Leonardo Marmo Moreira
Buscando
aprofundar o estudo sobre os problemas da obra roustainguista, para que as
respectivas reflexões tornem-se mais didáticas para os confrades, objetivamos
retornar à análise dos problemas destacados em artigos anteriores de nossa
autoria, sobretudo do texto intitulado “Os Erros Metodológicos de Roustaing”.
Antes
de retomarmos a análise dos tópicos já discutidos inicialmente no artigo
supracitado, devemos frisar que Kardec deixou claro que nós esperaríamos que as
utopias fossem realizadas. Essa explicação do Codificador consiste em uma outra
maneira de dizer aquilo que está exarado em “O Livro dos Médiuns” (LM), de
autoria de Erasto, “É preferível rejeitar dez verdades do que aceitar uma única
mentira, uma única teoria falsa” e também em “O Evangelho Segundo o
Espiritismo” (ESE): “Na dúvida, abstém-te”.
Em um
“terreno” tão “minado” como os estudos do psiquismo, do parapsiquismo, da vida
além-túmulo e do mundo espíritual, tais cuidados são de fundamental importância
para que não aceitemos e propaguemos teses que possam estar equivocadas. O
Espiritismo fornece totais condições para vencermos a superstição, o místico, o
mágico, o maravilhoso, o miraculoso, o fantástico e a ficção, em questões
espirituais. Entretanto, o descuido em relação a “novas revelações” pode fazer
com que misturemos o “joio e o trigo”.
Nesse
contexto, vale afirmar que os princípios básicos da Doutrina Espírita vêm sendo
sistematicamente confirmados por várias evidências de diversas fontes, de
dentro e de fora do movimento espírita. O mesmo não pode ser dito das “teses”
da obra de Roustaing. Portanto, no mínimo, a obra de Roustaing deveria ser
deixada em uma espécie de “quarentena”, até que fossem comprovadas suas
propostas estranhas à Doutrina Espírita, pelo menos por parte daqueles que se
consideram “espíritas roustainguistas” (aliás, foi justamente nesse sentido a
recomendação de Kardec concernente à atitude que nós espíritas deveríamos ter
perante essa obra). De fato, se o indivíduo é roustainguista apenas (e não
sendo espírita, não participa e nem divulga suas ideias em eventos e
instituições espíritas), ele está no seu pleno direito de optar, através do
livre-arbítrio, pelo que acha melhor para si (assim como ocorre com os irmãos
católicos, protestantes, budistas e de todas denominações), e não nos cabe
qualquer tipo de reprovação e nem mesmo qualquer interesse por essa opinião.
Importante
registrar também que são os supostos “espíritas roustainguistas” que necessitam
provar que suas supostas “inovações” estão certas do ponto de vista espírita e
não nós espíritas que necessitamos provar que as mesmas estão erradas, até
porque não podemos dispor de todo o tempo do mundo para refutar o absurdo,
sendo que existem diversas outras questões doutrinárias tão ou mais relevantes
para que dediquemos atenção. Ademais, por mais inconsistentes que tais ideias
esdrúxulas sejam, como é usual ocorrer em se tratando de teses de âmbito
religioso, sempre existem companheiros profundamente aficionados, por diversos
motivos, o que enfatiza que nosso papel é estudar, refletir e informar, sem a
pretensão de convencer a quem quer que seja.
Assim sendo,
em nosso trabalho espírita, dedicamos uma pequena parcela de tempo para tais
questões, devido a um motivo básico: a aceitação de Roustaing por confrades espíritas,
denota, eloquentemente, o baixo nível de compreensão doutrinária, o que
consiste em sério problema do Movimento Espírita. Realmente, a aceitação de
tais “hipóteses” demonstra sérias dificuldades de entendimento doutrinário por
parte do Movimento Espírita, ou seja, demonstra grandes limitações para a
compreensão do que é Espiritismo e do que não é Espiritismo. Além disso, em
função da histórica e maciça propaganda/divulgação roustainguista em nossos
arraiais, que prossegue, inclusive, em pleno ano de 2016, essa discussão,
infelizmente, é eventualmente levantada, por mais que a aceitação das ideias
roustainguistas no seio do movimento espírita seja incompreensível.
Em
todo o caso, é possível questionar:
Temos
evidências concretas de um Espírito instrutor de grandes comunidades (ou de
qualquer Espírito (obviamente em condição humana)) que reencarnou como
“criptógamo carnudo” (uma espécie de lesma ou lagarta)?
Quais
são as obras de elevada qualidade mediúnico-doutrinária que comentam sobre
Espíritos que nunca precisaram reencarnar? André Luiz ou Manoel Philomeno de
Miranda, por exemplo, comentam sobre alguma entidade nessas condições em suas
obras? Há também obras fidedignas doutrinariamente que também retratam colônias
de Espíritos que nunca reencarnaram?
Os
roustainguistas rejeitam a obra de André Luiz “Evolução em Dois Mundos” (EDM)?
Afinal, sendo tal obra um resumo da evolução anímica do Espírito imortal, se
fosse possível a evolução sem encarnação, André Luiz deveria ter comentado
sobre isso. Vale lembrar que Emmanuel prefacia todos os livros de André Luiz,
inclusive EDM, chancelando seus respectivos conteúdos.
