audácia incompreensível
imaginais a realização sublime sem vos afeiçoardes ao Espírito de Verdade,
que é o próprio Senhor? (XAVIER, 1986, p. 99, grifo nosso).
Aqui se afirma, mais uma vez, agora com uma informação
mais atual, próxima a nós, que o Espírito de Verdade é o Senhor, ou seja,
Jesus.
De uma forma
indireta, podemos também citar Léon Denis (1846-1927), ressaltando que
ele é considerado como um dos principais seguidores de Allan Kardec e difusor
da Doutrina Espírita. Quando afirma que Jesus opera a Nova Revelação sob
direção oculta, nos remete ao Espírito que, em resposta a Kardec, disse se
chamar a Verdade; vejamos:
A passagem de Jesus pela Terra, seus
ensinamentos e exemplos, deixaram traços indeléveis; sua influência se
estenderá pelos séculos vindouros. Ainda hoje, ele preside os destinos do
globo em que viveu, amou, sofreu. Governador espiritual deste planeta,
veio, com seu sacrifício, encarreirá-lo para a senda do bem, e é sob a sua
direção oculta e com o seu apoio que se opera essa nova revelação, que, sob
o nome de moderno espiritualismo, vem restabelecer sua doutrina, restituir aos
homens o sentimento dos próprios deveres, o conhecimento de sua natureza e dos
seus destinos. (DENIS, 1987, p. 79, grifo nosso).
b) Kardec disse alguma coisa?
A primeira vez em que Kardec fala, em suas obras,
sobre esse episódio, foi no livro Instruções
Práticas sobre as Manifestações Espíritas (Iniciação Espírita, p.
231-232), onde diz que o Espírito usou um nome alegórico e que soube
depois, por outros Espíritos, ter sido ele “um ilustre filósofo da
antiguidade”. Entretanto, quando lança O
Livro dos Médiuns, que, segundo ele mesmo, substitui o primeiro por ser
“muito mais completo e sobre um outro plano” (Revista Espírita 1860, p. 256), ao relatar novamente essa mesma
comunicação, já fala que “ele pertencia a uma ordem muito elevada, e que
desempenhou um papel muito importante sobre a Terra” (O Livro dos
Médiuns, FEB, 2007, p. 110, grifo nosso); e, finalmente, no livro Obras Póstumas (p. 305-306), quando relata
todo o acontecimento, ele fala que o Espírito usou o codinome “A Verdade”,
se abstendo de revelar quem realmente Ele teria sido. (ver item IV).
Por que será que Kardec muda a fala? Para encontrarmos
a explicação, devemos ver algumas observações que ele faz a respeito das
comunicações:
a) Recebida em 11 de dezembro de 1855: “Vê-se, por
estas perguntas, que eu era ainda muito noviço acerca das coisas do mundo
espiritual”. (p. 302).
b). Recebida em 25 de março de 1856: “Nessa época,
ainda não se fazia distinção nenhuma entre as diversas categorias de Espíritos
simpáticos. Dava-se-lhes a todos a denominação de Espíritos familiares”. (p.
305).
Considerando que essas três comunicações, constantes
do livro Obras Póstumas, são os
documentos originais que Kardec possuía e que, por sua vez, também são
anteriores à época da publicação do livro Instruções
Práticas sobre as Manifestações Espíritas, que se deu no ano de 1858, e que
em sua substituição veio O Livro dos
Médiuns, disponível ao público em data posterior, qual seja, no ano de
1861, e que neste último livro já mudava o “um ilustre filósofo da
antiguidade”, (se colocássemos o mais ilustre caberia como uma luva a Jesus),
para qualificá-lo como sendo um Espírito “que pertence a uma categoria muito
elevada e que desempenhou na Terra importante papel” (O Livro dos Médiuns,
FEB, 2007, p. 110) (se disséssemos o de uma categoria mais elevada que
desempenhou o papel mais importante sobre a Terra, ficaríamos com a impressão
de que, de fato, estaríamos falando de Jesus). E concluímos que essas últimas
expressões devam prevalecer sobre aquelas. Quer dizer, as comunicações
constantes do livro Obras Póstumas
são as que devemos considerar como a realidade dos acontecimentos, enquanto
que, para as outras, acreditamos na hipótese de Kardec ter colocado a questão
de modo diferente, por absoluta discrição, e também para que não atraísse a si,
nem à Doutrina nascente, a ira dos religiosos de seu tempo, como aconteceu em
relação ao Cristianismo, quando esse ainda se encontrava no início.
Em 1868, há uma interessante observação de Kardec, que
nos ajudará no esclarecimento do uso, no livro Instruções Práticas, da
expressão “um ilustre filósofo”, cujo teor poderemos encontrar no item 41, do
cap. I, de A Gênese:
O Espiritismo, longe de negar ou destruir o Evangelho,
vem, ao contrário, confirmar, explicar e desenvolver, pelas novas leis da
Natureza, que revela tudo quanto o Cristo disse e fez; elucida os pontos
obscuros dos seus ensinamentos, de tal sorte que aqueles para quem eram ininteligíveis
certas partes do Evangelho, ou pareciam inadmissíveis, as compreendem e
admitem, sem dificuldade, com auxílio desta doutrina; veem melhor o seu alcance
e podem distinguir entre a realidade e a alegoria; o Cristo lhes parece
maior: já não é simplesmente um filósofo, é um Messias divino. (A
Gênese, FEB, 2007, p. 42-43, grifo nosso).
Fica evidente que a expressão “um ilustre filósofo”
foi tomada pelo uso comum, mas nesta fala Kardec eleva Jesus à categoria de um
Messias divino.
Em Obras Póstumas, lemos que em 07 de maio de
1856 na casa do Sr. Roustan, pela médium Srta Japhet, veio a informação do
espírito Hahnemnn, confirmando a Kardec a missão de que estava incumbido. (Obras
Póstumas, 2006, p. 309). Pouco mais de um mês depois, 12 de junho de 1856, na
casa do Sr. C..., médium Srta. Aline C..., Kardec, em diálogo com o Espírito de
Verdade, pede-lhe para confirmar se tem mesmo uma missão, ao que lhe foi dito:
“Confirmo o que te foi dito, mas recomendo-te muita descrição, se
quiseres sair-te bem. [...]”. (Obras Póstumas, 2006, p. 313, grifo
nosso).
Continuando o diálogo com o Espírito de Verdade, a
certa altura Kardec lhe disse: “[...] Nesse caso, reclamo a tua assistência e a
dos bons Espíritos, no sentido de me ajudarem e ampararem na minha tarefa”. E ao
final, expressou-se da seguinte forma:
Espírito Verdade, eu vos agradeço pelos vossos sábios conselhos. Aceito tudo sem restrição e sem dissimulação.
Senhor! Se vos dignastes lançar os
olhos sobre mim para o cumprimento de vossos desígnios, que seja feita a vossa
vontade! A minha vida está em vossas mãos, disponde do vosso servidor. Em
presença de uma tão grande tarefa, reconheço a minha fraqueza; minha boa
vontade não faltará, mas, talvez, as minhas forças me trairão. Supri a minha
insuficiência; dai-me as forças físicas e morais que me forem necessárias.
Sustentai-me nos momentos difíceis, e com a vossa ajuda, e a de vossos celestes
mensageiros, esforçar-me-ei para corresponder aos vossos objetivos. (Obras
Póstumas, 2006, p. 314-315).
Dois pontos queremos levantar: 1º) Ao dizer “reclamo a
tua assistência e a dos bons Espíritos”, Kardec, certamente, colocava o
Espírito de Verdade numa condição superior à dos bons Espíritos; 2º) Se inicia
o agradecimento nominando o Espírito de Verdade para logo após dizer Senhor,
não estaria aí o relacionando a uma figura que todos nós denominamos de Senhor,
ou seja, Jesus? Esse é o entendimento do editor Paulo Henrique de Figueiredo
(FIGUEIREDO, 2007, p. 51), que no artigo “A Verdade” fala exatamente desse
assunto que estamos tratando no momento.
c) Recebida em 09 de abril de 1856, com o detalhe que
nessa a pergunta é feita ao Espírito que se identificou como A Verdade: “A
proteção desse Espírito, cuja superioridade estava longe de imaginar, de fato,
jamais me faltou. [...]”. (p. 307).
Ademais, significativo é o fato de que, nas primeiras
páginas do livro O pensamento de Emmanuel, o autor Martins Peralva
coloca exatamente essa fala de Kardec, dizendo: “Cântico de Allan Kardec ao ser
informado pelo Espírito de Verdade da missão que lhe caberia desempenhar como
Codificador do Espiritismo. (Obras Póstumas, de Allan Kardec, pág. 254, 12ª
edição da FEB)”. (PERALVA, 1987, p. 11); portanto, estabelece a ligação entre
Espírito de Verdade e Senhor.
