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quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Reflexões Adicionais sobre os erros metodológicos de Roustaing


Leonardo Marmo Moreira

                Buscando aprofundar o estudo sobre os problemas da obra roustainguista, para que as respectivas reflexões tornem-se mais didáticas para os confrades, objetivamos retornar à análise dos problemas destacados em artigos anteriores de nossa autoria, sobretudo do texto intitulado “Os Erros Metodológicos de Roustaing”.
                Antes de retomarmos a análise dos tópicos já discutidos inicialmente no artigo supracitado, devemos frisar que Kardec deixou claro que nós esperaríamos que as utopias fossem realizadas. Essa explicação do Codificador consiste em uma outra maneira de dizer aquilo que está exarado em “O Livro dos Médiuns” (LM), de autoria de Erasto, “É preferível rejeitar dez verdades do que aceitar uma única mentira, uma única teoria falsa” e também em “O Evangelho Segundo o Espiritismo” (ESE): “Na dúvida, abstém-te”.
Em um “terreno” tão “minado” como os estudos do psiquismo, do parapsiquismo, da vida além-túmulo e do mundo espíritual, tais cuidados são de fundamental importância para que não aceitemos e propaguemos teses que possam estar equivocadas. O Espiritismo fornece totais condições para vencermos a superstição, o místico, o mágico, o maravilhoso, o miraculoso, o fantástico e a ficção, em questões espirituais. Entretanto, o descuido em relação a “novas revelações” pode fazer com que misturemos o “joio e o trigo”.
                Nesse contexto, vale afirmar que os princípios básicos da Doutrina Espírita vêm sendo sistematicamente confirmados por várias evidências de diversas fontes, de dentro e de fora do movimento espírita. O mesmo não pode ser dito das “teses” da obra de Roustaing. Portanto, no mínimo, a obra de Roustaing deveria ser deixada em uma espécie de “quarentena”, até que fossem comprovadas suas propostas estranhas à Doutrina Espírita, pelo menos por parte daqueles que se consideram “espíritas roustainguistas” (aliás, foi justamente nesse sentido a recomendação de Kardec concernente à atitude que nós espíritas deveríamos ter perante essa obra). De fato, se o indivíduo é roustainguista apenas (e não sendo espírita, não participa e nem divulga suas ideias em eventos e instituições espíritas), ele está no seu pleno direito de optar, através do livre-arbítrio, pelo que acha melhor para si (assim como ocorre com os irmãos católicos, protestantes, budistas e de todas denominações), e não nos cabe qualquer tipo de reprovação e nem mesmo qualquer interesse por essa opinião.
                Importante registrar também que são os supostos “espíritas roustainguistas” que necessitam provar que suas supostas “inovações” estão certas do ponto de vista espírita e não nós espíritas que necessitamos provar que as mesmas estão erradas, até porque não podemos dispor de todo o tempo do mundo para refutar o absurdo, sendo que existem diversas outras questões doutrinárias tão ou mais relevantes para que dediquemos atenção. Ademais, por mais inconsistentes que tais ideias esdrúxulas sejam, como é usual ocorrer em se tratando de teses de âmbito religioso, sempre existem companheiros profundamente aficionados, por diversos motivos, o que enfatiza que nosso papel é estudar, refletir e informar, sem a pretensão de convencer a quem quer que seja.
Assim sendo, em nosso trabalho espírita, dedicamos uma pequena parcela de tempo para tais questões, devido a um motivo básico: a aceitação de Roustaing por confrades espíritas, denota, eloquentemente, o baixo nível de compreensão doutrinária, o que consiste em sério problema do Movimento Espírita. Realmente, a aceitação de tais “hipóteses” demonstra sérias dificuldades de entendimento doutrinário por parte do Movimento Espírita, ou seja, demonstra grandes limitações para a compreensão do que é Espiritismo e do que não é Espiritismo. Além disso, em função da histórica e maciça propaganda/divulgação roustainguista em nossos arraiais, que prossegue, inclusive, em pleno ano de 2016, essa discussão, infelizmente, é eventualmente levantada, por mais que a aceitação das ideias roustainguistas no seio do movimento espírita seja incompreensível.

                Em todo o caso, é possível questionar:

                Temos evidências concretas de um Espírito instrutor de grandes comunidades (ou de qualquer Espírito (obviamente em condição humana)) que reencarnou como “criptógamo carnudo” (uma espécie de lesma ou lagarta)?

                Quais são as obras de elevada qualidade mediúnico-doutrinária que comentam sobre Espíritos que nunca precisaram reencarnar? André Luiz ou Manoel Philomeno de Miranda, por exemplo, comentam sobre alguma entidade nessas condições em suas obras? Há também obras fidedignas doutrinariamente que também retratam colônias de Espíritos que nunca reencarnaram?

                Os roustainguistas rejeitam a obra de André Luiz “Evolução em Dois Mundos” (EDM)? Afinal, sendo tal obra um resumo da evolução anímica do Espírito imortal, se fosse possível a evolução sem encarnação, André Luiz deveria ter comentado sobre isso. Vale lembrar que Emmanuel prefacia todos os livros de André Luiz, inclusive EDM, chancelando seus respectivos conteúdos.