André
Luiz em “Evolução em Dois Mundos” (o que está perfeitamente de acordo com as
bases kardequianas) afirma que no início do processo evolutivo a necessidade da
reencarnação é maior e os intervalos entre existências físicas tendem a ser
menores. A medida que o Espírito vai evoluindo, a tendência é que os intervalos
entre encarnações tendem a ir ficando maiores, uma vez que o Espírito mais
lúcido consegue aproveitar de forma mais efetiva seu período na chamada
“intermissão” (período entre reencarnações). Roustaing defende uma ilógica
ideia contrária. O princípio inteligente que veio do reino animal, assim que
chegasse à condição hominal, pararia de reencarnar e só voltaria se fosse por
castigo, podendo voltar como uma espécie de “minhoca”, “lesma” ou “lagarta” (os
“criptógamos carnudos”). O que é parece mais lógico? O que soa mais racional,
as ideias de Kardec e de André Luiz ou a proposta de Roustaing?
A
obra de Roustaing defende que a evolução anímica passa pelos níveis mineral,
vegetal, animal até chegar ao hominal. Antes da chegada à condição hominal, o
princípio espiritual, em nível animal, estaria, a priori, reencarnando. Daí, a partir
do início da transição do animal para o hominal, o princípio inteligente
poderia evoluir somente no mundo espiritual. Nâo é estranha essa contradição?
Qual evidência corrobora tal ideia?
As hipóteses
da virgindade de Maria de Nazaré e do corpo fluídico de Jesus receberam
corroboração por obras de elevada qualidade mediúnica e/ou doutrinária, tais
como André Luiz e Manoel Philomeno de Miranda? Podemos citar, igualmente, a
obra de Joanna de Ângelis “Jesus e o Evangelho à luz da Psicologia Profunda”, na
qual a figura de Jesus é esmiuçada e é claramente demonstrado que o Mestre de
Nazaré não tinha nenhuma característica física que o diferenciasse dos homens
comuns de seu tempo. Seu diferencial era, obviamente, sua evolução espiritual.
Ainda assim, vale a reflexão: se as ideias de “Maria virgem” (forma como “Os
Quatro Evangelhos” citam Maria de Nazaré exaustivamente em sua Introdução, em
uma clara fixação católica) e de “Jesus fluídico” fossem confirmadas, Maria e
Jesus seriam mais dignos de admiração? Fornecendo o benefício da dúvida, não
seria mais aconselhável para um Espírita, a priori, ficar com a opinião do
Codificador Allan Kardec que, em “A Gênese”, discorda das duas ideias?
Quais
obras de elevada qualidade doutrinária (mediúnica ou não) caracterizam a Igreja
Católica como o futuro religioso do mundo? Kardec, Cairbar Schutel, Herculano
Pires e Léon Denis, entre outros, pensam que não. Todos esses expoentes do
Espiritismo estariam errados e Roustaing estaria certo?
Ora,
se não temos evidências científicas e/ou mediúnico-doutrinárias de elevada
qualidade de tais realidades, como podemos aceitar esses conceitos como
desdobramentos das bases kardequianas?
Vale
lembrar que a confirmação não pode vir apenas de médiuns de uma única
instituição, sobretudo quando essa instituição é claramente roustainguista.
Obviamente, os médiuns de uma mesma instituição podem ser, e usualmente são
encontrados, submetidos à influência dos mesmos Espíritos ou, pelo menos, de
Espíritos semelhantes em evolução espiritual e intenções. Há também a
influência anímica na comunicação mediúnica, na qual crenças do médium menos
habilidoso em neutralizar suas opiniões quando em transe mediúnico, podem
aparecer como ideias da Entidade comunicante. Corroborações obtidas a partir de
médiuns inexpressivos e/ou de obras de baixo nível doutrinário, não constituem
verdadeira confirmação, à luz da Doutrina Espírita, pois não consistem em
evidências da “Universalidade do Ensino dos Espíritos”.
Alguns
confrades podem supor que o comentário acima é parcial, mas vejamos: se não
usarmos desse critério, como deveremos opinar em novas polêmicas, tais como
aquela que afirma ser Chico Xavier foi a reencarnação de Allan Kardec? Essa
hipótese já foi chancelada por várias mensagens mediúnicas e por vários
“espíritas famosos”. Também foi rejeitada por grande grupo de notáveis
trabalhadores espíritas. Portanto, devemos avaliar o conteúdo da mensagem
(abrangendo suas propostas principais e secundárias, sua lógica, sua coerência
científica, sua objetividade, sua linguagem etc.), o caráter moral do médium (e
também seu preparo intelectual e doutrinário) e a assinatura/identificação,
para, subsequentemente, estudar várias outras mensagens, analisando se essas
outras também passam por tais critérios, para, finalmente, buscar uma
corroboração inicial entre diferentes mensagens obtidas por diferentes e bons
médiuns. Só assim, tal “inovação” estará a caminho de uma confirmação que possa
sugerir um respaldo do “Controle da Concordância Universal do Ensino dos
Espíritos” (CCUEE).
Vejamos
os erros metodológicos de Roustaing e analisemos um pouco mais tais tópicos:
1)
Roustaing e a
hipervalorização do texto bíblico
Os Espíritos orientadores de
Roustaing poderiam narrar o que de fato aconteceu ou até mesmo comentar um
único Evangelho, fazendo os incrementos e ressalvas necessárias. Por que
comentar todos os textos?