Como a seguir citaremos algo importante em O Livro
dos Médiuns, julgamos necessário fazer uma consideração, já que pode
ocorrer que essa obra seja considerada como de menor valor que O Livro dos
Espíritos, por ser este de respostas às perguntas feitas aos Espíritos
Superiores, enquanto o outro não é visto dessa forma. Ledo engano! Vejamos
essas considerações de Kardec na Introdução da primeira obra citada:
Importantes alterações para melhor foram introduzidas nesta
segunda edição, muito mais completa do que a primeira. Acrescentando-lhe grande
número de notas e instruções do maior interesse, os Espíritos a corrigiram,
com particular cuidado. Como reviram tudo, aprovando-a, ou modificando-a à sua
vontade, pode dizer-se que ela é, em grande parte, obra deles, porquanto a
intervenção que tiveram não se limitou aos artigos que trazem assinaturas. São
poucos esses artigos, porque apenas apusemos nomes quando isso nos pareceu
necessário, para assinalar que algumas citações um tanto extensas provieram
deles textualmente. A não ser assim, houvéramos de citá-los quase que em
todas as páginas, especialmente em seguida a todas as respostas dadas às
perguntas que lhes foram feitas, o que se nos afigurou de nenhuma utilidade.
Os nomes, como se sabe, importam pouco, em tais assuntos. O essencial é que o
conjunto do trabalho corresponda ao fim que colimamos. O acolhimento dado à
primeira edição, posto que imperfeita, faz-nos esperar que a presente não
encontre menos receptividade. (O Livro dos
Médiuns, FEB, 2007, p. 17-18, grifo nosso).
Portanto, está no mesmo nível de O Livro dos
Espíritos, sendo, como assevera Kardec, O Livro dos Médiuns um
seguimento dela. (KARDEC, 2007, p. 3). Diante disso, o que vamos citar do guia
dos médiuns e dos evocadores assume um caráter bem especial, ou seja, de tudo
que dele transcrevermos foi sancionado pelos Espíritos Superiores.
Dito isso, analisemos, em O Livro dos Médiuns, a comunicação IX, inserida no capítulo XXXI,
intitulado Dissertações Espíritas, da qual destacamos, em negrito, alguns
trechos:
Venho,
eu, vosso Salvador e vosso juiz; venho, como outrora, aos filhos transviados
de Israel; venho trazer a verdade e dissipar as trevas. Escutai-me. O
Espiritismo, como outrora a minha palavra, tem que lembrar aos
materialistas que acima deles reina a imutável verdade: o Deus bom, o Deus
grande, que faz germinar a planta e que levanta as ondas. Revelei a Doutrina
Divina; como o ceifeiro, atei em feixes o bem esparso na Humanidade e
disse: Vinde a mim, vós todos que sofreis!
Mas,
ingratos, os homens se desviaram do caminho reto e largo que conduz ao reino
de meu Pai e se perderam nas ásperas veredas da impiedade. Meu Pai não quer
aniquilar a raça humana; quer, não mais por meio de profetas, não mais por meio
de apóstolos, porém, que, ajudando-vos uns aos outros, mortos e vivos, isto é,
mortos segundo a carne, porquanto a morte não existe, vos socorrais e que a voz
dos que já não existem ainda se faça ouvir, clamando-vos: Orai e crede! por
isso que a morte é a ressurreição, e a vida – a prova escolhida, durante a
qual, cultivadas, as vossas virtudes têm que crescer e desenvolver-se como o
cedro.
Crede
nas vozes que vos respondem: são as próprias almas dos que evocais. Só muito
raramente me comunico. Meus amigos, os que hão assistido à minha vida e à
minha morte são os intérpretes divinos das vontades de meu Pai.
Homens
fracos, que acreditais no erro das vossas inteligências obscuras, não apagueis
o facho que a clemência divina vos coloca nas mãos, para vos clarear a estrada
e reconduzir-vos, filhos perdidos, ao regaço de vosso Pai.
Em
verdade vos digo: crede na diversidade, na multiplicidade
dos Espíritos que vos cercam. Estou infinitamente tocado de
compaixão pelas vossas misérias, pela vossa imensa fraqueza, para deixar de
estender mão protetora aos infelizes transviados que, vendo o céu, caem no
abismo do erro. Crede, amai, compreendei as verdades que vos são reveladas; não
mistureis o joio com o bom grão, os sistemas com as verdades.
Espíritas! amai-vos, eis o primeiro ensino;
instrui-vos, eis o segundo. Todas as verdades se encontram no Cristianismo; são
de origem humana os erros que nele se enraizaram. Eis que do além-túmulo, que
julgais o nada, vos clamam vozes: Irmãos! nada perece; Jesus-Cristo é o
vencedor do mal, sede os vencedores da impiedade. (O Livro dos Médiuns, FEB, 2007, p. 482-483, grifo nosso).
Examinando as expressões usadas aqui nessa mensagem,
as quais realçamos em negrito, não há como não relacioná-las a Jesus. Na
realidade, elas dão-nos a impressão de estarmos ouvindo-O falar. Entretanto, o
mais importante dessa comunicação é a nota que Kardec coloca logo após;
vejamo-la:
Esta comunicação, obtida
por um dos melhores médiuns da Sociedade Espírita de Paris, foi assinada com um nome que o respeito não
nos permite reproduzir, senão sob todas as reservas, tão grande seria o
insigne favor de sua autenticidade e porque dele se há muitas vezes abusado
demais, em comunicações evidentemente apócrifas. Esse nome é o de Jesus de
Nazaré. De modo algum duvidamos de que ele possa manifestar-se; mas, se os
Espíritos verdadeiramente superiores não o fazem, senão em circunstâncias
excepcionais, a razão nos inibe de acreditar que o Espírito por excelência
puro responda ao chamado do primeiro que apareça. Em todos os casos,
haveria profanação, no se lhe atribuir uma linguagem indigna dele.
Por estas considerações, é
que nos temos abstido sempre de publicar o que traz esse nome. E
julgamos que ninguém será circunspecto em excesso no tocante a publicações
deste gênero, que apenas para o amor-próprio têm autenticidade e cujo menor
inconveniente é fornecer armas aos adversários do Espiritismo.
Como já dissemos, quanto
mais elevados são os Espíritos na hierarquia, com tanto mais desconfiança devem
os seus nomes ser acolhidos nos ditados. Fora mister ser dotado de bem grande
dose de orgulho, para poder alguém vangloriar-se de ter o privilégio das
comunicações por eles dadas e considerar-se digno de com eles confabular, como
com os que lhe são iguais.
Na comunicação acima,
apenas uma coisa reconhecemos: é a superioridade incontestável da linguagem e das
ideias, deixando que cada um julgue por si mesmo de quem ela traz o nome, que
não a renegaria. (KARDEC, O Livro dos Médiuns, FEB, 2007, p. 483-484,
grifo nosso).
Primeiramente, gostaríamos de chamar a atenção para o
que Kardec coloca, logo no início da nota, para ressaltar as qualidades do
médium que recebeu a comunicação, visando nos alertar para a confiabilidade que
depositava nele, visto o que, na sequência, haveria de falar sobre quem assinou
tal mensagem.
E quando ele coloca que “temos abstido sempre de
publicar o que traz esse nome” ao se referir à assinatura de Jesus de Nazaré,
nos parece que existiram várias comunicações deste tipo, porquanto o Espírito
São José confirma isso quando diz que “o próprio Divino Mestre ensina em suas
comunicações”. A pergunta é: onde estão essas mensagens, considerando que nas
obras de Kardec encontramos apenas três, sendo que duas delas ele as considerou
apócrifas? E, quanto à outra, disse que “ela leva, na forma e no fundo dos
pensamentos, na simplicidade junto à nobreza do estilo, uma marca de identidade
que não se poderia desconhecer” (Revista Espírita 1868, p. 288). Devemos
considerar as assinadas pelo Espírito de Verdade, como sendo a resposta a essa
questão, fato que se confirmará a seguir.