                André Luiz em “Evolução em Dois Mundos” (o que está perfeitamente de acordo com as bases kardequianas) afirma que no início do processo evolutivo a necessidade da reencarnação é maior e os intervalos entre existências físicas tendem a ser menores. A medida que o Espírito vai evoluindo, a tendência é que os intervalos entre encarnações tendem a ir ficando maiores, uma vez que o Espírito mais lúcido consegue aproveitar de forma mais efetiva seu período na chamada “intermissão” (período entre reencarnações). Roustaing defende uma ilógica ideia contrária. O princípio inteligente que veio do reino animal, assim que chegasse à condição hominal, pararia de reencarnar e só voltaria se fosse por castigo, podendo voltar como uma espécie de “minhoca”, “lesma” ou “lagarta” (os “criptógamos carnudos”). O que é parece mais lógico? O que soa mais racional, as ideias de Kardec e de André Luiz ou a proposta de Roustaing?

                A obra de Roustaing defende que a evolução anímica passa pelos níveis mineral, vegetal, animal até chegar ao hominal. Antes da chegada à condição hominal, o princípio espiritual, em nível animal, estaria, a priori, reencarnando. Daí, a partir do início da transição do animal para o hominal, o princípio inteligente poderia evoluir somente no mundo espiritual. Nâo é estranha essa contradição? Qual evidência corrobora tal ideia?
               
As hipóteses da virgindade de Maria de Nazaré e do corpo fluídico de Jesus receberam corroboração por obras de elevada qualidade mediúnica e/ou doutrinária, tais como André Luiz e Manoel Philomeno de Miranda? Podemos citar, igualmente, a obra de Joanna de Ângelis “Jesus e o Evangelho à luz da Psicologia Profunda”, na qual a figura de Jesus é esmiuçada e é claramente demonstrado que o Mestre de Nazaré não tinha nenhuma característica física que o diferenciasse dos homens comuns de seu tempo. Seu diferencial era, obviamente, sua evolução espiritual. Ainda assim, vale a reflexão: se as ideias de “Maria virgem” (forma como “Os Quatro Evangelhos” citam Maria de Nazaré exaustivamente em sua Introdução, em uma clara fixação católica) e de “Jesus fluídico” fossem confirmadas, Maria e Jesus seriam mais dignos de admiração? Fornecendo o benefício da dúvida, não seria mais aconselhável para um Espírita, a priori, ficar com a opinião do Codificador Allan Kardec que, em “A Gênese”, discorda das duas ideias?

                Quais obras de elevada qualidade doutrinária (mediúnica ou não) caracterizam a Igreja Católica como o futuro religioso do mundo? Kardec, Cairbar Schutel, Herculano Pires e Léon Denis, entre outros, pensam que não. Todos esses expoentes do Espiritismo estariam errados e Roustaing estaria certo?

                Ora, se não temos evidências científicas e/ou mediúnico-doutrinárias de elevada qualidade de tais realidades, como podemos aceitar esses conceitos como desdobramentos das bases kardequianas?

                Vale lembrar que a confirmação não pode vir apenas de médiuns de uma única instituição, sobretudo quando essa instituição é claramente roustainguista. Obviamente, os médiuns de uma mesma instituição podem ser, e usualmente são encontrados, submetidos à influência dos mesmos Espíritos ou, pelo menos, de Espíritos semelhantes em evolução espiritual e intenções. Há também a influência anímica na comunicação mediúnica, na qual crenças do médium menos habilidoso em neutralizar suas opiniões quando em transe mediúnico, podem aparecer como ideias da Entidade comunicante. Corroborações obtidas a partir de médiuns inexpressivos e/ou de obras de baixo nível doutrinário, não constituem verdadeira confirmação, à luz da Doutrina Espírita, pois não consistem em evidências da “Universalidade do Ensino dos Espíritos”.
                Alguns confrades podem supor que o comentário acima é parcial, mas vejamos: se não usarmos desse critério, como deveremos opinar em novas polêmicas, tais como aquela que afirma ser Chico Xavier foi a reencarnação de Allan Kardec? Essa hipótese já foi chancelada por várias mensagens mediúnicas e por vários “espíritas famosos”. Também foi rejeitada por grande grupo de notáveis trabalhadores espíritas. Portanto, devemos avaliar o conteúdo da mensagem (abrangendo suas propostas principais e secundárias, sua lógica, sua coerência científica, sua objetividade, sua linguagem etc.), o caráter moral do médium (e também seu preparo intelectual e doutrinário) e a assinatura/identificação, para, subsequentemente, estudar várias outras mensagens, analisando se essas outras também passam por tais critérios, para, finalmente, buscar uma corroboração inicial entre diferentes mensagens obtidas por diferentes e bons médiuns. Só assim, tal “inovação” estará a caminho de uma confirmação que possa sugerir um respaldo do “Controle da Concordância Universal do Ensino dos Espíritos” (CCUEE).
                Vejamos os erros metodológicos de Roustaing e analisemos um pouco mais tais tópicos:

1)      Roustaing e a hipervalorização do texto bíblico

               Os Espíritos orientadores de Roustaing poderiam narrar o que de fato aconteceu ou até mesmo comentar um único Evangelho, fazendo os incrementos e ressalvas necessárias. Por que comentar todos os textos?
               O fato dos Espíritos orientadores de Roustaing comentarem algo sobre o texto bíblico e fazerem alguma eventual ressalva a alguma passagem do novo testamento e/ou alguma impressão do redator do respectivo texto não quer dizer que o texto bíblico não tenha sido superestimado. Ora, se os Espíritos não comentassem nada, não haveria obra, ainda mais uma obra tão extensa e prolixa quanto “Os Quatro Evangelhos” de J. B. Roustaing.
               Vale lembrar que as duas principais obras do Espiritismo são “O Livro dos Espíritos” (LE) e “O Livro dos Médiuns” (LM), o qual foi considerado por Allan Kardec o desdobramento natural de LE. Só depois da publicação de LE, LM, além da obra “O que é o Espiritismo” e dos primeiros volumes (8 anos de publicações mensais, a partir de janeiro de 1858) da Revista Espírita, com as bases doutrinárias já bem estabelecidas, as quais nasceram do análise do fenômeno mediúnico, isto é, dentro de um âmbito científico e não propriamente religioso, irá surgir “O Evangelho Segundo Espiritismo” (ESE) (1864). Essa sequência de obras da Codificação não ocorreu, obviamente, “por acaso”. Os Mentores espirituais sabiam que seria mais interessante construir bases fundamentais na ciência para depois surgir os aspectos filosófico e religioso. Caso contrário, o Espiritismo não conseguiria nunca fugir dos rotineiros debates filosóficos e religiosos inócuos, ou seja, que não têm grandes possibilidades de serem concluídos satisfatoriamente.
O título da obra publicada por Allan Kardec em 1864 é “O Evangelho segundo o Espiritismo” e não “O Espiritismo segundo o Evangelho”, como foi registrado recentemente por um confrade. Como as bases doutrinárias já estavam bem consolidadas, Kardec poderia analisar a essência do pensamento de Jesus, que foi indicado em LE como o “ser mais perfeito que Deus nos ofereceu como modelo e guia”. Portanto, quando surge a análise dos textos evangélicos, a partir do desenvolvimento da terceira parte de LE, intitulada “As Leis Morais”, os princípios básicos da Doutrina Espírita já estavam bem consolidados, através da análise do conteúdo da mensagem obtida por vários médiuns.
               Roustaing e/ou seus Espíritos orientadores, diferentemente do trabalho de Kardec, agem como “reformadores cristãos”, estabelecendo uma espécie de “nova seita cristã” com suas particularidades e diferenças acentuadas em relação ao Espiritismo. Assim como Lutero e os reformadores cristãos, a obra de Roustaing é fundamentada na análise do texto bíblico e em uma nova interpretação da mesma.
               Segundo Herculano Pires, em “O Verbo e a Carne”, o que tem de Espiritismo em “Os Quatro Evangelhos” foi o que Roustaing “decalcou” de LE e LM, que o advogado de Bordeaux já havia lido (pode até ter lido, mas claramente não estudou minimamente antes de começar sua própria obra).
               Aliás, a própria “Queda Espiritual” não deixa de ser uma nova roupagem da velha e totalmente ultrapassada, à luz da Doutrina Espírita, intepretação do primeiro livro do Velho Testamento (VT), intitulado “Gênesis”. Portanto, a obra “Os Quatro Evangelhos” não constitui tão somente em uma nova interpretação do Novo Testamento (NT), mas igualmente sofre o impacto da tendência à aceitação quase que literal do texto bíblico, incluindo o VT, o “Gênesis” e o mito relacionado a Adão e Eva.
               De fato, o título completo da obra de Roustaing é “Os Quatro Evangelhos Seguidos dos mandamentos explicados em espírito e em verdade pelos Evangelistas assistidos pelos Apóstolos e Moisés”. A menção aos “mandamentos” é claramente uma indicação que a obra também comtempla algo do VT. O próprio destaque a Moisés no título do livro também reforça essa ideia de que a obra foi elaborada por “autoridades” do NT (os “Evangelistas” e os “Apóstolos”) e do VT (“Moisés”).  Assim sendo, é interessante constatar que a suposta “Revelação da Revelação” ou “Nova revelação” resgata uma série de ideias antigas, tais como a “Queda Espíritual”, que nasceu com o primeiro livro do VT, “Gênesis”.
               O Espiritismo, em suas bases kardequianas, não nasce como reforma religiosa, mas nasce como ciência, através da análise do fenômeno paranormal, ou seja, Kardec parte dos efeitos (os mais diversos tipos de fenômenos paranormais, anímicos e mediúnicos, de efeitos intelectuais e de efeitos físicos) para remontar às causas (a imortalidade da alma, a existência do mundo espiritual e a comunicabilidade dos espíritos).  A obra de Roustaing, ao contrário, postula uma série de hipóteses para fornecer a sua interpretação do Evangelho. Lembra a tendência das igrejas evangélicas que a cada semana sofre novos desmembramentos com novas interpretações dos textos bíblicos.

2)      A obra de Roustaing seria a “Revelação da Revelação”?!