O fato dos Espíritos orientadores
de Roustaing comentarem algo sobre o texto bíblico e fazerem alguma eventual
ressalva a alguma passagem do novo testamento e/ou alguma impressão do redator
do respectivo texto não quer dizer que o texto bíblico não tenha sido
superestimado. Ora, se os Espíritos não comentassem nada, não haveria obra,
ainda mais uma obra tão extensa e prolixa quanto “Os Quatro Evangelhos” de J.
B. Roustaing.
Vale lembrar que as duas
principais obras do Espiritismo são “O Livro dos Espíritos” (LE) e “O Livro dos
Médiuns” (LM), o qual foi considerado por Allan Kardec o desdobramento natural
de LE. Só depois da publicação de LE, LM, além da obra “O que é o Espiritismo”
e dos primeiros volumes (8 anos de publicações mensais, a partir de janeiro de
1858) da Revista Espírita, com as bases doutrinárias já bem estabelecidas, as
quais nasceram do análise do fenômeno mediúnico, isto é, dentro de um âmbito
científico e não propriamente religioso, irá surgir “O Evangelho Segundo
Espiritismo” (ESE) (1864). Essa sequência de obras da Codificação não ocorreu,
obviamente, “por acaso”. Os Mentores espirituais sabiam que seria mais
interessante construir bases fundamentais na ciência para depois surgir os
aspectos filosófico e religioso. Caso contrário, o Espiritismo não conseguiria
nunca fugir dos rotineiros debates filosóficos e religiosos inócuos, ou seja,
que não têm grandes possibilidades de serem concluídos satisfatoriamente.
O
título da obra publicada por Allan Kardec em 1864 é “O Evangelho segundo o
Espiritismo” e não “O Espiritismo segundo o Evangelho”, como foi registrado
recentemente por um confrade. Como as bases doutrinárias já estavam bem
consolidadas, Kardec poderia analisar a essência do pensamento de Jesus, que
foi indicado em LE como o “ser mais perfeito que Deus nos ofereceu como modelo
e guia”. Portanto, quando surge a análise dos textos evangélicos, a partir do
desenvolvimento da terceira parte de LE, intitulada “As Leis Morais”, os
princípios básicos da Doutrina Espírita já estavam bem consolidados, através da
análise do conteúdo da mensagem obtida por vários médiuns.
Roustaing e/ou seus Espíritos
orientadores, diferentemente do trabalho de Kardec, agem como “reformadores
cristãos”, estabelecendo uma espécie de “nova seita cristã” com suas
particularidades e diferenças acentuadas em relação ao Espiritismo. Assim como
Lutero e os reformadores cristãos, a obra de Roustaing é fundamentada na
análise do texto bíblico e em uma nova interpretação da mesma.
Segundo Herculano Pires, em “O
Verbo e a Carne”, o que tem de Espiritismo em “Os Quatro Evangelhos” foi o que
Roustaing “decalcou” de LE e LM, que o advogado de Bordeaux já havia lido (pode
até ter lido, mas claramente não estudou minimamente antes de começar sua
própria obra).
Aliás, a própria “Queda
Espiritual” não deixa de ser uma nova roupagem da velha e totalmente
ultrapassada, à luz da Doutrina Espírita, intepretação do primeiro livro do
Velho Testamento (VT), intitulado “Gênesis”. Portanto, a obra “Os Quatro
Evangelhos” não constitui tão somente em uma nova interpretação do Novo
Testamento (NT), mas igualmente sofre o impacto da tendência à aceitação quase
que literal do texto bíblico, incluindo o VT, o “Gênesis” e o mito relacionado
a Adão e Eva.
De fato, o título completo da
obra de Roustaing é “Os Quatro Evangelhos
Seguidos dos mandamentos explicados em espírito e em verdade pelos Evangelistas
assistidos pelos Apóstolos e Moisés”. A menção aos “mandamentos” é
claramente uma indicação que a obra também comtempla algo do VT. O próprio
destaque a Moisés no título do livro também reforça essa ideia de que a obra
foi elaborada por “autoridades” do NT (os “Evangelistas” e os “Apóstolos”) e do
VT (“Moisés”). Assim sendo, é
interessante constatar que a suposta “Revelação da Revelação” ou “Nova
revelação” resgata uma série de ideias antigas, tais como a “Queda Espíritual”,
que nasceu com o primeiro livro do VT, “Gênesis”.
O Espiritismo, em suas bases
kardequianas, não nasce como reforma religiosa, mas nasce como ciência, através
da análise do fenômeno paranormal, ou seja, Kardec parte dos efeitos (os mais diversos
tipos de fenômenos paranormais, anímicos e mediúnicos, de efeitos intelectuais
e de efeitos físicos) para remontar às causas (a imortalidade da alma, a
existência do mundo espiritual e a comunicabilidade dos espíritos). A obra de Roustaing, ao contrário, postula
uma série de hipóteses para fornecer a sua interpretação do Evangelho. Lembra a
tendência das igrejas evangélicas que a cada semana sofre novos desmembramentos
com novas interpretações dos textos bíblicos.
2)
A obra de Roustaing seria a “Revelação da Revelação”?!