Também está aqui explicado por que Kardec não quis
colocar a assinatura na mensagem: “não fornecer armas aos adversários do
Espiritismo”. Entretanto, quando do Evangelho
Segundo o Espiritismo, ele coloca esta mesma mensagem no Capítulo VI – O
Cristo Consolador, item 5 (p. 135-136) (a pequena divergência ficou por conta
dos trechos sublinhados, que não constam da mensagem do ESE), agora assinada
pelo Espírito de Verdade, datando-a como ocorrida em Paris, em 1860, ou seja,
bem no início do Espiritismo. Isso quer dizer que, ao afirmar que essa
comunicação tem a assinatura de Jesus, mas em vez desse nome coloca o de
Espírito de Verdade, devemos pressupor que, para ele, ambas provinham da mesma
individualidade. Fato que fica mais claro quando, em O Livro dos Médiuns, no capítulo XXXI, ao tratar das Comunicações
Apócrifas (p. 502-511), Kardec coloca duas comunicações assinadas por Jesus
(item XXXIII), às quais, em nota, nos explica o seguinte:
Indubitavelmente, nada há
de mau nestas duas comunicações; porém, teve o Cristo alguma vez essa
linguagem pretensiosa, enfática e empolada? Faça-se a sua comparação com a
que citamos acima, firmada pelo mesmo nome, e ver-se-á de que lado está
o cunho da autenticidade. (O Livro dos Médiuns, FEB, 2007, p. 508, grifo
nosso).
Para nós fica claro que, ao pedir para comparar essas
duas mensagens com a anterior, e ver onde se encontra o “cunho da
autenticidade”, é porque admite como autêntica a primeira, que é exatamente a
que citamos um pouco mais acima, ou seja, aquela “firmada pelo mesmo nome”, na
qual consta a assinatura Jesus de Nazaré. O que, em outras palavras, podemos
dizer é que Kardec admitia como verdadeira a comunicação dada por Jesus e que,
ao colocá-la em outra ocasião como assinada pelo Espírito de Verdade, é porque
sabia que se tratava do mesmo Espírito e, dessa forma, também se mantinha a
descrição que lhe foi sugerida.
Um ponto também interessante é que na mensagem está se
afirmando que “Só muito raramente me comunico”, exatamente o que o Espírito de
Verdade disse a Kardec, logo no início, que aconteceria.
Segundo afirma o codificador, Jesus é o “Espírito puro
por excelência”, situação em que acreditamos, e ninguém duvida dela; daí termos
encontrado, acreditamos, mais uma forte razão para tê-lo como o coordenador da
Terceira Revelação Divina, porquanto “Só os puros Espíritos recebem a palavra
de Deus com a missão de transmiti-la” (Revista Espírita 1867, p. 260).
Ainda em O Livro dos Médiuns, quando
Kardec fala dos Sistemas, ao se referir ao Sistema unispírita ou
monoespírita (item 48), ele faz uma colocação pela qual podemos concluir
claramente que Cristo e o Espírito de Verdade são a mesma personalidade;
vejamos:
Como variedade do sistema otimista, temos o que
se baseia na crença de que um único Espírito se comunica com os homens,
sendo esse Espírito o Cristo, que é o protetor da Terra. […]. Assim,
enquanto uns atribuem todas as comunicações ao diabo, que pode dizer coisas
excelentes para tentar, pensam outros que só Jesus se manifesta e que
pode dizer coisas detestáveis, para experimentar os homens. […].
Quando se lhes objeta com os fatos de
identidade, que atestam, por meio de manifestações escritas, visuais, ou outras, a presença de
parentes ou conhecidos dos circunstantes, respondem que é sempre o mesmo
Espírito, o diabo, segundo aqueles, o Cristo, segundo estes, que toma
todas as formas. Porém, não nos dizem por que motivo os outros Espíritos não se
podem comunicar, com que fim o Espírito da Verdade nos viria enganar,
apresentando-se sob falsas aparências, iludir uma pobre mãe, fazendo-lhe crer
que tem ao seu lado o filho por quem derrama lágrimas. A razão se nega a
admitir que o Espírito, entre todos santo, desça a representar
semelhante comédia. […]. (O Livro dos Médiuns, FEB, 2007, p. 69, grifo
nosso).
Não podemos deixar de ressaltar que, aí, Kardec
faz uma relação objetiva entre o Cristo e o Espírito de Verdade de forma a não
deixar dúvida alguma quanto à sua identidade. Na hipótese de que somente o
Cristo se manifesta, contra-argumenta o codificador indagando “com qual
objetivo o Espírito de Verdade nos viria enganar...” e, concluindo, que “a
razão se recusa a admitir que o Espírito, entre todos santo, se rebaixe para
executar uma semelhante comédia”, o que nos leva a deduzir que não há a mínima
possibilidade de entendimento, senão, o de que os dois são a mesma
personalidade, porquanto o questionamento coerente com o texto deveria ser:
“com qual objetivo o Cristo nos viria enganar...”. Merece destaque esta
expressão “entre todos santo” usada por Kardec, que, a nosso ver, só caberia a
Jesus. Na tradução feita por Renata Barbosa e Simone T. N. Bele, em publicação
da Petit Editora (p. 48-49), fica ainda mais nítida esta questão: “o Espírito,
entre todos o mais santo”.
Podemos ainda corroborar isso, em se comparando essas
duas falas de Kardec:
[...]
o Espiritismo […]. Vem cumprir, nos tempos preditos, o que o Cristo anunciou e
preparar a realização das coisas futuras. Ele é, pois, obra do Cristo, que preside, conforme
igualmente o anunciou, à regeneração que
se opera e prepara o reino de Deus na Terra. (O Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. I, item 7, 1990, p. 59-60,
grifo nosso).
[...] reconhece-se que o Espiritismo realiza todas
as promessas do Cristo com respeito ao Consolador anunciado. Ora, como é
o Espírito de Verdade que preside ao grande movimento de regeneração,
a promessa da sua vinda se acha por essa forma cumprida, porque, de fato, é ele
o verdadeiro Consolador. (A Gênese, cap. I, item 42, FEB, 2007, p. 43,
grifo nosso).
Aqui é oportuno lembrar que O Evangelho Segundo o Espiritismo foi
publicado em abril de 1864, enquanto que o livro A Gênese, o foi em janeiro de 1868. Queremos chamar a sua atenção,
caro leitor, para que observe a comparação que faremos entre essas duas
mensagens:
“obra do Cristo,
que preside... à regeneração que
se opera”; e
“é o Espírito de Verdade que preside ao
grande movimento da regeneração.”
Falando do Espiritismo, Kardec afirma, primeiramente,
que o Cristo o preside; depois disse que o Espírito de Verdade é quem o
preside, do que podemos concluir que os dois são, indubitavelmente, a mesma
personalidade, porquanto a coordenação geral do movimento de regeneração coube
somente a um. Então, percebe-se claramente que ele fala da mesma
individualidade, usando nomes diferentes; o que vem fortalecer, em nós, a
convicção de que ele sabia perfeitamente quem era o Espírito de Verdade, que,
para ele, não era outro senão o próprio Jesus.
Outro fato importante é que, no já citado capítulo VI
– O Cristo Consolador, de O Evangelho Segundo o Espiritismo, com
o subtítulo Advento do Espírito de Verdade, existem, nas Instruções dos
Espíritos, cinco mensagens assinadas pelo Espírito de Verdade. Aliás, para nós,
certamente há uma relação direta entre o título “O Cristo Consolador” com as
cinco mensagens assinadas pelo Espírito de Verdade. A primeira delas é a que
consta de O Livro dos Médiuns, comunicação IX, do capítulo XXXI, da qual
transcrevemos alguns trechos mais acima, mas com a assinatura de Jesus de
Nazaré. Vejamos o que se pode realçar em três delas:
5. Venho, como outrora aos transviados filhos de Israel,
trazer a verdade e dissipar as trevas. […].
Mas, ingratos, os homens afastaram-se do caminho reto e largo
que conduz ao reino de meu Pai e enveredaram pelas ásperas sendas da
impiedade. Meu Pai não quer aniquilar a raça humana; […].
Sinto-me por demais tomado de compaixão pelas vossas misérias,
pela vossa fraqueza imensa, para deixar de
estender mão socorredora aos infelizes transviados que, vendo o céu, caem nos
abismos do erro...
Espíritas! Amai-vos, este o primeiro ensinamento, instrui-vos,
este o segundo […]. (O Espírito de Verdade – Paris, 1860) (O
Evangelho Segundo o Espiritismo, 1990, p. 135-136, grifo nosso)
6. Venho instruir e consolar os pobres deserdados. Venho
dizer-lhes que elevem a sua resignação ao nível de suas provas, que chorem, porquanto
a dor foi sagrada no Jardim das Oliveiras; mas, que esperem, pois que
também a eles os anjos consoladores lhes virão enxugar as lágrimas.