A responsabilidade da publicação é fundamentalmente do responsável encarnado pela publicação, seja ele o médium e/ou o organizador (ainda mais caracterizando tal publicação de “Revelação da Revelação”, como foi o caso de Roustaing!). Os Espíritos podem dizer qualquer coisa e assumir qualquer identidade, e não podemos, nós encarnados, achar que estamos isentos de responsabilidade por ter sido “o Espírito que afirmou”. Isso é básico em Espiritismo e qualquer neófito sabe disso.
Aliás, a atual explosão editorial de livros de baixa qualidade doutrinária no meio espírita é a mais triste evidência de que a análise crítica das obras espíritas em geral, sobretudo aquelas de origem mediúnica, não tem sido, na maioria dos casos, muito bem empreendida. Essa responsabilidade abrange médiuns, dirigentes mediúnicos, organizadores de textos, redatores, revisores e editores, entre outros, que estejam relacionados ao processo de publicação da respectiva obra. Ademais, a responsabilidade também recai sobre expositores, coordenadores de grupos de estudo e dirigentes de centros espíritas que estudam ou simplesmente citam obras fracas doutrinariamente. Igualmente, há grande responsabilidade por parte dos diretores de livrarias espíritas, quando promovem a venda de livros fracos ou até mesmo de livros que verdadeiramente violentam as bases doutrinárias do Espiritismo.
Portanto, o fato dos Espíritos terem dito a Roustaing que sua obra era a “Revelação da Revelação ou Nova Revelação” não fornecia a Roustaing o direito de repetir isso várias vezes no prefácio de sua autoria e colocar a expressão “Revelação da Revelação ou Espiritismo Cristão” na folha de rosto do livro.
Roustaing, assumiu a responsabilidade da suposta “revelação” de forma entusiástica, a ponto de ficar profundamente irritado com a análise de Kardec sobre “Os Quatro Evangelhos”. Os Espíritos podem ter utilizado, por primeira vez, a expressão, mas Roustaing não só gostou da ideia, mas a aceitou entusiasticamente e fez um esforço desmedido para divulgá-la com o claro objetivo de convencer que tal ideia estava certa. Vale lembrar que Kardec não esteve isento de “mensagens apócrifas” e fez questão de registrá-las em LM para advertir todos os leitores e estudiosos da mediunidade dos perigos da aceitação, sem sistemática avaliação, do que vem do mundo espiritual (vide capítulos 24, 25, 26, 27, e 28 de LM).
Ademais, Roustaing poderia revisar o livro, retirando alguns excessos ou mesmo enviando uma pequena amostragem inicial para Allan Kardec emitir uma opinião antes da publicação. Seria uma atitude de humildade, inteligência e de respeito ao Codificador. Outra opção seria Roustaing escrever um pequeno artigo, com o resumo das ideias, e submetê-lo à Revista Espírita de Allan Kardec (daria a Kardec a possibilidade de publicar ou não, e caso publicasse, o Codificador poderia redigir um artigo explicando os problemas do texto, minimizando o impacto do mesmo. Nessa hipótese, mesmo equivocado, Roustaing não estaria conscientemente trabalhando contra Kardec).
Todo nós devemos recorrer a pessoas com mais experiência para obter uma segunda opinião sobre questões de alta gravidade. Tobias afirma para André Luiz em “Nosso Lar”: “Quando o discípulo está pronto, o mestre aparece”. No entanto, é fundamental frisar que, pelo livre-arbítrio, cabe ao discípulo reconhecer o mestre e segui-lo ou não. Roustaing publica seu trabalho ignorando Kardec e até mesmo buscando superá-lo. Roustaing, portanto, assume os riscos, consequências e responsabilidades da sua precipitação.
               Roustaing, de fato, isolou-se com Emilie Collignon (não frequentando mais o grupo do senhor Sabó), médium tinha acabado de conhecer (ver o item 5 - Roustaing não avaliou Emilie Collignon do presente artigo), pois queria todo o destaque da “publicação inovadora”, com todo o impacto causado pela surpresa das “ideias novas”. Na folha de rosto da obra chega a registrar “Recebidos e Coordenados por J. B. Roustaing”. Ora, não foi a Emilie Collignon que “recebeu” mediunicamente? Ele coordenou, sem dúvida. Mas recebeu também?! Fica evidente que Roustaing empenhou esforços prioritários para que a obra e ele como autor tivessem um destaque editorial estrondoso, independentemente da avaliação do conteúdo da mensagem. Roustaing, por conseguinte, não parece ter procurado avaliar adequadamente a obra, nem parece que tinha condições doutrinárias para tal avaliação.
Roustaing, ao colocar no cabeçalho da folha de rosto da obra “Revelação da Revelação ou Espiritismo Cristão”, sugere que existiam dois Espiritismos e, o que é pior, que o Espiritismo de Kardec não era cristão, mesmo ESE tendo sido publicado dois anos antes de “Os Quatro Evangelhos”.  Pelo uso do termo “OU”, Roustaing sugere que “Os Quatro Evangelhos” constituem a “Revelação da Revelação” justamente por representar o “Espiritismo Cristão”, aparentemente sobrando para Kardec o papel de Codificador do “Espiritismo Não Cristão”, isto é, da “Revelação Velha”, apesar na “Terceira Revelação”, naquele momento não ter nem 10 anos.
Nesse contexto, cabe um questionamento: Que revelação é essa de uma publicação só? E a missão de Roustaing era tão somente elaborar esse único livro? A sua missão era tão somente publicar seu único livro? Roustaing fundou instituições? Palestrou? Elaborou periódicos para divulgação? Escreveu artigos após 1866? Aparentemente não.  Roustaing, que se saiba, nunca foi um trabalhador efetivo do Movimento Espírita nascente, tendo frequentado apenas algumas reuniões no grupo do Senhor Sabó em Bordeaux, as quais rapidamente foram abandonadas. Portanto, Roustaing não ajudou a “Terceira Revelação” (nem antes da publicação de “Os Quatro Evangelhos” e muito menos depois) e aparentemente não fez nada pela suposta “Quarta revelação”. Portanto, que revelação é esta?!