A
responsabilidade da publicação é fundamentalmente do responsável encarnado pela
publicação, seja ele o médium e/ou o organizador (ainda mais caracterizando tal
publicação de “Revelação da Revelação”, como foi o caso de Roustaing!). Os
Espíritos podem dizer qualquer coisa e assumir qualquer identidade, e não
podemos, nós encarnados, achar que estamos isentos de responsabilidade por ter
sido “o Espírito que afirmou”. Isso é básico em Espiritismo e qualquer neófito
sabe disso.
Aliás,
a atual explosão editorial de livros de baixa qualidade doutrinária no meio
espírita é a mais triste evidência de que a análise crítica das obras espíritas
em geral, sobretudo aquelas de origem mediúnica, não tem sido, na maioria dos
casos, muito bem empreendida. Essa responsabilidade abrange médiuns, dirigentes
mediúnicos, organizadores de textos, redatores, revisores e editores, entre
outros, que estejam relacionados ao processo de publicação da respectiva obra.
Ademais, a responsabilidade também recai sobre expositores, coordenadores de
grupos de estudo e dirigentes de centros espíritas que estudam ou simplesmente
citam obras fracas doutrinariamente. Igualmente, há grande responsabilidade por
parte dos diretores de livrarias espíritas, quando promovem a venda de livros
fracos ou até mesmo de livros que verdadeiramente violentam as bases
doutrinárias do Espiritismo.
Portanto,
o fato dos Espíritos terem dito a Roustaing que sua obra era a “Revelação da
Revelação ou Nova Revelação” não fornecia a Roustaing o direito de repetir isso
várias vezes no prefácio de sua autoria e colocar a expressão “Revelação da
Revelação ou Espiritismo Cristão” na folha de rosto do livro.
Roustaing,
assumiu a responsabilidade da suposta “revelação” de forma entusiástica, a
ponto de ficar profundamente irritado com a análise de Kardec sobre “Os Quatro
Evangelhos”. Os Espíritos podem ter utilizado, por primeira vez, a expressão,
mas Roustaing não só gostou da ideia, mas a aceitou entusiasticamente e fez um
esforço desmedido para divulgá-la com o claro objetivo de convencer que tal
ideia estava certa. Vale lembrar que Kardec não esteve isento de “mensagens
apócrifas” e fez questão de registrá-las em LM para advertir todos os leitores
e estudiosos da mediunidade dos perigos da aceitação, sem sistemática
avaliação, do que vem do mundo espiritual (vide capítulos 24, 25, 26, 27, e 28
de LM).
Ademais,
Roustaing poderia revisar o livro, retirando alguns excessos ou mesmo enviando
uma pequena amostragem inicial para Allan Kardec emitir uma opinião antes da
publicação. Seria uma atitude de humildade, inteligência e de respeito ao
Codificador. Outra opção seria Roustaing escrever um pequeno artigo, com o
resumo das ideias, e submetê-lo à Revista Espírita de Allan Kardec (daria a
Kardec a possibilidade de publicar ou não, e caso publicasse, o Codificador
poderia redigir um artigo explicando os problemas do texto, minimizando o
impacto do mesmo. Nessa hipótese, mesmo equivocado, Roustaing não estaria
conscientemente trabalhando contra Kardec).
Todo
nós devemos recorrer a pessoas com mais experiência para obter uma segunda
opinião sobre questões de alta gravidade. Tobias afirma para André Luiz em
“Nosso Lar”: “Quando o discípulo está pronto, o mestre aparece”. No entanto, é
fundamental frisar que, pelo livre-arbítrio, cabe ao discípulo reconhecer o
mestre e segui-lo ou não. Roustaing publica seu trabalho ignorando Kardec e até
mesmo buscando superá-lo. Roustaing, portanto, assume os riscos, consequências
e responsabilidades da sua precipitação.
Roustaing, de fato, isolou-se com
Emilie Collignon (não frequentando mais o grupo do senhor Sabó), médium tinha
acabado de conhecer (ver o item 5 - Roustaing não
avaliou Emilie Collignon do presente artigo), pois queria todo o
destaque da “publicação inovadora”, com todo o impacto causado pela surpresa
das “ideias novas”. Na folha de rosto da obra chega a registrar “Recebidos e
Coordenados por J. B. Roustaing”. Ora, não foi a Emilie Collignon que “recebeu”
mediunicamente? Ele coordenou, sem dúvida. Mas recebeu também?! Fica evidente
que Roustaing empenhou esforços prioritários para que a obra e ele como autor
tivessem um destaque editorial estrondoso, independentemente da avaliação do
conteúdo da mensagem. Roustaing, por conseguinte, não parece ter procurado
avaliar adequadamente a obra, nem parece que tinha condições doutrinárias para
tal avaliação.
Roustaing,
ao colocar no cabeçalho da folha de rosto da obra “Revelação da Revelação ou
Espiritismo Cristão”, sugere que existiam dois Espiritismos e, o que é pior,
que o Espiritismo de Kardec não era cristão, mesmo ESE tendo sido publicado
dois anos antes de “Os Quatro Evangelhos”.
Pelo uso do termo “OU”, Roustaing sugere que “Os Quatro Evangelhos”
constituem a “Revelação da Revelação” justamente por representar o “Espiritismo
Cristão”, aparentemente sobrando para Kardec o papel de Codificador do
“Espiritismo Não Cristão”, isto é, da “Revelação Velha”, apesar na “Terceira
Revelação”, naquele momento não ter nem 10 anos.
