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terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

Buscar a verdade ou ter razão?

Buscar a verdade ou ter razão?
Vladimir Alexei

Vladimir Alexei

vla.alexei@gmail.com
Belo Horizonte, das Minas Gerais, em
05 de fevereiro de 2018.

É recorrente, no movimento espírita brasileiro, a polêmica em torno da divulgação doutrinária. Parece-nos característica do ser humano, independente da religião. Em alguns momentos, as diferenças se avolumam e o desentendimento de ideias passa a ditar o ritmo da desunião no movimento, como se não fosse mais possível uma convivência fraterna, em meio a pensamentos diferentes.
A mais recente, versa sobre as alterações existentes na obra A Gênese, publicada pela primeira vez por Allan Kardec em 1868. Quando as discussões são amplas e as reflexões vão além dos extremos (gosto, não gosto; aceito, não aceito; concordo, discordo; etc...), é possível extrair informações interessantes que estimulam a busca por novos conhecimentos.
Alguns companheiros tem a desfaçatez de afirmar que esse tema eclodiu sobre os auspícios dos “espíritos superiores” que, provavelmente, cansados em ver a “lengalenga” dos encarnados, decidiram abrir o livro “preto” (ou seria vermelho?), contendo anotações que os encarnados não poderiam saber antes, porque não estavam preparados. Estamos preparados?
Nietzsche diz o seguinte: “à força de querer buscar as origens nos tornamos caranguejo. O historiador olha para trás e acaba crendo para trás”. O olhar apressado, do presente, ante informações do passado, torna as diferenças ainda mais absolutas, o que suscita outras reflexões.
O professor Cesar Perri, ex-presidente da federação, usa tom adequado e a linguagem prudente de um catedrático, ao reconhecer a importância dos questionamentos ante o que se convencionou chamar de “fatos novos”, a respeito das alterações ocorridas na quinta edição de A Gênese. Elementos antes dispersos, ganharam interpretação e análise conjunta que chamou a atenção. Isso seria bom, se não fosse a ausência de diálogo entre os espíritas...
Polemiza-se o assunto ao se questionar se houve “adulteração”, já que alteração houve, o que parece consenso. Quem tem razão? Foi realmente adulterado? Quem está em busca da verdade? O uso da razão só perde para a vaidade em manifestar-se sempre, e apenas, quando a conveniência aponta que é o momento. Dentre os que, no limite de seus conhecimentos, expõem-se a críticas quando erram e aqueles que só aparecem para criticar aquilo que a lógica diz ser errado, seja prudente e observe... a lógica e a razão continuam sendo usadas de forma errada. Se o que motiva a lógica é a vaidade, perde-se a razão.
Por outro lado, o movimento espírita ganhou um novo “vilão”: Leymarie. Voltando às mentes férteis e cultas de nosso movimento espírita, citado no terceiro parágrafo desta pensata, questionamos: por que os “espíritos superiores” estimulariam o aparecimento de mazelas de uma figura até então secundária, cuja sombra não foi capaz de projetar-se ante a luz dos ensinamentos enfeixados nas obras de Allan Kardec? Permitiriam isso para fazer com que a dissensão entre os espíritas aumentasse? Os doutores dirão que sim. Simples assim.
Fico com Nietzsche: no afã de buscar na história os fatos, ou a melhor versão para os fatos, a figura de Leymarie ganhou destaque negativo, como se isso alterasse todas as mazelas produzidas no movimento espírita brasileiro, pela federação, ao publicar as obras de um certo advogado francês. E mesmo sendo Leymarie um ser egoísta que agiu por conta de interesses próprios, o que dizer de todos os presidentes que passaram pela federação e eram adeptos do pensamento do advogado francês? Em termos práticos, continuamos na periferia dos eventos.
Henri Sausse (Allan Kardec), Gaston Luce (Leon Denis) e tantos outros, dedicaram-se, com os recursos que possuíam, para preservar não somente a memória desses expoentes, mas também seus legados, suas obras. Por que ainda alçamos figuras tão falíveis quanto nós outros à condição de “Judas”? O que buscamos com isso? A verdade? A federação há mais de um século se mantem à margem da verdade e, ao primeiro vestígio de um pensamento contrário, manifesta-se sem a menor convicção daquilo que deveria dizer. Seria melhor não ter dito nada.
Isso quer dizer então que devemos aceitar tudo? Deixar tudo como está? Evidentemente que não. A busca pela verdade exige despir-se de certezas e convicções que foram construídas ao longo de uma Vida, para conseguir ver alternativas onde antes figuravam apenas hipóteses. Kardec exemplificou isso ao abrir mão de suas ideias em prol das orientações trazidas pelos espíritos superiores. “Hoje, a batalha se trava no terreno do Espírito” (Edgar Morin).




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