[...] o trabalho das vossas mãos vos fornece aos corpos o pão
terrestre; vossas almas, porém, não estão esquecidas; e eu, o
jardineiro divino, as cultivo […]. Nada fica perdido no reino de nosso Pai
[…].
Em verdade vos digo: os que carregam seus fardos e assistem os seus irmãos são
bem-amados meus. Instrui-vos na preciosa doutrina que dissipa o erro das
revoltas e vos mostra o sublime objetivo da provação humana... Estou convosco e
meu apóstolo vos instrui. (O Espírito de Verdade - Paris, 1861) (O
Evangelho Segundo o Espiritismo, 1990, p. 136-137, grifo nosso).
7. Sou o grande médico das almas e venho trazer-vos o remédio
que vos há de curar. Os fracos, os sofredores e os enfermos são os meus
filhos prediletos. Venho salvá-los. Vinde, pois, a mim, vós que sofreis e
vos achais oprimidos, e sereis aliviados e consolados […]. (O Espírito
de Verdade) (O Evangelho Segundo o Espiritismo, 1990, p. 137-138,
grifo nosso).
Não há como não relacioná-las a Jesus, tão evidente
fica o estilo de linguagem que lhe é próprio. Inclusive, um detalhe bem
particular em uma delas é dito algo importante para relacionar o Espírito de
Verdade a Jesus, mas que passa despercebido a muitos. Trata-se da expressão “o
jardineiro divino”; embora Jesus nunca a tenha usado, referindo-se a si
próprio, ela tem significado relevante, pois, após a sua ressurreição, Ele
aparece a Madalena, que o confunde com o jardineiro (Jo 20,15); assim, cabe-nos
dar um caráter alegórico para essa visão, no sentido de nos considerarmos
“plantas” do seu jardim. Julgamos fora de propósito que Kardec tenha se
enganado ou que nos tenha deixado ver uma coisa onde ela não está. Portanto,
não vemos outra opção senão aceitá-las como sendo mesmo de Jesus, uma vez que a
primeira, conforme dito em O Livro dos Médiuns, leva essa assinatura. A
expressão “meu apóstolo vos instrui”, certamente é a Kardec que se refere,
demonstrando, mais uma vez, sua condição de Espírito de uma categoria mais
elevada.
c) O Espírito de Verdade nos deixou alguma pista?
A
essa pergunta responderemos que sim, pois, pelo menos, é o que, diante dos
fatos, nos parece; e no que acreditamos. Vejamos uma comunicação assinada pelo
Espírito de Verdade, a propósito de A
Imitação do Evangelho (O Evangelho
Segundo o Espiritismo), dada em Bordeaux, em maio de 1864:
Um novo livro acaba de
aparecer; é uma luz mais brilhante que vem clarear o vosso caminho. Há
dezoito séculos eu vim, por ordem de meu Pai, trazer a palavra de Deus aos
homens de vontade. Esta palavra foi esquecida pela maioria, e a
incredulidade, o materialismo, vieram abafar o bom grão que eu tinha depositado
sobre vossa Terra. […].
Há várias moradas na casa
de meu Pai, eu lhes disse há dezoito séculos. Estas palavras o Espiritismo veio fazer compreendê-las. (Revista Espírita 1864, p. 399, grifo
nosso).
A respeito da assinatura, Kardec faz a seguinte
observação:
Sabe-se que tomamos tanto menos
a responsabilidade dos nomes quanto pertençam a seres mais elevados. Nós não
garantimos mais essa assinatura do que muitas outras, nos limitamos a entregar
esta comunicação á apreciação de todo Espírita esclarecido. Diremos, no
entanto, que não se pode nela desconhecer a elevação do pensamento, a nobreza e
a simplicidade das expressões, a sobriedade da linguagem, a ausência de todo
supérfluo. Se se a compara àquelas que estão reportadas em A Imitação do
Evangelho (prefácio, e cap. III - O Cristo Consolador[2], e que levam a mesma assinatura, embora obtidas
por médiuns diferentes e em diferentes épocas, nota-se entre elas uma analogia
evidente de tom, de estilo e de pensamento que acusa uma fonte única. Por
nós, dizemos que ela pode ser de O Espírito de Verdade, porque é digna dele;
ao passo que delas vimos massas assinadas com este nome venerado, ou o de Jesus,
cuja prolixidade, verborragia, vulgaridade, às vezes mesmo a trivialidade das
ideias, traem a origem apócrifa aos olhos dos menos clarividentes. […]. (Revista
Espírita 1864, p. 399-400, grifo nosso).
Kardec, embora muito reservado e não fugindo a essa
sua característica, diz que tal comunicação pode ter vindo do Espírito que a
assinou, por ser digna dele e, além disso, por “ter uma analogia de tom, de
estilo e de pensamento”, quando comparada às outras, “que acusa uma única
fonte”. O que não fica difícil de aceitar se considerarmos que, ao falar das
comunicações apócrifas, Kardec coloca que apareceram várias delas assinadas por
Jesus e pelo Espírito de Verdade, do qual disse ser um nome venerado, o que
significa que igualou os dois.
Ressaltamos as expressões: “há dezoito séculos eu vim,
por ordem de meu Pai” e “eu lhes disse há dezoito séculos”, que deixam
transparecer que se trata mesmo de Jesus, embora tenha assinado como Espírito
de Verdade.
Estes pontos abordados são
suficientes para desvendar o mistério sobre quem seria a personalidade, que na
codificação teve participação ativa, assinando várias mensagens e coordenando
todos os espíritos nela envolvidos.
E encerra, enfatizando:
– Vês que tua missão está subordinada a
condições que dependem de ti!...
Kardec, em resposta, dirigiu-se primeiro ao
Espírito da Verdade e, posteriormente, ao Senhor, em oração:
– Espírito da Verdade, eu vos agradeço os
sábios conselhos. Aceito tudo sem restrições e sem dissimulação.
– Senhor! Se dignastes lançar os olhos
sobre mim para a realização de Vossos desígnios, que seja feita a Vossa
vontade! Minha vida está em Vossas mãos; disponde de Vosso servo. Diante de tão
grande tarefa, reconheço a minha fraqueza. Minha boa vontade não falhará, mas
talvez as forças me traiam. Supri a minha insuficiência e dai-me as forças
físicas e morais que me sejam necessárias! Sustentai-me nos momentos difíceis
e, com o Vosso auxílio e o de Vossos celestes mensageiros, esforçar-me-ei por
corresponder aos Vossos desígnios.
Vejamos que o próprio Allan Kardec
considerava o Espírito da Verdade um espírito distinto do Espírito do Senhor:
com um, ele dialoga; ao outro, ele ora, suplicando forças para o cumprimento de
sua tarefa!... (p. 340-341).
Já colocamos, um pouco atrás,
as nossas considerações sobre esta oração de Kardec, consta em nosso texto
“Espírito de Verdade, quem seria ele?”, como ela está numa transcrição meio
longa, vamos transcrever só este parágrafo, para evitar repetição tudo quanto
foi dito:
Dois pontos queremos levantar: 1º) Ao dizer “reclamo a
tua assistência e a dos bons Espíritos”, Kardec, certamente, colocava o
Espírito de Verdade numa condição superior à dos bons Espíritos; 2º) Se inicia
o agradecimento nominando o Espírito de Verdade para logo após dizer Senhor,
não estaria aí o relacionando a uma figura que todos nós denominamos de Senhor,
ou seja, Jesus? Esse é o entendimento do editor Paulo Henrique de Figueiredo
(FIGUEIREDO, 2007, p. 51), que no artigo “A Verdade” fala exatamente desse
assunto que estamos tratando no momento.
Para nós, é evidente que, por
saber quem era o Espírito de Verdade, foi que Kardec se utilizou do termo
“Senhor”, ao se referir ao Espírito comunicante.
No dia 31 de março
de 1869, Hippolyte-Léon-Denisard Rivail, devido à ruptura de um
aneurisma que se lha desenvolvera na aorta, desencarna de súbito! Então,
conforme o Espírito da Verdade lhe dissera, daí a quarenta anos, em 2 de
abril de 1910, reencarna na condição de filho biológico de João Cândido
Xavier e Maria de São João de Deus. (p. 373).
Mais uma vez, temos mais um
espírito se manifestando pelo médium Carlos A. Baccelli que afirma ter sido
Chico Xavier a reencarnação de Kardec. O que estranhamos é que somente os
espíritos que se “manifestam” por este médium é que afirmam isso.