Nesse
contexto, cabe um questionamento: Que revelação é essa de uma publicação só? E
a missão de Roustaing era tão somente elaborar esse único livro? A sua missão
era tão somente publicar seu único livro? Roustaing fundou instituições?
Palestrou? Elaborou periódicos para divulgação? Escreveu artigos após 1866?
Aparentemente não. Roustaing, que se
saiba, nunca foi um trabalhador efetivo do Movimento Espírita nascente, tendo
frequentado apenas algumas reuniões no grupo do Senhor Sabó em Bordeaux, as
quais rapidamente foram abandonadas. Portanto, Roustaing não ajudou a “Terceira
Revelação” (nem antes da publicação de “Os Quatro Evangelhos” e muito menos
depois) e aparentemente não fez nada pela suposta “Quarta revelação”. Portanto,
que revelação é esta?!
3)
A Igreja católica para Roustaing e para Kardec
No terceiro tomo da obra "Os
Quatro Evangelhos" (p.65) [Roustaing, J.B. Os Quatro Evangelhos, 5 ed. FEB (1971)
p.65-66]
, os autores
ensinam que o futuro espiritual da humanidade estará centralizado na Igreja
Católica e no Papa. Os “Espíritos Reveladores” de Roustaing afirmam o seguinte:
"O chefe da Igreja católica, nessa época em que este qualificativo
terá a sua verdadeira significação, pois que ela estará em via de tornar-se
universal, como sendo a Igreja do Cristo, o chefe da Igreja católica, dizemos,
será um dos principais pilares do edifício. Quando o virdes, cheio de humildade, cingido de uma corda e trazendo
na mão o cajado do viajante..." (p.65)
(grifos meus).
“Debaixo da influência e da
direção do Regenerador, caminhará o chefe da Igreja católica, a qual, repetimos,
será então católica na legítima acepção deste termo, pois que estará em via de
tornar-se universal, como sendo a Igreja do Cristo” (p.66) (grifos meus)
O termo católico significa
“universal” e, por essa razão, os Espíritos orientadores de Roustaing afirmam
que “...nessa época em que este qualificativo terá a sua verdadeira
significação, pois estará em via de tornar-se universal...”.
Obviamente, o mundo com o aumento
da sua população e de sua diversidade cultural tende a aumentar o número de
denominações religiosas e não a buscar uma centralização cada vez maior. É
justamente o contrário. No tempo de Kardec, a humanidade estava atingindo, pela
primeira vez na história, aproximadamente um bilhão de habitantes. Atualmente,
somos mais de sete bilhões de habitantes no planeta e a população planetária
continua aumentando. É por essas e outras, que “o Espiritismo será o futuro das
religiões e não a religião do futuro”, pois não há como unificar todos em um
único grupo religioso, mas, apesar disso, a Doutrina Espírita, cada vez mais,
impactará o pensamento religioso geral da humanidade. O texto de Roustaing, por
conseguinte, trata-se de um pensamento sectário, católico e inexplicável à luz
da Doutrina Espírita.
O
fato de uma instituição ser protegida pelos amigos espirituais não quer dizer
que suas ideias constituam o ápice da espiritualidade no mundo. Em outras
palavras, receber proteção espiritual não constitui exclusividade do(s)
movimento(s) de vanguarda na busca pela espiritualização da Terra. Isso também
é básico para qualquer estudante de Espiritismo.
É
claro que a Igreja Católica Apostólica Romana (ICAR) é protegida pelos mentores
espirituais. Uma instituição religiosa com mais de um bilhão de adeptos vai,
necessariamente, receber proteção espiritual. E isso não é exclusividade da
ICAR ou do movimento espírita. A Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), por
exemplo, e os vários grupos budistas, hinduístas, e quaisquer outros grupos
filosófico-religiosos também recebem proteção espiritual.
O
nível de excelência do conteúdo da mensagem e o tipo, a excelência e as nuances
das orientações espirituais é que divergem significativamente de grupo para
grupo. Além disso, a assimilação da inspiração dos mentores espirituais, por
parte dos adeptos encarnados, tende a ser mais diferenciada do que o próprio
trabalho de orientação espiritual dos mentores espirituais, tanto do ponto de
vista intelectual como do ponto de vista moral.
O
envio de grandes missionários, via reencarnação, para melhorar o nível de
espiritualidade da ICAR, assim como de qualquer outro grupo
filosófico-religioso, é totalmente compreensível, dado o impacto da ICAR na
espiritualidade do ocidente e de todo o mundo e a heterogeneidade dos
caracteres de cada Entidade espiritual e seus vínculos e compromissos
espirituais.
Vale
registrar que antes de o Espiritismo surgir, aproximadamente 160 anos atrás, a
evolução da religiosidade do mundo teria que ser feita através de outras
denominações religiosas, ou através de uma antecipação do advento do
Espiritismo. Entretanto, os Mentores Espirituais da Terra conheciam e
prepararam o momento mais apropriado para uma iniciativa de tal porte. Se,
tendo surgido em meados do século XIX, temos enfrentado tantas dificuldades na
divulgação e na assimilação, em bom nível doutrinário, do Espiritismo, tal
situação seria muito mais complicada se a Doutrina Espírita tivesse surgido
mais cedo.