3)      A Igreja católica para Roustaing e para Kardec

               No terceiro tomo da obra "Os Quatro Evangelhos" (p.65) [Roustaing, J.B. Os Quatro Evangelhos, 5 ed. FEB (1971) p.65-66]
, os autores ensinam que o futuro espiritual da humanidade estará centralizado na Igreja Católica e no Papa. Os “Espíritos Reveladores” de Roustaing afirmam o seguinte: "O chefe da Igreja católica, nessa época em que este qualificativo terá a sua verdadeira significação, pois que ela estará em via de tornar-se universal, como sendo a Igreja do Cristo, o chefe da Igreja católica, dizemos, será um dos principais pilares do edifício. Quando o virdes, cheio de humildade, cingido de uma corda e trazendo na mão o cajado do viajante..." (p.65) (grifos meus).

               “Debaixo da influência e da direção do Regenerador, caminhará o chefe da Igreja católica, a qual, repetimos, será então católica na legítima acepção deste termo, pois que estará em via de tornar-se universal, como sendo a Igreja do Cristo” (p.66) (grifos meus)
              
               O termo católico significa “universal” e, por essa razão, os Espíritos orientadores de Roustaing afirmam que “...nessa época em que este qualificativo terá a sua verdadeira significação, pois estará em via de tornar-se universal...”.
               Obviamente, o mundo com o aumento da sua população e de sua diversidade cultural tende a aumentar o número de denominações religiosas e não a buscar uma centralização cada vez maior. É justamente o contrário. No tempo de Kardec, a humanidade estava atingindo, pela primeira vez na história, aproximadamente um bilhão de habitantes. Atualmente, somos mais de sete bilhões de habitantes no planeta e a população planetária continua aumentando. É por essas e outras, que “o Espiritismo será o futuro das religiões e não a religião do futuro”, pois não há como unificar todos em um único grupo religioso, mas, apesar disso, a Doutrina Espírita, cada vez mais, impactará o pensamento religioso geral da humanidade. O texto de Roustaing, por conseguinte, trata-se de um pensamento sectário, católico e inexplicável à luz da Doutrina Espírita.
O fato de uma instituição ser protegida pelos amigos espirituais não quer dizer que suas ideias constituam o ápice da espiritualidade no mundo. Em outras palavras, receber proteção espiritual não constitui exclusividade do(s) movimento(s) de vanguarda na busca pela espiritualização da Terra. Isso também é básico para qualquer estudante de Espiritismo.
É claro que a Igreja Católica Apostólica Romana (ICAR) é protegida pelos mentores espirituais. Uma instituição religiosa com mais de um bilhão de adeptos vai, necessariamente, receber proteção espiritual. E isso não é exclusividade da ICAR ou do movimento espírita. A Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), por exemplo, e os vários grupos budistas, hinduístas, e quaisquer outros grupos filosófico-religiosos também recebem proteção espiritual.
O nível de excelência do conteúdo da mensagem e o tipo, a excelência e as nuances das orientações espirituais é que divergem significativamente de grupo para grupo. Além disso, a assimilação da inspiração dos mentores espirituais, por parte dos adeptos encarnados, tende a ser mais diferenciada do que o próprio trabalho de orientação espiritual dos mentores espirituais, tanto do ponto de vista intelectual como do ponto de vista moral.
O envio de grandes missionários, via reencarnação, para melhorar o nível de espiritualidade da ICAR, assim como de qualquer outro grupo filosófico-religioso, é totalmente compreensível, dado o impacto da ICAR na espiritualidade do ocidente e de todo o mundo e a heterogeneidade dos caracteres de cada Entidade espiritual e seus vínculos e compromissos espirituais.
Vale registrar que antes de o Espiritismo surgir, aproximadamente 160 anos atrás, a evolução da religiosidade do mundo teria que ser feita através de outras denominações religiosas, ou através de uma antecipação do advento do Espiritismo. Entretanto, os Mentores Espirituais da Terra conheciam e prepararam o momento mais apropriado para uma iniciativa de tal porte. Se, tendo surgido em meados do século XIX, temos enfrentado tantas dificuldades na divulgação e na assimilação, em bom nível doutrinário, do Espiritismo, tal situação seria muito mais complicada se a Doutrina Espírita tivesse surgido mais cedo.
Com relação à Reforma Protestante, por exemplo, era, sim, uma tentativa de melhoria do nível de espiritualidade da ICAR, mas não deixou de ser o mecanismo pelo qual a cisão da Igreja de Roma acabou ocorrendo, visando a uma maior diversidade religiosa dentro do Cristianismo. Esse processo não deixou de ser positivo para o surgimento posterior do Espiritismo. Léon Denis afirma em “No Invisível” que “O Espiritismo será aquilo que os homens fizerem dele”. Isso vale também para todos os movimentos humanos.
Por outro lado, a ICAR, haja vista a opinião dos Espíritos orientadores de Kardec em “Obras Póstumas”, deixou de receber prioridade, como movimento de vanguarda, em termos de espiritualidade, isto é, como ferramenta de ponta para a evolução dos indivíduos mais lúcidos da sociedade terrena. O que não significa que não receba proteção espiritual, mas proteção não quer dizer que toda a humanidade vai ser reunida sob a orientação do papa, como o texto de Roustaing afirma categoricamente, o que é um absurdo à luz da Doutrina Espírita. Se isso fosse verdade, para que Terceira Revelação? Sim, pois a suposta “Quarta Revelação”, que surgiu concomitantemente à terceira, já nasceu apontando supostos erros da terceira e prevendo o retorno ao Catolicismo.
Roustaing seria, por conseguinte, uma espécie de “Contra-Revelação” para, na melhor das hipóteses, caracterizar os Espíritas e o Espiritismo como uma espécie de nova “ordem do catolicismo”, assim como os jesuístas, franciscanos, dominicanos, entre outras?!