Já escrevemos quatro textos
relacionados à questão, nos quais procuramos demonstrar a impropriedade disso;
são eles: “Kardec reencarnou-se como Chico Xavier?”, “Supostas reencarnações de
Chico Xavier”, “Que se apresentem os candidatos a Kardec reencarnado” e “Só
para fanáticos Chico Xavier foi Kardec”. Deles tomaremos, pela ordem, algumas
de nossas considerações:
Tudo
o que estamos colocando tem razão de ser, pois há manifestações do Espírito
Kardec na mesma época em que Chico estava encarnado. O que nos levaria a crer
que, nesse caso, teria ocorrido a manifestação de um espírito de pessoa viva.
Alguns autores falam dessas manifestações de Kardec, conforme ver-se-á com as
informações que se seguem.
Eduardo
Carvalho Monteiro (1950-2005), em Allan Kardec (o druida reencarnado),
narra o seguinte:
Na obra O
Gênio Céltico e o Mundo invisível do mestre Léon Denis, só há pouco tempo
disponível ao público brasileiro, o autor reproduziu uma série de mensagens
do Espírito de Allan Kardec que, em verdade, escreveu a parte final de O
Gênio Céltico. Madame Baumard, esta que o acompanhou nos últimos anos
de vida como sua secretária, assim descreveu o processo criativo do grande
escritor: “Durante os anos de 1926-1927, Denis manteve constantes
contatos com o invisível. O interesse de Allan Kardec para com a obra em
elaboração era “intenso”: apresentava-se a cada
quinze dias e se encarregou, por ditado mediúnico, da parte final do livro” (MONTEIRO, 1996, p. 74, grifo nosso).
O
biógrafo André Moreil (?-?), em Vida e Obra de Allan Kardec, afirma:
“Na segunda-feira da Páscoa de 1910, no centro
'Esperança' de Lião, por intermédio da Srta. Bernadette em estado de
sonambulismo, Allan Kardec manifestou-se para agradecer ao que fora até
então o seu único biógrafo, o espírita Henri Sausse”. (MOREIL, 1986, p. 174,
grifo nosso).
Conforme
nos informa Wilson Garcia (1949- ) “a Páscoa de 1910 coincide exatamente com o
retorno ao corpo físico do Espírito que hoje conhecemos por Chico Xavier. Como
se sabe, Chico nasceu em 2 de abril de 1910.” (GARCIA, 1999, p. 141). Assim,
essa manifestação já seria de um espírito de um vivo. Nesse autor também
encontramos:
Os registros
de comunicações dadas por Kardec já na condição de Espírito fora do corpo
físico não ficam apenas no período imediatamente posterior à sua desencarnação. Avançamos
no tempo e uma dessas mensagens merece destaque, apesar de ser bem conhecida
dos estudiosos. Foi dirigida ao extraordinário filósofo Léon Denis no ano de
1925 (mais uma vez, anote o leitor a data), contendo um veemente apelo de
Kardec para que comparecesse ao congresso espiritualista daquele ano, em
virtude da importância do evento para o Espiritismo. [...] (GARGIA, 1999, p.
143, grifo nosso).
De
fato, em José Herculano Pires (1914-1979) se confirma isso:
Em 1925,
quando se reuniu em Paris o Congresso Espiritualista Internacional, o próprio
Kardec, através de comunicações mediúnicas teve de forçar Léon Denis, já velho
e cego, a sair de Tours, na província, para defender o Espiritismo dos enxertos
que lhe pretendiam fazer os representantes de várias tendências, como a
aceitação ingênua de ilustres mas desprevenidos militantes espíritas. [...]”.
(PIRES, 1978, p. 13-14).
Informa-nos
também Garcia que “Wantuil e Thiesen reproduzem, ainda, na mesma obra [Allan
Kardec], uma mensagem transmitida por Kardec no dia 14 de junho de 1979, no
Grupo Espírita Ismael, do Rio de Janeiro. A íntegra do documento aparece ao
final do volume III, fechando a biografia” (GARCIA, 1999, p. 146). Comprovamos
que, de fato, na obra citada, existe essa mencionada mensagem[3].
Ao
que tudo indica não é de hoje essa de se querer apontar alguém como sendo
Kardec reencarnado; vejamos, novamente, em Garcia:
Devemos
registrar um outro fato. Denis faz uma anotação interessante no livro, a
respeito de uma notícia que então se divulgava, dando conta de que Kardec
estaria na época reencarnado. Ora, isso demonstra como a questão é antiga.
Denis escreveu o livro em 1927, quando Chico estava com 17 anos de idade e dava
início à sua tarefa mediúnica. Já havia na ocasião aqueles que admitiam estar
Kardec reencarnado mas não como Chico, note-se! Era ele um francês, com cerca
de 30 anos de idade, portanto, teria reencarnado antes do novo século. Eis o
registro de Denis: “Uma outra objeção consiste em pretender que Allan Kardec
está reencarnado no Havre, desde 1897. Trinta anos teriam se passado de sua
nova existência terrestre. Ora, pode-se admitir que um espírito deste valor
tenha esperado tão longo tempo para se revelar por obras ou ações adequadas?
Além disso, Allan Kardec não se comunica unicamente em Tours, mas também em
muitos outros grupos espíritas da França e da Bélgica. Em todos esses lugares
ele se afirma pela autoridade de sua palavra e a sabedoria de seus
conhecimentos” (O Gênio Céltico, p. 220). (GARCIA, 1999, p. 145, grifo
nosso).
Então,
desde o ano de 1897 já se vem afirmando que Kardec estaria reencarnado. Aliás,
se pesquisarmos na Internet, veremos que, atualmente, são apresentados vários
outros candidatos; além do Chico, conseguimos listar alguns deles; veja-se em
nosso texto “Que se apresentem os candidatos a Kardec reencarnado”, disponível
em nosso site www.paulosnetos.net, na categoria “Artigos e Estudos”.
Resolvemos
confirmar todas essas informações a respeito da manifestação do Espírito Allan
Kardec; para isso recorremos à obra de Léon Denis (1846-1927) intitulada O
gênio céltico e o mundo invisível, citada acima, de cuja Introdução tomamos
esse trecho da fala do autor: “Com efeito, é pelo estímulo do Espírito Allan
Kardec que realizei este trabalho, em que se encontrará uma série de
mensagens que ele nos ditou, por incorporação, em condições que excluem toda
fraude”. (DENIS, 2001, p. 28, grifo nosso). Foi publicado 1927, depois de
sua morte.
Em
duas oportunidades, Léon Denis fala sobre o Congresso Espírita de 1925 (p. 208
e 259), confirmando o que acima foi dito. Transcrevemos uma delas:
Então, ao se
aproximar o Congresso de 1925, foi o grande iniciador, ele mesmo, que veio nos
certificar de seu concurso e nos esclarecer com seus conselhos. Atualmente
ainda é ele, Allan Kardec, quem nos anima a publicar este estudo sobre o gênio
céltico e a reencarnação, como se poderá verificar pelas mensagens
publicadas mais adiante. (DENIS, 2001, p. 259, grifo nosso).
Nessa
obra de Denis temos também a confirmação de que Kardec teria reencarnado em
1897 (DENIS, 2001, p. 278-279). Além disso, fato importante, ele não deixou de
mencionar que “Allan Kardec não
se comunica unicamente em Tours, mas também em muitos outros grupos espíritas
da França e da Bélgica.” (DENIS, 2001, p. 279).
À
página 168, Denis coloca uma mensagem ditada pelo Espírito Allan Kardec em 25
de novembro de 1925 e no final da obra coloca outras treze ocorridas no ano
seguinte, de janeiro a outubro. Julgamos que não há como contestar a veracidade
de tais manifestações a não ser comportando-se como um fanático, que faz de
todo para defender aquilo que acredita.
O
que podemos concluir disso tudo é que é bem pouco provável que o espírito de
Kardec, se reencarnado como Chico, pudesse manifestar-se tantas vezes como se
demonstrou comprovado. Para aceitarmos a tese seria imprescindível levantar
todas elas, especificando dia e hora de início e término, para ver se naqueles
momentos nos quais Kardec comunicou-se, Chico estava dormindo ou numa situação
na qual o seu espírito não precisasse comandar seu corpo físico. Fica aí o
primeiro desafio para os que advogam essa tese.
Cabe, portanto, aos defensores
da tese de que Chico Xavier foi Kardec provarem que todas as vezes em que o
espírito Kardec se manifestou, o nosso Chico estava dormindo ou em uma situação
que sua alma emancipada se comunicasse como Kardec.