Com
relação à Reforma Protestante, por exemplo, era, sim, uma tentativa de melhoria
do nível de espiritualidade da ICAR, mas não deixou de ser o mecanismo pelo
qual a cisão da Igreja de Roma acabou ocorrendo, visando a uma maior diversidade
religiosa dentro do Cristianismo. Esse processo não deixou de ser positivo para
o surgimento posterior do Espiritismo. Léon Denis afirma em “No Invisível” que
“O Espiritismo será aquilo que os homens fizerem dele”. Isso vale também para
todos os movimentos humanos.
Por
outro lado, a ICAR, haja vista a opinião dos Espíritos orientadores de Kardec
em “Obras Póstumas”, deixou de receber prioridade, como movimento de vanguarda,
em termos de espiritualidade, isto é, como ferramenta de ponta para a evolução
dos indivíduos mais lúcidos da sociedade terrena. O que não significa que não
receba proteção espiritual, mas proteção não quer dizer que toda a humanidade
vai ser reunida sob a orientação do papa, como o texto de Roustaing afirma
categoricamente, o que é um absurdo à luz da Doutrina Espírita. Se isso fosse
verdade, para que Terceira Revelação? Sim, pois a suposta “Quarta Revelação”,
que surgiu concomitantemente à terceira, já nasceu apontando supostos erros da
terceira e prevendo o retorno ao Catolicismo.
Roustaing
seria, por conseguinte, uma espécie de “Contra-Revelação” para, na melhor das
hipóteses, caracterizar os Espíritas e o Espiritismo como uma espécie de nova
“ordem do catolicismo”, assim como os jesuístas, franciscanos, dominicanos,
entre outras?!
4)
Uma única médium na obra de Roustaing: Emilie Collignon
Apesar
de Chico Xavier, Divaldo Pereira Franco e Yvonne do Amaral Pereira terem
redigido suas obras mediúnicas majoritariamente como médiuns únicos (com
especial exceção para a parceria mediúnica de aproximadamente dez anos entre
Chico Xavier e Waldo Vieira) nunca colocaram suas respectivas obras como sendo
a “Revelação da Revelação” ou “Nova Revelação”. Divaldo Franco enfatiza que se
tratam de obras subsidiárias da Doutrina Espírita.
Nesse
sentido, nosso papel como estudantes do Espiritismo consiste em buscar uma
análise pós-publicação, ou seja, procurarmos as corroborações, visando a um
objetivo maior de controle da concordância universal do ensino dos Espíritos
(CCUEE) para todas as obras tidas como espíritas, mediúnicas ou não.
Vale adir que as obras mediúnicas, mesmo de médiuns respeitáveis, podem
apresentar autores espirituais diferentes e qualidades também diferenciadas.
Mesmo um único autor espiritual, pelo mesmo médium, pode apresentar obras de
diferentes níveis de conteúdo. Nenhuma obra está livre da necessidade de
análise crítica, mediúnica ou não, bem como da necessidade de corroboração
visando ser chancelada pelo CCUEE.
Nesse caso, perguntamos: Divaldo Franco costuma citar Roustaing em suas
palestras? José Raul Teixeira costuma citá-lo? Há, inclusive, uma palestra de
Raul Teixeira em que ele critica e coloca Roustaing e Ubaldi, entre outros,
fora do Espiritismo (A palestra denomina-se “O Centro Espírita e a Dinâmica do
Amor”). Raul Teixeira estaria equivocado? Ademais, conteúdos roustainguistas
têm contribuído para o avanço das discussões doutrinárias espiritas, tendo-se
em vista suas exposições de maior qualidade e/ou seus estudos mais sérios?!
Bezerra de Menezes, que quando encarnado foi roustainguista, tem recomendado o
estudo de Roustaing através da mediunidade de Divaldo Franco?
5)
Roustaing não
avaliou Emilie Collignon
Toda
faculdade mediúnica é “fugidia” (vide “O que é o Espiritismo”), ou seja, toda
potencialidade mediúnica é “oscilante” (Divaldo Pereira Franco utiliza essa
palavra e enfatiza essa realidade em várias de suas palestras). O próprio
professor Herculano Pires, ao analisar a potencialidade mediúnica de José Pedro
de Freitas, conhecido como Zé Arigó (médium do Doutor Fritz), comenta que a
potencialidade mediúnica de Arigó vinha diminuindo com a idade. O mesmo
aconteceu com Daniel Dunglas Home, considerado um dos maiores médiuns do século
XIX (vide os vários artigos que Allan Kardec escreveu sobre Daniel Dunglas Home
na Revista Espírita e também a obra de Arthur Conan Doyle “História do
Espiritismo”, entre outras).
Na
história do movimento espírita (brasileiro e mundial), o número de médiuns que
começaram a tarefa muito bem e não conseguiram persistir no ideal superior
abraçado é muito grande. Portanto, para quem tem algum nível mínimo de
responsabilidade doutrinária, para lidar seriamente com o fenômeno mediúnico,
tal recomendação é mais do que fundamental, é óbvia. Roustaing foi precipitado
e arriscou-se demasiadamente. Vejamos o
que o advogado de Bordeaux afirma na página 58 de seu prefácio [Roustaing, J.B. Os Quatro Evangelhos, 5
ed. FEB (1971) p.58]:
“Em Janeiro de 1861, completamente
restabelecido, cuidei de voltar ao exercício dessa amada profissão...”