4)                  Uma única médium na obra de Roustaing: Emilie Collignon

Apesar de Chico Xavier, Divaldo Pereira Franco e Yvonne do Amaral Pereira terem redigido suas obras mediúnicas majoritariamente como médiuns únicos (com especial exceção para a parceria mediúnica de aproximadamente dez anos entre Chico Xavier e Waldo Vieira) nunca colocaram suas respectivas obras como sendo a “Revelação da Revelação” ou “Nova Revelação”. Divaldo Franco enfatiza que se tratam de obras subsidiárias da Doutrina Espírita.
Nesse sentido, nosso papel como estudantes do Espiritismo consiste em buscar uma análise pós-publicação, ou seja, procurarmos as corroborações, visando a um objetivo maior de controle da concordância universal do ensino dos Espíritos (CCUEE) para todas as obras tidas como espíritas, mediúnicas ou não.
Vale adir que as obras mediúnicas, mesmo de médiuns respeitáveis, podem apresentar autores espirituais diferentes e qualidades também diferenciadas. Mesmo um único autor espiritual, pelo mesmo médium, pode apresentar obras de diferentes níveis de conteúdo. Nenhuma obra está livre da necessidade de análise crítica, mediúnica ou não, bem como da necessidade de corroboração visando ser chancelada pelo CCUEE.
Nesse caso, perguntamos: Divaldo Franco costuma citar Roustaing em suas palestras? José Raul Teixeira costuma citá-lo? Há, inclusive, uma palestra de Raul Teixeira em que ele critica e coloca Roustaing e Ubaldi, entre outros, fora do Espiritismo (A palestra denomina-se “O Centro Espírita e a Dinâmica do Amor”). Raul Teixeira estaria equivocado? Ademais, conteúdos roustainguistas têm contribuído para o avanço das discussões doutrinárias espiritas, tendo-se em vista suas exposições de maior qualidade e/ou seus estudos mais sérios?! Bezerra de Menezes, que quando encarnado foi roustainguista, tem recomendado o estudo de Roustaing através da mediunidade de Divaldo Franco?

5)                  Roustaing não avaliou Emilie Collignon

               Toda faculdade mediúnica é “fugidia” (vide “O que é o Espiritismo”), ou seja, toda potencialidade mediúnica é “oscilante” (Divaldo Pereira Franco utiliza essa palavra e enfatiza essa realidade em várias de suas palestras). O próprio professor Herculano Pires, ao analisar a potencialidade mediúnica de José Pedro de Freitas, conhecido como Zé Arigó (médium do Doutor Fritz), comenta que a potencialidade mediúnica de Arigó vinha diminuindo com a idade. O mesmo aconteceu com Daniel Dunglas Home, considerado um dos maiores médiuns do século XIX (vide os vários artigos que Allan Kardec escreveu sobre Daniel Dunglas Home na Revista Espírita e também a obra de Arthur Conan Doyle “História do Espiritismo”, entre outras).
               Na história do movimento espírita (brasileiro e mundial), o número de médiuns que começaram a tarefa muito bem e não conseguiram persistir no ideal superior abraçado é muito grande. Portanto, para quem tem algum nível mínimo de responsabilidade doutrinária, para lidar seriamente com o fenômeno mediúnico, tal recomendação é mais do que fundamental, é óbvia. Roustaing foi precipitado e arriscou-se demasiadamente.  Vejamos o que o advogado de Bordeaux afirma na página 58 de seu prefácio [Roustaing, J.B. Os Quatro Evangelhos, 5 ed. FEB (1971) p.58]:
               “Em Janeiro de 1861, completamente restabelecido, cuidei de voltar ao exercício dessa amada profissão...”
               “Um distinto clínico daquela cidade me falou da possibilidade das comunicações do mundo corpóreo com o mundo espiritual, da doutrina e da ciência espíritas, como fruto dessa comunicação, objetivando uma revelação geral. Minha primeira impressão foi a de incredulidade devido à ignorância...”.

