Roberto Cury /Goiânia
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Roberto Cury |
“Quando o Senhor nos exortou à pureza infantil, como sendo a condição de entrada no plano superior, não nos convidava à insipiência ou à incultura. Recomendava-nos a simplicidade do coração, que se revela sempre disposto a aprender.” Emmanuel.
Os noticiários escritos, falados e televisivos estão repletos de uma enormidade de notícias sobre violências as mais inusitadas.
Manchete de capa do jornal “O Popular”, de Goiânia, do dia 23 de fevereiro: “20 horas de crimes. Assaltos, brigas, tiroteios, bomba e homicídios na Capital. Tudo no mesmo dia.” E, no texto introdutório, ainda na capa, remetendo para a matéria da página 4: “O crime não deu folga ontem (22) aos moradores da Grande Goiânia. Em 20 horas, 13 graves ocorrências. Entre mortos e feridos, nem todos escaparam. O estudante Kelvin Silva foi morto com um tiro na cabeça. Assaltos a farmácia, supermercado, livrarias e joalheria deixaram policiais e empresário feridos.”
Semana passada, a mãe do cantor sertanejo Adriano, foi estrangulada depois de várias pauladas com um taco de “críquete”, na cabeça, pelo namorado, roubada em pertences e, inclusive, nos seus cartões de crédito e demais documentos pessoais, sem que se apontasse qualquer motivo aparente para o crime.
Roger da Silva, menino de 9 anos, sobrevivente da chacina do dia 18, está internado em estado gravíssimo na UTI do Hospital Evangélico de Anápolis. Rogério Lopes dos Santos, de 19 anos, confessou ter matado a enxadadas, além da avó de 75 anos, também dois de seus irmãos um de 13 e outro de 15 anos, onde moravam.
Psicólogos e psicoterapeutas aturdidos, cada vez mais, se surpreendem com as causas apontadas para tanta violência estrugindo no mundo. Buscam, incessante e ininterruptamente, fundamentos de cada causa para compreensão de cada efeito.
Livros, internet, teses, tudo pesquisam, interessados na descoberta do significado e da importância das causas em cada um dos efeitos da violência em geral, para, assim, encontrarem soluções que minorem os sofrimentos das vítimas e fortaleçam a paz e a harmonia nas relações humanas.
A propensão à violência é característica dos Espíritos vinculados ao planeta Terra, variando apenas quanto à intensidade e aos estímulos necessários para desencadear a ação violenta.
Os estudiosos têm apontado vários fatores como causas da tipificação da violência. A cultura, a educação, o lazer, o emprego, a afetividade, sendo que a ausência de um ou de vários destes tipos têm sido considerados como carências dos indivíduos violentos.
Assim, a violência resultaria de um estado interior. Toda pessoa insatisfeita ou carente, interiormente explodiria e isso, certamente, pode acontecer com todos nós.
Outro fator que vem sendo considerado como causa preponderante para a violência, nos dias atuais, é a da leviandade de muitos mestres e educadores imaturos, sem habilitação moral para tais propósitos, ou seja, para a educação de novos indivíduos que aportam na crosta terrestre, facilitando a disseminação da violência.
Uma argumentação muito utilizada nestes tempos é que, graças à mídia, agora ficamos sabendo dos fatos violentos tão logo acontecem, pois, no passado, havia coisas muito mais drásticas, só que ninguém sabia, porque inexistiam imprensa, TV, rádio, jornal, muito menos Internet.
Lembramos de que os reis, os senhores feudais tinham direito de vida e morte sobre as pessoas, que havia escravidão legalizada, que nos faz entender o quanto a humanidade estava mergulhada na ignorância das violências que a atingiam.
Diante da escala de violência, dá pra acreditar que a Terra está mesmo evoluindo para melhor?
A humanidade está evoluindo. A Terra já passou de mundo primitivo para mundo de expiações e provas e nessa escala se transformará agora em mundo de regeneração, um lugar onde o bem terá sobrepujado o mal.
Entretanto, uma das causas, ainda enclausurada no seio da humanidade e responsável por uma enormidade de violências, reside no “espírito de competição”, muitas vezes elogiado e engrandecido nas rodas sociais como sinal de inteligência, na expressão corriqueira de que “o mundo é dos espertos”. Infelizmente, o que se vê destacando são o orgulho e o egoísmo, esses dois defeitos do caráter, verdadeiras chagas que retardam o crescimento do homem e o desenvolvimento do planeta.
No processo regenerativo, os homens deverão se transformar. Então, só aqueles que vencerem seus impulsos violentos, fazendo-se construtores da paz, terão a oportunidade de habitar a Terra em seu período de regeneração.