“Um distinto clínico daquela
cidade me falou da possibilidade das comunicações do mundo corpóreo com o mundo
espiritual, da doutrina e da ciência espíritas, como fruto dessa comunicação,
objetivando uma revelação geral. Minha primeira impressão foi a de
incredulidade devido à ignorância...”.
Portanto, em janeiro de 1861, Roustaing estava
convalescendo de uma grave enfermidade e pela primeira vez ouviu falar de
Espiritismo. Não tinha a mínima noção do assunto.
Na
página 59 Roustaing começa um dos parágrafos afirmando:
“Li O Livro dos Espíritos”.
Depois de breves comentários, já na página 60, Roustaing
relata:
“Li em seguida O Livro dos Médiuns e nele se
me deparou uma explicação racional: da possibilidade das comunicações do mundo
corpóreo com o mundo espiritual...”
Roustaing chega a afirmar nessa mesma página 60:
“O mundo espiritual era bem o reflexo do
mundo corporal”.
Em verdade, o mundo corporal é que o reflexo do mundo
espiritual, mas não seremos muito exigentes com Roustaing. Já na página 61,
Roustaing comenta:
“Perlustrei os livros das duas revelações, o
Antigo e o Novo Testamento”.
Nessa mesma página Roustaing comenta:
“Mas,
se por um lado a moral sublime do Cristo resplandeceu a meus olhos em toda a
sua pureza, em todo o seu fulgor, como brotando de uma fonte divina, por outro
lado, tudo permaneceu obscuro, incompreensível e impenetrável à minha razão, no
tocante à revelação sobre a origem e a natureza espirituais de Jesus, sobre a
sua posição espírita em relação a Deus e ao nosso planeta, sobre os seus poderes
e a sua autoridade.”.
Portanto,
foi Roustaing, que não estando satisfeito, por não haver estudado e entendido
minimamente LE e LM, que deseou uma nova revelação. Vejamos comentários de
Roustaing registrados na página 64:
“Na véspera do dia 24 de Junho de
1861...” teve uma comunicação
supostamente do Espírito S. João Batista e “em Dezembro de 1861” foi sugerido a
Roustaing “...ir a casa de Mme. Collignon, que eu não tinha a satisfação de
conhecer e a quem devia ser apresentado...”. (grifos meus)
Roustaing
deixa claro desconhecer por completo Madame Collignon!
Continua Roustaing (p. 64):
“Oito
dias depois voltei a casa de Mme. Collignon...”
E,
nesse mesmo dia, há uma comunicação mediúnica definitiva na qual as Entidades conclamam:
“Metei
mãos à obra...”
“Cumpre
que essa luz lhes seja mostrada...”
“Mostrai-lhes
a verdade...”
“Com
esse objetivo nós, oh! bem-amados, vimos incitar-vos a que empreendais a
explicação dos Evangelhos em espírito e verdade, explicação que preparará a
unificação das crenças entre os homens e à qual podeis dar o nome de Revelação
da Revelação”.
Em
menos de um ano, um completo ignorante teve condições de conhecer profundamente
a obra de Allan Kardec?! E, ademais, esse neófito começou a trabalhar com a
médium Emilie Collignon em questão de dias após tê-la conhecido! E, como se não
bastasse, estava coordenando a “revelação da revelação”! É ou não é muita
ingenuidade?!
O
fato de Madame Collignon ter sido elogiada por Kardec anteriormente, não quer
dizer que a mesma estava bem assistida espiritualmente meses ou anos depois. E
mesmo que ela estivesse bem assessorada, Roustaing deveria ter feito testes
para avaliar não somente ela, mas os Espíritos que estavam transmitindo
informações para ela. Ele não fez nem uma coisa nem outra.
Alguns
estudiosos espíritas afirmam que Emilie Collignon não aceitava o conteúdo das
mensagens (talvez até por sentir a vibração das entidades comunicantes), mas,
segundo esses irmãos, teria sido Roustaing quem insistiu para que as mesmas
fossem publicadas.
O
mais interessante e paradoxal na atitude dos roustainguistas, é que, para
respaldar Emilie Collignon, eles repetem exaustivamente que Kardec fez
comentários positivos a respeito dela. Engraçado! Nesses horas, os
roustainguistas lembram de citar o opinião do Codificador do Espiritismo. Os
roustainguistas também deveriam considerar as impressões de Allan Kardec,
quando o Codificador deixa claro que a obra de Roustaing é “opinião pessoal”
dos Espíritos que a ditaram e que tal obra “não pode ser considerada parte
constituinte do Espiritismo”.
Aliás,
quando Kardec afirma que a obra “Os Quatro Evangelhos” é “opinião pessoal” dos
Espíritos que a ditaram, e ele, Kardec, deixava inteiramente para os
respectivos autores a responsabilidade daquilo que afirmavam, fica mais do que
evidente que Allan Kardec não acreditava que os Evangelistas e os Apóstolos
eram os autores de “Os Quatro Evangelhos”.