Mais ainda, teriam que
desmentir o próprio Chico Xavier:
Por
outro lado, na possibilidade disso ter ocorrido, ainda resta um outro desafio a
ser vencido, que seria o de desmentir o próprio Chico, pois, nessa hipótese
levantada, após emancipar-se do corpo ele teria que, de forma totalmente
consciente, como acontece com os desencarnados, ter assumido a personalidade
anterior para se manifestar. Ora, isso nos leva à situação de que Chico deveria
se lembrar dessa “mudança”. Então, como explicar que no dia 28 de agosto de
1988, em entrevista ao jornal Diário da Manhã, de Goiânia, respondendo à
pergunta se ele seria Kardec reencarnado, disse:
Consulto a
minha via psicológica, as minhas tendências. Tudo aquilo que tenho dentro do
meu coração é eu. Não tenho nenhuma semelhança com aquele homem corajoso e
forte que, em doze anos, deixou dezoito livros maravilhosos. [...] (COSTA E
SILVA, 2004, p. 115-116, grifo nosso).
Antônio
Corrêa de Paiva (?- ) confirma essa publicação, citando-a em sua obra Será
Chico Xavier a reencarnação de Allan Kardec?, acrescentando a seguinte nota
de rodapé:
Trecho
fundamental da reportagem feita pelo “Diário da Manhã”, de Goiânia-GO, pelo
jornalista Batista Custódio, no dia 28 de agosto de 1988, e que foi transcrita
por Carlos Antônio Baccelli, em artigo publicado no mensário “A Flama
Espírita”, de Uberaba-MG, em novembro de 1994. (PAIVA, p. 79).
Achamos
bem curiosa a citação do nome de Baccelli, pois ele é um dos que vem defendendo
de “unhas e dentes” que Chico Xavier era Kardec reencarnado. Será que se
esqueceu dessa fala de Chico?
Ademais,
podemos ainda citar este trecho da fala de Chico Xavier, quando de sua
entrevista no programa Pinga-fogo, realizado, em julho de 1971, pela extinta TV
Tupi:
Quando
ouvimos o Espírito de Emmanuel pela primeira vez, e que ele nos fez compreender
a importância do assunto, nós nos informamos com ele de que, em outras
vidas, abusamos muito da inteligência, nós, em pessoa, e que nesta
consagraríamos as nossas forças para estar com ele na mediunidade, nos serviços
de Nosso Senhor Jesus Cristo, no Espiritismo, e por isso mesmo coloquei minha
vida nas mãos de Jesus e nas mãos dos bons Espíritos. (GOMES, 2010, p. 232-233,
grifo nosso).
É
certo que isso, que Chico disse, não quer dizer na encarnação imediatamente
anterior; porém, nos leva a refletir sobre se caberia a Kardec, como
personalidade anterior à de Chico, ter dito “abusamos muito da inteligência” em
si referindo-se às suas outras encarnações anteriores?
Assim,
quem ainda quiser sustentar a ideia de que Kardec reencarnou como Chico deve
solucionar esses dois desafios, o que, acreditamos, resolverá de vez a questão.
Supostas reencarnações de Chico
Xavier
Parece que
os espíritas continuam descobrindo as várias reencarnações de Chico Xavier,
pois sempre circulam na internet a lista delas.
Vejamos o
quadro comparativo em duas listas:
Chico
Xavier, diálogos e recordações...
(autor
Carlos Alberto Braga Costa, publicação da União Espírita Mineira)
|
Vivências
de um Espírito – Médium do Cristo (baseado na obra A volta de Allan Kardec,
autor Weimar Muniz de Oliveira, impresso pela Federação Espírita do Estado
de Goiás)
|
Nome
|
Local
|
Época
|
Nome
|
Época
|
nihil
|
Profeta
Isaac
|
c. 1900
a.C.
|
Hatshepsut
|
Egito –
Tebas
|
c. 1470
a.C.
|
Faraó
Hatshepsut
|
c. 1.470
a.C.
|
Chams
|
Egito –
Tanis
|
c. 800
a.C.
|
Faraó
Chams
|
c. 800
a.C.
|
Sacerdotisa
|
Grécia –
Atenas
|
c. 600
a.C.
|
nihil
|
nihil
|
Profeta
Daniel
|
c. 622 a
550 a.C.
|
Platão
|
c. 428 a
348 a.C.
|
Druida
Allan Kardec
|
c. 58 a
44 a.C.
|
Lucina
|
Itália
-Roma
|
60 a.C.
|
nihil
|
Flávia
Cornélia
|
Roma e
Palestina
|
26 a 79 d.C.
|
nihil
|
nihil
|
João
Evangelista
|
c. 10 a 103 d.C.
|
Lívia
|
Ciprus,
Massilia, Lugdnm, Neapolis
|
233 a 256 d.C.
|
nihil
|
nihil
|
Santo
Antão
|
251 a 356
|
Um
sacerdote
|
c. 440 a
530
|
Francisco
de Assis
|
1182 a
1226
|
Lucrezja
di Colinna
|
Itália -
|
Século
XIII
|
nihil
|
nihil
|
Jan Huss
|
1369 a
1415
|
Joana de
Castela (a louca)
|
Espanha
|
1479 a
1555
|
nihil
|
nihil
|
Manuel
de Paiva
|
1508 a 1584
|
Dama da
corte francesa
|
França
|
1556
|
nihil
|
Joanne
d'Arencourt
|
França –
Arras
|
Séc.
XVIII – 1789 Rev. Francesa
|
nihil
|
Dolores
Del Sarte Hurquesa Hernandes
|
Espanha
– Barcelona
|
Séc. XIX
|
Hippolyte
Léon Denizard Rivail
|
1804 a
1869
|
Chico
Xavier
|
Brasil –
Pedro Leopoldo
|
1910 a
2002
|
Chico
Xavier
|
1910 a
2002
|
A obra de Carlos Alberto Braga é baseada nos relatos de
Arnaldo Rocha, que, segundo ele nos informa, foi amigo e confidente de Chico
Xavier. Uma publicação da União Espírita Mineira.
Observar que no quadro além dos personagens divergirem,
há sérios conflitos de datas.
Por outro lado, se pela lista, Kardec foi João
Evangelista e Platão, como então fica a assinatura de ambos em Prolegômenos (O
Livro dos Espíritos)?
Quanto ao fato da coordenação dos espíritos da
codificação ter sido exercida por João Evangelista, isso, também não procede,
pois, conforme Kardec, quem exercia essa função era o Espírito de Verdade, fato
que, ainda, se pode corroborar em uma das mensagens de Erasto.
Wilson Garcia, em Chico você é Kardec?, apresenta
uma entrevista publicada no “'Diário da Manhã”, de Goiânia, em 1998, na qual
Chico nega ser Kardec.
Fora isso, podemos acrescentar aquilo que já dissemos
anteriormente, os que advogam a tese que Chico foi Kardec têm a obrigação de
provar que todas as vezes que Kardec, manifestou-se em espírito, Chico estava
dormindo ou numa condição tal que seu espírito pudesse desligar-se do corpo
para se manifestar como Kardec. Inclusive, ele esteve “assessorando” Léon Denis
durante o período e 1926 a 1927, quando este estava escrevendo uma obra O
Gênio Céltico.
Quando Kardec ficou sabendo que o seu desencarne estava
se aproximando, ele também teve a notícia que voltaria para completar a sua
missão. Comparando-se a forma de trabalho de ambos, Kardec e Chico, vemos que
esse último, considerado como o brasileiro do século, apenas serviu de
intermediário dos espíritos, enquanto que o primeiro fez todo um trabalho de
coordenação, que para isso se utilizou de pesquisas e muita análise crítica,
não colocando como ponto doutrinário senão aquilo que foi confirmado por vários
espíritos, por vários médiuns de localidades diferentes. Ora, nem mesmo as
obras de André Luiz, que dizem completar a doutrina, passaram por esse
controle. Com isso não queremos desmerecer essas obras, apenas estamos
registrando o fato.
É lamentável que tudo isso
venha acontecendo no Movimento Espírita, coisas que os detratores usam como
arma contra o Espiritismo.
Pesquisamos na Internet e
encontramos vários candidatos a ser o Codificador reencarnado, então:
Que se apresentem os candidatos
a Kardec reencarnado
É interessante
como insistem em querer nomear algumas pessoas como sendo Kardec reencarnado,
e, infelizmente, nem o Movimento Espírita, escapou desse tipo de fanatismo,
indo mais além, criando polêmica sobre isso. Temos, inclusive, duas Federativas
publicando obras que são contraditórias sobre a pretensa reencarnação de Kardec
como Chico Xavier, conforme demonstramos em nosso texto “Supostas reencarnações
de Chico Xavier”, postado em Artigos e Estudos, em nosso site
www.paulosnetos.net.
Isto tem sido um
prato cheio para os detratores do Espiritismo que recebe do próprio Movimento
Espírita munição para seus constantes ataques.