Os mestres e os educadores referidos serão os próprios pais, que ao receberem os espíritos na condição de filhos, também ficam incumbidos do trabalho de moldagem dos mesmos dentro dos princípios da moralidade e da vivência no bem.
Deus nos confiou as crianças para que, através da educação reta, instruções corretas e formação do seu caráter, estajamos integrados na participação efetiva da transformação do mundo.
Mas, para tanto é preciso que nos atenhamos a princípios básicos, não só na reformulação dos conceitos, mas, principalmente, porque existem razões especiais para que pudéssemos recepcionar essas crianças em nosso lar.
“A moral cristã precisa ser ministrada à criança, desde tenra idade, tendo em vista o seu contínuo progresso intelecto-moral. Não basta, portanto, propiciar-lhe instrução, mas, também, a educação que faz homens de bem, favorecendo que alcance êxito na sua programação reencarnatória. A criança é o esteio da Humanidade. Educá-la com instrução e amor é sublimar a causa do progresso evolutivo dos seres, instituída pelas Leis de Deus.” (RIE, ano LXXXVII, nº 12, editorial).
A formação e o preparo da criança envolvem hábitos saudáveis e cultivo do esporte, das artes e mais atividades físicas, mentais dentro da moral cristã que se regra pelo amor a Deus, a ela mesma e ao próximo.
A internet e os recursos audiovisuais devem ser orientados para que deles a criança tire o máximo de proveito para sua formação e educação sempre voltadas para o bem pessoal além do benefício coletivo.
Não é com pancadas ou terríveis castigos que ferem a carne que se corrigem defeitos de caráter nos espíritos recém-vindos. Muito menos gritos e elevação de voz para ridicularizar a criança. As palavras chulas, os palavrões, a desídia, nunca conquistaram pontos positivos no espírito infantil, porque jamais a violência conseguirá despertar a paz, enquanto a mansuetude, o respeito, a benevolência, a compreensão e o amor são responsáveis pelo despertamento da bondade além de estabelecerem alegre e feliz cumplicidade entre os pais e as crianças.
Os bons exemplos no lar, são a essência da formação moral da criança. Mostrar-lhe a importância das regras e dos limites, com firme energia e amor, constitui a missão dos pais promovendo o discernimento daquele ser em desenvolvimento na direção do bem.
Ter mansidão é ter fé na providência divina, o que nos dá a tranquilidade íntima, a consciência de que não precisamos agredir, nem em pensamento, quem quer que seja.
Para que as coisas fiquem bem, não precisamos forçar. Precisamos é agir respeitando o semelhante e as suas diferenças.
Os pais nunca poderão tomar atitudes dúbias, nem demonstrar incertezas nos seus atos, para que as crianças tenham sempre em mente a linha reta da correção, da responsabilidade dos seus atos e da verdade incondicional. Devemos nos pautar como o ensino do Cristo de Deus: “seja o seu dizer e o seu fazer, sim, sim; não, não”.
“Não existe este ser encarnado ou desencarnado que não deseje verdadeiramente a felicidade sem mesclas, o amor sem fronteiras, o carinho verdadeiro sem interesse, a bonança da verdade, a paz de espírito, a comunhão com Deus. Para um dia podermos dizer: Eu e o Pai somos um!” ( Injúrias e violências, artigo de Walkiria L. de Araújo Cavalcante, em O Clarim, n 6, ano CVII).
Kardec nos alerta para a lei introduzida por Jesus para que possamos segui-Lo e chegar ao Pai: “Por essas máximas, Jesus faz da doçura, da moderação, da mansuetude, da afabilidade e da paciência uma lei; condena por conseguinte, a violência, a cólera e mesmo toda expressão descortês com respeito ao semelhante.”
Em nossa Casa Espírita, temos recomendado aos pais de crianças problemas que quando do desprendimento durante o sono físico, a criança está na posse plena do seu espírito que não é infantil. Façamos preces e em seguida esclareçamos, com voz calma e tranquila, sobre os efeitos positivos de viver com correção, com atitudes boas, com discernimento do bem e do bom caminho, contando com seus anjos guardiães, assim o espírito encontrará as melhores soluções em cada passo de sua existência corporal, crescendo e se desenvolvendo para um mundo cada vez melhor até pelo seu próprio contributo.
Richard Simonetti nos lembra que "quando a contenção da violência deixar de ser um problema policial e se transformar em questão de disciplina do próprio indivíduo; quando a paz for produto não da imposição das leis humanas, mas da observação coletiva das leis divinas, então viveremos num mundo melhor."
Destarte, os instintos mais bravios, as violências mais ferozes, se amainarão, até que, definitivamente, serão extintas do globo terrestre que, então estará transformado em Mundo Regenerado.