6)
Roustaing evocou
vários Espíritos, incluindo o precursor João Batista
Roustaing
afirma que evocou, mentalmente, João Batista, seu pai e seu guia protetor, sem
comunicar o médium que o acompanhava. Isso obviamente é evocação e pode até
ser, a depender de alguns detalhes, evidência do caráter ostensivo da
mediunidade de Collignon, mas não é, de maneira nenhuma, garantia da identidade
dos Espíritos. Admitindo, por hipótese, que obsessores estivessem assistindo
Roustaing e Collignon, a partir do processo de leitura do pensamento
(“telepatia”), os obsessores saberiam quem Roustaing estava evocando. E ele
estava evocando “ninguém menos” do que João Batista! Isso além de outros
Espíritos específicos!
Nem
mães desesperadas evocavam tanta gente assim quando procuravam o Chico Xavier!
E nem elas evocariam São João Batista, precursor de Jesus de Nazaré! Digamos
que, além de volumosa (3 Espíritos de uma só vez!), não foi uma “evocação
humilde” por parte de Roustaing!
Ademais,
Roustaing não seguiu o princípio xavierino que afirma que “o telefone toca de
lá para cá”. Ainda assim, o exercício poderia ser super positivo, desde que o
recebimento das mensagens não implicasse necessariamente na publicação das
respectivas mensagens. Chico Xavier queimou malas de mensagens mediúnicas no
início de suas tarefas; Divaldo Franco também queimou malas; Raul Teixeira
idem. Roustaing, pelo jeito, publicou tudo!
Em
suma, os Espíritos assinariam o nome da(s) personagem(ns) evocada(s) por
Roustaing, através do médium que ignorava a evocação, para que Roustaing,
neófito em Espiritismo, ficasse convicto da autenticidade não só da
comunicação, mas igualmente das assinaturas e de sua “missão providencial”
(dada à sua ignorância em matéria de mediunidade). Isso é tão elementar em
Espiritismo que fica claro o nível de risco a que se submetiam Roustaing e
Collignon. Vou transcrever o texto roustainguista para facilitar para quem não
tem a famigerada obra (perceba que para Roustaing o processo de recebimento já
“provou” sua autenticidade e ele submetia-se à tarefa como um “servo”, ou seja,
nenhuma postura de análise crítica foi assumida pelo advogado):
“Na véspera do dia 24 de Junho de
1861, eu rogara a Deus, no sigilo de uma prece fervorosa, que permitisse ao
Espírito de João Batista manifestar-se por um médium, que se achava então em
minha companhia e com o qual diariamente me consagrava a trabalhos assíduos. Pedira
também a graça da manifestação do Espírito de meu pai e do guia protetor.
Essas manifestações se produziram
espontaneamente, com surpresa do médium, a quem eu deixara ignorante da minha
prece. Constituíram para mim uma fonte de alegria imensa, com o me provarem que a minha súplica fora ouvida e que Deus me aceitava por seu servo”. (grifos meus)
[Roustaing, J.B. Os Quatro Evangelhos, 5 ed. FEB (1971) p.64]
7)
Sobre João Evangelista, Paulo e outros Espíritos que
seriam autores tanto das obras de Kardec como da obra de Roustaing
A
questão concernente a João Evangelista estar presente, supostamente, tanto na
obra de Kardec como na obra de Roustaing não diz respeito, evidentemente, ao
dom da ubiquidade e eventuais dificuldades para a Entidade espiritual
manifestar-se em dois lugares diferentes, tais como Paris (com a equipe
mediúnica e espiritual de “O Espírito de Verdade” e Allan Kardec) e Bordeaux
(com os Espíritos que manifestaram com Emilie Collignon e J. B. Roustaing).
Vale lembrar que André Luiz manifestava-se em Pedro Leopoldo-MG e em
Uberaba-MG, respectivamente através de Chico Xavier e Waldo Vieira, para a
transmissão da obra “Evolução em Dois Mundos”.
O
problema, obviamente, diz respeito ao conteúdo das obras que são totalmente
discordantes. Dessa forma, a pergunta principal permanece vigente: como é que o
mesmo Espírito afirma uma tese para um médium e apresenta outra completamente
diferente para outro médium? Como é que o mesmo Espírito, ainda mais do nível
do Apóstolo e Evangelista João, ensina conteúdos discordantes em dois ambientes
diferentes?
Logicamente,
isso é inadmissível, ainda mais para Espíritos desse nível. Dessa forma,
podemos concluir que pelo menos uma das mensagens não é verdadeira.
Portanto,
ou não se trata do mesmo Espírito, apenas de um Espírito mistificador usando de
um nome célebre para ser mais facilmente aceito ou estamos frente a um problema
seríssimo de “filtração mediúnica”?
De
qualquer maneira, se as obras são discordantes em vários tópicos, não podem ter
sido elaboradas pelo mesmo grupo de Espíritos e não podem ser estudadas dentro
de uma mesma diretriz doutrinária.
Novamente,
enfatizamos que quem precisa provar que suas novas informações têm consistência
doutrinária é aquele que acrescenta “novidades” e, sobretudo, que apresenta
teses discordantes das bases doutrinárias (tal tarefa demonstrou-se impossível,
mas a divulgação da obra do advogado de Bordeaux continua). Nesse contexto,
quem tem que provar a coerência doutrinária de Roustaing são os
roustainguistas. Isso se o companheiro
acreditar ser “roustainguista e espírita”, pois se for apenas roustainguista e
não um suposto “espírita roustainguista”, ele está no seu total direito e não
cabe nenhuma reprovação de nós, espíritas.
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