               Portanto, em janeiro de 1861, Roustaing estava convalescendo de uma grave enfermidade e pela primeira vez ouviu falar de Espiritismo. Não tinha a mínima noção do assunto.
               Na página 59 Roustaing começa um dos parágrafos afirmando:
               “Li O Livro dos Espíritos”.
               Depois de breves comentários, já na página 60, Roustaing relata:
               “Li em seguida O Livro dos Médiuns e nele se me deparou uma explicação racional: da possibilidade das comunicações do mundo corpóreo com o mundo espiritual...”
               Roustaing chega a afirmar nessa mesma página 60:
               “O mundo espiritual era bem o reflexo do mundo corporal”.
               Em verdade, o mundo corporal é que o reflexo do mundo espiritual, mas não seremos muito exigentes com Roustaing. Já na página 61, Roustaing comenta:
               “Perlustrei os livros das duas revelações, o Antigo e o Novo Testamento”.
               Nessa mesma página Roustaing comenta:
               “Mas, se por um lado a moral sublime do Cristo resplandeceu a meus olhos em toda a sua pureza, em todo o seu fulgor, como brotando de uma fonte divina, por outro lado, tudo permaneceu obscuro, incompreensível e impenetrável à minha razão, no tocante à revelação sobre a origem e a natureza espirituais de Jesus, sobre a sua posição espírita em relação a Deus e ao nosso planeta, sobre os seus poderes e a sua autoridade.”.
              
               Portanto, foi Roustaing, que não estando satisfeito, por não haver estudado e entendido minimamente LE e LM, que deseou uma nova revelação. Vejamos comentários de Roustaing registrados na página 64:

               “Na véspera do dia 24 de Junho de 1861...” teve uma comunicação supostamente do Espírito S. João Batista e “em Dezembro de 1861” foi sugerido a Roustaing “...ir a casa de Mme. Collignon, que eu não tinha a satisfação de conhecer e a quem devia ser apresentado...”. (grifos meus)

               Roustaing deixa claro desconhecer por completo Madame Collignon!
               Continua Roustaing (p. 64):
               “Oito dias depois voltei a casa de Mme. Collignon...”
               E, nesse mesmo dia, há uma comunicação mediúnica definitiva na qual as Entidades conclamam:
               “Metei mãos à obra...”
               “Cumpre que essa luz lhes seja mostrada...”
               “Mostrai-lhes a verdade...”
               “Com esse objetivo nós, oh! bem-amados, vimos incitar-vos a que empreendais a explicação dos Evangelhos em espírito e verdade, explicação que preparará a unificação das crenças entre os homens e à qual podeis dar o nome de Revelação da Revelação”.
              
               Em menos de um ano, um completo ignorante teve condições de conhecer profundamente a obra de Allan Kardec?! E, ademais, esse neófito começou a trabalhar com a médium Emilie Collignon em questão de dias após tê-la conhecido! E, como se não bastasse, estava coordenando a “revelação da revelação”! É ou não é muita ingenuidade?!
               O fato de Madame Collignon ter sido elogiada por Kardec anteriormente, não quer dizer que a mesma estava bem assistida espiritualmente meses ou anos depois. E mesmo que ela estivesse bem assessorada, Roustaing deveria ter feito testes para avaliar não somente ela, mas os Espíritos que estavam transmitindo informações para ela. Ele não fez nem uma coisa nem outra.
               Alguns estudiosos espíritas afirmam que Emilie Collignon não aceitava o conteúdo das mensagens (talvez até por sentir a vibração das entidades comunicantes), mas, segundo esses irmãos, teria sido Roustaing quem insistiu para que as mesmas fossem publicadas.
               O mais interessante e paradoxal na atitude dos roustainguistas, é que, para respaldar Emilie Collignon, eles repetem exaustivamente que Kardec fez comentários positivos a respeito dela. Engraçado! Nesses horas, os roustainguistas lembram de citar o opinião do Codificador do Espiritismo. Os roustainguistas também deveriam considerar as impressões de Allan Kardec, quando o Codificador deixa claro que a obra de Roustaing é “opinião pessoal” dos Espíritos que a ditaram e que tal obra “não pode ser considerada parte constituinte do Espiritismo”.
               Aliás, quando Kardec afirma que a obra “Os Quatro Evangelhos” é “opinião pessoal” dos Espíritos que a ditaram, e ele, Kardec, deixava inteiramente para os respectivos autores a responsabilidade daquilo que afirmavam, fica mais do que evidente que Allan Kardec não acreditava que os Evangelistas e os Apóstolos eram os autores de “Os Quatro Evangelhos”.