“Bem-aventurados aqueles que agem com brandura porque possuirão a Terra. Bem-aventurados os pacíficos, porque serão chamados filhos de Deus.” – Mateus V, 4 e 9.
CONTO
EM TORNO DA PAZ
O relógio tilintou, marcando oito horas, quando Anacleto Silva acordou na manhã clara. Lá fora, o Sol prometia calor mais intenso e a criançada disputava bagatelas como vaga chilreante de passarinhos.
Anacleto estirou-se no leito, relaxando os nervos, e, porque iniciaria o trabalho às nove, antes de erguer-se tomou o Evangelho e leu nos apontamentos do Apóstolo João, capítulo catorze, versículo vinte e sete, as sublimes palavras do Celeste Amigo:
A paz vos deixo, a minha paz vos dou. Não vo-la dou à maneira do mundo. Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize. - “Alegro-me na certeza de que a paz do Senhor envolve o mundo inteiro”. Onde estiver, receberei o amor do Cristo, que assegura a tranquilidade, em torno do meu caminho.
Sei que a presença de Jesus abrange toda a Terra e que a sua influência nos governa os destinos. Desfrutarei, assim, a paz entre as criaturas.
O Eterno Benfeitor está canalizando todas as mentes para a vitória da paz. Por isso, ainda mesmo que os homens me ofendam, neles procurarei enxergar meus irmãos que o Divino Poder está transformando para a harmonia geral.
Regozijo-me na convicção de que o Príncipe da Paz orienta as nações e que, desse modo, me garantirá o bem-estar. Recolherei do Céu a bênção da calma e permanecerei nos alicerces do entendimento e da retidão, junto da Humanidade.
Louvo o Senhor pela paz que me envia hoje, esperando que Ele me sustente em sua paz, agora e em todos os dias de minha vida.
Após monologar, fervoroso, levantou-se feliz, mas, findo o banho rápido, verificou que a fina calça com que lhe cabia comparecer no escritório sofrera longo corte de faca.
Subitamente transtornado, chamou pela esposa, em voz berrante.
Dona Horacina veio, aflita, guardando nos braços uma pequerrucha doente. Viu a peça maltratada e alegou triste: - Que pena! Os meninos estão à solta, e eu ocupada com a pneumonia da Sônia.
Longe de refletir na grave enfermidade da filhinha de meses, Anacleto vociferou:
- Que pena? É tudo o que você encontra para dizer? Ignora, porventura, que esta roupa me custou os olhos da cara?
A senhora, sem revidar, dirigiu-se a velho armário e trouxe-lhe um costume semelhante ao que fora dilacerado.
Pouco depois, ao café, notando a ausência do leite, Anacleto reclamou, irritadiço.
- Sim, sim – explicou a dona da casa -, não pude enfrentar a fila... Era preciso resguardar a pequena...
Silva engoliu alguns palavrões que lhe assomavam à boca e, quando abriu a porta, na expectativa do lotação, eis que o sogro, velhinho, lhe aparece, de chapéu à destra encarquilhada, rogando, humildemente:
- Anacleto, perdoe-me a intromissão; contudo, é tão grande a nossa dificuldade hoje em casa que venho pedir-lhe quinhentos cruzeiros por empréstimo...
- Ora, ora... – respondeu o genro, evidenciando cólera injusta – onde tem o senhor a cabeça? Se eu tivesse quinhentos cruzeiros no bolso, não sairia agora para encarar a onça da vida.
Nisso um carro buzinou à reduzida distância, passando, porém, de largo, sem atender-lhe ao sinal.
- Malditos! Como seguirei para a repartição? Malditos! Malditos!...
Outro carro, no entanto, surgiu rápido, e Silva acomodou-se, enfim.
Mas, enquanto o veículo deslizava no asfalto, confrontou a própria conduta com as afirmações que fizera ao despertar, e só então reconheceu que ele, tão seguro em exaltar a harmonia do mundo, não suportara sem guerra uma calça rasgada; tão convicto em prometer a si mesmo o equilíbrio no Senhor, não se conformara ante a refeição incompleta; tão pronto em proclamar o seu prévio perdão às ofensas humanas, não soubera acolher com gentileza a solicitação de um parente infeliz, e tão solene em asseverar-se nos alicerces do entendimento, não hesitara em descer da linguagem nobre para a que condiz com a gíria que amaldiçoa...
E, envergonhado por haver caído tão apressadamente da serenidade à perturbação, começou a perceber que, entre ele e a Humanidade, surgia o lar, reclamando-lhe assistência e carinho, e que jamais receberia a paz do Cristo por fora, sem se dispor a recolhê-la por dentro.
Livro: Cartas e Crônicas – Médium: Chico Xavier - Espírito Irmão X.
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