O primeiro
ponto, é que essa de se descobrir o Kardec reencarnado não é algo novo; Léon
Denis nos dá conta disso, em O Gênio Céltico e o mundo invisível, ao
falar dos que objetavam sobre as mensagens enviadas pelo Espírito Allan Kardec,
afirmou:
Uma outra objeção consiste em pretender
que Allan kardec está reencarnado no Havre, desde 1897. Ele teria chegado,
portanto, aos trinta anos de sua nova existência terrestre. (Este livro foi
escrito em 1927, N.T.) Ora, pode-se admitir que um espírito deste valor tenha
esperado tão longo tempo para se revelar por obras ou ações adequadas? Além
disso, Allan Kardec não se comunica unicamente em Tours, mas também em muitos
outros grupos espíritas da França e da Bélgica. Em todos esses lugares, ele
se afirma pela autoridade de sua palavra e a prudência de suas observações.
(DENIS, 2001, p. 278-279, grifo nosso).
Como,
anteriormente, já argumentamos (“Kardec reencarnou-se como Chico Xavier”,
disponível em Artigos e Estudos, em nosso site www.paulosnetos.net), cabe aos
partidários de que Kardec teria sido algum personagem específico, provar que
neste período em que o Espírito Allan Kardec se manifestava na França,
inclusive, “assessorando” diretamente Léon Denis, o candidato a sua
reencarnação estava dormindo ou num estado em que seu espírito pudesse se emancipar
para manifestar-se nestas localidades mencionadas.
Resolvemos
pesquisar e encontramos cinco candidatos:
1) Alziro Abrahão Elias David Zarur
(1914-1979) foi um jornalista, radialista, poeta e escritor, fundador e
primeiro presidente da Legião da Boa Vontade. (Wikipédia).
“Allan
Kardec recebeu de Seus Amigos Espirituais em meados do século passado, a
notícia de que regressaria à Terra para completar a sua missão, porque o
Espiritismo não dera a última palavra”. “... Ora, tudo isso está
matematicamente cumprido no Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho e do
Apocalipse, graças à ação heroica, pertinaz de Alziro Zarur: Kardec veio.
Cumpriu, na íntegra, a segunda metade de sua admirável tarefa missionária”.
“... os irmãos espíritas, diante da marcha inexorável da Verdade, reconhecerão
que Alziro Zarur foi Kardec que voltou. E completou a missão do
Espiritismo, com a RELIGIÃO DE DEUS...”. (A Saga de Alziro Zarur-III, JESUS,
Zarur, Kardec, Roustaing Na Quarta Revelação, 5ª edição, p. 11-13) (site
CACP Ministério Apologético, grifo nosso).
2) Ennio
Schiess, não conseguimos nenhum dado biográfico sobre ele.
A informação a
seguir, consta no site Candeia, em referência ao livro Obras Atuais – Vinda
de Jesus:
Livro que ensina orações, reúne versos,
depoimentos e fala sobre os trabalhos realizados pelo médium Ennio Schiess, que
afirma ser Allan Kardec reencarnado e se diz receber o espírito de Jesus
Cristo. (http://www.candeia.com/produto.asp?section=1&id=7481, grifo nosso)
3) Osvaldo Polidoro
(1910-2000)
No site O Divinismo,
encontramos:
Em 5 de junho de 1910, Allan Kardec
reencarnou com o nome de Osvaldo Polidoro, na cidade de São Paulo. O maior
trabalhador da Doutrina do Caminho que a Terra pôde conhecer escreveu, nesta
encarnação, dentre inúmeras outras obras, 116 livros, restaurando tudo o que já
foi ensinado no nosso planeta em termos de Verdades Divinas, tendo aprofundado
muitos pontos que atualmente já temos condição de entender melhor.
Por meio do livro Evangelho Eterno e
Orações Prodigiosas, prometido em Apocalipse 14,6, instituiu o Divinismo, a
Doutrina Integral.
Ao desencarnar, em 25 de dezembro de
2000, Osvaldo Polidoro deixou no mundo, com a restauração concluída, “UM DEUS,
UMA VERDADE, UMA DOUTRINA”. (http://divinismo.org/, grifo nosso).
4) Chico Xavier
(1910-2002), o mineiro do século e o maior brasileiro de todos os tempos,
nascido em Pedro Leopoldo, MG.
Essa informação circula no meio
espírita sob diversas fontes e depoimentos; citamos, por exemplo, a obra A
volta de Allan Kardec, de Weimar Muniz de Oliveira, publicação apoiada pela
Federação Espírita do Estado de Goiás.
O estranho é que
a União Espírita Mineira publicou a obra Chico Xavier, diálogos e
recordações..., de autoria de Carlos Alberto Braga Costa, na qual a
reencarnação anterior de Chico Xavier foi como Dolores Del Sarte Hurquesa
Hernandes, - Barcelona, Espanha (p. 236). Se duas Federativas não se entendem,
o que se pode esperar dos adeptos do Espiritismo?
Quem se
interessar pelas divergências entre essas duas publicações, veja o nosso texto
“Supostas reencarnações de Chico Xavier”, disponível na categoria Artigos e
Estudos em nosso site: www.paulosnetos.net.
5) Jan Val
Ellam, é o pseudônimo usado pelo escritor natalense Rogério de Almeida
Freitas (1959- ) (Wikipédia).
Da entrevista do
escritor Alfredo Nahas a Alex S. Guimarães, disponível em
http://alexscguimaraes.blogspot.com.br/, transcrevemos o seguinte trecho:
ALEX – Há
mais de um ano atrás nos encontramos em Jacareí-SP, onde você falou sobre
diversas personalidades da história que reencarnaram novamente depois,
divulgando até os nomes dos mesmos os co-relacionando. Você poderia dizer
alguns deles para nós?
ALFREDO
– Este assunto é
sempre polêmico, pois há opiniões contraditórias, de difícil comprovação. Mas
de todos os que conheço e posso falar com mais certeza, como opinião pessoal
minha, é da reencarnação de Kardec no Brasil, em Natal no Rio Grande do
Norte, na pessoa de Jan Val Ellam. (grifo nosso).
Esta lista não está fechada,
portanto, podem-se apresentar novos canditados.
Só
por equívoco Chico Xavier foi Kardec
Temos em mãos o livro “Até sempre, Chico Xavier”, de
autoria de Nena Galves, publicação do Centro Espírita União, no qual
encontramos mais alguma coisa, que ajudará em muito a solução do caso de Chico
ser ou não a reencarnação de Allan Kardec.
Indiscutivelmente D. Nena Galves foi amiga de Chico, o que ela
demonstra com várias fotos, talvez para que não pairasse nenhuma dúvida sobre
isso. Um detalhe que nos chamou a atenção é que ela não teve a mínima
preocupação em identificar quem foi Chico na reencarnação passada, como alguns
dos que dizem ser seus “amigos” espalham, a nosso ver, sem provas convincentes,
que ele teria sido Kardec.
O capítulo dois tem o título “Reencontro de corações”, de onde
transcrevemos:
Os bons ou
maus momentos que passamos são sempre lembrados, são pontos definitivos em
nossas vidas.
Maio de 1959
é data que recordamos com imensa alegria.
O encontro
com Chico Xavier fez florescer na memória atual reencarnações passadas na
Espanha e na França. Chico nos confidenciou que nos reconheceu imediatamente.
Galves e eu sentimos uma atração imensa, uma grande afeição, e quando Chico
tomou as mãos de Galves e as minhas entre as suas e as beijou, tivemos a
certeza de que suas mãos e as nossas já haviam estado unidas num passado
distante. Foi uma volta a tempos longínquos e um despertar no presente.
Tivemos a impressão exata de que nos localizávamos no espaço e no tempo.
(GALVES, 2011, p. 19, grifo nosso).
Ora, aqui é taxativo o fato de que Chico viveu na Espanha e na França,
com o casal Galves, o que derruba a tese dos que defendem ter sido ele Kardec e
confirma o que Carlos Alberto Braga Costa afirma na obra Chico Xavier, diálogos e recordações... sobre as reencarnações anteriores
de Chico, conforme se pode ver em meu artigo publicado em 02 de dezembro de
2012, intitulado “Supostas reencarnações de Chico Xavier”, disponível pelo
link:
(http://www.oconsolador.com.br/ano6/289/paulo_neto.html).