6)                  Roustaing evocou vários Espíritos, incluindo o precursor João Batista

               Roustaing afirma que evocou, mentalmente, João Batista, seu pai e seu guia protetor, sem comunicar o médium que o acompanhava. Isso obviamente é evocação e pode até ser, a depender de alguns detalhes, evidência do caráter ostensivo da mediunidade de Collignon, mas não é, de maneira nenhuma, garantia da identidade dos Espíritos. Admitindo, por hipótese, que obsessores estivessem assistindo Roustaing e Collignon, a partir do processo de leitura do pensamento (“telepatia”), os obsessores saberiam quem Roustaing estava evocando. E ele estava evocando “ninguém menos” do que João Batista! Isso além de outros Espíritos específicos!
               Nem mães desesperadas evocavam tanta gente assim quando procuravam o Chico Xavier! E nem elas evocariam São João Batista, precursor de Jesus de Nazaré! Digamos que, além de volumosa (3 Espíritos de uma só vez!), não foi uma “evocação humilde” por parte de Roustaing!
               Ademais, Roustaing não seguiu o princípio xavierino que afirma que “o telefone toca de lá para cá”. Ainda assim, o exercício poderia ser super positivo, desde que o recebimento das mensagens não implicasse necessariamente na publicação das respectivas mensagens. Chico Xavier queimou malas de mensagens mediúnicas no início de suas tarefas; Divaldo Franco também queimou malas; Raul Teixeira idem. Roustaing, pelo jeito, publicou tudo!
               Em suma, os Espíritos assinariam o nome da(s) personagem(ns) evocada(s) por Roustaing, através do médium que ignorava a evocação, para que Roustaing, neófito em Espiritismo, ficasse convicto da autenticidade não só da comunicação, mas igualmente das assinaturas e de sua “missão providencial” (dada à sua ignorância em matéria de mediunidade). Isso é tão elementar em Espiritismo que fica claro o nível de risco a que se submetiam Roustaing e Collignon. Vou transcrever o texto roustainguista para facilitar para quem não tem a famigerada obra (perceba que para Roustaing o processo de recebimento já “provou” sua autenticidade e ele submetia-se à tarefa como um “servo”, ou seja, nenhuma postura de análise crítica foi assumida pelo advogado):
               “Na véspera do dia 24 de Junho de 1861, eu rogara a Deus, no sigilo de uma prece fervorosa, que permitisse ao Espírito de João Batista manifestar-se por um médium, que se achava então em minha companhia e com o qual diariamente me consagrava a trabalhos assíduos. Pedira também a graça da manifestação do Espírito de meu pai e do guia protetor.
               Essas manifestações se produziram espontaneamente, com surpresa do médium, a quem eu deixara ignorante da minha prece. Constituíram para mim uma fonte de alegria imensa, com o me provarem que a minha súplica fora ouvida e que Deus me aceitava por seu servo”. (grifos meus) [Roustaing, J.B. Os Quatro Evangelhos, 5 ed. FEB (1971) p.64]

7)                  Sobre João Evangelista, Paulo e outros Espíritos que seriam autores tanto das obras de Kardec como da obra de Roustaing

A questão concernente a João Evangelista estar presente, supostamente, tanto na obra de Kardec como na obra de Roustaing não diz respeito, evidentemente, ao dom da ubiquidade e eventuais dificuldades para a Entidade espiritual manifestar-se em dois lugares diferentes, tais como Paris (com a equipe mediúnica e espiritual de “O Espírito de Verdade” e Allan Kardec) e Bordeaux (com os Espíritos que manifestaram com Emilie Collignon e J. B. Roustaing). Vale lembrar que André Luiz manifestava-se em Pedro Leopoldo-MG e em Uberaba-MG, respectivamente através de Chico Xavier e Waldo Vieira, para a transmissão da obra “Evolução em Dois Mundos”.
O problema, obviamente, diz respeito ao conteúdo das obras que são totalmente discordantes. Dessa forma, a pergunta principal permanece vigente: como é que o mesmo Espírito afirma uma tese para um médium e apresenta outra completamente diferente para outro médium? Como é que o mesmo Espírito, ainda mais do nível do Apóstolo e Evangelista João, ensina conteúdos discordantes em dois ambientes diferentes?
Logicamente, isso é inadmissível, ainda mais para Espíritos desse nível. Dessa forma, podemos concluir que pelo menos uma das mensagens não é verdadeira.
Portanto, ou não se trata do mesmo Espírito, apenas de um Espírito mistificador usando de um nome célebre para ser mais facilmente aceito ou estamos frente a um problema seríssimo de “filtração mediúnica”?
De qualquer maneira, se as obras são discordantes em vários tópicos, não podem ter sido elaboradas pelo mesmo grupo de Espíritos e não podem ser estudadas dentro de uma mesma diretriz doutrinária.

Novamente, enfatizamos que quem precisa provar que suas novas informações têm consistência doutrinária é aquele que acrescenta “novidades” e, sobretudo, que apresenta teses discordantes das bases doutrinárias (tal tarefa demonstrou-se impossível, mas a divulgação da obra do advogado de Bordeaux continua). Nesse contexto, quem tem que provar a coerência doutrinária de Roustaing são os roustainguistas.  Isso se o companheiro acreditar ser “roustainguista e espírita”, pois se for apenas roustainguista e não um suposto “espírita roustainguista”, ele está no seu total direito e não cabe nenhuma reprovação de nós, espíritas.

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