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Margarida Azevedo |
Margarida Azevedo
Mem Martins,
Sintra - Portugal
Com o ritmo alucinante das grandes cidades, a insegurança profissional, a fragilização da estrutura familiar e o consequente desmembramento das famílias; com o lar transformado artificialmente em dormitório, a sede de conhecer à distância de um clique no computador ou no telemóvel e os novos interesses impostos aos cidadãos, sub-repticiamente por quem manda; com as práticas religiosas reduzidas a momentos fugazes na engrenagem de um tempo fugaz, as “conversas” com Deus transformadas em desabafos colectivos psicóticos, pergunta-se: Quais os valores que as religiões cristãs estão a passar para os seus fiéis? O dar a outra face, o perdão incondicional, a tolerância, interna e externa a cada igreja, a alegria da fé em Deus Todo Poderoso, a fraternidade, a igualdade de todos perante Deus, a liberdade da fé, e, muito especificamente, a santidade…
Que sentido tem tudo isto nos tempos que correm? Ou será que os homens e as mulheres estão a leste de todos estes valores que são o fundamento da actividade religiosa, o alimento da fé? A santidade tornou-se uma matéria tabu e portanto marginal das igrejas.
De repente todos se tornaram autónomos e auto-suficientes em matéria de fé. A santidade não traz Deus à cidade barulhenta e poluída, nem é um garante de triunfo social. Pelo contrário, é a via mais directa para ser engolido sem dó nem piedade. Logo, para não perder “adeptos”, as igrejas abafam este e muitos outros valores, caindo na apatia e nos discursos repetitivos.
A vertente axiológica e ética das religiões tornou-se um chorrilho de preceitos desconformes com os interesses dos fiéis, por duas razões: primeiro, porque não conseguem impor um discurso de salvação onde cada fiel se sinta empenhado no seu auto-aperfeiçoamento em comunidade, isto é, dentro de um ambiente de partilha; segundo, porque insatisfeitos, os fiéis estão a desenvolver cadeias de preceitos domésticos, muitos dos quais impondo-se aos rituais colectivos das igrejas, remetendo para estas as celebrações pontuais (nascimentos, casamentos e funerais).
Se é certo que cada vez mais há o crer sem pertencer, herança do segundo quartel do séc. XX, principalmente, não é menos certo que o isolamento da fé e das suas manifestações conduz a perigosos níveis de isolamento em que cada um começa a ter a sensação de que o seu estar e ler é o mais conforme com os textos sagrados. Paralelamente a este fenómeno de isolamento religioso, um outro surge não menos preocupante: muitas igrejas começaram a evocar Espíritos, sob o pretexto de sarar maleitas do foro psíquico.
Como a sociedade quer impor aos seus cidadãos que as lutas pela melhoria das condições de vida é o resultado de histeria colectiva, uma vez que os Estados não podem abdicar dos seus programas políticos, então está tudo doido. Neste ponto, as igrejas têm aqui matéria superabundante para angariar gente e dinheiro. Os Espíritos são um meio fácil, porém, desconhecendo o terreno onde estão a mexer. É que, além de nunca se evocarem os Espíritos, estes não estão à disposição de ninguém, não são criados para todo o serviço. Orar pelos Espíritos e esclarecê-los, esse sim, deve ser o trabalho de todo o crente.
Com tudo isto, os valores da fé têm-se perdido e a luta pela santidade, como forma de elevação do ser humano a outros níveis da sua espiritualidade tem vindo a ficar para trás. O que propomos é que se olhe para os valores religiosos, na sua vertente libertadora, com outros olhos. Vale a pena, e valerá sempre, lutar com todas as forças pela santidade. Ela é um nobre valor que requer um coração abençoado pelo desejo de paz, uma vida dedicada ao bem-fazer, à limpeza da mente e à consequente desvaloração de muitos dos aliciantes que a sociedade de consumo nos quer impor.
A santidade é esclarecedora, é limpa de pensamento, é nobre de carácter, é honesta e simples na sua vivência; a santidade é o alimento mais elevado para quem quer um dia ser um membro de luz no Reino de Deus. Ninguém adquire a luz se não for santo. Aliviar o outro nas suas fadigas, sentir um desejo desmesurado de fazer o bem, procurar a gratuitidade dos gestos e das dádivas, elevar as palavras aos sentidos mais altos, tudo isso e muito, muito, muito mais são apanágios da santidade.
Só por meio dos santos a sociedade se transformará em um conjunto fraterno dos filhos de Deus, estejamos nós onde estivermos.
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