No texto “Chico Xavier foi
Ruth-Céline Japhet”, publicado na revista eletrônica digital O Consolador(),
o autor Luciano dos Anjos também apresenta várias reencarnações do Chico,
embora em quantidade superior às apresentadas por Carlos Alberto, a maioria
confirma as listadas por ele(). Destaque
especial para Ruth-Céline Japhet, uma das médiuns que colaborou com Kardec
quando da elaboração das obras da Codificação Espírita.
E para completar o xeque-mate, a favor do que diz, D. Nena
apresenta dois cartões-postais (p. 21) nos quais o Chico de próprio punho
confirma ter vivido na Espanha, com o casal, ao dizer “lembrança de nossa
querida España”. Vejamo-los:
Uma
dessas imagens, a da espanhola, fez-nos lembrar que na obra citada do Carlos
Alberto Braga Costa havia alguma coisa neste sentido. E não deu outra; a
encontramos numa fala de Arnaldo Rocha, que, por oportuno, transcrevemos:
Meses se
passaram e a Senhora Aida Fassanello voltou à casa de Chico, levando um
presente para Alma Querida. Tratava-se de um quadro pintado a óleo,
muito bonito, que retratava uma cena no mínimo curiosa, de três espanholas com
roupas do século XIX. Sentada sobre uma mesa, a primeira tocava uma guitarra,
enquanto as outras duas dançavam com suas castanholas.
Chico, muito
emocionado com o presente, confidenciou-me: “Ela conseguiu registrar, na
tela do quadro, o que captou da história que lhe descrevi, sobre nossa amizade
anteriormente vivida. Éramos três grandes amigas, (Chico revela
que a outra personagem se chamava Maria Yolanda – referindo-se a Dona Neném), e
vivemos na cidade de Barcelona no século XIX, meu nome era Dolores del Sarte
Hurquesa Hernandes”. (COSTA, 2006, p. 236, itálico do original, grifo
nosso).
Voltando à obra de D. Nena Galves; mais à frente ela informa:
Chico
dedicou atenção especial para nós, como se fôssemos velhos amigos. Tempos
depois, ele confidenciou-nos que Emmanuel havia prometido que ele
reencontraria familiares de outras vidas, já reencarnados em São Paulo.
Naquela época, Chico mudara-se recentemente para Uberaba e sentia falta de seus
familiares. Consolava-se com as palavras de Emmanuel e esperava a nova família
do passado que chegaria em breve.
Ele nos
reconheceu prontamente. Nós sentimos profunda atração por ele, mas tivemos
alguma dificuldade em relembrar o passado que pouco a pouco foi surgindo.
Voltamos assiduamente a Uberaba para visitá-lo. Nesses encontros fraternos
foram acentuando-se as lembranças do passado e a alegria no trabalho
doutrinário espírita. [...]. (GALVES, 2011, p. 32, grifo nosso).
Um desabafo de D. Nena que, embora não relacionado diretamente
com o assunto, importa destacá-lo, pois pode ser que nas “entrelinhas” tenha
algo, sim:
Depois de
sua desencarnação, apareceram diversas pessoas que se autodenominaram amigos
antigos do médium. Entretanto, essas pessoas nunca compartilharam com ele das
lutas e sacrifícios que enfrentou em favor do movimento espírita.
Muitas
comunicações mediúnicas atribuídas ao médium desencarnado não correspondem às
confidências que conhecemos. Ao compará-las, nos perguntamos: será possível que
Chico tenha mudado tanto? (GALVES, 2011, p. 139-140, grifo nosso).
D. Nena, mais para o final da obra, informa que todo ano Chico
Xavier ia comemorar com eles a data de nascimento de Kardec. Coloca trechos da
entrevista de Chico ao amigo Luiz Rodovil Rossi, que vale a pena transcrever
alguns deles:
ROSSI:
Querido Chico, é com enorme prazer e honra que o recebemos mais uma vez aqui no
Centro Espírita União. Nós gostaríamos de ouvir um pouquinho a respeito da
semana de Kardec e da feira do Centro União, às quais você comparece com tanto
carinho todos os anos.
CHICO:
Estamos aqui diante da bondade de todos e especialmente do nosso amigo Dr. Luiz
Rossi, que lembra a nossa palavra simples e desataviada para exaltarmos a
memória de Allan Kardec, o mentor inesquecível a quem devemos tanto.
Nosso amigo
fala em prazer e honra, mas esses dois substantivos ajudam a mim, de vez que
essa honra e esse prazer não me pertencem, pois na verdade, não mereço estar
dentro de nossa comunidade com qualquer destaque especial.
Todos nós
conhecemos a altura espiritual de Allan Kardec e reverenciamos nele aquele
professor inolvidável, cujos ensinamentos atravessam grande parte do século
passado. Estamos em pleno século XX e seus ensinamentos nos encontram para nos
felicitar com o conhecimento de nossa própria natureza e com o imperativo do
nosso aprimoramento espiritual...
Por muito
que sejam expressivas as palavras que eu pudesse dizer a respeito de Allan
Kardec, elas seriam demasiadamente pálidas para criar em nosso espírito o
respeito, a admiração, o carinho e o amor com que não apenas anualmente, mas
todos os dias, nos lembramos desse homem admirável, cuja herança para nós, da
comunidade humana, representa um patrimônio de paz e luz.
Peçamos a
Nosso Senhor Jesus Cristo que engrandeça Allan Kardec onde estiver. Que ele
possa receber as vibrações de nossos melhores sentimentos e que o Centro
Espírita União continue nessa obra maravilhosa de redenção humana, a abraçar os
necessitados, difundir a luz e honrar Allan Kardec por meio dos seus dignos
diretores e dos dignos companheiros que me escutam, em memória daquele que não
podemos esquecer.
Allan Kardec
vive. Esta é uma afirmativa que eu quisera pronunciar com uma voz que no
momento não tenho. Mas com todo o coração, repito: Deus engrandeça o nosso
codificador, o codificador da nossa Doutrina! Que ele se sinta cada vez mais
feliz em observar que as suas ideias e suas lições permanecem acima do tempo,
auxiliando-nos a viver. É o que eu pobremente posso dizer na saudação que Allan
Kardec merece de nós todos. Sei que cada um de nós, na intimidade doméstica,
torná-lo-á lembrado e cada vez mais honrado, não só pelos espíritas do Brasil,
mas do mundo inteiro. (GALVES, 2011, p. 213-216).
As
considerações que Chico Xavier fez a Kardec soam estranhas caso ele, realmente,
soubesse ser o Codificador reencarnado, pois pareceria pura bajulação de si
mesmo, o que, convenhamos, não combina com o que conhecemos de sua
personalidade.
Para concluir este artigo,
trazemos duas importantes falas de Kardec.
A primeira, encontraremos na Revista
Espírita 1859, no artigo “Deve-se publicar tudo quanto dizem os
espíritos?”, do qual ressaltamos o seguinte trecho:
[…]
O erro de certos autores é o de escrever sobre um assunto antes de tê-lo
aprofundado suficientemente, e, por aí, dar lugar a uma crítica fundada. Lamentam-se
do julgamento temerário de seus antagonistas: não prestam atenção ao fato de
que, eles mesmos, frequentemente, mostram o ponto fraco. […] (KARDEC, 1993e, p.
283).
A segunda, consta da obra Viagem Espírita em 1862,
da qual transcrevemos:
É preciso que se saiba que o Espiritismo sério
patrocina com satisfação e zelo toda obra feita em boas condições, venha de
onde vier; mas, por outro lado, repudia todas as publicações excêntricas. Todos
os espíritas que se empenham para que a Doutrina não seja comprometida devem,
pois, esforçar-se para as condenar, tanto mais porque, se algumas delas são
feitas de boa fé, outras podem sê-lo pelos próprios inimigos do Espiritismo,
tendo em vista desacreditá-lo e poder motivar acusações contra ele. Daí por
que, repito, é necessário que se conheça o que ele aceita, daquilo que repudia.
(KARDEC, 2000d, p. 98).
As recomendações, que constam destas considerações de
Kardec, são tão óbvias que não ousamos acrescentar-lhes mais nada.
Paulo da Silva Neto Sobrinho
out/2013.
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http://pt.wikipedia.org/wiki/Augusto, acesso em 20.10.2013, às 08:15hs.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Tib%C3%A9rio,
acesso em 20.10.2013, às 08:20hs.
Os textos de nossa autoria citados podem ser
lidos em:
[1]
Nessa obra o nome do
autor consta Jacó Abramovitch Lentsman, porém, parece-nos que os nomes próprios
não devem ser traduzidos, é por isso que em vez de Jacó colocamos Iakov.
[4] Texto publicado em duas partes, links: http://www.oconsolador.com.br/ano4/204/especial.html
e http://www.oconsolador.com.br/ano5/205/especial.html
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